UMA DE GIMNOSOFISTAS: O Doro estava em estado de graça naquela
sexta-feira. Encheu o tampo, correu bicho trocando as pernas e a língua e, lá
pras tantas, achou, por bem dos birinaites, de tirar a roupa e sair por aí nu. Pode?
O camburão passou e levou-lo pro xilindró. No outro dia, nem sabia onde estava.
Foi, aos puxavanques, levado à presença de um delegado poeta que o interrogou:
Quer dizer que o senhor é gimnosofista! Hem? Encarcera esse que além de
reincidente é burro! Uma semana depois ele reaparece com a cara mais lisa. Onde
andava Doro? Fui em cana! Danou-se! Que foi dessa vez? Ah, não foi Papai Noel
não, foi por um tal de não sei que lá – na verdade, ele foi trancafiado pela
primeira vez numa dessas vésperas de natal, quase matando a garotada de medo e
intoxicação. Agora, não. E apertava as catracas do quengo para se lembrar como
era mesmo o nome. Doutor Gulu que ouvia o relato dele, gritou: Estava nu? Gimnosofista!
Isso mesmo, doutor, o que é que significa? Sábio nu. Eita! Eu já soube de um
rei nu, mas sábio, nunca ouvi falar! Ah, na Índia antiga havia uns sábios
gimnosofistas. Ah, tá, deu no mesmo, continuo sem entender patavina. Deixa para
lá, é muito para um broco como você! E fechou-se em copas. Doro queria por que
queria saber que desaforo era esse. Um dia lá, ficou sabendo. Veja como aqui. DUAS: SANTA PELONHA - Afredo Bocoió só
vivia falando duma santa. Como é o nome dela? Santa Pelonha. Nunca ouvi falar.
Ah, a santa que cura todas as dores, mô fio! Pelonha? Sim, essa mesma. E
perguntaram a um e a outro, foram até o vigário, mas havia saído. Explica direito,
vai. Aí Afredo debulhou: Foi uma raizeira mãe de santo, catimbozeira afamada das
boas, quem me ensinou. Como assim? Se tiver qualquer dor, basta rezar por Santa
Pelonha que fica bonzinho da hora. D-u-du-v-i-vi-d-o-do! Duvido! A-rá! Aí que
você se engana, mô fio. Faça o teste! E fui ver. Veja mais abaixo e, depois, aqui.
LÁ VAI TRES, SAIDEIRA - Apesar de
ser dia do Pão e da Alimentação – que para mim é todo dia -, todo mundo tá
correndo mesmo atrás é de ganha-pão (não estou falando do filme The Breadwinner, não, mas de
sobrevivência mesmo!). E só ouço o povo falar de grafeno, nióbio, borofeno,
essas coisas que ninguém sabe o que droga que é. Já vi gente dizer: Como é que
se come grafeno, hem? Nióbio é doce ou salgado? O borofeno é bom pra digestão? Quando
souberam que uma cientista usava um tecido de grafeno para espantar mosquitos, caíram
na real: Isso é lá veneno, meu! Estão pensando em usá-lo como bateria de
celular. Oxe, se tem gente que come pilha, deve comer isso também, ora! Ah,
deve ser uma droga arretada para os doidões! E o borofeno? Deve ser a mesma
merda. Ah. Mas o nióbio deve servir para alguma coisa! Lembra do Enéas? Ah,
sim, o Coiso lá tá dando o maior cartaz pra isso também. E se come isso? Sei lá!
Estão dizendo que o Brasil é quem tem mais disso aí que o resto do mundo! Ah,
então serve para enricar mesmo! Então, tá. Vamos aprumar a conversa! © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.O TEATRO DE DENISE STOKLOS
Teatro gera
reflexão, produto que não se vende, que não interessa para nenhuma corporação...
Teatro sempre trata de temas que são universais, atemporais e que dizem
respeito a cada um que esteja sentado na plateia... O artista de teatro se
difere de outros: sua função é ser uma espécie de arauto de sua comunidade, que
se agrega em uma reunião sagrada, pedindo ao ator que lhe traga uma situação e
um ponto de vista de análise crítica...
Pensamento da dramaturga,
encenadora e atriz Denise Stoklos. Veja mais aqui & aqui.
AS BRUXAS DA REPÚBLICA, DE CHLOÉ DELAUME
[…] Era necessário um país onde a língua
fosse uma questão, um desafio e um território. No princípio era a palavra, e o
poder pertencia aos gramáticos. A regra da proximidade. Em 1767, Nicolas
Beauzée, Gramática Geral: "O gênero masculino é considerado mais nobre que
o feminino devido à superioridade do masculino sobre o feminino." Em 1772,
Nicolas Beauzée, gramático, foi eleito para a Académie Française. Desde então,
o masculino prevaleceu sobre o feminino, oficialmente, por golpe de espada, com
a bênção de Bescherelle e os votos de felicidades do Pequeno Roberto. [...] Os desejos
das mulheres francesas perfeitamente realizados, o novo começo e seus
ensinamentos. liberdade, paridade, irmandade. [...] Cada vez mais, me
pego rezando em meu espaço privado para uma entidade pertencente a um culto
monoteísta masculino aprovado pelo Estado. [...].
Trechos
extraídos da obra Les Sorcières de la République (Points, 2019), da escritora, musicista, cantora, artista e editora francesa
Chloé Delaume (Nathalie Dalain), autora de obras como Une femme avec
personne dedans (2012), S'écrire mode d'emploi: Vécu mis en fiction,
mais jamais inventé (2006) e Le Cri du sablier (2001), expressando-se
assim sobre a palavra: A Palavra é poder. Nunca se esqueça disso. A
Palavra é poder, talvez até o supremo, e é por isso que o Ogro matou o
dicionário.
EM LOUVOR À DESOBEDIÊNCIA
[...] O que eu faria sem livros? Tenho uma
casa cheia deles, e mesmo assim nunca tenho o suficiente. Gostaria de ter um
dia de 36 horas para ler à vontade. Tenho livros de todos os tamanhos: livros
de bolso, livros de bolsa, livros de mala, livros de bolso, livros de
prateleira, livros de mesa. E sempre carrego um comigo. Nunca se sabe: se
encontro um tempinho, se me fazem esperar num escritório, seja nos correios ou
no consultório médico, pego meu livro e leio. Quando estou com o nariz na
página, não sinto o cansaço da espera. E, como diz Ortega y Gasset, num livro
eu "fico preso", a ponto de ser difícil me perder. Saio dos livros
com as pupilas dilatadas. Considero isso o maior, o mais certo, o mais profundo
prazer da minha vida. [...].
Trecho extraído da obra Chiara di Assisi: Elogio della disobbedienza ( Rizzoli, 2013), da premiada escritora italiana Dacia Maraini, autora também dos livros: Il treno dell'ultima notte (2008), Bagheria (1993), The
Silent Duchess(1990) e La larga vida de Marianna Ucrìa (1990), que
assim se expressa sobre o amor: Sabe, às vezes é o amor dos outros que nos faz
apaixonar: só vemos uma pessoa quando ela pede nossos olhos...



