Ao som dos álbuns O convertido (2013) e Mensageiro (2014), do compositor, instrumentista, arranjador e violeiro, Adelmo Arcoverde, autor do livro Viola do Nordeste – Método de Viola (Nova Presença, 2022).
TRÍPTICO DQP:
- A casa dela... - Ali não
havia quintal, apenas os olhos vivos de Copacabana repletos de esperança e alguns temores com os ruídos e a dispersão
do tempo, desencontros e incompreensões. Às vezes, na casa dela, seus olhos brilhavam
assustados na encruzilhada fortuita como se estivessem submersos pelas sombras da Inés de Goya, diante dos fantasmas misóginos que povoavam os
arredores para captura das Filhas da Dor.
Eram abantesmas que diziam aos seus passos: Ôpa, volta... E ela não, levada pela
Carolina Maria de Jesus: Anda, anda... faz de conta que está
sonhando. E seguia Sol a pino, com suas
intensas inquietações na contundência de dizer não, porque não era Efeito Mandela: tudo acontecia na esquina – a mão
atrevida do algoz, as vestes aos farrapos, a marca do estupro, o desdém da
hipocrisia, a dor de nunca esquecer. E tinha de sair de casa para constatar o
que dizia a jornalista/blogueira cubana Yoani
Sánchez: Fomos
para as ruas porque tínhamos fome, é certo. Tínhamos tanta fome que comemos o
medo. A liberdade é contagiosa, sempre se quer mais. Era assim
que podia sorrir: olhos pedintes, a volúpia na carne, a entrega da alma. Na moradia
do passado, portadentro, ela exorcizava seus
medos e se desnudava impune para valer a vida: meu sexo nela.
As aldravias
de Xexéu... - Na manhã ensolarada Janilson era mais que imponente porque Rute era mais que poeta radiante: os
dois brilhavam no palco na maior festa. Na entrada eu conversava com Durán e Tony Antunes sobre o volume da publicação de Dom Acácio,
arremedando hestórias de ontem quase esquecidas na memória. O povo xexeuense
foi chegando engalanado e logo os acordes da Banda Ipiranga saudavam a todos com a abertura ao som da Aquarela de
Ari Barroso, seguida de um Pot-pourri do inesquecível Gonzagão. Para os presentes começou a festa: gente
chamada para compor a mesa das autoridades, a ciranda da meninada do Maria das Mercês, as aldravias do casal Donadon
com as Confidência do itabirano do Drummond:
Itabira é apenas
uma fotografia na parede. Mas como dói!..., os livros infantis da Eliane Santos e a conversa animada sobre As Lendas
do Piauí, com a radialista/jornalistescritora Arleni Portelada, também retratadas pelo Mestre Portelada: ... me deparei com muitas estórias compartilhadas
por toda a região do Nordeste. E falou do Cabeça de Cuia: No caso do Crispim há o castigo da
metamorfose do ser errante e sem paz, como mensagem. Conversa animada, tudo
corria como o desejado pelo poetamigo Marcos Xhêpa. E seguiu-se até ao meio dia quando desci a ladeira para o almoço na
companhia da Maria Joyce. Singramos a
cidade, percorremos ruas e a feira já quase desfeita, saboreamos suas canções
com uma cerveja gelada até o finalzinho da tarde para constatar, no meio de uma
rompante crepuscular: canto e sou xexéu!
A poesia em
queda livre... - Na ruina das
certezas todas as dúvidas, graças. Afinal estou vivo e já sei: toda beira do abismo é redonda, assim o infinito é
pequeno (porque, como diz o poeta, a criação do homem derrota Deus). Pois é,
foi Vital Corrêa de Araújo que deu
as caras e sacou: Todo ápice cambaleia! E com uma meia declaração sincera: a
eternidade é inútil! Havia nos olhos dele os tendões do amanhã: quem não vacila
diante do aparato de possibilidades, se nada mais intransponível entre palavras
perdidas, o confessional e a crua meditação, o dom noturno e a aura da
desilusão, as estrelas descalças da calçada pelo chão da manhã, situações nuas
e o rio lento e voraz do tempo, todas as náuseas e vergastas, haja paradoxo. Disse-me
mais: É preciso conjulgar tudo com nada: a liberação total da força expressão. Evidente
alguém ouvir isso e se achar como se numa desconfortável assistência a um
concerto, digamos, de música atonal ou dodecafônica; ou de uma exposição de
pintura abstrata, ou mesmo de uma sessão com cenas delirantes de um teatro ou
filme de vanguarda. E ainda por cima ouvir Cocteau:
A poesia é indispensável. Se eu ao menos
soubesse para quê... Serviria de consolo saber de Ionesco: Creio que se tinha
esquecido, nestes últimos tempos, o que é teatro. E eu fui o primeiro a
esquecê-lo; penso tê-lo novamente descoberto, para mim, passo a passo, e eu
acabo de descrever simplesmente a minha experiência... Favorecendo a
digestão, talvez, melhor Sábato: Se é absurdo, no entanto, é eficaz; se
contraditório, é poderoso, porque substitui as palavras e expressões
desgastadas que, psicologicamente, são inoperantes, por novas combinações que
atraem pelo inesperado. Sabe de uma coisa? O melhor é que de tudo que sabia até agora, muito
ainda por aprender. Ponto final, até mais ver.
A
alfabetização está tão entrelaçada em nossas vidas que muitas vezes deixamos de
perceber que o ato de ler é um milagre que está acontecendo nas nossas mãos. O
que lemos, como lemos e por que lemos mudam a maneira como pensamos.
Pensamento da professora estadunidense Maryanne Wolf. Veja mais Educação &
Livroterapia aqui e aqui.