quarta-feira, julho 26, 2017

ARQUÉTIPOS DE JUNG, MOACIR SANTOS, CONTRAPONTO DE HUXLEY, JACOB DE HAAN, MAWACA, ÉRICA GARCIA, JENNY SAVILLE & MARIE JOHNSON HARRISON

OS AVÓS SÓ BOTAM A PERDER – Imagem: Art by Marie Johnson Harrison - Vivi momentos felizes de muitas aventuras na minha infância com os meus avós. O primeiro neto que apareceu no meio de uma penca de tios e tias, pronto, virava eu o xodó e o centro das atenções, manhando dengoso no meio da maior plateia, isso no de menos. Na garupa do cavalo, meu avô Arlindo me levou por vales, rios e canaviais. Quando não, por ser o administrador de engenhos de cana de açúcar do Rio Grande Norte até terras no sul de Minas Gerais, eu podia gabola beiçudo impressionar os matutos com minhas invencionices e trelas de menino tagarela, tudo abestalhado com o meu poder de inventar pinóias cada uma pior que a outra: esse menino bebeu água de chocalho. Essa e muitas outras aventuras nos engenhos só paravam de mesmo quando meu avô ia pra casa dele em Água Preta, eram dias de reinação na bodega sortida de vó Benita, coisa de levar carão o dia todo e esperar pelos acalantos e histórias de trancoso que ela mandava ver pra me amedrontar arrepiado embaixo do cobertor. Os acalantos e histórias dela era coisa de ciúmes nos cabarés, soldados que se perderam, mães que se vingaram, mortes e brigas de famílias, afora coisas do outro mundo e presepadas de espíritos zombeteiros. Quando eu não tremia de medo, morria de rir, e ela mais ainda, até se esquecia das horas contando cada coisa. Findavam as férias e eu de volta pra casa, eram os tempos de ganhador aberto: Pai Lula mesmo todo dia trazia um Mané Gostoso, uma peteca, ioiô, cavalo de pau, boneco de barro, brinquedos de plásticos, doces, biscoitos, confeitos e guloseimas regionais, afora me atiçar com piadas e adivinhações que me premiavam independente de que eu acertasse ou não. Ganhava de todo jeito. Às vezes me levava pra casa dele e lá eu virava artista de cinema com Carma que me recepcionava com o sorriso mais lindo do universo. Depois eu puxava conversa e parava todo movimento da casa, Carma atenta às minhas leseiras, me tratando como um homenzinho que mais queria aparecer que crescer. Oxe, eu ficava contando coisas engraçadas só pra ver a risada de Carma, quando não me ressentia pra ela da minha mãe que não deixava eu brincar no quintal com minha irmã nem com meus primos, me amarrava no pé da mesa, não podia botar o pé descalço no chão, nem chacoalhando na água, nem atrepar no pé de fruta, nem no muro, nem por cima do quintal do vizinho, nem comer chocolate, vixe, ela não deixa, Carma, não deixa! E Carma ria me abraçando e me oferecendo doces e bolos os tantos. O melhor de tudo de todos os meus aprontamentos com meus avós, era que quanto mais eu folgava nas peraltices, mais eles me davam corda para mandar ver nas presepadas. Pois é, os avós botam mesmo tudo a perder, como eu que sou perdido de não prestar mais. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

OS ARQUÉTIPOS E O INCONSCIENTE DE JUNG
[...] Uma existência psíquica só pode ser reconhecida pela presença de conteúdos capazes de serem conscientizados. Só podemos falar, portanto, de um inconsciente na medida em que comprovarmos os seus conteúdos. Os conteúdos do inconsciente pessoal são principalmente os complexos de tonalidade emocional, que constituem a intimidade pessoal da vida anímica. Os conteúdos do inconsciente coletivo, por outro lado, são chamados arquétipos. [...] Estou convencido de que o depauperamento crescente dos símbolos tem um sentido. O desenvolvimento dos símbolos tem uma conseqüência interior. Tudo aquilo sobre o que nada pensávamos e a que, portanto, faltava uma conexão adequada com a consciência em desenvolvimento, foi perdido. Tentar cobrir a nudez com suntuosas vestes orientais, tal como fazem os teósofos, seria cometer uma infídelidade para com a nossa história. Não caímos no estado de mendicância para depois posar como um rei indiano de teatro. Mais vale, na minha opinião, reconhecer abertamente nossa pobreza espiritual pela falta de símbolos, do que fingir possuir algo, de que decididamente não somos os herdeiros legítimos. Certamente somos os herdeiros de direito da simbólica cristã, mas de algum modo desperdiçamos essa herança. Deixamos cair em ruínas a casa construída por nosso pai, e agora tentamos invadir palácios orientais que nossos pais jamais conheceram. Aquele que perdeu os símbolos históricos e não pode contentar-se com um substitutivo, encontra-se hoje em situação difícil; diante dele o nada bocejante, do qual ele se aparta atemorizado. Pior ainda: o vácuo é preenchido com absurdas idéias político-sociais e todas elas se caracterizam por sua desolação espiritual. Mas quem não consegue conviver com esses pedantismos doutrinários vê-se forçado a recorrer seriamente à sua confiança em Deus. Embora em geral se constate que o medo é ainda mais convincente. Tal medo decerto não é injustificado, pois onde o perigo é maior, Deus parece aproximar-se. É perigoso confessar a própria pobreza espiritual, pois o pobre cobiça e quem cobiça atrai fatalidade. Um drástico provérbio suíço diz: "Por detrás de cada rico há um demônio e atrás de cada pobre, dois". Da mesma forma que os votos de pobreza material, no cristianismo, afastavam a mente dos bens do mundo, a pobreza espiritual renuncia às falsas riquezas do espírito, a fim de fugir não só dos míseros resquícios de um grande passado, a "Igreja" protestante, mas também de todas as seduções do perfume exótico, a fim de voltar a si mesma, onde à fria luz da consciência, a desolação do mundo se expande até as estrelas. Já herdamos essa pobreza de nossos pais. [...] Nosso intelecto realizou tremendas proezas enquanto desmoronava nossa morada espiritual. Estamos profundamente convencidos de que apesar dos mais modernos e potentes telescópios refletores construídos nos Estados Unidos, não descobrirem nenhum empíreo nas mais longínquas nebulosas; sabemos também que o nosso olhar errará desesperadamente através do vazio mortal dos espaços incomensuráveis. As coisas não melhoram quando a física matemática nos revela o mundo do infinitamente pequeno. Finalmente, desenterramos a sabedoria de todos os tempos e povos, descobrindo que tudo o que há de mais caro e precioso já foi dito na mais bela linguagem. Estendemos as mãos como crianças ávidas e, ao apanhá-lo, pensamos possuí-lo. [...].
Trechos extraídos da obra Os arquétipos e o inconsciente coletivo (Vozes, 2000), do psicoterapeuta suíço Carl Gustav Jung (1875-1961), trazendo fundamentações teóricas que descrevem arquétipos específicos num estudo sobre as relações deles com o processo de individualização e da psicoterapêutica. Veja mais aqui & aqui.

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CONTRAPONTO DE HUXLEY
[...] Era sempre demasiado fácil para ele dispensar os outros. Gostava muito de se fechar no fundo de seu próprio silêncio. Mas podia ter aprendido a se exteriorizar mais, se não sobreviesse aquele horrível acidente. [...] - Eu quisera que Phillip tivesse ido à guerra. Não por motivos belicosos ou patrióticos. Mas porque se me pudessem garantir que ele não morreria nem ficaria mutilado, teria sido tão bom para ele […] Podia ter-lhe quebrado a concha, podia tê-lo libertado de sua própria prisão. Liberdade sob o ponto de vista emocional, porque o seu intelecto já é bastante livre. [...] Duma maneira abstrata sabes que a música existe, e que é bela; mas não partas daí para fingir, ao escutar Mozart, que estás num arrebatamento que não sentes. Se procedes assim, transformas-te num desses esnobes musicais idiotas que se encontram na casa de Lady Edward Tantamount. Incapazes de distinguir Bach de Wagner, babando-se de êxtase quando os violinos se fazem ouvir. O mesmo se passa exatamente com Deus. O mundo está cheio de esnobes religiosos perfeitamente ridículos. Pessoas que não estão verdadeiramente vivas, que nunca praticaram um ato verdadeiramente vital, que não têm relação viva com coisa alguma; criaturas que não têm o menor conhecimento pessoal ou prático do que é Deus. Mas andam pelas igrejas, rosnam suas orações, pervertem e destroem a totalidade de sua existência sem brilho, agindo de acordo com a vontade duma abstração arbitrariamente imaginada a que resolveram dar o nome de Deus. [...] Tudo será incrível, se pudermos tirar a crosta de banalidade evidente que os nossos hábitos põem nas coisas. Todo objeto, todo acontecimento contêm em si uma infinidade de profundezas dentro de outras profundezas [...]
Trechos extraídos da obra Contraponto (Globo, 2014), do escritor inglês Aldous Huxley (1894-1963). Veja mais aqui, aqui & aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje é dia de especiais com o saudoso arranjador, maestro, compositor e multi-instrumentista Moacir Santos (1926-2006): Ouro negro & Coisas; com a multifacetada cantora, guitarrista, compositora, atriz & performer argentina Érica Garcia: Amorama & El Cerebro; do compositor holandês Jacob de Haan: Concerto d’ Amore, Ross Roy, Utopia & Pacifi Dream; e do grupo vocal e instrumental de pesquisa e recriação muscial Mawaca: Canto da Floresta & Gayatri Mantra. Para conferir é só ligar o som e curtir.

A ARTE DE JENNY SAVILLE
A arte da pintora britânica Jenny Saville. Veja mais aqui.

PATRICIA CHURCHLAND, VÉRONIQUE OVALDÉ, WIDAD BENMOUSSA & PERIFERIAS INDÍGENAS DE GIVA SILVA

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