DIÁRIO DO GENOCÍDIO NO FECAMEPA – UMA: SABE
AQUELA... OPERA OMNIA - O quê de ontem no
que é tão recente, pouco mais de um ano e a modorra preme, espreme a fadiga, o
horror transmuda-se camaleônico, enquanto alguns tantos se estapeiam e negam
aos gritos: não há nenhum reparo a ser feito! Como não, cara pálida? As cloacas
se escancaram e nem rangem insuspeitas, nem se sabe direito o que é: algo não
está conforme. Só excreções e quem sucumbe nelas, das homofagias: cada qual só
excreta o que tem na bolsa da valsa e valores, na balsa e nas bolhas, só o
sentido do inferno e a cegueira de quem vê e nada, tudo como um simples jogo
eletrônico, um peteleco ou tiras de quadrinhos. Nem é para dá a mínima, a cada
um o que lhe falta, qual fronteira a se romper, só a do procto, enfim, ou se
matam ou se danam. Jorge Luís Borges
vem na sirene de alerta das ambulâncias: A democracia é um erro estatístico, porque na democracia decide a
maioria e a maioria é formada de imbecis. As ditaduras fomentam a opressão, as
ditaduras fomentam o servilismo, as ditaduras fomentam a crueldade; mas o mais
abominável é que elas fomentam a idiotia. Por isso todas as cabeças enlouqueceram no muitos e
tantos Brasis. E a peste dizima na desimportância de cento e tantos que serão
duzentos ou milhões de mortos e quantos mais, e daí, nada demais.
DOIS ANTEONTENS & OUTRO ONTEM HOJE - Olhei no espelho e não era, tudo como em campo minado,
como se não houvesse o que retratar no cotidiano, nenhuma beleza, nenhum prazer
e lembranças escuras que se reviram com o verso de Paulo Leminski: Haja
hoje para tanto ontem. Acordei e me olhei no espelho ainda a tempo de ver meu
sonho virar pesadelo. Nada além do quarto escuro na noite
enluarada de nuvens pesadas. Baixinho escuto La Solitud de Leo Ferré:
Eu sou de um outro país, de um outro
bairro, de uma outra solidão. Eu invento atalhos. Eu não pertenço mais... Já
não há nada... Na verdade não é outro país é o meu com minha gente nem sei
como, e o asceta perdeu o dia e as horas, porque
um teve um derrame e nunca mais viu, outro enfartado e o tempo lhe comeu o
tutano do talento e correu os demais, enquanto eu só queria a maçã de Cézanne,
as tintas no chão de Pollock, quase nada sobrou além da hora minguante e solitária.
TRÊS MINUTOS & NADA MAIS DE NADA - Tudo muito decadente, esse o meu desencanto: a extinção
inevitável. Valho-me agora da
ternura de sempre da Cristina de Pisano:
Assim como os corpos das mulheres são mais suaves que os
dos homens, sua compreensão é mais aguçada. Claro, sou dela e sempre
serei porque se não fosse a nudez de Carolyn Weltman com a promessa do amor na minha noite desastrada, não
teria mais razão para viver, nenhuma mesmo. Quem
ao desejo não se submete se é o vetor da loucura com tensão entre códigos e
quereres, os pactos conjurados, estereótipos, reacionarismo, crises
existenciais, ascensão e queda disso e daquilo, tudo se desmoronando porque é
muito falso, quando não hostil: esperanças viram pragas; vida humana ou pedra,
tanto faz; um migrante carregando um sonho que seja despido de outros tantos e
muitos sonhos que se dissolveram e nunca deixaram de existir. Voo e até mais
ver.
A ARTE DE BETE GOUVEIA
[...] a família, muito conservadora, nunca apoiou a opção pela arte. Queria
que fosse dona-de-casa ou, no caso de ter uma formação acadêmica, que seguisse
Arquitetura ou Direito. [...].
Trecho do depoimento concedido
pela premiada artista, pesquisadora e professora universitária Bete Gouveia (Ana
Elisabete de Gouveia) para Mulheres nas
artes visuais em Pernambuco: um resgate (Comitê de História, Teoria e
Crítica de Arte da ANPAP – 25º Encontro – Porto Alegre, 2015), de Madalena Zaccara. Bete Gouveia
é professora do Departamento de Artes da UFPE e como artista já realizou
exposições individuais e coletivas nacionais e internacionais e contemplada com
um vídeo da série Versa do
Departamento de Teoria da Arte e Expressão Artística, produzido pelo Núcleo
de Audiovisual da Pró-Reitoria de Comunicação, Informação e Tecnologia da
Informação (Procit) da UFPE. Veja mais aqui, aqui & aqui.