SOLILÓQUIO - Ainda
ontem minha juventude: um menino semeava o futuro tropeçando no presente entre
estrelas, a voz contra o muro, pedras e errâncias, distâncias que trilhei sem
fim. O que ficou de quem partiu, perdas no tempo que não esqueci entre o choro a
desaguar lapsos e lembranças na solidão restante dos escombros de agora e o que
sobrou de mim. Sou rio afora por terras que deixei, mais que nunca a
perseverança como o dia teima amanhecer pelos passos da esperança na janela
insone que sou chuva torrencial na madrugada. É tudo que tenho cão sem dono e me
valho de quase não ter outra opção, enquanto há muito mais em mim do que sou e
nem sabia, só aos poucos a cada dia, ao ver-me tão patético quanto fui aprendiz
de feiticeiro, cada qual seus caminhos e utopias, nunca é tarde para ir além
dos medos e das convicções. Sei das minhas vulnerabilidades e com quantos
defeitos me refiz perdido pelas estradas da existência. Parecia saber mais que
sei e descobri a minha mentira com todas as simulações. Tive que me despir de mim
mesmo, corpalma, tudo que sou e não, ao espelho o desconhecido, aquele que
enterrei a pulso vingava impávido, o que se queria expresso restava falível destronado
no envoltório da sordidez. Aos pedaços, catei cada um como quem junta as
próprias cinzas e, na colheita, um grão de esperança. Reduzido a nada, dei fé
do infinito que emergiu das minhas entranhas desfeitas, e me descobri maior que
minhas fraquezas e infortúnios. Convalesci mãos espalmadas no horizonte e
refeito peito aberto pronto para colher os sonhos nos galhos da vida. © Luiz
Alberto Machado. Veja mais aqui.
O JULGAMENTO DE GANDHI
Gandhi
nasceu em Porbandar, noivou aos oito anos, casou-se aos doze, cursou as escolas
públicas e aos dezenove estudou Direito na Universidade de Londres. Após o jantar
quase morre: “Passei noites sem dormir;
tinha a impressão de ser um assassino”, não costumava comer carne animal. Estava em vias de conquistar riqueza e
respeitabilidade, subitamente renunciou a tudo e definiu o que defender: a
causa dos oprimidos contra a injustiça dos opressores, a causa da justiça
contra a força. O primeiro passo foi provar a ilegalidade do decreto Asiatic Exclusion Act, destinado a deter
a imigração e o despojamento de todos os direitos indianos na África do Sul. Ao
vencer a causa, abandonou a advocacia por considerá-la “uma profissão imoral”, tornando-se “um dos esbulhados”, recusado
nos hotéis, expulso dos trens, cuspido por todos. A partir de então, entrou em
greve religiosa contra toda violência: “O
soldado nunca deve temer a morte! O agressor poderá matar alguns de nós; nunca,
porém, poderá escravizar os restantes”. O seu objetivo: liquidar o inimigo
transformando-o em amigo. A princípio, nem brancos nem hindus compreendiam
aquele homem singular e seus métodos curiosos: “Servir-vos-ei como a irmãos meus; mas não me submeterei a vós na
qualidade de amos”. Muitos hindus opunham-se violentamente com irrisão: “desobediência à injustiça, coragem de morrer
sem matar”. Acreditava na vitória: “Sei
que muitas pessoas no Ocidente – e mesmo aqui no Oriente – julgam impossível
uma vitória não-violenta. Reconheço que podemos estar longe de alcançá-la; que
talvez não se verifique durante a minha existência. Podem ser necessárias
muitas gerações. Mas no fim o triunfo há de vir. Nenhum inimigo pode ser
bastante forte ou bastante feroz para resistir ao fogo do amor”. No dia 6
de abril de 1919, a primeira campanha de afetuosa desobediência, o hartal, cessão pública de trabalho em
toda a Índia e, por causa disso o governo reprimiu o movimento e mandou
prendê-lo: “De que serve agora a tua fé,
contra as balas e as bombas do inimigo?”. Respondeu: “Os estrangeiros são bem-vindos como hóspedes; como usurpadores, não os
desejamos aqui”. Então o juiz Broomsfield elogiou Gandhi e o condenou à
prisão pela ilegalidade de seu procedimento e, sobre o assunto, um aluno da
Faculdade de Direito falou: “Isto pode
ser legal, senhor, mas não é justo”. O professor reagiu com um sorriso: “Se quer justiça, moço, atravesse a rua e
entre na Escola de Teologia; aqui é a Escola de Direito”. Gandhi sabedor
das leis, também sabia o que esperar do seu julgamento: “Com os meus sofrimentos, proponho-me conquistar o mundo”.
Trechos
extraídos de Gandhi (Globo, 1979),
contando a vida do advogado e fundador do Estado moderno indiano Mohandas
Karamchand Gandhi (1869-1948).
Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
Veja
mais sobre:
Mãe é
mãe & Deus proteja a minha, a sua, a nossa & o da mãe-joana & e das
mães (do guarda, do juiz de futebol e dos políticos) que são coitadas!, Inteligência emocional de John Gottman, o teatro de Máximo Gorki, a
poesia de Jorge Tufic, a música de Caetano Veloso,
Travessuras de mãe de Denise Fraga, a arte de Luciah Lopez , a pintura de Gustav Klimt & Lena Gal aqui.
E mais:
A
literatura de Aníbal Machado, Teoria
da alienação de István Mészarós,
Semiologia da representação de André Helbo, o cinema de Roberto Rossellini & Anna Magnani, a
música de Keith Jarret, Erótica
pornográfica de J. J. Sobral, a pintura de Jean-Léon Gérome.& Almeida
Junior aqui.
Direitos
humanos fundamentais aqui.
A arte
de Dhara - Maria Alzira Barros aqui.
Exercício
de admiração de Emil Cioran. Abril
despedaçado de Ismail Kadaré, O teatro de arte de Meyerhold, Fridha Khalo, A música de Badi Assad, A pintura de Karel Appel, Carlota Joaquina & Clube
Caiubi de Compositores aqui.
Brincarte do Nitolino, Tratado lógico-filosófico de Ludwig Wittgenstein, o teatro futurista de
Filippo Marinetti, a literatura de Azar Nafisi, a música de Nelson Freire, a pintura de Eugène Delacroix, Augustine de Charcot, a
arte de SoKo, a fotografia de John De Mirjian, a cangaceira Dadá & O eco da trombeta de Maria Iraci Leal aqui.
A sina de Agar, A nascente de Ayn Rand, o teatro de Jean-Louis
Barrault, Mundos oscilantes de Adalgisa Nery, a literatura de Anita Loos, a
música de Cláudia Riccitelli & The Bossa Nova exciting Jazz Samba Rhythms, a pintura
de Jose Gutierrez de la Vega & Amor
como princípio de Delasnieve Daspet aqui.
Canto de
circo de Osman Lins, a arte de Paul
Éluard, a música de Paulo César
Pinheiro, o teatro de Adolphe Appia, a poesia de Alberto de Oliveira, o cinema
de Pedro Almodóvar & Penélope Cruz, a pintura de Francesco Hayez
& José Malhoa, A travessia
poética de Valéria Pisauro & Programa
Tataritaritatá aqui.
A dança
dos meninos, a poesia de Manuel Bandeira & João Cabral de Melo Neto, A dançarina de Yasunari Kawabata, A dança poética de Amiri
Baraka, A dançarina do Kama Sutra de Kama Sutra, de Vatsyayana,
a música de Isabel Soveral &
António Chagas Rosa, a pintura
de Jose Manuel Abraham, Pas de Deux
& a fotografia de M. Richard Kirstel, Dança Alagoas & Ary Buarque aqui.
O voo da mulher & mulheres no mundo, o teatro de Federico Garcia Lorca, Os
adoradores de cabras de Gianni
Guadalupi & Alberto Manguel,
a música de Duke Ellington, o
cinema de Lars von Trier & Nicole Kidman, a arte de Tatiana Parcero
& Caco Galhardo, Como veio a
primeira chuva & Pétalas do Silêncio de Rô Lopes aqui.
O dono
da razão, a poesia de Murilo Mendes, Identidade e etnia de Carlos Rodrigues Brandão,
Fundamentos da educação de Maria Sérgio Michaliszyn, a pintura
de Jules Pascin,
a arte de Francisco Zúñiga & a música
de Ju Martins aqui.
Não era
pra ser, nem foi, Entre a vida e a morte de Nathalie Sarraute, a música de Galina
Ustvolskaya, a fotografia de Takashi Aman, o ativismo
de Emmeline Parnkhurst, o cinema de Sarah Gravon & Carey
Mulligan, a gravura de Jean-Frédéric Maximilien de Waldeck, a arte de
Paul-Émile Chabas & Carlos
Alberto Santos aqui.
A
esperança equilibrista, O espaço da cidadania de Milton Santos, Admirável mundo novo de Aldous
Huxley, Os saberes da educação de Edgar Morin, a música de Vivaldi & Michala Petri, a fotografia de Andreas Feininger, a pintura de Gianluca Mantovani & Jose De la Barra, a arte de
Daniele Lunghin & Dave Stevens aqui.
Eita!
Vou por ali no que vem e que vai, a literatura de Ítalo Calvino, Os tempos da Praieira de Costa
Porto, a poesia de Louise Glück, Neurofilosofia & Neurociências, a
música de Edson Zampronha, Betina
Muller & Mike Edwards, a
arte de Laszlo Moholy-Nagy & Anke Catesby aqui.
O aperto
que virou vexame trágico, As estratégias sensíveis de Muniz Sodré, a
poesia de Sophia de Mello Breyner
Andresen, Tecnologias: memórias e esquecimentos de Maria Cristina Franco
Ferraz, a fotografia de Alexander Yakovlev, a arte de William Mulready & Doris Savard, a pintura de Angelo Hasse, a música de Asaph Eleutério, Ricardo Loureiro
& Rádio Estrada 55 aqui.
&
A ERA DOS EXTREMOS DE ERIC
HOBSBAWN
[...] Vivemos num mundo
conquistado, desenraizado e transformado pelo titânico processo econômico e
tecnocientífico do desenvolvimento do capitalismo, que domina os dois ou três
últimos séculos. Sabemos, ou pelo menos é razoável supor, que ele não pode
prosseguir ad infinitum. O futuro não pode ser uma continuação do passado, e há
sinais, tanto externamente quanto internamente, de que chegamos a um ponto de
crise histórica. As forças geradas pela economia tecnocientífica são agora suficientemente
grandes para destruir o meio ambiente, ou seja, as fundações materiais da vida
humana. Nosso mundo corre o risco de explosão e implosão. Tem de mudar. [...]
Se a humanidade quer ter um futuro
reconhecível, não pode ser pelo prolongamento do passado ou do presente. Se
tentarmos construir o terceiro milênio nesta base, vamos fracassar, ou seja, a
alternativa para uma mudança da sociedade é a escuridão. [...].
Trechos da obra Era dos extremos:
o breve século XX – 1914 – 1991 (Companhia das Letras, 1994), do historiador
egípcio Eric Hobsbawm (1917-2012). Veja mais aqui e aqui.
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra: arte do gravurista, ceramista, desenhista e muralista Poty Lazzarotto (1924-1998)
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.