VAMOS APRUMAR A CONVERSA? NEM TE CONTO! -
O Doro depois de tanto pelejar pela vida, passou a dar uma de conformado, só na
zona de conforto e a tudo referenciado como normal. Parece que o cara
definitivamente ficou às sopas, no limbo da ocasião. Não dá outra, seja o que
for, ele tasca: - É normal. Para até disco arranhado na radiola. Pra se ter
ideia, ele passou duas horas na fila bancária para receber a mixaria, quando um
outro revoltado baixou o decoro na maior palmatória do mundo: - Isso é um vitupério!
Nesse banco não se respeita o direito do consumidor! -, e virou-se pro Doro com
a maior cara de interrogação. E ele, como se não estivesse nem aí para quem
pintou a zebra, na maior cara lisa, balbuciou o refrão: - É normal. O cara saiu
revoltando xingando todos os seus antepassados. Até o Robimagaiver, pariceiro
da mesma laia e moquém, chegou todo trombudo e na maior apertura, reclamando em
ponto de bala: - Rapaiz, tô qui nem capim: quando não chove, não nasce; quando
nasce o boi come! -, e ele, como se dissesse que quem tem cabeça de cera não se
expõe ao sol, simplesmente largou de forma peculiar: - É normal. Deu nos nervos
do parceiro. Ninguém aguentava mais aproximar-se dele que tudo, para ele,
estava nos conformes da normalidade. Subiu a conta da luz? Normal. Aumento da
gasolina? Oxe. Presunto sumido achado no matagal? Comum. Carestia comendo no
centro? Nada demais. Foi aí que Zé Corninho apareceu virado na breca pela
constatação de que a sua décima segunda esponsal havia lhe coroado com duas de
quinhentos. O Doro, como sempre, pra seu consolo, remediou o seu: - É normal. –
Normal, uma porra! -, azedou Zé Corninho: - Chifre de corno ninguém vê, mas que
desarruma o juízo, isso faz! E saiu jurando que se ele só tinha dois votos,
acabou de perder todos. E ele de si pra si: - É normal, eu num mi inlegeria
mermo! Será o Benedito? Não, é a hipnose do Big Shit Bôbras, mesmo! E vamos
aprumar a conversa! Veja mais aqui e aqui.
Imagem: A reclining female nude, do artista plástico húngaro Richard Geiger (1870-1945).
Curtindo a ópera Orfeo ed Euridice (Philips, 1994), do compositor alemão Christoph Willibald Gluck (1714-1787),
performer Sylvia McNair &
Monteverdi Choir Orchestra & English Baroque Soloists, conductor John Eliot
Gardiner. Veja mais aqui, aqui e aqui.
A
NATUREZA, ELEGIAS & SÁTIRAS
- O poeta, sábio e rapsodo grego Xenófanes
de Colofão (570-528aC), foi o fundador da escola eleática expondo suas
concepções filosóficas em um poema doutrinal A Natureza, do qual só restam fragmentos. Criticou severamente o
politeísmo e o antropomorfismo de Homero e Hesíodo, lançando as bases do
monismo, acósmico, caracterizada pelos eleatas. A sua filosofia foi toda
escrita em versos, entre eles destaco Ateneu X: Agora o chão da casa está limpo, as mãos de todos / e as taãs; um cinge
as cabeças com guirlandas de flores, / outro oferece odorante mirra numa salva;
plena de alegria, ergue-se uma cratera, / à mão está outro vinho, que promete
jamais faltas, / vinha doce, nas jarras cheirando a flor; / pelo meio perpassa
sagrado aroma de incenso, / fresca é a água, agradável e pura; / ao lado estão
pães tostados e suntuosa mesa / carregada de queijo e espesso mel; / no centro
está um altar todo recoberto de flores, / canto e graça envolvem a casa. / É
preciso que alegres os homens primeiro cantem aos deuses / com mitos piedosos e
palavras puras. / Depois de verter libações e pedir forças para realizar / o
que é justo – isto é que vem em primeiro lugar -, / não é excesso beber quanto
te permita chegar / à casa sem guia, se não fores muito idoso. / É de louvar-se
o homem que, bebendo, revela atos nobres / como a memoria que tem e o desejo de
virtude, / sem nada falar de titãs, nem de gigantes, / nem de centauros,
ficções criadas pelos antigos, / ou de lutas civis violentas, nas quais nada há
de útil. / Ter sempre veneração pelos deuses, isto é bom. Veja mais aqui e
aqui.
O
LOBO DA ESTEPE – O
romance O lobo da estepe (Der Steppenwolf, 1927 - Record, 1995),
do escritor alemão e Prêmio Nobel de 1946, Hermann
Hesse (1877-1962), conta a história de outsider e misantropo de meia idade,
alcoolátra e intelectualizado, angustiado por não ver saída da tormentosa
condição e que se envolve em incidentes fantásticos e inesperados que o
conduzem ao despertar de um longo sonho ao conhecer uma mulher e um músico,
numa história surpreendente. Da obra destaco o trecho: [...] Quando voltei a mim, vi Mozart sentado ao meu lado como antes,
tocando-me nos ombros e dizendo-me: — Acabou de ouvir a sentença. Já pode ir-se
acostumando a ouvir a música de rádio desta vida. Isso lhe fará bem. O senhor é
extraordinariamente mal dotado, não passa de um cabeça-dura; mas irá
compreendendo pouco a pouco o que se espera do senhor. Tem de aprender a rir,
isso é o que se exige. Tem de compreender o humor da vida, o humor patibular.
Mas, é claro, o senhor está preparado no mundo para tudo, menos para o que se
lhe pede! Está preparado para matar mocinhas, para deixar-se julgar
solenemente, decerto também está preparado para mortificar-se durante cem anos
e mesmo flagelar-se, não é verdade? — É verdade! Estou preparado de todo o
coração — exclamei em minha miséria. — Naturalmente! O senhor está disposto a
qualquer tolice que careça de humor, meu caro; para tudo o que seja patético e
destituído de graça. Mas eu não estou disposto a dar-lhe nem wcapfennig por toda
a sua romântica penitência. O senhor quer ser julgado, quer que lhe cortem a
cabeça, ó sanguinário! Por esse estúpido ideal seria capaz de dar outras dez
punhaladas. O senhor está disposto a morrer, seu covarde, mas não a viver. Ao
diabo! mas terá de viver! Seria bem merecido que o condenássemos ã pena máxima.
— Oh! e qual seria essa pena? — Podíamos, por exemplo, ressuscitar a moça e
casá-lo com ela. — Não, a isso não estaria disposto. Seria uma desgraça. — Como
se não fosse uma desgraça toda a confusão que o senhor já preparou! Mas vamos
acabar de vez com todo o patético e os golpes mortais. Já está na hora de ser
razoável. O senhor tem de viver e aprender a rir. Tem de aprender a escutar a
maldita música de rádio da vida, tem de reverenciar o espírito que existe por
trás dela e rir-se da algaravia que há na frente. É tudo o que exigimos do
senhor. Lentamente, por entre dentes cerrados, perguntei: — E se eu não me
submeter? E se eu vos negar, Sr. Mozart, o direito de dispor do Lobo da Estepe
e de vos imiscuirdes em meu destino? — Então — disse Mozart, calmamente — eu o
convido a fumar um dos meus maravilhosos cigarros. Dizendo isto, e enquanto
tirava num passe de mágica um cigarro do bolso do colete e mo oferecia, deixou
de ser Mozart, e fitando-me calidamente com seus olhos exóticos, converteu-se
em meu amigo Pablo, bem assim no homem que me havia ensinado a jogar com as
figurinhas no tabuleiro de xadrez. — Pablo! — exclamei, palpitando. — Pablo,
onde estamos? Pablo deu-me o cigarro e ofereceu-me fogo. — Estamos — disse
rindo — em meu teatro mágico, e se quiseres aprender a dançar o tango ou ser um
general ou conversar com Alexandre o Grande, tudo isto estará à tua disposição
da próxima vez. Mas devo dizer-te, Harry, que me decepcionaste bastante.
Esqueceste horrivelmente de ti, quebraste o humor do pequeno teatro e cometeste
uma felonia; mataste a punhaladas e manchaste o nosso belo mundo de imagens com
as nódoas da realidade. Isso não foi correto de tua parte Espero, pelo menos,
que o tenhas feito por ciúmes, quando viste Hermínia dormindo nos meus braços.
Infelizmente, não soubeste manejar essa figura; imaginei que havias aprendido o
jogo melhor. Espero que procedas melhor da próxima vez. Apanhou Hermínia, que se
havia convertido, de súbito, numa figurinha de xadrez em seus dedos, e
guardou-a no mesmo bolso do colete de que antes havia tirado o cigarro.
Prazerosamente saboreei o doce e pesado fumo do cigarro, senti-me exausto e
disposto a dormir um ano inteiro. Oh! agora compreendia tudo: compreendia
Pablo, compreendia Mozart, ouvia algures atrás de mim seu riso espantoso, sabia
ter em meu bolso centenas de milhares de figurinhas do jogo da vida, suspeitava
emocionado o sentido, tinha a intenção de iniciar de novo o jogo, de voltar a
estremecer diante de seus desatinos, de voltar a percorrer o inferno do meu
interior, não uma vez, mas sempre. Da próxima vez saberia jogar melhor. Da
próxima vez aprenderia a rir. Pablo me esperava. Mozart também. Veja mais aqui, aqui e aqui.
REPENSO
O MUNDO – O livro Poemas (Companhia das Letras, 2011), da
poeta, critica literária e tradutora polonesa e Prêmio Nobel de Literatura, Wislawa Szymborska (1923-2012), reúne
quarenta e quatro poesias da autora, entre as quais destaco Repenso o mundo: Repenso o mundo, segunda edição, / segunda
edição corrigida, / aos idiotas o riso, / aos tristes o pranto, / aos carecas o
pente, / aos cães botas. / eis um capítulo: / a Fala dos Bichos e das plantas,
/ com um glossário próprio / para cada espécie. / mesmo um simples bom-dia /
trocado com um peixe, / a ti, ao peixe, a todos / na vida fortalece. / essa há
muito pressentida, / de súbito revelada, / improvisação da mata. / essa épica
das corujas! / esses aforismos do ouriço / compostos quando imaginamos / que,
ora, está só adormecido! / o tempo (capítulo dois) / tem direito de se meter /
em tudo, coisa boa ou má. / porém — ele que pulveriza montanhas / remove
oceanos e está / presente na órbita das estrelas, / não terá o menor poder /
sobre os amantes, tão nus / tão abraçados, com o coração alvoroçado / como um
pardal na mão pousado. / a velhice é uma moral / só na vida de um marginal. /
ah, então todos são jovens! / o sofrimento (capítulo três) / não insulta o
corpo. / a morte chega com o sono. / e vais sonhar / que nem é preciso
respirar, / que o silêncio sem ar / não é uma música má, / pequeno como uma
fagulha, / a um toque te apagarás. / morrer, só assim. Dor mais dolorosa /
tiveste segurando nas mãos uma rosa / e terror maior sentiste ao som / de uma
pétala caindo no chão. / o mundo, só assim. / Só assim viver. / E morrer só
esse tanto. / E todo o resto — é como Bach / tocado por um instante num serrote.
Veja mais aqui & aqui.
DA
PRINCESINHA MIMADA AO TISTU
– A atriz, locutora, escritora, cantora e compositora Bia Sion tem desenvolvido uma trajetória nas artes, entre a
televisão, o teatro, o rádio e a música – só pra ficar nisso, pois ela é duma
versatilidade ímpar e transita por onde o talento der. No teatro ela estreou
com A princesinha mimada (1977), depois Festa no Sábado (1978), O girassol
mágico (1979), Eu chovo, tu choves, ele chove (1979), Don Quixote de la Pança
(1980), Viagem à Imaginação (1981), Band Age (1982), Tistu, o menino do dedo
verde (1983), Sapatinho de Cristal (1984), Isadora e Oswald (1984), Feliz Ano
Velho (1985), Filumena Marturano (1987), Vira Lats (1989), Ensina-me a viver
(1990), Noturno – sonetos e canções de Shakespeare (1991), Antes de ir ao baile
(1991), Música divina música (1992), A balada de um palhaço (1993), Os saltimbancos
(1984), Fazendo amigos na fazenda (2002) e Tistu (2005). Ela também lançou o
disco A levada do Jazz (2008) e tem perseguido sua estrada com muito talento e
competência. Veja mais aqui e aqui.
LADIES
OF THE CHORUS – O
musical Ladies of the Chorus (Mentira
Salvadora, - Columbia Pictures, 1948), dirigido pelo cineasta estadunidense
Phil Karlson (1908-1985), baseado na história do roteirista russo Harry Sauber
(1885-1967), contando a história de uma dançarina que se apaixona por um homem
rico. Foi este o primeiro que assisti estrelado por Marilyn Monroe e marcando definitivamente a imagem dessa bela
mulher na minha adolescência: ela cantando, ela sorrindo, ela dançando,
caminhando, enfim, de todas as formas da sua expressão na tela. Acho que vi e
revi o filme na época umas trocentas vezes, ficando marcado na minha memória, a
ponto de guarda no nome Peggy Martin muito bem guardado no meu apreço. Veja
mais aqui, aqui e aqui.
IMAGEM DO DIA
Grabados – Serie América
& Ex Libri, do artista plástico argentino Osvaldo Jalil. Veja mais aqui e
aqui.
Veja mais sobre:
A lenda do açúcar e do álcool, Educação não é privilégio de Anísio
Teixeira, História da Filosofia de Wil Durant, a música de Yasushi Akutagawa,
Não há estrelas no céu de João Clímaco Bezerra, Cumade Fulosinha & Menelau
Júnior, a pintura de Madison Moore, João Pirahy &
Pulsarte aqui.
E mais:
Sorria, Canto geral de Pablo Neruda, A desobediência civil de Henry David Thoreau, O
feijão e o sonho de Orígenes Lessa, Revolução na América do Sul de Augusto Boal, Monteiro
Lobato & Brincarte do Nitolino, a
pintura de Amedeo Modigliani, a música de Sebastião Tapajós, Mestre Vitalino & Marcelo Soares aqui.
Psicologia social e educação, a poesia de Pablo
Neruda, a pintura de Amedeo Modigliani, a
música de Yasushi Akutagawa, a arte de Regina
Espósito & Ju Mota aqui.
Devagar e sempre, A monadologia de Leibniz, Estudo do poema de Antônio
Cândido, Meu país de Dorothea Mackellar, A arte da comédia de Lope de Vega, o
ativismo de Emma Goldman, a arte de Gilvan
Samico, a música de Alceu Valença, a xilogravura de Amaro Francisco Borges,
Brincarte do Nitolino & a pintura de Nina Kozoriz
aqui.
A vida dupla de Carolyne & sua cheba
beiçuda, Psicologia da arte de Lev Vygotsky, a poesia de
William Butler Yeats, A República de Platão, a
pintura de Raphael Sanzio & Boleslaw von Szankowski, a música de Leonard Cohen, o cinema de Paolo Sorrentino & World
Erotic Art Museum - WEAM aqui.
Divagando na bicicleta, Onde
andará Dulce Veiga de Caio Fernando Abreu, Os elementos de Euclides de Alexandria, O
teatro e seu duplo de Peter Brook, a
música de Billie Myers, a fotografia de Alberto Henschel, a pintura de Jörg Immendorff & Oda Jaune aqui.
A conversa das plantas, Memória
da guerra de Duarte Coelho, a poesia de Cruz e
Sousa, Arquimedes de Siracusa, a música de Natalie
Imbruglia, a arte de Hugo Pratt & Tom
14 aqui.
Leitoras de James leituras de Joyce, a fotografia de Humberto Finatti, a arte de Henri Matisse & Wayne Thiebaud aqui.
Incipit vita nuova, As
raízes árabes da arte nordestina de Luís Soler, A divina comédia de
Dante Alighieri, a música de Galina Ustvolskaya, a pintura de Jack Vetriano & Paul Sieffert, as
gravuras de Gustave Doré & a arte de
Luciah Lopez aqui.
&
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
Imagem: Nude Woman Reading, do artista plástico francês Philippe de Rougemont (1891-1965).
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra:
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.