OU INCHA OU CHOCHA – Imagem da artista argentina Matilde Marin. - Robimagaiver estava espoletado! Que é que há, rapaz? A minha
mulher agora deu de me botar pra trás. Ué, como assim? Qualquer coisa que aconteça
que deu certo, ela logo se vira pra mim e diz: Vê se aprende, viu? Isso é lá
coisa que se faça. Ela é braba que só uma capota choca, solta desaforo na cara
de qualquer gorila e, na horagá, vira-se pra mim e diz: Resolve aí, véi! E sai
de fininho, eu que fique com a bronca, encarando o maior bufe-bufe na lata, nas
costelas, nos guardados. Tô aguentando não, uma hora dessa eu mostro quem é que
manda. Mal dizia isso, ela aproximou-se: Larga de ser frouxo, mané! Ele teve o
maior susto, nem deu tempo atinar, ela saiu na maior das rabissacas na cara do
indignado. O cara ficou injuriado, rabinho entre as pernas, todo se remoendo. Danado
isso, depois de velho, passar vergonha na frente de todo mundo. Ah, isso não
vai ficar assim não. Tanto se revoltou que a moçada resolveu aprontar uma com
ele, só pra ver se o sujeito era macho tanto quanto dizia. Pois bem. Lá foram
pruns descampados fora de Alagoinhanduba, quando se aproximaram dum matagal, o
Robimagaiver sentiu umas cólicas estranhas remoendo no bucho e logo foi se
escondendo atrás duma touceira, se livrando como podia do mal-estar. A turma
ficou de conversa solta esperando pelo resultado. Enquanto isso, ele lá caçando
papel ou palha que fosse para se limpar, quando sentiu um bafo quente nas
proximidades. Ih, tem coisa! Ele ficou desconfiado. Ficou matutando a
inequívoca possibilidade de se livrar daquilo, cogitava se preparar para
enfrentar o que viesse. Na hora que ele desalojava o bregueço das tripas, mal
soltou o primeiro peido desatolando o indigesto, eis que um bufado forte
ameaçou hostilidade, aí ele sublevou. Oxe, nem deu tempo dele torar o aço, saiu
numa carreira desgramada aos gritos, de todo mundo correr amedrontado atrás
dele: É um monstro! É um monstro! E sumiram atrás do primeiro morro, comeram distância
quando o encontraram atolado numa poça, lavando os possuídos e as vestes. Que é
que foi, homem? Oxe! Topei com o coisa ruim! Carreira danada dessa, devia de
ter sido pior que isso. Como é que era? Ah, o monstro-ruim! Gigante! Coisa mais
feia do mundo! Dali mesmo ficaram de tocaia para ver se bicho vinha à caça
deles. Deram tempo, nem sinal. Ô rapaz, tem certeza que era o coisa-ruim? Claro
que tenho, eu vi. Então vamos lá ver! Oxe, vou nada. Peiticaram muito. Aí voltaram
pra ver. Todo preparado para enfrentar ou correr. Foram se aproximando do
local, cada um que segurasse o seu, todos tremiam de medo. Arrodearam, se
aproximaram em círculo e, quando deram fé, uma vaquinha estava espragatada no
meio do mato, ruminando. Corresse com medo duma vaca, abestalhado! A mangação
correu solta. E ele: Nada, meu, era o cabrunco mesmo, o bafo forte no meu
cangote, sou lá de esperar, corri feito doido, eu vi o desgracento. Quanto mais
ele explicava, mais a mundiça mangava da leseira dele. A cada motejo, ele mais
se invocava, a ponto de disparar: O cu que é bom ninguém quer dar, né? E se
justificava: Como eu nunca vi direito o capiroto, logo abri da vela, ora. Um sujeito
precavido vale por dois afoitos, é ou não é? Quero ver quem é que é macho na
hora do aperto. Saiu-se com essa: O passado condena todo mundo. É? Caiu na
zombaria, ainda hoje ele peitica homência, ninguém acredita. É que no meio da
bravata, o esparro come no centro, chega ele incha de macheza; na hora do
revide grosso, logo chocha e sai caladinho como se nem fosse com ele. Esse o
Robimagaiver, o brabo de água doce. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais abaixo e aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio
Tataritaritatá especial
com a música da violoncelista croata Ana Rucner: In The City Croatia,
Crickvenica Croatia Live, Sakura Live & Toccata Bach & muito mais nos
mais de 2 milhões & 600 mil acessos ao blog & nos 35 Anos
de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja
mais aqui, aqui e aqui.
PENSAMENTO DO DIA – [...] se
começarmos a ensinar as grandes massas de povo a consumar uma autorrealização
individual, depois de tudo dito e feito veremos, de fato, que elas não passam
de criaturas fragmentárias, incapazes de alcançar por inteiro a sua
individualidade; que acabaremos por torná-las invejosas, rancorosas e malévolas.
Quem é generoso para com os homens, conhece o caráter fragmentário da maior
parte e deseja organizar uma sociedade de poder onde todos os homens cedam,
como é natural, a uma totalidade coletiva por serem incapazes de formar uma
totalidade individual. Poder-se-ão realizar nesta totalidade coletiva. Contudo,
se fizerem esforços para chegar à realização individual estarão fadados a
fracassar já que são, por natureza, fragmentários. E fracassados, sem poderem
dispor de nenhuma espécie de totalidade, cedem à inveja e ao rancor. Jesus
sabia perfeitamente que isto era assim quando disse: aos que têm será dado,
etc. Esqueceu-se, porém, de contar com a massa dos medíocres cujo lema é: como
nada temos, ninguém terá nada. [...]. Trecho extraído da obra Apocalipse/O homem que morreu
(Companhia das Letras, 1990), do escritor britânico D. H. Lawrence
(1885-1930), sintetizando a poética religiosa do autor, ao efetuar a
desmontagem de fragmentos de imagens, mitos e alegorias na qual, capítulo a
capítulo, ele empreende uma verdadeira arqueologia da relação do homem com o
cosmo e acaba por conduzir o texto bíblico ao encontro de antigas cosmogonias -
hindu, persa, etrusca e cretense, entre outras. Veja mais aqui.
A FELICIDADE - [...] suponhamos por um momento que as paixões façam
mais infelizes do que felizes; e digo que ainda seriam algo desejável, porque
são uma condição sem a qual não se pode obter grandes prazeres; ora, só vale a
pena viver quando mais vívidos forem os sentimentos agradáveis; e, quando mais
vívidos forem os sentimentos agradáveis, mais felizes somos. É, portanto, o
caso de desejar ser suscetível a paixões, e repito novamente; só não as tem
quem não quer [...] É certo que o amor pelo estudo é menos necessário à felicidade dos
homens que à das mulheres. Os homens têm uma infinidade de recursos, que faltam
inteiramente às mulheres, para serem felizes. Eles têm muitos outros meios de
chegar à glória, e certamente a ambição de tornar seus talentos úteis a seu
país e servir seus concidadãos, por sua habilidade na arte da guerra, ou por
seus talentos para o governo, ou ainda pelas negociações, está bem acima que é possível
se propor pelo estudo; as mulheres, porém são excluídas por sua condição de
qualquer espécie de glória, e quando, por acaso, se encontra alguma que nasceu
como uma alma elevada, só lhe resta o estudo para consolá-la de todas as
exclusões e de todas as dependências às quais ela se encontra condenada por
condição. [...] O amor pela glória,
que é fonte de tanto prazer e de tantos esforços de todos os gêneros que
contribuem para a felicidade, para a instrução e para a perfeição da sociedade,
é inteiramente baseada na ilusão, nada é tão fácil quanto fazer desaparecer o
fantasma atrás da qual correm todas as almas elevadas, mas quanto haveria de
perder para elas e para as outras! Sei que há alguma realidade no amor pela
glória de que podemos usufruir enquanto estamos vivos; mas praticamente não
existe nenhum herói, de nenhum gênero, que queira se despojar inteiramente dos aplausos
da posteridade, da qual se espera até mais justiça do que de seus
contemporâneos. [...] Por mais que
neguemos, o amor-próprio é sempre o móvel mais ou menos oculto de nossas ações;
é o vento que infla as velas, sem a embarcação não navegaria [...] Empenhemo-nos portanto em ter boa saúde, em não
ter preconceitos, em ter paixões, em fazê-las servir à nossa felicidade, em
substituir nossas paixões por gostos, em conservar preciosamente nossas
ilusões, em ser virtuosos, em jamais nos arrepender, em afastar de nós as ideias
tristes, em jamais permitir que nosso coração conserve uma faísca de amor por
alguém cujo gosto esteja diminuindo e que deixe de nos amar. É preciso
abandonar o amor um dia, por menos que se envelheça, e esse dia deve ser aquele
em que ele deixe de nos fazer feliz. Por fim, trataremos de cultivar o gosto
pelo estudo, esse gosto que faz nossa felicidade só depende de nós mesmos.
Evitemos a ambição, e, sobretudo, saibamos bem o que queremos ser, enveredar
para passar nossa vida, e tratemos de semeá-lo com flores. [...]. Trechos
extraídos da obra Discurso sobre a
felicidade (Martins Fontes, 2002), da cientista francesa Émilie Châtelet (Gabrielle Émilie Le
Tonnelier de Breteuil – 1706-1749).
ACHADOS E PERDIDOS – [...] descobriu
que o percurso não diminuía distância nenhuma, mas pelo contrário era motivo de
repetidos atrasos na chegada ao colégio. Flor percebeu que a verdadeira razão
do itinerário do grupo (cada vez mais numeroso) era ela própria. Mais do que
sentir-se envaidecida (era um bando de pirralhos), vislumbrou a possibilidade
de um negócio inocente mas lucrativo. Fez chegar aos ouvidos de alguns dos
meninos que mediante o pagamento de módica quantia, na verdade pouco mais do
que o preço de um refrigerante, eles poderiam vê-la trocar de roupa, pela
janela do quarto. Bastaria uma parada na janela um de cada vez para não atrair
a atenção da vizinhança, dinheiro no peitoril, e a rápida cena de Flor tirando
e vestindo a roupa. Em pouco tempo teve que estabelecer um horário, de modo que
os meninos não fossem todos no mesmo dia e na mesma hora. Foi seu primeiro
grande sucesso comercial. E a mercadoria melhorava dia após dia. A historia
tomou rumos quando os meninos não se contentaram mais em olhar e passaram a
querer tocar em Flor. Num domingo em que a família foi à praia Flor se deu
conta, pelos olhares dos homens, de possibilidades mais amplas. O emprego como
babá e a posterior mudança para o Rio eram parte de novos caminhos que antevia
à sua frente [...]. Trecho extraído da obra Achados e perdidos (Planeta De Agostini, 2004), do escritor Luiz Alfredo Garcia-Roza.
DOIS POEMAS
– NOITE TÓTEM - São os transfundos outros da in extremis
médium / que é a noite ao entreabrir os ossos / as mitoformas outras /
aliardidas presenças semimorfas / sotopausas, sossopros / da enchagada libido
possessa / que é a noite sem vendas / são os grislumbres outros atrás esmeris
pálpebras videntes / os atônitos gessos do imóvel ante o refluído / ferido
interrogante / que é a noite já lívida / são as crivadas vozes / as suburbanas
veias de ausência de remansas omoplatas / as acrinsones dragas famintas do
agora com seu limo de nada / os idos passos outros da incorpórea ubíqua também
outra / escavando o incerto / que pode ser a morte com sua demente muleta
solitária / e é a noite / e deserta. DESTINO
- E para cá ou além / e desde aqui outra vez / e volta a ir de volta e
sem alento / e do princípio ou término do precipício íntimo / até o extremo ou
meio ou ressurrecto resto de este ou aquele / ou do oposto / e roda que te rói
até o encontro / e aqui tampouco está / e desde acima abaixo e desde abaixo
acima ávido asqueado / por viver entre ossos / ou do perpétuo estéril
desencontro / ao demais / de mais / ou ao recomeço espesso de cerdos
contratempos e destempos / quando não a bordo senão de algum complexo herniado
em pleno / vôo / cálido ou gelado / e volta e volta / a tanta terça turca /
para entregar-se inteiro ou de três quartos / farto já de metades / e de
quartos / ao entrevero exausto dos leitos desfeitos / ou dar-se noite e dia sem
descanso contra todos os nervos do / mistério / do além / daqui / enquanto se
resta quieto ante o fugaz aspecto sempiterno do / aparente ou do suposto / e
volta e volta fundido até o pescoço / com todos os sentidos sem sentido / no
sufocotédio / com unhas e com idéias e poros / e porque sim não mais. Poemas
do poeta vanguardista argentino Oliverio
Girondo (1891-1967).
A ARTE DE RENÉE GUMIEL
A arte
da bailarina, coreografa e atriz francesa Renée
Gumiel (1913-2006).
AGENDA
&
Paradisus, arte de Matilde Marin.
&
Outras do Robimagaiver aqui.
&
O
talendo de Linaldo que é de Zé & Martins!, Ernesto
Cardenal, Patrice Lumumba, Thomas Merton, O ser quântico de Danah Zohar, Luciah Lopez, Hermeto Pascoal, Jocy
Oliveira, Laurie Anderson, Orquestra Armorial & Quinteto Armorial aqui.