POR TRÁS DE TODA
APARÊNCIA HÁ SEMPRE UMA VIDA SECRETA – Imagem:
arte do professor, gravurista e pintor tcheco Jan Cernos. - Por trás da boa aparência, há sempre uma vida
secreta. Esse o tema da hora encetado pela tropa na mesa do bar. Claro, não
pode faltar assunto. Cada um vai chegando com a novidade e o que parecia ser
coisa de pouca monta, vai assumindo caráter de escândalo. Sempre assim. Quando o
assunto não é futebol, o cardápio das conversas é sobrecarregado de
enredamentos com temas como cornagens, gafes, seboseiras, afanagens e as mortes
matadas ou morridas, sobretudo às terças que é dia de assunto renovado. Futebol
é tema de acalorados debates todas as segundas, quartas, quintas e sextas,
menos sábado e domingo, porque todo mundo vai fazer média com aquela que
esquenta os pés todos os dias e noites, só carimbando com a turma na segunda
pra zoar quem perdeu e vangloriar quem ganhou no jogo do fim de semana. Ufanismo
e gozações, sempre regadas com insolentes pilhérias e desafiadores motejos para
desancar o discordante de plantão. Logo, suscitam mexericos com anúncio do mais
novo chifrado, da gostosona gaieira flagrada, dos micos dos alesados, dos
roubos dos cofres públicos ou dos que foram torados pelas balas perdidas, ou
que bateram as botas assim sem mais nem menos. Um dos mais preferidos é o
prefeito: Aquele gigolô de viado, viciado nas apostas da porrinha e carteado, posando
de falso moralista na primeira fila da missa. Ou de cada um dos vereadores:
Aquele salafrário fidumaégua, mente que o cu apita, ainda bota a mulher quase
nua pra desfilar pros ricaços pra arrancar grana deles! Aquilo é um fidapeste,
vivia à custa das fodas da mãe! Isso quando não entra na roda a senhora esposa
de uma autoridade local: Ela apareceu na varanda de babidol transparente,
nuínha, cara de sonsa, descalça e tarada, é gaia, meu, a carne é fraca e homem
é tudo cachorro: jogou o osso, se ferrou! É, meu, uma gaia destrói tudo. Quem
segura a onda? Ninguém é Tomé para ser fechadura, a carne de casa também enjoa
de quase ter que se virar no viagra pra poder traçar a obrigação da semana, né
não? Semana ou mês? Tem que vá por semestre. Homem nenhum presta, tudo carrega
a marca suja de freio na cueca, deixa o pingo do mijo na tampa da bacia do
aparelho sanitário, chulé brabo, penteilheira catingosa, tudo é cafajeste, não
tem um que se salve! Danou-se! Afora aqueles que, amostrados que só como eu,
gostam de aparecer mais que o devido e carregados de soberba com florilégios,
crestomatias e parnasos, quando não passam de poetastros fabricantes de
pechisbeques, sacudindo loas de segunda mão por próprias. Peidam o plágio,
quando não a apropriação indébita. Só amostramento e mais nada. É quando um
gaiato – expondo uma camiseta com a inscrição: A terra gira em torno do Sol!
Grande novidade, os cientistas só comprovaram o que os bêbados já sabiam –
solta da sua: Todo mundo tem segredo! Ora, se tem. Quem tem a coragem de ser
hipnotizado para contar o que tem de escondido, hem? Haja Freud. Ah, uma amiga
minha mesmo já disse: Deus me livre de ser hipnotizada, quero que ninguém saiba
meus segredos, são só meus. Imagine! Quem é capaz de contar uma perfídia, uma
sabotagem, uma caída por cima do que era dos outros, hem? Tem gente que roubou
com força e pensa que ninguém sabe, todo mundo sabendo, só brechando os pés
dele. Os sabidos que pensam que todo mundo é besta, hem,hem. Pois é, cada um
seus pavores e mistérios. Nada, basta tomar uma despranaveada e logo logo passa
a chave e abre o cofre, de destampá-lo a depor tudinho que estava enterrado no
maior dos esconderijos com não sei quantos cadeados e grades lá dentro há
séculos. É, quando esborra não tem quem se segure, lava o remordimento, chega
fica leve como se salvasse uma alma. Não tem jeito é segredo de morto, até quem
sabe doi na memória, melhor esquecer. Nada, quando o pipoco dilata é estilhaço
pra todo lado. Papo de morte, vamos mudar de assunto, homem. Vambora. Imagina
só: quantos, tarde da noite, não estão rendendo homenagem pruma dessas beldades
e morrendo numa punheta, hem? Rapaz, num é que a filha daquele cabra safado é
bonita como a gota! E a daquele outro sovina, quando ela passa endoida o juízo
e acelera as batidas do coração. Tudo provocação, essas danadas são pecado
mesmo! Não tem aguente. Imagina, e a siririca das viúvas, ninfomaníacas e
freiras, tudo morrendo na vela, arrá!? Ah eu lá. Uma dessa não cai do céu no
meu colo. E nos fins de expedientes da repartição, hem, quando ajeitam o serão
e só ficam eles dois, chefe e secretária, ou no escurinho de casa o patrão e a empregada
quando a dona sai pras compras ou. E na hora do flagra? Não é o que você está
pensando! Ridículo! Numa bocada dessa o cabra sabe: entra, só depois vê que é
engano. Pois é, aprende a lição? Hem? Nada, não entende, mas gosta! Cai de
cabeça: o amor sobre todas as coisas. Vai ver depois só o reboliço: um drama
silencioso e triste. Coração não é terém que se dê confiança, terreno traiçoeiro.
Inda mais quando quem pensa é o pingolim, aí tudo padece, né? Pois é, por trás
de toda aparência há sempre uma vida secreta. Vamos simbora que já tá hora da
onça beber água, gente! © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados.
Veja mais aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá é dia de especial com a banda britânica de rock progressivo
Genesis: Live Concert Turn It on again, Live whem in Rome & In
The Cage Medley Afterglow & muito mais nos mais de 2 milhões de acessos ao
blog & nos 35 Anos de Arte
Cidadã. Para conferir é só ligar o
som e curtir.
PENSAMENTO DO DIA – [...] resultado
da evolução de um processo profundamente afetado pela influencia decisiva de
três fatores principais: a concentração urbana, a domesticação social do
capitalismo e o progresso contínuo da tecnologia [...] O neo-humanismo, como um social-humanismo cientificamente lúcido e
tecnologicamente eficaz, é tão improvável quanto indispensável e perfeitamente
factível. Ter consciência desses aspectos é um passo dado em direção à sua
instituição. Trechos extraídos de O
humanismo na sociedade tecnológica de massas (Revista Brasileira, 2007), do
advogado, sociólogo, escritor e cientista político Hélio Jaguaribe.
EDUCAÇÃO HOLÍSTICA – [...] a
que envolve os alunos de maneira ativa nos processos de ensino/aprendizagem e a
ter uma responsabilidade pessoal e coletiva, em que a relação professor/aluno
tende a ser igualitária, aberta, dinâmica; o aluno é capacitado para que se
aproxime criticamente de contextos culturais, sociais e políticos e enfatiza-se
a conexão critica que pode ser desenvolvida entre a sala de aula e o mundo real.
[...]. Texto extraído de Educação
integral: uma educação holística para o século XXI (Artmed, 2002), do
professor e pedagogo espanhol Rafael Yus.
Veja mais aqui.
QUAL É A DE TUDO - [...] Um
homem tinha um poderoso computador e queria saber se os computadores conseguiam
pensar. Resolveu então perguntar-lhe, certamente em Fortran castiço: “Você
conseguirá um dia raciocinar como um ser humano?” O computador zumbiu, fez
alguns ruídos e piscou luzes, imprimindo por fim sua resposta numa folha de
papel, como é hábito dessas máquinas. O homem correu para pegar o impresso,
ondeu leu, impecavelmente datilografas, as seguintes palavras: “Isso me faz
lembrar de uma história”. [...]. Texto do biólogo, pensador sistêmico,
epistemólogo da comunicação e antropólogo inglês Gregory Bateson, extraído da obra Sabedoria incomum: conversa com
pessoas notáveis (Cultrix, 1995) de Fritjof
Capra. Veja mais aqui.
A
CONFISSÃO DE LEONTINA – [...] Subimos
a escada de caracol e entramos no quarto. Então fiquei sentada na cama. Ele riu
e agradou meu queixo. Depois me deu um sabonete vere e avisou que o banheiro
ficava ao lado. Não me envergonho de dizer que aprendi a tomar banho com o
Rogério. Você tem que tomar banho todo dia e lavar bem as partes ele ensinou
quando expliquei que em casa a gente só tamava banho de bacia em dia de festa porque
nas outras vezes só lava o pé. E na casa da minha patroa ela não gostava que eu
me lavasse pra não gastar água quente. Quando voltei do banheiro embrulhada na
toalha ele me deu pra vestir uma cueca e uma camiseta com umas coisas escritas
no peito. Perguntou se eu sabia ler isso daí que estava escrito e foi logo
explicando que era tudo em inglês e repetiu e me fez repetir inglês inglês e
Estados Unidos ele disse e ficou enxugando meu cabelo que pingava água. Já
tinha estado por lá e isso escrito na camiseta queria dizer Eu não posso deixar
de te amar. Ainda sou magra mas nesse tempo era mais magra ainda e aquela roupa
ficou tão grande e fui me esconder na cama debaixo do lençol, ele riu e se
deitou do meu lado. Você está com medo? Ele perguntou. Confessei que estava.
Não tenha medo ele disse. É como beber um copo d’água. [...]. Foi com ele que aprendi isso de dizer que
não tem problema. Nada de se aporrinhar que a vida assim acaba ficando uma puta
aporrinhação ele repetia quando eu me quexava de alguma coisa. Não tem problema
Joana. Não tem problema. Aprendi também a fazer amor e a fumar. Até hoje não
consgui gostar de fumar. Comprava cigarro e ficava fumando porque todo mundo em
nossa volta fumava e ficava esquisito eu não fumar. Mas dizer que gostava isso
eu não gostava mesmo. Também fazia amor tudo direitinho para deixar ele
contente mas sempre com uma tristeza que não sei até hoje explicar. Essa hora
do amor foi sempre a mais sem graça de todas. Justo na hora de ir pra cama com
ele já esperando eu inventava de fechar a torneira que deixei aberta ou ver se
não tinha perdido minha carteira de dinheiro. Vem logo Joana que já estou quase
dormindo o Rogério me chamava. Quando não tinha mais remédio então eu suspirava
e ia com cara de boi indo pro matadouro. Me sentia melhor se tomava um bom copo
de vinho mas era depois do fuque-fuqye que o Rogério cismava de beber. E de
cantar a modinha do marinheiro. [...]. Trecho de A confissão de Leontina e fragmentos (Ediouro, 1996), da
escritora premiada e membro da Academia Brasileira de Letras do Brasil e de
Lisboa, Lygia Fagundes Telles. Veja mais aqui e aqui.
DOIS
POEMAS - Ah, meu
coração: Ah, meu
coração / fluente atento apocalíptico resoluto / pleno de vícios / alegre
formoso / e em forma de gota. / No amor tem seu reino: / exercício inquieto e
longo / (de claro e lúcido desempenho) / invadindo o outro / mas invadindo-o de
fato / além do tato do cansaço do medo / cavalgando-o como idéia / esporas
leves / pernas rudes / Égua e cavalos / galope escancarado / à luz de outras
janelas. / Porque se não agarra assim o outro / meu coração se perde / deixa-se
ficar como coisa conclusa / vendo e tendo como urgente / um limite falso e
amortizado. / Solidão de árvore / esperando o fruto. / Solidão de Lázaro / esperando
o Cristo. / Solidão de alvo / esperando a seta. / Ave, poeta. Ontem: Ontem
/ noite alta / na cama desfeita / tua imagem me surpreendia / cravando um
punhal doce / no meio do meu corpo / onde o desejo renascia. / Ninguém nos via
/ nem o sono / que diante da tua presença / bruscamente se evadia. / Ontem / noite
alta / na cama desfeita / nasciam flores / nasciam flores. Poemas
da poeta, advogada e psicóloga Neide Archanjo.
MOSTRANDO AS PRENDAS
Imagem: Três Mulheres (1945), xilogravura a
cores sobre papel do desenhista, ilustrador, gravador e professor Oswaldo
Goeldi (1895-1961).
Três moças receberam presentes muito bonitos:
um anel, um par de brincos e uns sapatinhos de baile, todos de obra de luxo e
vistosos. Um dia receberam elas uma visita e, para mostrar os presentes, chamando
atenção sobre eles, imaginaram uma cena que foi assim: A mais velha apontando
com o dedoonde brilhava o anel,incicou a sala: -Menina, venha vai varrer esta sala! A do meio,sacudindo a
cabeça e fazendo faiscar os brincos,completou: -Que sala suja! A ultima,ultima
passando o pé no chão,concluía: -Neste canto já está limpo!Neste canto já está
limpo! E as três mostraram as ricas prendas que tinham recebido.
Facécia
extraída da obra Contos tradicionais do
Brasil (Global, 2006), do historiador, antropólogo, advogado e jornalista Luís
da Câmara Cascudo (1898-1986). Veja mais aqui e aqui.
Veja mais:
A
felicidade era dela & ela pegou e me deu, o cinema de David
Lynch & Anne Bancroft, a
música de Elba Ramalho & a arte de Luciah Lopez aqui.
Ponte
sobre águas turvas na Crônica de amor por ela, Lima Barreto, Luigi Pirandello, Dario Fo, Bigas Luna, Tracey Moffatt, Ana Terra, Aitana
Sánchez, Rui Carruço, Consuelo de Paula, Ciberartes & André
Lemos & Regine Limaverde aqui.
Frineia,
Euclides da Cunha, Federico Fellini, Amedée Ernest Chausson,
Ana Terra, Antonio Parreiras & Jean-Léon
Gérôme aqui.
O Brasil
de Caio Prado Júnior, A cultura brasileira de Manoel Diégues Júnior, Sociologia
Crítica de Pedri Guareschi & Educação Comparada de Nicholas Hans aqui.
Ezra
Pound, Graciliano Ramos, Miguel Torga, Leonardo Boff, Nelson Werneck Sodré,
Otto Maria Carpeaux, Silvio Romero, Rogel Samuel, Raúl Castagnino, Oliveiros
Litrento, Sindicalismo & Repressão de Paulo Meneses Profeta, Raimundo
Carrero, Niraldo Farias & Sheila Maluf, Enaura Quixabeira,
Ideograma de Haroldo de Campos, Linguística & Poética, Teoria da Literatura
dos Formalistas Russos, Literaturas de Vanguarda de Guilhermo de Torre &
Ecos deodorenses de Sebastião Heleno aqui.
Celso
Furtado, Economia Popular de Cícero Péricles de Carvalho, Pensamento Econômico,
Sociedades Sustentáveis & Questões Ambientais aqui.
&
ARTE DE JAN CERNOS
A arte do
professor, gravurista e pintor tcheco Jan
Cernos.