Ao som dos álbuns
O corpo do som (2002), O seguinte é esse (2005), Corpo de som ao vivo (2010), Tum
pá (2012), Ayú (2015) e Só mais um pouquinho (2018), do grupo de percussão
corporal, Barbatuques, criado em 1995, pelo músico Fernando Barba
e formado por André Hosoi, Marcelo Pretto, André Venegas, Giba Alves, João
Simão, Lu Horta, Heloiza Ribeiro, Mairah Rocha, Maurício Maas, Renato Epstein,
Charles Raszl e Lu Cestari. O grupo propõe música a partir do batuque com o
próprio corpo, como palmas, batidas no peito, estalos com os dedos e a boca,
assobios e sapateados, resultando ritmos que vão do samba ao rap, mostrando o
resultado da coletividade e da brasilidade como tema. Veja mais aqui.
A lebre e o coelho, o amor proibido... - A vida vai, corrente de rio, onda de mar,
chuva que cai, nuvem que passa, a Terra gira e um reles sujeito, tipo Rabitt de Updike, segue sua vida vã esvaziada. Em suas andanças sem rumo conheceu
o tapiti candimba dos Karitiana, Tupi-Arikém, que trazia uma gaiola com um preá
e um porquinho-da-índia. Ali algo de interessante ocorrera. Curioso e atento
ouvia sobre o Yùtù - O Coelho de Jade da China, que vivia na Lua esmagando
ervas com seu pilão para fabricar um elixir da longa vida, enquanto acompanhava
a deusa lunar Chang'e. Ficou maravilhado ao saber de Tsukimi no Japão, que se
sacrificava queimando seu próprio corpo para alimentar qualquer um viajante esfomeado
e, em recompensa, ter sua imagem impressa na Lua. Empolgou-se com a narrativa
de Daltokki na Coreia, celebrado no Festival de Outono, Chuseok, o astuto
trapaceador que roubou o fogo do Povo do Céu, no Festival do Milho Verde, para
compartilhá-lo com sua gente hitchiti e ser celebrado entre os Hopi e o Shawnee,
pelos cerimoniais dos Kiowa – a sociedade dos Kasowe e na dança dos Oneida. Ali
mesmo presenciou a dança das máscaras cerimoniais dos Kwakwaka’wakw e dos
rituais potlatch - um rito de passagem, no qual empunhavam a pata esquerda traseira do Br’er, um trickster e totem dum clã africano, um amuleto da sorte
que curava doenças, um talismã que o hoodoo usava no espaço
com terra vinda de túmulos. Não
sabia que os astecas lançavam um coelho ao céu para encontrar a Lua. E aí teve um
estalo diante do testemunho do Popol-Vuh dos Maia-Quiché: a deusa Lua estava em
perigo, teria de ser socorrida e salva por um herói. Quem seria esse herói? Revestiu-se
duma empáfia e se fez heroico demiurgo de um ancestral mítico. Era só saltar de
um lado e outro para encontrar Menebuch dos algoquinos Ojibwa e dos sioux
Winebago – porque ele é o possuidor do segredo da vida elementar e ensina as
artes manuais para combater os monstros aquáticos das profundezas. Soube: foi
ele que, depois de um dilúvio, recriou a terra e, ao partir, deixou-a no seu
estado atual. Mesmo? E mais: É dele que receberia a graça do invisível Grande
Manitu, do Sheshajataka, de quem terá Bodhisativa no Kampuchea das chuvas
fertilizantes. Assim soube de tudo e passou a almejar a Lua para dar sentido à
sua vida. Precisava alcançá-la e, para isso, teve de cruzar as águas das feras
ululantes. Viu-se ali nu e só, seguindo pela terra de ninguém. Não havia pontes
para a travessia e estava hipnotizado com as profundezas do fosso. Sentia-se
proscrito, exaurido, se malograsse não valeria nada. E se quisesse privar da
Mulher Estrela não poderia mais voltar atrás, havia de suportar a Noite Negra
da Alma na Jornada Noturna do mar, como se estivesse na barriga duma baleia. E tudo
suportou na cidade eterna: encarou o escaravelho egípcio e a lagosta de ouro da
Costa Rica. Atravessou o inferno védico – o Reino de Yama, guardada por dois
mastins; teve de enfrentar Cérbero, o cão tricéfalo, servindo-se apenas da lira
de Orfeu. No meio do caminho uma sibila o conduziu pelo inferno até se sentir lunático
e subiu a colina, era a serra da Prata e lá, mais do que nunca, o medo de
morrer. A Lua então apareceu e se aproximou, nascia a paixão e ele enfeitiçado
pela Deusa da Noite: era o seu renascimento. Diante dela sentiu-se desolado e
ela fez-se sua estrela guia iluminando o céu. Nem mesmo o lado escuro dela não
mais o aterrorizava e ela reuniu todas as lembranças jogadas fora e todos os
sonhos esquecidos, guardando-os em sua taça de prata e, ao despontar da aurora,
foram todos devolvidos à Terra como seiva dos orvalhos que brotavam de suas
lágrimas, a nutrir e retemperar a vida no planeta e nada se perdia. Com as
memórias repostas, ele soube do seu passado ignorado. Fez-se grato pela descoberta.
Por que não estamos no paraíso? Ela então mostrou-se Luna para enlouquecer os
homens; e se fez Circe para transformá-los em porcos; e foi Medusa, para petrificá-los.
Aos seus olhos ela parecia Ártemis que aguardava o seu amigo camaleão para
seguirem as caravanas. E logo encontraram Jacklope, a cornuda, com Jackrabbit
que corria como louca. Deram notícias dos cuspes de Wolpertinger da Baviera e
trouxeram a Raurakl austríaca, a rasselbock da Turíngia, a Elwedritsche do
Palatinado e o Skvader de Sundsvall. Todas se aproximaram para o trabalho à
sombra de uma figueira, moendo ervas medicinais num almofariz. E cantavam: Vi
na Lua \ três pequenos coelhos \ que comiam ameixas \ bebendo vinho \ demais.
Depois da cantoria estavam prontas para a celebração. Eis que apareceu Nanabozho
e sua voz soou como uma maldição despótica: Lebre e coelho não são compatíveis,
distinguem-se. Todas as cabeças baixaram misantropas, um balde de água fria no
evento: estavam condenados a se amarem com os terrores abissais indestrutíveis
da tradição, a fustigar seus corpos com os rumores nefastos da execração geral.
E se sufocaram com o mormaço dançante aos voos das borboletas movendo o mundo e
as correntes dos rios lavrando a terra com a brisa dos ventos amenos. Fitaram-se
melancólicos como se indagassem um ao outro: como olvidar da atração fatal do
amor que se eternizava, ah, que revolta, e se flagelaram desconsolados, e se
revolveram inquietos, e se amarguraram da sina para, de repente, olhos fixos,
se encaram destemidos: Por que não? E se desembaraçaram da convenção, com a
cumplicidade dos amantes desgarrados e, diante de todos, ali mesmo contraíram
as núpcias no mundo do grande mistério da vida que se refaz por meio da morte:
a desobediência mútua e se viram felizes até então. Até mais ver.
Sylvia Plath: Lembre-se, lembre-se, isso é agora, e agora, e agora. Viva, sinta, apegue-se a isso. Quero me tornar profundamente consciente de tudo o que tomei como certo... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
Trudi Canavan: Não só
estou conversando comigo mesma, como agora me recuso a falar comigo mesma. Isso
deve ser o primeiro sinal de loucura... Os mortais não
precisavam de Deus para ordenar que se matassem. Eles eram perfeitamente
capazes de encontrar razões para fazê-lo eles mesmos... Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui
& aqui.
Doris Lessing: Só existe uma
maneira de ler: folhear bibliotecas e livrarias, escolhendo livros que lhe
atraem, lendo apenas aqueles, abandonando-os quando o aborrecem, pulando as
partes que o arrastam — e nunca, nunca lendo nada porque você sente que deve,
ou porque faz parte de uma tendência ou movimento. Lembre-se de que o livro que
o aborrece aos vinte ou trinta anos lhe abrirá portas aos quarenta ou cinquenta
— e vice-versa. Não leia um livro fora do seu tempo... Veja mais aqui,
aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
NOVEMBER WITHOUT WATER
Imagem: Acervo ArtLAM.
Olha-me p’ra
estas crianças de vidro \ cheias de água até às lágrimas \ enchendo a cidade de
estilhaços \ procurando a vida \ nos caixotes do lixo. \ Olha-me estas crianças
\ transporte \ animais de carga sobre os dias \ percorrendo a cidade até os
bordos \ carregam a morte sobre os ombros \ despejam-se sobre o espaço \ enchendo
a cidade de estilhaços. \ Chegas \ eu digo sede as mãos \ fico \ bebendo do ar
que respirar \ a brevidade \ assim as águas \ a espera \ o cansaço.
Poema da poeta, antropóloga
e historiadora angolana Ana Paula Ribeiro Tavares, autora das obras: Ritos
de Passagem (1985), O Sangue da Buganvília (1998), O Lago da Lua
(1999), Dizes-me coisas amargas como os frutos (2001), A cabeça de
Salomé (2004), Os olhos do homem que chorava no rio (2005) e Manual
para amantes desesperados (2007). Veja mais aqui, aqui & aqui.
A ILHA DAS ÁRVORES DESAPARECIDAS – [...] Porque na vida real, ao contrário dos livros de
história, as histórias não chegam até nós na íntegra, mas em pedaços, segmentos
quebrados e ecos parciais, uma frase completa aqui, um fragmento ali, uma pista
escondida no meio. Na vida, ao contrário dos livros, temos que tecer nossas
histórias com fios tão finos quanto as veias finas que correm pelas asas de uma
borboleta. [...] é isso que as migrações e as mudanças de residência fazem
conosco: quando você deixa sua casa para terras desconhecidas, você não
continua simplesmente como antes; uma parte de você morre por dentro para que
outra parte possa começar tudo de novo. [...] Vocês não compartilham uma
língua, você pensa, e então percebe que o luto é uma língua. Nós nos
entendemos, pessoas com passados conturbados. [...] Algum dia essa dor
será útil para você. [...] Cartografia é outro nome para histórias
contadas por vencedores. Para histórias contadas por aqueles que perderam, não
existe. [...] Gostaria de ter dito a ele que a solidão é uma invenção
humana. As árvores nunca estão solitárias. Os humanos acham que sabem com
certeza onde termina o ser e começa o do outro. Com suas raízes emaranhadas e
presas no subsolo, ligadas a fungos e bactérias, as árvores não abrigam tais
ilusões. Para nós, tudo está interligado. [...] As pessoas presumem que
a diferença entre otimistas e pessimistas é uma questão de personalidade. Mas
eu acredito que tudo se resume à incapacidade de esquecer. Quanto maior a sua
capacidade de retenção, menores as suas chances de ser otimista. [...] O
amor é a afirmação ousada da esperança. Você não abraça a esperança quando a
morte e a destruição estão no comando. Você não veste seu melhor vestido e
coloca uma flor no cabelo quando está cercado por ruínas e cacos. Você não
perde o coração em um momento em que os corações deveriam permanecer selados,
especialmente para aqueles que não são da sua religião, não são da sua língua,
não são do seu sangue. Você não se apaixona em Chipre no verão de 1974. Nem
aqui, nem agora. E, no entanto, lá estavam eles, os dois. [...]. Trechos
extraídos da obra The Island of Missing Trees (Bloomsbury Publishing, 2021), da escritora turca Elif Shafak,
autora de obras como Honor (2011), The Bastard of Istanbul (2005),
The Forty Rules of Love (2000) e The Gaze (2000). Veja mais aqui,
aqui & aqui.
SEM AS MULHERES OS OBJETIVOS GLOBAIS NÃO VERÃO A LUZ DO DIA – [...] Os
dados comprovam que mulheres e meninas são realmente a chave para que essa
agenda se concretize [...] Se falamos de ação contra as mudanças
climáticas, a solução mais econômica e prática para as mudanças climáticas é a
combinação da educação das meninas com os direitos reprodutivos das mulheres.
[...] Temos de perceber que existe um recurso inexplorado e que a única
forma de o podermos realmente aproveitar é através da educação e do
empoderamento económico. […]
Muitas vezes instrumentalizamos as mulheres [...] Raramente
empoderamos e permitimos que as mulheres sejam capazes de arquitetar seus
próprios projetos. E a única maneira de realmente fazer isso é por meio do
empoderamento econômico, porque sabemos que, quando as mulheres são
economicamente empoderadas, elas reinvestem 90% em suas comunidades. E a grande
maioria desses 90% vai para saúde e educação, então estamos transformando
completamente esse cenário para as gerações futuras. [...] Sem mulheres e meninas,
essa agenda não verá a luz do dia – nem um pouco. [...]. Trecho de uma entrevista (SDGLive/ United Nations, 2025) concedida pela escritora e médica líbia-canadense Alaa Murabit, co-fundadora do The Omnis Institute, fundadora
da The Voice of Libyan Women, co-autora da antologia Feministas não usam rosa
(e outras mentiras) e autora de diversos artigos publicados no The Boston Globe, Wired, Carter Center,
NewAmerica, Chime for Change, Huffington Post, The Christian Science Monitor e
Impakter, contemplada com a Meritorious Service Cross.
A ARTE DE CLARICE
FALCÃO
Nasci no Recife,
com 4 anos vim pra São Paulo. Quando eu tinha 5 anos fomos pro Rio, aí fiquei.
Minha mãe era muito paranoica, quer dizer, ela era ótima, mas era meio nervosa
com tudo. Isso tem muito a ver com a história dela. Quando eu saía ela fica apreensiva,
superpreocupada. Tinha um certo cuidado extremo. Mas ao mesmo tempo eu era
muito livre para fazer minhas escolhas. Ela nunca olhou um boletim na vida, não
sei se ela sabe como é um boletim... Nasci em uma família em que, se você não brincasse ou entrasse na
onda, era engolido... Acho que cantar precisa de um pouco mais de tato,
você se equilibra um pouco mais. Atuar é texto e fazer bem; música é atuar,
interpretar, fazer bem, ter uma conexão com a plateia, as letras da música, as
notas, o tempo. E ainda tem a banda que está junto. Mas adoro fazer os dois, e
os dois dão o mesmo tipo de nervoso antes de entrar no palco - além da mesma
dinâmica de você entrar mais nervoso do que sai... Ainda fico muito
nervosa, mas é uma sensação nova e muito boa... Gosto muito de estar no
palco, mas acho que é bom ficar nervosa, quando parar de ter frio na barriga
vai ser meio chato...
Palavras da premiada cantora, atriz, compositora, humorista, roteirista e diretora Clarice Falcão (Clarice Franco de Abreu Falcão), que participou de diversos filmes como atriz, entre eles, Fica Comigo Esta Noite (2006), Primeiro Dia de um Ano Qualquer (2012), Eu não Faço a Menor Ideia do que Eu tô Fazendo Com a Minha Vida (2013), Desculpe o Transtorno (2016) e Música para Morrer de Amor (2020). Como diretora, produtora e roteirista trabalhou nos filmes O Segundo Minuto (2006), Dois Menos Dois (2006), Laços (2007) e Chamada em Espera (2008). Atuou também como atriz no Teatro, bem como como roteirista, em espetáculos como Confissões de Adolescente (2009), Inbox (2011) e Especial de Ano Todo (2017). Gravou os álbuns musicais de estúdio Monomania (2013), Problema meu (2016), Tem conserto (2019) e Truque (2023). Veja mais aqui, aqui & aqui.
ITINERARTE –
COLETIVO ARTEVISTA MULTIDESBRAVADOR:
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