AS
DROGAS & AS CAMPANHAS ANTIDROGAS
- Têm-se registros de que a droga apareceu na China com as plantas da alegria e
o papiro Ebers e que era usada para fins religiosos, magias e iniciações nos
mistérios culticos nas diversas culturas antigas, como a chinesa, a grega, a
egípcia, a romana e a árabe, há mais ou menos uns cinco mil anos. Também é de
muito tempo atrás o uso dela entre as primitivas comunidades indígenas, como o é
até hoje, juntamente com o uso do café, da coca e de outras substâncias por
parte de algumas populações do planeta. Um dado importante foi destacado no
século XVII, durante o combate à malária, suscitando o aparecimento do fumo do
ópio que, a partir de então, começou a ser traficado por mercadores portugueses
e ingleses, sobretudo com os registros históricos das vitórias inglesas e a
luta dos imperadores chineses contra o tráfico: não podia ser permitido na
China o que era proibido na Grã-Bretanha. O resultado a que se chegou o impasse
nessa época é o mesmo dos tempos atuais: não se podia abrir mão dos lucros da
Companhia das Índias. E assim foi. Deu-se então o surgimento da morfina em
1806, de um poderoso analgésico denominado de heroína em 1898, vindo depois os
barbitúricos, a cannabis sativa, a
cocaína – o ídolo universal, o alcalóide da felicidade -, o LSD-25, as pílulas
do amor, o crack e o ecstasy nas ultimas décadas do século XX e todo o pocesso
de drogadicção formada por opiáceos, psicoestimulantes pesados e leves,
psicodepressores, alucinógrenos, solventes e inalantes. Além do tráfico, o uso
foi disseminado por meio de prescrições médicas – que o diga Freud -, e as estratégias
militares nas guerras – vide depoimentos dos pilotos do Enola Gay, que fizeram uso delas para terem coragem de jogar a
bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki, na segunda grande guerra, ou o
documentário Viagem ao inferno a Edgewood.
A gravidade foi detectada quando apareceram os casos de dependências psíquicas
e físicas, a síndrome de abstinência, redundando no que hoje se convencionou
chamar de dependência química, que tem devassado famílias e causado grandes
problemas à saúde pública. O combate ao uso das substâncias psicoativas começou
faz tempo e até hoje está amargando um resultado de fracasso retumbante nas
suas campanhas, por conta da hipocrisia de discriminação arbitrária, da
indiferença geral, das sanções excludentes, do policonsumo e das falsas
premissas, simplistas e redutoras do pragmatismo esclarecido. Ninguem é tão
bobo o suficiente nem precisa ser tão sabido para saber que nessa bronca há
mais coisas implicadas do que possa prever nossa vã presunção. Enfrenta-se o
problema como quem, num campo de batalha, só desse conta do inimigo pelo
pelotão aparente no front,
ignorando-se que ele também tem estratégias, recursos e um grandioso arsenal
escondidíssimo. Como sempre, voltamos praquela velha questão dos chineses: quem
pode enfrentar o poder econômico e os lucros advindos do tráfico das drogas? Aí
eclodem campanhas só pra tapiar, chamando pela moralidade mais fajuta e com a
hipocrisia mais sem-vergonha de que se deve reprimir violentamente para salvar
a humanidade dessa praga. Aí se deu o impasse do discriminar e descriminar.
Discrimina-se as pesadas das leves, lícitas das ilícitas, e se esqueceram do
chocolate, do café, tabaco, álcool e medicamentos como os soníferos,
tranquilizantes, excitantes e os estupefacientes. Ou seja, repartiram o bolo e
se esqueceram do prejuízo individual, das famílias e de toda sociedade. Por
outro lado, se a ONU fosse de verdade, fecharia um pacto planetário pela
descriminação, com uma campanha maciça educativa de prevenção sob a perspectiva
da medicina e psicologia sociais no mundo todo. Aí sim, poder-se-ia augurar
êxito para enfrentar o tráfico e, ao mesmo tempo, conscientizar individual e
coletivamente os malefícios das drogas. Todavia, faz-se necessário evidenciar a
vetusta e repetida pergunta que não quer calar: quem vai abrir mão dos lucros
do tráfico das drogas? Afora isso, pelos estudos e leituras que fiz, o problema
tem que ser visualizado a partir de determinadas óticas para que não sejamos
tão canhestras quanto hipócritas. A primeira ótica necessária é de que o
problema envolve desde os danos causados ao Sistema Nervoso Central, como as
questões da tolerância, dependência e gratificação, afora o entendimento de
cada casa é um caso, não se deve generalizar. Outro ponto que merece ser levado
em conta é que a dependência química é oriunda de problemas pessoais complexos,
relacionais e psicoafetivos que levam à fuga diante do enfrentamento de
condições aversivas inexoráveis e sofrimentos ocultos causados pelo despreparo
dos pais, pela destruição das relações familiares, pelo desafeto e indiferença
nas relações comunitárias, pelo individualismo possessivo transformado no
umbigocentrismo das líquidas relações da hipermodernidade, promovendo a
banalização do catastrofismo, da espetacularização da repressão inócua e
midiática como respostas que não passam de paliativos insignificantes,
desinformação, alheamento e ineficientes ações preventivas numa sociedade que
se apresenta como da performance e da aparência, constatando os mais
desastrosos efeitos. Esse conjunto de erros só conduz a uma fonte de confusão e
equívocos. A grita pela prevenção é unânime, porém na prática só se ataca uma
das múltiplas faces do problema. É preciso educação sim, sobretudo na
orientação do uso de qualquer dessas substancias de forma abusiva e que seu uso
não resolverá os conflitos internos de ninguém, devendo ser dito ao dependente
que não basta escapar de uma realidade insuportável, criando uma distorção da
realidade. É preciso entender, reitero, que cada caso é um caso e que os pais
são os principais atores na prevenção e que esta precisa ser aplicada com
diálogo, afeto, sorriso, tolerância e confiança diante do riso desolador, e de
que se faz necessário ser amável e amar para ser amado como se deseja ser
amado. Afinal, o problema do dependente não é só ele nem só dele, tem
profundezas subterrâneas bastante complexas, que me levam até a constatação de
que a gente já nasce drogado ou com predisposição para tal, quando por conta de
qualquer mal-estar mais ou menos sério, os médicos entopem nossas mães na
gravidez, afora nos certificar do uso desde o útero de diversas drogas e de que
vivemos nos autodrogando a cada iniciativa de automedicação. É evidente que não
sou o dono da verdade, muito menos uma estudiosa autoridade sobre o caso em
tela, apenas um simples beletrista pesquisador cidadão que busca a verdade. Por
conta disso, dou minha contribuição honesta metendo o meu bedelho sobre o
assunto. E vamos aprumar a conversa & tataritaritatá! © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
Imagem:
a arte do pintor
simbolista alemão Carlos Schwabe
(1866-1926).
Curtindo
o álbum Tales from Topographic Oceans
(Atlantic Records, 1973), da banda britânica de rock progressivo Yes, formada Jon Anderson (vocal),
Chris Squire (baixo), Rick Wakeman (teclados), Steve Hove (guitarra) & Alan
White (bateria). Veja mais aqui e aqui.
PESQUISA
A droga é só um pretexto (Loyola, 2005), do médico, psiquiatra
clínico, perito de tribunais e especialista em problemas ligados à droga, Francis
Curtet.
Veja mais aqui.
EPÍGRAFE
“As drogas são uma tragédia para os
toxicômanos. Mas a criminalização de seu uso foi desastrosa para a sociedade,
para os usuários e os não-usuários. Se as drogas tivessem sido legalizadas há
dezessete anos, o crack jamais teria sido produzido – os elevados custos das
drogas ilegais fizeram da produção do crack um negócio rentável, por se tratar
de uma droga mais barata -, e hoje haveria bem menos viciados, um contingente
menor de pessoas estaria encarcerado e menos presídios teriam sido construídos”, do economista, estatístico, escritor
estadunidense, Prêmio Nobel de Economia de 1976, Milton Friedman (1912-2006).
LEITURA
On the road (Pé na estrada – Cultural, 1986),
do escritor estadunidense Jack Kerouac (1922-1969). Veja mais aqui.
PENSAMENTO DO DIA
Como
já dizia o cientista espanhol especialista em Bioética, Javier Gafo Fernández
(1936-2001), O grau de satisfação do
indíviduo depende de sua capacidade de consumo. Ou seja, a felicidade hoje
está reduzida à capacidade de consumir cada vez mais e, como nem todo mundo tem
condições de acompanhar as descartáveis e constantes novidades tecnológicas,
muito menos tem acesso a esse consumo desenfreado, sentem-se todos
profundamente insatisfeitos e frustrados. Uma bronca da porra! É como eu digo:
ou pra nossa infelicidade tudo está com preço conforme as nossas
impossibilidades de compra, ou a gente deve adotar uma conduta consumerista.
Vou na segunda.
Veja mais Antonio Carlos
Nóbrega, Darel Valença Lins Aristóteles,
John Donne, Henrik Ibsen, Marquês de
Sade, Luis Buñuel, Hieronymus Bosch & Marilene Alagia Azevedo aqui.
CRÔNICA
DE AMOR POR ELA
La Tentation de saint Antoine (desenho em
pastel, 1878), do pintor, desenhista, ilustrador e gravador belga Félicien Rops (1833-1898).
CANTARAU:
VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Recital Musical Tataritaritatá