PELAS RUAS DA CIDADE – Acenos pros que passam rostos
vivos e mãos suadas que vão e outros vindos nem sei de onde, olá pros que estão
nos parapeitos, nas filas, nos corrimões das rampas de acesso, ou jogando conversa
fora, qualquer reverência, isso aí, como vai, bom dia pra lá, boa tarde para
cá, boa noite, valeu assim assado, não se pode deixar de saudar, até mesmo se
as visitas nem sempre forem tão amáveis, comum cortesia até pros óculos
escuros, abas sobre os olhos, gesto que seja, tinindo, apertos de mãos, abraços
afetuosos, sorrisos largos que logo somem na cara carrancuda impaciente a
seguir pelo que se decide do planejado ou de última hora, sei lá, as
desconfianças com os fios que balançam nos postes, sustos com frenagens
bruscas, buzinas e chacotas, para ir a tal canto resolver sabe-se lá o quê, grosserias
gratuitas de ofendidos, não se pode ser indiferente com os mal-amados, fazer
que não viu nmão dá, ou virar as costas, que coisa, fala ao telefone enquanto
caminha, atravessar de qualquer modo, sem saber onde pisar, só em dia chuvoso,
ainda vai, às pressas, pelas poças chacoalhadas pelos veículos, pelos buracos
desagradáveis entupidos e o que der na telha, todo sem jeito com a moça bonita,
tão vistosa debruçada no balcão com olhar de quem chama, ao invés da repulsa
constante de nem chegar perto, enquanto outros cochicham em discretas
transações, estão nem aí para quem passa ou chega avexado, enquanto, de
repente, um céu azul da manhã entra pela tarde, nenhuma nuvem no mormaço, ah,
sombras da praça, os pingos da fonte na face, um jogo de dados, rumores e
disfarces, mil vezes já passei pelas ruas, todas, com pés ambulantes,
indolentes, como se tivesse um tapete mágico e corresse por todos os recantos,
como se saísse do casulo a passos largos, mesmo mantendo a distância, nunca se
sabe, dizer só por dizer, qualquer coisa serve escapando o contato, comendo as
horas, não tem graça nenhuma, mas é isso mesmo, a vida como uma jogada, chega
dá na vista a sacada, só pelo dinheiro que tudo começa e acaba, a gente se
encontra qualquer dia desse, promessa de pé, asseverada, então está certo, até
logo, até mais, esta cidade sou eu por aí coberto de dores e amor incurável. © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS:
[...] Ruas que
começam pobrezinhas e que hoje são as novas-ricas da cidade. Umas, que
continuam a viver a mesma vida de outrora, como essas velhinhas que se
escandalizam e resmungam sempre que as novidades do progresso lhes afetam os
velhos hábitos de antanho. Outras que mantêm, o esplendor, o viço, a vivacidade
através dos anos, como uma Nino de Lenclos, sempre moça e sempre amável. E em
contraste, aquelas que decairam da grandeza passada, que de ruas movimentadas e
ruidosas, ricas e fidalgas, se transformaram em obscuras pobretonas,
abandonadas, com velhos casarões descascados pelo tempo, tristonhos na sua
irremediável ancianidade. [...].
Trecho extraído da obra Tempo de Pernambuco – ensaios críticos (EdUFPE, 1971), do advogado,
crítico literário, tradutor e escritor Oscar
Mendes (1902-1983), autor de obras como Searas de romances (1982), Estética
literária inglesa (1983), Entre dois rios (1970), entre outros.
A POESIA DE ETHEL FELDMAN
MANIFESTAÇÃO: Desfilamos na avenida / e eu
gritei contigo / fascismo nunca mais / roubei-te um beijo / segredei na tua
boca / o povo unido jamais será vencido / chorei o acaso / amei-te na derrota /
que a esperança não era morta / nem
a vida, alheia / na despedida, prometi resistir / No poder reina a ganância / Uma
gralha ri de ti / Prometes e desistes / Rumba la rumba la rumba la / Deixaste a
vontade dormir / Tal a preguiça de existir / Prometes e desistes / Rumba la
rumba la rumba la / Abre as asas, dança / Ama sem pudor / Rumba la rumba la
rumba la / Prometemos resistir!
LIBERDADE: Em dias de
tempestade o corpo pode vergar / Espera que adormeça a tormenta e respira / Será
no silêncio que se prolonga em cada / palavra esquecida que abraçarás a
liberdade.
BEIJO: Vou ter contigo amanhã / apanho
o primeiro barco / enquanto tomas café / atravesso o Tejo / encontro Lisboa / subo a
pé o Chiado / espero pelo teu beijo / se achares por bem que sim / eu te direi
sem hesitar que sim / que neste sim adiado / ele viaje de elétrico / por toda a
cidade / e traga na volta a vontade / que se demore no tráfego / se não for
amanhã / será na segunda-feira / ou na próxima semana / talvez nas tuas férias
/ se for no Inverno / não esqueças o casaco / que antes do beijo / quero um
abraço. / amanhã, se chover / não posso / fico em casa / não tenho pressa / sei
que este beijo / nasceu predestinado.
Poemas da poeta e artista visual Ethel Feldman, editora do blog Paladar da loucura. Veja mais aqui, aqui, aqui
& aqui.
A ARTE DE CLARA LEFF
A arte da artista visual e grafiteira Clara Leff. Veja mais aqui.
&
A OBRA DE CECILIA MEIRELES
Quanto mais me despedaço, mais fico inteira e
serena.
A obra da escritora, pintora, professora e jornalista Cecília
Meireles (1901-1964) aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.