O
DEFUNTO DO DEDO AZUL
Luiz
Alberto Machado
- Quem tem que dá luz a cego é farol de
trem! -, era o gênio do Melquisedec, astuto portador de crueldades sádicas e
fatais, enjeitado, usurento, prestidigitador, daquele que dá o bote e esconde a
unha e ainda ficava mangando da vítima otária. Mesmo! Precisava disso, todo dia
amanhecia com um polegar azul impresso na testa. Quando olhava no espelho, puta
merda! De novo? Todo santo dia ia dormir e quando acordava aparecia a marca lá.
Ele lavava, esfregava, passava horas removendo o mínimo vestígio daquela
mancha. Um dia não apareceu mais. Pensava ele que se livrara definitivamente
daquela maldição. Qual nada! Quando viu o dorso da mão esquerda, estava lá.
Putzgrila! No outro dia, na palma da mão direita. Mais outro: na bochecha
esquerda. Antes era só na testa, agora era em qualquer parte de seu corpo que
ficasse visível. Torcia para que aparecesse nas mãos ou no braço porque bastava
colocar uma luva ou camisa de manga comprida, mas na bochecha ou testa, ou na
nuca – só se usasse gola da moda Elvys Presley -, no cotovelo, atrás da orelha,
locais agora mais frequentes, imprevisíveis, alguns difíceis de esconder.
Quando na testa, só se usasse um chapéu ou boné que cobrisse até as pestanas,
do contrário, todo mundo veria. E ninguém poderia ver.
- A melhor defesa é o ataque! -, era ele
atuando no dia a dia. Se alguém viesse abrir alguma condição duvidosa pra cima
dele, ele usava do expediente de acusar ou de atacar de cara! Fazia questão de
levantar os podres de quem quer que fosse para se safar de qualquer aperto,
mantendo-se ileso de qualquer ameaça. Não vacilava um só segundo, sempre pronto
e disposto pra demover, amedrontar ou sacanear quem tivesse a doidice de ter
topete pra enfrentá-lo. Se as palavras não bastassem, partia pro uso da força.
E ele se valia dos seus músculos, suas astúcias, sua ginga, nocauteando
qualquer metido a besta que viesse querer botar gosto ruim na sua vida.
- Chapéu de otário é marreta! -, e com
isso tirava vantagem de tudo. Se fosse necessário, até a última gota de sangue
da sua vítima. Não era de deixar que a peçonha viesse pegá-lo desprevenido.
Vivia ligado, mutuca em pé vinte e quatro horas por dia. E saía na frente com
uma lábia pra cima do cristão de deixá-lo zonzo e sem um pule de bicho para se
salvar. E num viesse prestar contas que ele arrotava arrogância em riba da
fivela de qualquer despeitado, à patadas, rebuço, trimiliques, verdadeiro
cavalo de vaquejada, pisando forte e esmagando tudo. Era o que se podia dizer
que de rei da cocada preta, passava a perna e só era esperar a rasteira e a
bunda no chão. Não havia repente que intimidasse o rapaz; matreiro, só se via o
toque da vaca na insígnia do amigo da onça. É, é.
- Se vier, se prepare pros bregues! -,
avisava, ameaçando. Quando ele nasceu, lá pelos idos dos anos cinquenta, ao que
parece meados de dezembro, signo de escorpião, foi numa situação bastante
truculenta. A mãe dele, coitada, falecera na horinha do rebento, não aguentando
as dores parideiras e os quilos graúdos do menino. Rasgara a mãe todinha num
parto difícil, a fórceps e, ainda assim, num dera um choramingado sequer. Teve
de levar mais de três palmadas na bunda para que emitisse apenas um chorinho
ralo, maroto, desses bem manhosos. A mãe agonizara naquela hora, coitada, vez
que os médicos e enfermeiras se preocupavam com a tácita chegada dele. Ela dera
o último suspiro justo na hora que ele preguiçosamente manifestara sua chegada
para a vida. Hem, hem. Daí, todos tomarem uma ojeriza pelo recém-nascido de não
se saber o que fazer com o desditoso. Estava malsinado, o fedorento.
- Não venha com o bocal aberto que eu sou
tampa! Quando fecho, num tem quem desate! -, do pai ninguém sabia o paradeiro,
apenas que havia se enroscado num furto de pequena monta, desses de roubo de
galinha no terreiro alheio, entretanto, por capricho do delegado local, fora
envolvido como bode expiatório num crime hediondo e, depois de preso,
escafedera das grades numa fuga nebulosa que ainda hoje se especula. Todo mundo
sabia que o pai dele era um galegão cigano, de olhos azuis, espadaúdo,
profissão de prestamista, metido a namorador e que andara mexendo com algumas
filhas dos de bem de Alagoinhanduba. Dizem até, aos cochichos mais cuidadosos,
que se metera em adultério, a ponto de botar duas de quinhentos no delegado Tranquísio
que não se conformara com a gaia, perseguindo-o até então, metendo-lhe numa
bronca com o assassinato dum rábula local, estremecendo as bases da estrutura
municipal. Visto que a autoridade não conseguia descortinar os meandros daquele
homicídio, achou por bem, melhor, por capricho e vingança, enrolar Sebruíno numa
enrascada pior que camisa de onze varas. Depois de preso, algemado, pisoteado e
seviciado, sem saber de nada, meteu-se na cadeia e depois de enjaulado
anunciaram uma fuga ardilosa dele dali, para nunca mais saber de seu paradeiro.
Enfim, nascia nosso herói órfão, vítima de uma repugnância geral, uma negativa
de adoção unânime, uma rejeição perene, a ponto da enfermeira-mor jogá-lo na
lata de lixo da maternidade, às escondidas. Uma semana depois fora encontrado
no lixão porque levou uma mordida de urubu e berrou. Se não fosse esse fato,
estaria lá calado e morto ao cabo de dias. Fora um milagre. Um gari remexendo
no meio daquela excrescência recolheu o sugismundo e levou para casa, dando-lhe
um banho para retirar aquela fedentina. Ainda estava sob a placenta e o umbigo
lhe caíra para felicidade da fome da cadela Megera que latia muito perto dele.
Ela mastigou demoradamente o cordão umbilical dele. O catador de lixo morava
numa casa de taipa bastante apertada. Mas ele deu um jeito de caber o menino,
arranjando uma tipoia de saco velho, deixando-o a embalar no meio da sala. Os
olhos rasos d’água de abandonado pela família, visto sua pobreza extrema,
ganhara dos céus, como presente, aquela companhia para alegrar os seus dias e
os da cachorra. Pela ausência de choro ele comovia a vizinhança que, diligentes
e comiserados, preparavam a mamadeira de mingau d’água em qualquer frasco
encontrado nos dejetos ou amamentava o desnaturado qualquer ama-seca. A cadela
tomava-lhe conta. Gente pobre, solidária. Quando faltava o leite por razão da
penúria que lhes assolavam, a cadela mesmo esfregava as suas próprias tetas na
venta do menino que mamava solto o dia todo nela, jeito de um verdadeiro
bezerro desmamado com uma mãe pelicana, rasgando o peito para alimentar os
filhotes. Por isso, dizem, que ele possuiria sangue chacal. Mais essa, hem?
Outra curiosidade: o menino era
escatófago. Quando a cachorra exaurida, com a carreira de peito inchada,
lânguida, era só largar um tolotinho de merda que o menino se satisfazia. Se
comia? Ora, de ficar empanzinado. Arrepare não, mas o menino comia de tudo:
caco de tijolo, retalho de pano, farelo de pedra, metralhas, lavagem de porco,
resinas, goma arábica, óleo de peroba, talisca de pau, estrume, sabugo de
milho, papel rasgado, - não comia dinheiro porque não havia ali -, tralhas,
ripas, fios, latas, fiações, caibros, eita que fastio! Pudera, também naquela
vidinha escatófila. Certa vez deu uma dentada no rabo da cachorra dela ficar
apavorada. A fome era tanta que quase ele comia ela. Isto, na verdade figurada
e licenciosa, só aconteceria quando o danadinho já taludo e botando os pelos
para fora, faria para saciar outro tipo de fome, quebrando o cabresto dele.
Quando não, a cachorra saía catando restos de comida, ou roubando nacos de
carne nas cozinhas ou mesmo dividindo com o tarzinho o que tivesse comendo,
isso quando não estava caindo de fome pelos cantos, devorando o que lhe caísse
às mãos.
Quando se via a Megera feliz com a sua
panelada: fuba com o resto de comida, ele atanazava a coitada. Ela era braba,
não deixava ninguém chegar perto quando estivesse roendo algum osso, mas o
menino não, cria sua, arrastava-o para perto do que encontrasse de mantimento.
A tal ponto de, quando começou a engatinhar, ver-lhe lambendo o caco de comida
dela.
Ao cabo de dois anos estava ali um menino
robusto, lourinho, bonito, gordinho que só filho de ladrão quando o pai tá
solto, chamando a atenção de todos pelo viço, talo de gente miúda com as mesmas
manias comilonas.
Foi aí que apareceu uma comitiva de caridade,
em dia de Cosme e Damião, levando uma distribuição filantrópica de um certo
clube de serviço local, visando doações alimentícias para aplacar a inanição
dos estornados e brinquedos para a criançada daquela favela, uma delas, dona
Ernestalda, ficou apaixonada com as feições belas do menino, buchudinho,
carinha suja, olhinhos vivos e a amizade que ele mantinha com a cachorra. Após
indagar pelos pais dele, soube que se tratava de um órfão encontrado no lixão.
Revestida de uma ternura peculiar àquelas visitadoras assíduas beatas da igreja
católica, botou-lhe no braço e levou-o para sua luxuosa residência, adotando-o
como um de seus filhos. O trastezinho, bandoleiro que só, nem chorava a
ausência de sua ama-seca. A cachorra era especial e não fosse a assistência
dela teria morrido ali mesmo.
Agora ele se encontrava na mansão dos
Moreirais com mais outros cinco irmãos maiores, dois deles do sexo feminino e
muito achegados a ele. Dona Ernestalda era uma senhora simpática, amável,
sofrida, casada com um bicho ruim, brabo que só, rabugento e pisoteador,
fominha e agiota, um tal de Belisário Moreiral, abastado fazendeiro dali, o
qual, com suas atitudes, personificou no danadinho a verdadeira imagem
detestante. Escapara o velho infame de mortes várias vezes por dívidas
impagáveis, volumosas pela exorbitância dos juros cobrados e da empertigada
presença constante dele na cobrança dos devedores. Até aí o menino num tinha
nome, era apelidado de Bregueçinho, apenas. A tutora resolvera registrá-lo em
cartório de registro civil como se filho fosse do casal. Agora tinha nome:
Melquisedec Moreiral, homenagem ao personagem bíblico, honrando a crença
inarredável da sua fé professada pela igreja. Assim, era Dequinho para lá,
Dequinho para cá. Outros mais enciumados continuavam por tratá-lo de
Breguecinho, pela presença indesejável do intruso no recinto do lar dos
Moreirais. Principalmente a cabroeira, esta sim, adivinhava o sangue ruim do
danado.
Certo tempo depois estava matriculado na
melhor escola. Isso alimentou seu ódio, viciado em jogo, queria mesmo era estar
nas roletas, jogo do bicho, apostas. E tome reprimenda. Mas o danado possuía o
ganhador aberto, uma estrela na testa. Transava tudo que aparecesse dalguém
morrendo de fome, comprado por uma migalha e vendido sempre por um bom preço.
Prosperava. Embrutecido pelo porte atlético, ganhava muito mais as coisas no
grito e na força. E quando soube que Mercúrio, na mitologia greco-romana, era o
deus dos ladrões, dos comerciantes e dos mensageiros, vôte! Achou por bem de cultuá-lo
para sempre. Era o seu talismã.
O menino crescera ali, agora um rapagão
subserviente e treloso, muito achegado a hieromania, forte que só o Milton de
Crotona que carregou um boi vivo às costas, matando-o depois de um bofete e
comendo-o num só repasto, dava de, às escondidas, planejar a desforra para com
os outros irmãos que o tratavam como bicho repelente e intruso desagradável.
Ele, então, vivia de bajular a mãe e o pai, pau mandado das costas ocas com a
cara mais cínica e nem aí para as insinuações de que aquilo era gente da pior
laia. A babada era tão clamorosa a ponto de alisar a erupção papilar com
inflamação e acúmulo de segregação das glândulas sebáceas, ou seja, aquela
proeminência acima da cintura do pai, cosquinhas que o ancião gostava de sentir
ao cair da tarde. Sai-te, babão, que subserviência ardilosa. Por isso seguia
incólume aos olhos da mãe e do pai que admiravam sua babada serviçal, capaz de
morrer afogado acaso, algum dos dois, tivesse água na altura da cintura. Assim
se deu, o mais velho, Delcino, formou-se em medicina na Europa; o encostado,
Delfinino, formou-se em Direito, nos Estados Unidos. As irmãs, Dulcelita, era
formada em Letras; e Dianilda, formada em Psicologia; ambas viviam dividindo
moradia, ora com os pais, ora num apartamento na capital. O mais novo,
Dilsininho estava cursando agronomia e vivia na fazenda, tentando administrar
os negócios do pai. E o velho deixava? Só Melquisedec andava dando voltas nas
coisas íntimas do macróbio, arrumando-lhe prostitutas, levando recado para
desafetos, cobrando devedores, dando esporro nos empregados, se adiantando todo
nos segredos dele.
Muito embora todos estivessem
bastantemente independentes, não pela ajuda do pai de gênio ruim, mas por
iniciativa deles mesmos, andavam desconfiados em reuniões familiares, abrindo o
olho para as atitudes do tal luxento. Uma histeria. Melquisedec era o
motorista, o coçador de saco, o bajulador, o alcoviteiro, o cafetão, o cobrador
e, por fim, o braço direito do velho. Ainda, fazia o maior boi de fogo de todo
mundo para o velho e enredava de tudo, deixando o genitor a par de tudo e de
todos, levando intriga e desavença entre eles. Havia mais um agravante: os
filhos crescidos e independentes deram de se casar. Delcino casou-se com uma
bastarda espanhola do velho ficar emputecido. Delfinino contraiu matrimônio com
uma gringa hippie do homem quase ter um ataque cardíaco quando sacou o paz e
amor da desgraçada doida. E Dilsininho enrabichou-se pela mulata cartomante
mais dengosa do mundo, do desinfeliz emancebar-se arribando de casa sem dizer
nem para onde ia.
- Esses meus filhos querem a minha
desgraça! Se casaram com um bocado de quenga que querem tomar tudo o que tenho!
E acima de tudo umas chatas de galocha!
As filhas não, ficaram todas pra titia. Pudera,
além de aguadas e insossas, davam de encrenqueiras que seguiam, à risca, os
mandamentos carismáticos da igreja católica. Seguiam mesmo as atitudes da mãe.
Mas elas desconfiavam dos procedimentos melados e peguentos do Melquisedec, um
malambeiro que tinha por costume lamentar-se em presença de terceiros.
Desconfiavam ser ele um mama-em-onça.
- Essas meninas são tão ruim que nem
arrumam casamento! Eita f’ia dos sete cancro rodeiro!
- Deixe as meninas, Belisário!
- A culpa é sua, Ernestalda, deu mimo
demais, até o Dilsininho com o jeitinho de pirobo ficou. Inda bem que casou,
valha-me Deus, livrou-me de pederastia na família.
Belisário ficou a ponto de abominar os
filhos e idolatrar o Melquisedec. Foi aí que o velho teve um troço, arriou os
pés na cama e danou-se a morrer. Dona Ernestalda rezava de noite e dia. Os
filhos legítimos choravam pelos cantos. Um pesar profundo. Melquisedec não,
dando ordem, continuando os serviços do velho e arrumando de tudo na casa,
tratando dos furúnculos do pai, das erupções cutâneas dele, inexcrupulosamente
tomando pé da situação, escondendo tudo, pois que se tratavam de negociatas,
transações ilícitas, desonestas, as hipotecas, os penhores da agiotagem,
déspota das horas minguadas deles. Vez por outra ficava a sós cochichando com
Belisário que cada vez mais que ele falava o velho abria mais e mais os olhos a
ponto de ter um ataque cardíaco com o que ele contava. Providente, adiantou o
mausoléu, deixou-lo como num verdadeiro Taj Mahal para descanso daquele santo
aos seus olhos. Nisso o agonizante assinou testamento, procurações, os filhos
arengando, Melquisedec revogou tudo, deu uma rasteira em todos, no trono do seu
mandonismo megalomaníaco, melou o polegar do póstumo na almofada de carimbo e
registrou em cartório todas as posses no seu nome. Deixou a mãe e os irmãos com
uma mão na frente e outra atrás. Enrolou todo mundo e quando o velho bateu as
botas de mesmo, se fez inventariante, fez que fossem emitidos formais de
partilha falsos, juntou tudo e ganhou, como prêmio, a repulsa de todos. Até a
mãe arrependeu-se de ter ido ao lixão buscar tão execrável figura.
- Ei, e é o defunto do dedo azul, é?
Usava de alegações melífluas para
enrolá-los, enganando os incautos com negócios fraudulentos. Ludibriou muito.
Deixou o Delcino falando sozinho; o Delfinino abilolado e pensando ter ganho na
loteria federal sozinho; o Dilsininho esperando o anjo vingador; a Dulcelita e
a Dianilda esperando o príncipe encantado com uma rola gigantesca para
descabaçá-las; e a mãe num abrigo de velhos arrodeada de imagens de santos por
todos os lados. Durante as exéquias, a sua mania chegou a ficar aguda: queria
embalsamá-lo para perpetuar sua imagem para sempre. Acusado de louco, mesmo
assim, durante a cerimônia fúnebre, fez questão da maior pompa.
- Eu sou o melé do baralho!
Melquisedec, por fim, entrou para a
igreja duns crentes que ninguém nunca viu, assumiu a tesouraria, só pra tirar
bandeira, enrolou-se com a mulher do pastor, deu de brigar com funcionários
públicos vez que eles estavam ali para atendê-lo e não cumpriam a sua função:
foi muita munheca no colarinho dos buchudos barnabés. Outros que sentiram o
peso do seu punho no focinho ou no maluvido foram os funcionários do Incra que
cobrava anuidades absurdas; a previdência que não funcionava cobrando dele
recolhimento das taxas cabíveis pelo número de funcionários que não servia
quando eles adoeciam; a fazenda estadual e a receita federal que extorquiam seu
dinheiro; a prefeitura que só tinha ladrão dificultando tudo; o Detran que exigia
o emplacamento anual dos veículos de sua propriedade com uns arremedos de
gorjeta por trás das intenções; dos juízes que só dificultavam sua ambição, vez
que ele procurava encontrar, a todo custo, o quartzo jaspe na ilha do milho
miúdo, sabia lá ele o que era isso, mas que queria, queria; dos policiais
rodoviários que exigiam toda vez uma propina para liberar os seus veículos
irregulares quando todo mundo transitava impune nuns carros velhos de cair as
bandas; dos cartórios e delegacias que sempre pediam uma coisinha para liberar
qualquer certidão fora do tempo; dos gerentes dos bancos oficiais que queriam
uma comissão para liberar o dinheiro; de todo mundo que precisava de um
jeitinho para resolver as coisas. Ora.
-
Ah! Se todo mundo fosse direito feito eu! O mundo seria outro! -, assim ele
bradava, lavando a maldição da digital azul todo dia em uma das partes visíveis
do seu corpo e, inexoravelmente, afugentando qualquer infeliz das costas ocas
que aparecesse para mexer no que era de seu. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais
aqui.
Imagem: a arte do escultor, desenhista,
caricaturista, mímico, designer, cenógrafo, escritor, fotógrafo, ator e artista
plástico Juarez Machado.
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Imagem: Nu deitado (1986), do artista plástico Juarez Machado.