segunda-feira, agosto 24, 2015

BORGES, DALI, GERALDO AZEVEDO, LEMINSKI, JARRE, COLVILLE, PRÍAPO, FENELIVRO & PSICODRAMA.

VAMOS APRUMAR A CONVERSA? PRIMEIRA ENTREVISTA: GERALDO AZEVEDO – Embora já tenha iniciada a minha militância na radiodifusão no início dos anos 1980, foi em 1988 que se deu a primeira grande entrevista. Oriunda de alguns contatos com produtores e divulgadores, consegui marcar presença e de primeira emplacar com uma entrevista exclusiva com Geraldo Azevedo. Isso se deu quando o artista pernambucano foi passar o som no palco do Circo Voador e, no camarim, começou o nosso bate-papo. Conversa animada como se nos conhecêssemos de anos, pudera, eu conhecia toda obra e trajetória dele, e ele um cara supersimpático e alto astral, levando a nossa entrevista para revelações altamente interessantes. Já consumindo um lado da fita cassete, devido chamamento da produção para passagem do som, vez que já tinha gente chegando para o show que só começaria dali mais umas duas horas, suspendemos a conversa e Geraldinho me levou pro palco para conferir tudo. Terminada a passagem meia hora depois, retomamos a entrevista que só findou quando a plateia já chamava. Não quis perder e das coxias assisti e gravei áudio de algumas músicas do show do álbum Eterno Presente (RCA, 1988), para a edição no meu programa Panorama, na Quilombo FM que ia ao ar todas as tardes de domingo. Depois dessa, duas outras oportunidades tive de entrevistá-lo: a segunda dois anos depois dessa, quando ele lançou a música Adoro Você; e a terceira já para o meu tabloide Nascente, em 1998. E vamos aprumar a conversa aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.


Imagem: Nude and Dummy, do pintor, desenhista, gravador e muralista canadense Alex Colville (1920-2013).


Curtindo o álbum Revolutions (1988), do instrumentista, compositor e produtor musical francês Jean Michel Jarre. Veja mais aqui.

A MITOLOGIA DE PRÍAPO – O livro A busca fálica: Príapo e a inflação masculina (Paulus, 1994), de James Wyly, trata a respeito da mitologia de Príapo na literatura clássica e na história do séc. XX, o priapismo físico e os estágios da busca fálica. Da obra destaco o trecho: [...] A mitologia relativa a Príapo faz parecer que ele é o phallos cindido. Esta separação é o resultado da união entre o feminino (Afrodite, Cibele, Agdistis) e um masculino adolescente ou afeminado (Dioniso, Adorno, Átis) que não consegue trazer uma força fálica verdadeiramente desenvolvida a esse relacionamento. Então esse tipo específico de união entre masculino e feminino castra, ou seja, suprime phallos, e este, aí, assume uma vida própria autônoma, exatamente como o complexo simbolizado por Príapo e seu pênis enorme. Se este é um deus que surge quando a atenção se detém sobre um masculino relativamente não fálico, então estamos às voltas com um fenômeno compensatório, e como ele é ao mesmo tempo divino e um exagero, ele carrega a sua própria contracompensação, a faca que pode podar a árvore de novo a um tamanho saudável. Assim, há um equilíbrio inerente à figura de Príapo. Mas os mortais não são como os deuses, e não têm acesso automático a mecanismos compensatórios eficientes. A compensação humana tende mais a descambar para o extremo oposto do que a manter o equilíbrio (seria até possível argumentar que essa falta de equilíbrio automático é o fator principal que diferencia os deuses dos mortais). Para os mortais, a compensação só parece funcionar bem quando é reconhecida pela consciência, o que requer insight e um esforço da vontade. E o contato da consciência com as imagens psicologicamente compensatórias é, evidentemente, o que a análise junguiana busca fazer [...]. Veja mais aqui e aqui.

O ALEPH – O livro O Aleph (1949 – Globo, 1999), do escritor, tradutor, crítico literário e ensaísta argentino Jorge Luis Borges (1899-1986), reúne histórias curtas em que o autor aborda vários pontos paradoxais como a imortalidade, a identidade, o duplo, a eternidade, o tempo, a soberba, a condição humana e suas crenças, com um alto grau de criatividade e escrita superior, com elevadíssimo grau cultural, submetendo o leitor a um intrincado labirinto de ideias e reflexões. Da obra destaco o trecho de O Imortal: [...] Que eu me lembre, meus trabalhos começaram em um jardim de Tebas Hekatómpylos, quando Diocleciano era imperador. Militei (sem glória) nas recentes guerras egípcias, sendo tribuno de uma legião que esteve aquartelada em Berenice, diante do mar Vermelho: a febre e a magia consumiram muitos homens que cobiçavam com magnanimidade o aço. Os mauritanos foram vencidos; a terra, antes ocupada pelas cidades rebeldes, foi dedicada eternamente aos deuses plutônicos; Alexandria, debelada, implorou em vão a misericórdia de César; antes de um ano, as legiões alcançaram o triunfo, mas eu mal consegui divisar a face de Marte. Essa privação me doeu e foi talvez a causa de eu ter me lançado, por temerosos e extensos desertos, a descobrir a secreta Cidade dos Imortais. Meus trabalhos, como disse, começaram em um jardim de Tebas. Toda essa noite não dormi, pois algo estava combatendo em meu coração. Levantei-me pouco antes do amanhecer; meus escravos dormiam, a lua tinha a mesma cor da infinita areia. Um cavaleiro vencido e ensanguentado vinha do oriente. A uns passos de mim, caiu do cavalo. Com tênue voz insaciável, perguntou-me em latim o nome do rio que banhava os muros da cidade. Respondi-lhe que era o Egito, que as chuvas alimentam. "Outro é o rio que persigo", replicou com tristeza, "o rio secreto que purifica da morte os homens". Escuro sangue brotava de seu peito. Disse-me que sua pátria era uma montanha que está do outro lado do Ganges e que nessa montanha se falava que, se alguém caminhasse até o ocidente, onde o mundo se acaba, chegaria ao rio cujas águas dão a imortalidade. Acrescentou que na margem ulterior se ergue a Cidade dos Imortais, rica em baluartes e anfiteatros e templos. Antes do amanhecer, morreu, mas determinei descobrir a cidade e seu rio. Interrogados pelo verdugo, alguns prisioneiros mauritanos confirmaram a informação do viajante; alguém lembrou a planície elísia, no fim da terra, onde a vida dos homens é perdurável; outro, os cumes onde nasce o Pactolo, cujos moradores vivem um século. Em Roma, conversei com filósofos que sentiram que prolongar a vida do homem era prolongar sua agonia e multiplicar o número de suas mortes. Ignoro se acreditei alguma vez na Cidade dos Imortais: penso que então me bastou o trabalho de procurá-la. Flávio, procônsul de Getúlia, entregou-me duzentos soldados para a tarefa. Também recrutei mercenários, que se disseram conhecedores dos caminhos e foram os primeiros a desertar. Os fatos posteriores deformaram até o inextricável a lembrança de nossas primeiras jornadas. Partimos de Arsinoe e entramos no abrasado deserto. Atravessamos o país dos trogloditas, que devoram serpentes e carecem do comércio da palavra; o dos garamantes da Líbia, que têm as mulheres em comum e se nutrem de leões; o da tribo dos augilas, que só veneram o Tártaro. Fatigamos outros desertos, onde é negra a areia, onde o viajante deve roubar as horas da noite, pois o fervor do dia é intolerável. De longe divisei a montanha que deu nome ao Oceano: em suas ladeiras cresce o eufórbio, que anula os venenos; no cume, vivem os sátiros, nação de homens cruéis e rústicos, inclinados à luxúria. Que essas regiões bárbaras, onde a terra é mãe de monstros, pudessem abrigar em seu seio uma cidade famosa, a todos nos pareceu inconcebível. Prosseguimos na marcha, pois teria sido uma desonra retroceder. Alguns temerários dormiram com o rosto exposto à lua; a febre os queimou; na água corrompida das cisternas outros beberam a loucura e a morte. Então, começaram as deserções; muito pouco depois, os motins. Para reprimi-los, não vacilei no exercício da severidade. Procedi corretamente, mas um centurião me advertiu que os sediciosos (ávidos por vingar a crucificação de um deles) tramavam minha morte. Fugi do acampamento, com os poucos soldados que me eram fiéis. No deserto, perdi-os entre os redemoinhos de areia e a vasta noite. Uma flecha cretense me lacerou. Por vários dias, errei sem encontrar água, ou por um só enorme dia multiplicado pelo sol, pela sede e pelo temor da sede. Deixei o caminho ao arbítrio de meu cavalo. Na aurora, a distância encrespou-se de pirâmides e de torres. Insuportavelmente, sonhei com um exíguo e nítido labirinto: no centro havia um cântaro; minhas mãos quase o tocavam, meus olhos o viam, mas tão intrincadas e confusas eram as curvas que eu sabia que ia morrer antes de alcançá-lo. [...] Veja mais aqui e aqui.

CATATAU – O livro Catatau: um romance-ideia (Travessa dos Editores, 2004), do poeta, critico literário, tradutor e professor Paulo Leminski (1944-1989), é um livro de prosa experimental que explora o limite entre a poesia e a prosa, e trata das alucinações do filósofo Descartes durante as invasões holandesas. Da obra destaco o trecho: [...] Algomonstro está oculto atrás do ato nulo. O fato? Occam. O mapa é este. Não quero me precipitar, creio num abismo aí. Ele disse, ele se calou que só vendo, veio falando e foi desapercebendo. Um abismo, quem o mora? Nunca é demais voltar atrás, desde quando estamos caindo? Uma lei vai vigorar aqui. A lei é esta: assim não vale. A lei é estável. Qual o nome da lei? Um nome bem natural, a lei da máxima é múltipla. Faça o que te apetece, falte quando te fazem falta! Assim não vale. Ali está aquilo. Afastamento dos fatos, isolamento silencioso. Aqui é isso. Isso sai por uma porta e entra por outra, isso é uma raridade no dia de hoje. Uma coisa rara é coisa notável. Isso houve hoje. Um olhar de Janus aboliu a atualidade. Cara e coroa, cara e máscara. Aquilo está feito. Algo não andou bem. Houve um negócio. O próprio. Uma manifestação monstro adentrou-se nas dobras do terreno e concentrou-se no óbvio. Passa o tempo, o monstro não se mostra, que demora para uma demonstração. Queriam colocar-me aí. Quero ficar aqui, me respeitem. Eu assumo várias formas, ou arrumo vários casos. Caí em mim e nos que me equivocam, arranjem um outro eu mesmo que eu não dou mais para ser o próprio. Ele mesmo reconhecendo isso, foi levado a efeito. Isso não serve, temos que apresentar exemplos. Acostume-se com isto. Conosco, conosco, eis Occam. O qual já vem aí ver no que deu. Sem se esforçar, faz-se jus à voz corrente. O verbo acende um fogo, o sujeito vem se aquecer, esse sou eu, como é? Daqui dá para ver o objeto muito bem, além — a terra de ninguém do silêncio. Aqui faz frio, peço desculpas por fazer tão frio, faz tanto tempo que eu sinto frio que já nem sinto frio, já nem sei se isso é frio. O Toupinambaoults de tanto farejar marofa virou farofa. Assim não vale. Fiquei idêntico, mesmo eu estou bem aqui refazendo os nós que desatastes e adesatastes: não há mais quem consiga desatar um nó, depois que o rei de Górdio invadiu a Pérsia. Occam ocultus, Occam vultus, Occam, o bruxo. Occam torceu a sinalização. Occam disfarçou as peripécias. Aonde vai com tanta pressa? Vou a toda Pérsia, vai depressa. Occam vê o óbvio. Deixa o óbvio ali. Pensa uma oração e o óbvio desaparece. Occam não pensa nada, se nadifica e falta. A análise começa em casa, palavra. Para limpar lágrimas, uma lápide. Passou por aqui um desconhecido. Assim é que se faz, viu? Aparece na hora. Faz assim, assim se faça. Não é viável que você esteja me vendo. Absolutamente. Consta, não; é exato. O óbvio vive aqui. É aqui-del-rei que ele mora, quanta demora — para um botafora. O óbvio está vivo. Escapou e saltou até lá. Lá saiu, lá ficou, lá vai ele. Lá é grande, grande lá. Ali e lá, algo vem sendo, eu sei o que é isso: é o óbvio. Era uma vez, ele ia. Era uma vez, eu dizia. Era uma luz, um dia. Eu via, era um som na minha vida, me ouvindo. Proponho uma testemunha, um teste. Esta é minha testemunha, dando testemunho para todos os lados. Eu me chamo Procurado, muitos me têm procurado, poucos me têm achado. Eu estarei à sua direita, fazendo sinal. Sou o facho que atrai todos os olhares na escuridão das frases. Eu crio seres. [...]. Veja mais aqui e aqui.

O CORPO FALA - No livro Psicodrama no século XXI: aplicações clínicas e educacionais (Ágora, 2008), organizado por Jacob Gershoni, encontro o texto O corpo fala: o uso de psicodrama e de metáforas para conectar corpo e mente, escrito por Mary Anne Carswell e Kristi Magraw, do qual destaco o trecho: Nosso corpo deseja falar, mas como nós ouvimos? É comum desconsiderarmos suas tentativas de estabelecer conversação, ignorando nossa realidade interna: “É só meu ombro que está doendo novamente”. [...] a comunicação entre corpo e mente é essencial para garantir saúde e bem-estar. Os sintomas físicos aumentam quando não damos atenção aos aspectos emocionais subjacentes. Por exemplo, as manifestações físicas do eczema melhoram significativamente quando as manifestações emocionais da doença são amenizadas por meio de técnicas de relaxamento e visualização. Várias modalidades de relaxamento podem ajudar a diminuir o poder do medo sobre a mente. Mas o inverso também é verdadeiro: quando enfrentamos a realidade um perigo real, podemos agir de forma adequada, o que diminui as chances de o medo tomar conta do corpo. [...] Precisamos de uma comunicação de mão dupla. Precisamos cultivar maneiras de ouvir o corpo e falar de tal forma que este compreenda. Mas as palavras não são suficientes, por si mesmas, para estabelecer uma ponte que transponha esse antigo fosso entre corpo e mente. Precisamos cultivar novas ferramentas de linguagem. [...]. Veja mais aqui, aqui e aqui.

HARA-KIRI: DEATH OF A SAMURAI – O premiado filme Hara-Kiri: Death of a Samurai (2011), do cineasta japonês Takashi Miike, é a segunda adaptação para as telas do filme Ichimei (1965), contando a história de um samurai com poucos recursos, mas que quer morrer dignamente. Para tal, pede ajuda a outra pessoa que, para o demover, conta-lhe a história trágica de um outro jovem samurai que lhe pedira o mesmo. Hanshiro comove-se, mas mantém a sua decisão de morrer de forma digna. Na altura de cometer hara-kiri, o ritual japonês de suicídio, o seu último desejo é ser assistido por três tenentes de Kageyu, que estranhamente desapareceram. Questionado por Kageyu, Hanshiro revela a sua ligação a Motome e conta-lhe a história das suas vidas, justificando a prova de força que encetou por espírito de vingança. O destaque da película é a atriz japonesa Hikari Mitsushima. Veja mais aqui.

IMAGEM DO DIA
Dia do Artista: a arte de Salvador Dali. Veja mais aqui.

 Veja mais no MCLAM: Hoje é dia do programa Crônica de Amor, a partir das 21 hs, no blog do Projeto MCLAM, com a apresentação sempre especial e apaixonante de Meimei Corrêa. Para conferir online acesse aqui.

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CHRISTINA VASSILEVA, KATHERINE JOHNSON, MARTÍN-BARÓ, JOÃO CABRAL & MATA SUL INDÍGENA

    Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Mistérios do Rio Lento (The Voice of Lyrics, 1998), Santiago de Murcia: a portrait (Frame,...