DE REPENTE A CRISE - Imagem:
arte do pintor, gravador e estilista estadunidense David Salle.- Uma pedra caiu na água, danou-se! Deu-se a crise: não
era nem um pedregulho para tanto transtorno alardeado, era só um cascalho, coisinha
miúda de provocar pequenas ondas, nadica de nada. Já viu: se é pra manter
temores, é só boato de coisa ruim pra enganar tantos bestas que nem eu. Sei
não. Já soube? Um touro fugiu do cercado – assim feito um leão furioso que
escapuliu da jaula -, crise: não era nem um daqueles que bufam brabeza de se
correr pé na bunda levantando poeira, nada, foi só pra testar a carreira, era
um garrotinho crescido que vendiam por tragédia anunciada das lendas do arco da
velha. Que coisa! Ah, tem mais! Mesmo? Foi. Fulano peidou na esquina, vixe! Pronto,
já davam por terremoto ineivado, coisa de matar todo mundo com a fedentina, de
se esperar explosões de armagedom. Dizem até que o provocante findou reduzido
às cinzas pela combustão humana. Vai-te! Pois é, pras expectativas escatológicas
um dia o mundo acaba ou de fogo, ou de água, ou do sei lá o quê, sabem apenas
que acaba e fim de papo. Pois é, de nada, manobras e outras escusas práticas
engalobadoras dão conta de cabelinho de sapo como se fosse o fim do mundo do
estardalhaço. Assim é a crise que tanto falam: basta reduzirem um tiquinho de
nada os lucros ou escassearem por instantinho de nada as entradas ou captações
dos que querem tudo o tempo todo, logo se instala uma crise de plantão que já
dura, pelo menos pra mim, mais de sessenta anos – eu nem era nascido quando
falavam de tantas crises disso e daquilo. Qual a da vez? É só passar, entra ano
e sai ano, crises e crises, uma atrás da outras, encangadas, quando não
enroladas, inventadas, ou fabricadas na puxada do tapete geral, sempre para
amarelar o riso da maioria que sonha ter um pouco de estabilidade. Quem mandou?
A crise só se justifica para não haver um mínimo de dignidade, só para educação
ínfima, saúde precária, segurança pro beleléu, prestação parcas ou nenhuma dos
serviços públicos que já faltam, ineficiência, incompetência, enrolação e
trambicagem. Vai se vê no apurado, crise mesmo é conversa pra boi dormir – e deixar
a população insone. Porque basta um maioral anunciar a dita cuja, o efeito em
cadeia nacional é avassalador. Só resta segurar o tombo, envergar de quase
torar – segura a onda! -, equilibrista na corda bamba que é feita de areia
movediça e ventania de temporal, essa é só a primeira, vem mais, pode esperar, afinal,
de golpe em golpe a gente vai aprendendo – peraí, aprender mesmo o quê? -, vai
apurando, na marra, às topadas, aos empurrões. Conto outra? Ah, destá. Um dia
lá, não sei quando, a gente sai dessa. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje
na Rádio Tataritaritatá especiais com a música do
artista e músico Antonio Carlos Nóbrega: Pernambuco falando para o mundo, Lunário perpétuo, Carrossel do
destino, O romance de Riobaldo e Diadorim & Meu foguete brasileiro; da
violoncelista britânica Caroline Dale interpretando Merlis Hate & Such Sweet Thunder; o músico e compositor
estadunidense Lee Ritenour: World
of Brazil, West Bound & Night Rythms; e a cantora, compositora, produtora
musical e publicitária Rosana Simpson:
Cigano, Só, Tela de Cinema & Tanta Agonia. Para conferir é só ligar o som e curtir.
A CONDIÇÃO PÓS-MODERNA - [...]
O retrato do pós-modernismo que esbocei até agora
parece depender, para ter validade, de um modo particular de experimentar,
interpretar e ser no mundo - o que nos leva ao que é, talvez, a mais problemática
faceta do pós-modernismo: seus pressupostos psicológicos quanto à
personalidade, à motivação e ao comportamento. A preocupação com a fragmentação
e instabilidade da linguagem e dos discursos leva diretamente, por exemplo, a
certa concepção da personalidade. Encapsulada, essa concepção se concentra na
esquizofrenia (não, deve-se enfatizar, em seu sentido clínico estrito), em vez da
na alienação e na paranóia (ver o esquema de Hassan). Jameson (1984b) explora
esse tema com um efeito bem revelador. Ele usa a descrição de Lacan da
esquizofrenia como desordem lingüística, como uma ruptura na cadeia
significativa de sentido que cria uma frase simples. Quando essa cadeia se rompe,
"temos esquizofrenia na forma de um agregado de significantes distintos e
não relacionados entre si". Se a
identidade pessoal é forjada por meio de "certa unificação temporal do
passado e do futuro com o presente que tenho diante de mim", e se as
frases seguem a mesma trajetória, a incapacidade de unificar passado, presente
e futuro na frase assinala uma incapacidade semelhante de "unificar o
passado, o presente e o futuro da nossa própria experiência biográfica ou vida
psíquica". Isso de fato se enquadra na preocupação pós-moderna com o
significante, e não com o significado, com a participação, a performance e o happening,
em vez de com um objeto de arte acabado e autoritário, antes com as aparências
superficiais do que com as raízes (mais uma vez, ver o esquema de Hassan). [...] pós-modernismo tipicamente descarta essa possibilidade
ao concentrar-se nas circunstâncias esquizofrênicas induzidas pela fragmentação
e por todas as instabilidades (inclusive as lingüísticas) que nos impedem até
mesmo de representar coerentemente, para não falar de conceber estratégias para
produzir, algum futuro radicalmente diferente. O modernismo, com efeito, não
deixava de ter seus momentos esquizóides - em particular ao tentar combinar o
mito com a modernidade heróica -, havendo uma significativa história de "deformação
da razão" e de "modernismos reacionários" para sugerir que a
circunstância esquizofrênica, embora dominada na maioria das vezes, sempre
estava latente no movimento modernista. Não obstante, há boas razões para
acreditar que a "alienação do sujeito é deslocada pela fragmentação do
sujeito" na estética pós-moderna (Jameson, 1984a, 63). Se, como insistia
Marx, o indivíduo alienado é necessário para se buscar o projeto iluminista com
uma tenacidade e coerência suficientes para nos trazer algum futuro melhor, a
perda do sujeito alienado pareceria impedir a construção consciente de futuros
sociais alternativos. [...]. Trechos extraídos da obra A condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as
origens da mudança cultural (Loyola, 2001), do professor e geógrafo britânico marxista
David Harvey, definindo os contornos
culturais da 'condição' pós-moderna em seus aspectos estéticos, sociais,
literários e filosóficos, observando as mudanças que ocorreram na experiência
do espaço e do tempo, como uma conseqüência da atual crise do capitalismo, e
não como um sintoma do surgimento de uma sociedade pós-capitalista ou
pós-industrial. Veja mais aqui.
FIM DO TRABALHO – [...]
A imprescindível
eliminação do trabalho assalariado, do trabalho fetichizado e estranhado
(alienado) e a criação dos indivíduos livremente associados está
indissoluvelmente vinculada à necessidade de eliminar integralmente o capital e
o seu sistema de metabolismo social em todas as suas formas. O que, entretanto,
não deve impedir um estudo cuidadoso da classe trabalhadora hoje, suas principais
metamorfoses. [...] Claro que esta crise é particularizada e singularizada
pela forma pela qual essas mudanças econômicas, sociais, políticas e ideológicas
afetaram mais ou menos direta e intensamente os diversos países que fazem parte
dessa mundialização do capital que é, como se sabe, desigualmente combinada.
Para uma análise detalhada do que se passa no movimento operário inglês,
italiano, brasileiro ou coreano, o desafio é buscar essa totalização analítica
que articulará elementos mais gerais desse quadro, com aspectos da singularidade
de cada um desses países. Mas é decisivo perceber-se que há um conjunto
abrangente de metamorfoses e mutações que tem afetado a classe trabalhadora, e
para a qual é absolutamente prioritário o seu entendimento e desvendamento,
para resgatar um projeto de classe capaz de enfrentar esses monumentais desafios
presentes no final deste século. [...]. Trechos
extraídos da obra Adeus ao trabalho? Ensaio
sobre as metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho (Cortez,
2000), do sociólogo, filósofo e professor Ricardo Antunes. Veja mais aqui, aqui e aqui.
DESIGUALDADE E DIREITOS - [...]
O grande desafio àqueles cuja matéria é,
cotidianamente, lidar com as seqüelas decorrentes do processo de constituição
da questão social a partir da lei geral da acumulação: conhecer as muitas faces
da questão social no Brasil, das quais a mais perversa é a desigualdade econômica,
política, social e cultural a que estão submetidas milhões de pessoas, o que
requisita um grande esforço de pesquisa sobre o Brasil. É necessário e
imprescindível conhecer profundamente nossa matéria: a questão social
brasileira. [...] Falar sobre
direitos e sua relação com a totalidade da vida social pressupõe considerar os
indivíduos em sua vida cotidiana, espaço-tempo em que as expressões da questão
social se efetivam, sobretudo, como violação dos direitos. A vida humana não é
a mera reposição aleatória dos indivíduos ou explicitação de uma essência natural,
mas expressa, além das respostas às demandas imediatas, vínculos com a produção
da vida genérica, vida essa que se caracteriza pelo fato de os indivíduos serem
relacionais, diversos e interdependentes. [...] Sabemos que, no desenvolvimento da sociabilidade, um conjunto de
contradições e o antagonismo entre as necessidades do capital e as do trabalho
frustraram amplamente as promessas de liberdade e de igualdade, bem como a
efetivação de uma vida social sem dominação, exploração e opressão. Podemos, assim,
afirmar que, no tempo presente, os segmentos do trabalho, ao invés de sujeitos
de direitos, são sujeitos da desigualdade, que convivem nos cenários de
violência endêmica e de barbárie a que fizemos referência anteriormente. Trechos
do artigo Questão social e direitos
(ABEPSS, 2006), das professoras Elaine
Rossetti Behring e Silvana Mara de
Morais dos Santos. Veja mais aqui e aqui.
CAPITALISMO PARA PRINCIPIANTES - [...] A
ideologia domina a sociedade, que por sua vez é difundida pela ideologia
burguesa. Diante disso tudo, o mundo torna-se individualista. O que é passado
pela ideologia dominante só fica na teoria. As camadas inferiores são
consideradas mais solidárias. Portanto, percebe-se que o Capitalismo apesar de
todas as crises e reformulações sofridas ainda assim é inviável. Torna os
direitos humanos em negócios para garantirem lucros. [...]. Trecho da obra Capitalismo para principiantes (Ática,
1994), do advogado, cronista, romancista e dramaturgo Carlos Eduardo Novaes, com ilustrações do cartunista Vilmar
Rodrigues.
QUEM É CATIVO NÃO AMA
Patrão não repara a
sina
De quem vive
escravizado,
Só lhe interessa o
cuidado
De não cair na
ruína
Convive com gente
fina
Que tem talento e
tem fama
Se o empregado
reclama
Por viver do amor
ausente
Ele responde
imprudente
Quem é cativo não
ama.
Mote de um pé,
criação do grande cantador Nicandro Nunes da Costa (1829-1918).
Veja mais:
A arte
musical de Caroline Dale aqui.
A arte
de Lee Ritenour aqui.
O talento
musical de Rosana Simpsom aqui.
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