VAMOS APRUMAR A CONVERSA? O TRÂMITE DA
SOLIDÃO
– De 1992 pra cá, para quem cometia versos diariamente, passei a ser um
versejador bissexto: a poesia passou a ser em mim mais exigente. É que
envolvido com letras de músicas, a prosa se pronunciando mais efetiva, o ritmo
ditando a norma, o ato criativo voltando-se mais para os tons e a sua
dramatização, e, sobretudo, a sobrevivência requerendo mais ação que reflexão,
o verso exigiu-me mais apuração: a busca da frase perfeita. Ou melhor: do verso
perfeito. Isso clamou em mim mais engenhosidade, o lavor de um lapidário, a
lasca mais aprumada de artífice na pedra, 1% de inspiração e 99% de
transpiração: o exercício para o domínio do métier. E passei a experimentar de
tudo: todas as formas e nenhuma, do amorfo ao multiforme e polimorfo. Todas as
rimas e nenhuma, do verso branco ao monossilábico, concreto. Todos os ritmos,
inclusive os oriundos das intuições atonais e dissonantes. Todas as
introspecções extrospectivas: eu, o mundo, a vida, o outro e nós em mim e em
todos. Deu-me, então, de reunir alguns versos sobre a temática da solidão: a
boca fala do que está cheio o coração. E como até hoje não dei o volume por
fechado, alguns deles começaram a dar forma ao Trâmite da Solidão. Veja mais aqui, aqui e aqui.
Imagem: Frida y la cesárea (1931), da pintora
mexicana Frida Kahlo (1907-1954). Veja mais aqui.
Curtindo Mercedes Sosa en vivo en Europa (Universal, 1990), da cantora
argentina Mercedes Sosa, La Negra –
a voz dos sem voz (1935-2009). Veja mais aqui.
O ESPECTRO DA FOME – O livro Geografia da fome - o dilema brasileiro: pão ou aço
(Antares, 1984), do médico, professor catedrático, pensador, ativista político
e embaixador do Brasil na ONU, Josué de
Castro (1908-1973), aborda a fome no nordeste açucareiro, no sertão do
nordeste, nas áreas de subnutrição, no centro e no sul, estudo do conjunto
brasileiro com o seu pensamento sobre a fome e a miséria resultantes da má distribuição das riquezas,
concentradas cada vez mais nas mãos de pouquíssimas pessoas, defendendo a
distribuição dos recursos, da terra para produção dos trabalhadores e da
reforma agrária. Nesse trabalho ele mapeia a distribuição e concentração da
fome no Brasil, na qual destaco o trecho O espectro da fome: Tempos atrás, um surto de sarampo, de tipo
violento e infeccioso, que praticamente dizimou uma localidade mineira do vale
do Jequitinhonha, revelou, ou antes, confirmou, a situação calamitosa, em
matéria de saúde e desnutrição, em toda aquela vasta região. Logo em seguida,
ou pouco antes, as cifras enumeradas no documento trágico de 18 altas
autoridades eclesiásticas mostravam a mesma situação por todo o Nordeste. E
outro documento, talvez ainda mais impressionante, dos bispos do Centro-Oeste
(Marginalização de um povo), confirmava o impacto do primeiro e acentuava-o.
Ainda outro documento, no mesmo sentido, e talvez ainda mais alarmante, pois se
refere à região considerada mais sadia de todo o Brasil: o Rio Grande do Sul,
foi referido no O Estado de São Paulo de 12 de agosto: A Revista da Associação
Médica do Rio Grande do Sul publicou o resultado de uma pesquisa feita pela
entidade, revelando que quase a metade das crianças gaúchas (1 milhão em 2
milhões e 600 mil) são desnutridas (sic). A desnutrição é responsável pela alta
taxa de mortalidade infantil e pela evasão escolar: menos de 10% dos alunos
matriculados no primeiro ano atingem a oitava série do ensino fundamental. A desnutrição
é causada pela falta de alimentos, dificuldades econômicas e desconhecimento
dos princípios de alimentação balanceada. Uma criança de quatro anos da classe
A (isto é, das camadas ricas da população, lembro eu), diz a revista, é em
geral, 9,19 centímetros mais altas que uma da classe B (isto é, das camadas
populares, lembro eu) e seu peso é superior. Isso significa que no Estado mais
sadio da federação, a desnutrição está concorrendo, fundamentalmente, para a
divisão crescente de nossa terra em dois modelos de população: os tipos
biologicamente superiores e os tipos biologicamente inferiores. E como estas
estatísticas informam, a proporção entre os exemplarei: bem nutridos e sadios e
os desnutridos e enfermiços é praticamente de 50%. Isso na região mais sadia e
rica de nossa pátria. Imaginemos então o que ocorre nas regiões que representam
uma proporção de mais de 80% da nossa população total. [...] Interesses e preconceitos de ordem moral e
de ordem política e econômica de nossa chamada civilização ocidental tornaram a
fome um tema proibido, ou pelo menos pouco aconselhável de ser abordada.
[...] Veja mais aqui.
A
ILÍADA – A obra A Ilíada é um poema épico grego do poeta
Homero (928aC-898aC), composto de
quinze mil seiscentos e noventa e três versos em hexâmetro dactílico – composto
de seis sílabas -, que narra os acontecimentos ocorridos na Guerra de Tróia.
Acerca da obra, escreve Otto Maria Carpeaux (História da Literatura Ocidental –
Alhambra, 1978) que está cheia de ruídos de batalhas e lutas pessoais, uma
multiplicidade de episódios em torno dos personagens principais: ira, abstenção
e luta final de Aquiles, as empresas bélicas individuais de Ajax, Diomedes e
Menelau, as intervenções de Agamenon e Ulisses, a sabedoria episódica de Nestor
e a maledicência de Tersistes e mais os episódios troianos: a fraqueza de
Páris, a bravura estoica de Heitor, o sentimento sentimental de Andrômaca, o
sentimento trágico de Príamo. Da obra destaco o trecho do Canto I: Canta, ó
deusa, a cólera de Aquiles, o Pelida (mortífera!, que tantas dores trouxe aos
Aqueus e tantas almas valentes de heróis lançou no Hades, ficando seus corpos
como presa para cães e aves de rapina, enquanto se cumpria a vontade de Zeus), desde
o momento em que primeiro se desentenderam o Atrida, soberano dos homens, e o
divino Aquiles. Entre eles qual dos deuses provocou o conflito? Apolo, filho de
Leto e de Zeus. Enfurecera-se o deus contra o rei e por isso espalhara entre o
exército uma doença terrível de que morriam as hostes, porque o Atrida desconsiderara
Crises, seu sacerdote. Ora este tinha vindo até as naus velozes dos Aqueus para
resgatar a filha, trazendo incontáveis riquezas. Segurando nas mãos as fitas de
Apolo que acerta ao longe e um cetro dourado, suplicou a todos os Aqueus, mas
em especial aos dois Atridas, condutores de homens: “Ó Atridas e vós, demais
Aqueus de belas cnêmides! Qu e vos concedam os deuses, que o Olimpo detêm, saquear
a cidade de Príamo e regressar bem a vossas casas! Mas libertai a minha filha
amada e recebei o resgate, por respeito para com o filho de Zeus, Apolo que
acerta ao longe.” Então todos os outros Aqueus aprovaram estas palavras: que se
venerasse o sacerdote e se recebesse o glorioso resgate. Mas tal não agradou ao
coração do Atrida Agamêmnon; e asperamente o mandou embora, com palavras
desabridas: “Que eu te não encontre, ó ancião, junto às côncavas naus, demorando-te
agora ou voltando nos tempos próximos, pois de nada te servirá o cetro e a fita
do deus! Não libertarei a tua filha. Antes disso a terá atingido a velhice em
minha casa, em Argos, longe da sua pátria, enquanto se afadiga ao tear e dorme
na minha cama. Vai-te agora. Não me encolerizes: partirás mais salvo.” Assim
falou. Amedrontou-se o ancião e obedeceu ao que fora dito. Caminhou em silêncio
ao longo da praia do mar marulhante. E depois de ter se afastado para longe,
rezou o ancião ao soberano Apolo, que Leto de belos cabelos deu à luz: “Ouve-me,
senhor do arco de prata, deus tutelar de Crise e da sacratíssima Cila, que pela
força reges Tênedo, ó Esminteu! Se alguma vez ao belo templo te pus um teto, ou
queimei para ti as gordas coxas de touros ou de cabras, faz que se cumpra isto
que te peço: que paguem com tuas setas os Dânaos as minhas lágrimas!” Assim
disse, orando; e ouviu-o Febo Apolo. Desceu do Olimpo, com o coração agitado de
ira. Nos ombros trazia o arco e a aljava duplamente coberta; aos ombros do deus
irado as setas chocalhavam à medida que avançava. E chegou como chega a noite. Depois
sentou-se à distância das naus e disparou uma seta: terrível foi o som
produzido pelo arco de prata Primeiro atingiu as mulas e os rápidos cães; mas
depois disparou as setas contra os homens. As piras dos mortos ardiam
continuamente. Durante nove dias contra o exército voaram os disparos do deus.
Ao décimo dia, Aquiles convocou a hoste para a assembleia: fora isso que lhe
colocara no espírito a deusa Hera de alvos braços. Pois sentia pena dos Dânaos,
porque os via morrer. [...] Veja mais aqui.
SOB O CÉU DE PALMARES: CIDADE PROMETIDA DO
SER POETA – Da minha santa terrinha, vez em quando tenho ótimas notícias! Desta
vez, para ampliar as minhas saudades, chegou-me notícias para lá de
alvissareiras. Trata-se do trabalho artístico desenvolvido pelo poeta e
compositor Genesio Cavalcanti que acaba
de lançar Sob o céu de Palmares, no qual ele expressa: "Sendo
poeta, costumo usar palavras para compor meu estado de ser: ser feliz, viver
feliz, morrer feliz"; também o dvd Cidade
prometida, em que ele traz a sua ousadia: "Minha ousadia vai além dos meus sonhos. E, se por ventura, sinto medo,
tristeza ou melancolia, persisto. Nunca desanimo, pois encontro forças
necessárias escrevendo uma nova poesia! Mas, se esse sonho adormece à medida
que esmoreço, é tempo de renovar energias. Parar. Dar um tempo. Tempo para
pensar, repousar aquilo que mereço, porque sei que na verdade, é chegada a hora
de um novo desafio, um novo recomeço"; e o belíssimo livro Poéticas de Amor, do qual destaco o
poema Amor é arte: Amor é arte / Arte de
sentir, tocar / De despir, apreciar / É a arte de falar / De saber silenciar / É
a arte de receber, doar / Arte de completar / De plantar, colher / De saber
esperar / Arte de reinventar / De querer, satisfazer / Amor é a pura arte / De
viver, de amar! Ele também edita o blog Ser Poeta no qual costumo sempre
apreciar sua literatura. Parabéns, Genésio! Sucesso procê, meu irmão. Veja mais aqui e aqui.
ANA IN CONCERT – A bailarina e atriz brasileira Ana Botafogo é desde 1981 a primeira
bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, já realizando apresentações
na Europa e nas Américas. Ela estreou com o ballet Coppélia, tendo integrado o Ballet de Marseille, na França, e
participado de festivais na Suíça, Itália, Cuba e Espanha, bem como ter dançado
em palcos da Inglaterra, tendo como preocupação constante levar a arte para
todos os cantos do Brasil, ministrando palestras para estimulação de jovens
bailarinos, fato que a faz ser considerada uma das mais importantes bailarinas
brasileiras. Veja mais aqui e aqui.
CONVERSATION NOCTURNE – O documentário Martha Argerich,
conversation nocturne (2002),
realizado pelo diretor francês Georges Gachot com a pianista argentina
de ascendência judaica e catalã Martha
Angerich, considerada um dos maiores expoentes de sua geração e do período
pós-guerra, no qual ela conta suas memórias, confidências sobre suas dúvidas e
o seu apetite pela produção musical. Ela se destacou por suas interpretações de
Chopin, Liszt, Bach, Schumann, Ravel e Prokofiev, principalmente por sua
interpretação no Concerto para Piano nº 3, de Rachmaninoff, merecendo destacar
os duos que ela realizou com o pianista brasileiro Nelson Freire. Mesmo
mantendo-se distante da imprensa e publicidade, reservando-se à sua carreira,
concedendo pouquíssimas entrevistas, ela aceitou realizar o elegante
documentário entrelaça maravilhosos trechos de apresentações, ensaios,
entrevistas e depoimentos da talentosa artista, apresentando desde a
adolescência solitária de estudante na Europa, até os dias mais recentes de sua
vida. Veja mais aqui e aqui.
IMAGEM DO DIA
As obras
do artista plástico tricordiano Eliezer
Augusto (Info: Meimei Corrêa/SelTC)
Veja mais sobre:
O passado escreveu o presente; o futuro,
agora,
Sociolinguística de Dino Preti, o teatro de Bertolt Brecht, Nunca houve
guerrilha em Palmares de Luiz Berto, a música de Adriana Hölszky, a escultura
de Antonio Frilli, a arte de Thomas Rowlandson, a
pintura de Dimitra Milan & Vera Donskaya-Khilko aqui.
E mais:
A liberdade de expressão, A filha
de Agamenon de Ismail Kadaré, A natureza
de Parmênides de Eléia, Poema sujo de Ferreira Gullar, O teatro
essencial de Denise Stoklos, a música de Badi
Assad, o cinema de Ingmar Bergman & Liv Ullmann, a escultura de Emilio
Fiaschi, Programa Tataritaritatá, a pintura de Gustav
Klint & Vera Donskaya-Khilko aqui.
O discurso do método de René Descartes, a música de João Bosco, o teatro de Denise Stoklos, o cinema de
Ingmar Bergman, a pintura de Gustav Klimt, Sandra Regina, Bernadethe Ribeiro & Danny
Calixto aqui.
Literatura de cordel: História do capitão
do navio, de Silviano Pirauá de Lima aqui.
Preconceito, ó! Xô pra lá, Diários
de viagem de Franz Kafka, A revolta de
Atlas de Ayn Rand, A lua e o infinito de Giacomo Leopardi, a música de Leoš Janáček
& Cheryl Barker, o cinema de Alessandro Blasetti & Sophia Loren, Maguerite Anzieu & Jacques Lacan: caso Aimée, a arte de Liliana Castro, a pintura de Helmut Breuninger & Hermann
Fenner-Behmer aqui.
Os vexames dum curau no sul, O absurdo de Thomas Nagel, Voragem de Junichiro Tanizaki, Pretidão de
amor de Emílio de Meneses, Mão na luva de Oduvaldo Vianna Filho, o cinema de Olivier
Assayas & Maggie Cheung, a música de Rosalia de Souza, a pintura de Pierre-Auguste Renoir & Suzanne
Frie aqui.
Quadrilha das paixões mais intensas, Vaqueiros
& cantadores de Luís da Câmara Cascudo, Terra de Caruaru de José
Condé, a música da Orquestra Armorial
& Cussy de Almeida, A Setilha de Serrador, O
casamento de Maria Feia de Rutinaldo Miranda Batista, a arte de Roberto Burle Marx. a xilogravura de Severino Borges, J. Miguel & Vermelho aqui.
Entre nós, vivo você, as
gravuras de Lasar Segall, a música de Sivuca, Cartilha do cantador de Aleixo
Leite Filho, Cancão de fogo de Jairo Lima, a poesia de Belarmino
França, a arte de Luciah Lopez, a
xilogravura de J. Borges & José Costa Leite aqui.
Dos bichos de todas as feras e mansas, Cantadores
de Leonardo Mota, O Romance da Besta Fubana de Luiz Berto, O martelo
alagoano de Manoel Chelé, a música do Duo Backer, a escultura de Antoni Gaudí, a militância de Brigitte
Mohnhaupt, a arte de Natalia
Fabia & a xilogravura de J.
Borges aqui.
Quem desiste jamais saberá o gosto de
qualquer vitória, A linguagem & as ciências de Roman
Jakobson, Nos caminhos de Swan de Marcel Proust, a arte de Regina José Galindo,
a fotografia de Thomas Karsten, a pintura de Henry
Asencio, a música de Secos & Molhados & Luiza Possi aqui.
Tudo em mim, mestiço sou, O povo
brasileiro de Darcy Ribeiro, A história da minha vida
de Helen Keller, Anarquismo & ensaios de Emma Goldman, a escultura de Luiz Morrone, a fotografia de Pisco Del Gaiso, Os Fofos Encenam & Viviane Madu, a música de Guilhermina Suggia & a pintura de Martin
Eder aqui.
&
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
Imagem: Reclining Nude with Book (1927), da pintora art déco polaca Tamara de Lempicka (1898-1980).
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra:
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.