PERPETUUM MOBILE – Ainda tarda de ontens o que me asfixia agora
de manhã, apesar de mudar como mudas plantadas: o que habita em mim o vento
açoita flores e folhas. A hora passa e os que atravessam não vivem, só olhadas
pelos anúncios do rádio e da tevê nos luminosos multiplicados, comida rápida ao
relógio, coisas do interesse e desperdício. Quantos se perdem na correria das
desocupadas cabeças ocas desorientadas, ah, meu Deus, pelas ruas indecifráveis que
desconheço, esquecidas pelos néscios que possuem ali seus endereços e não
moram, só zombam dos defeitos alheios e os seus nem dão conta, entediados e mantidos
pela estupidez. Todos me são como atletas vigorosos, acrobatas do mundo que se
esquecem, tolos pelos ares com suas boas razões duvidáveis e mil maneiras
diferentes ou mais etiquetas, só passam às cambalhotas com roupas tão iguais, provas
cabais do decisivo por intemperança, tudo tão igual e isso não é vida. Para mim
quanta mentira e equivoco, quanta coisa fora de lugar no teatro alvoroçado das
bocas tagarelas, tudo é muito cinza no abuso das cores por dentro e fora, o
castigo invisível. E ademais tudo se perde para sempre e me desarrumo entre o
que apouca e o abundante. Como é pequeno o que se vê no meio de tão grandiosa
expectativa: só cacos e frestas, nenhuma vogal solidária, nenhum verbo de amor.
Cada qual seu desencanto com a cloaca da humanidade, as roupas na mala, o corpo
desnudo, nem sei mais onde moro ou morro, nem sinto fome, ao menos desengasgado
pelo anverso das coisas e pressinto entre a sede e o gole, versiprosa
cotidiária de quem se perdeu na frase, trovador suicida, fabricando sílabas e
ritmos para emprestar ao mundo o sentimento que morreu: a indignação. Ah, não,
não era isso que eu queria dizer, meu pentimento. Queria mesmo era falar da
tristeza dos citros e o declínio rápido da planta, como meu coração diante de
tudo isso, mais pertinente ao ato de escrever: o que viu e viveu, desesperando
na palavra, doendo no verso e não dissesse para ninguém o que resta de poeta,
crescendo em silêncio. Ninguém tem mesmo nada a ver com isso. Uma vida apenas,
nada mais. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja
mais aqui.
DITOS & DESDITOS:
Era no tempo do prato quente e gorduroso,
suculento e salgado, muito salgado, fumegante e apimentando. Porque também era
assim o centro do Recife, de muito sol e frevo. [...] Mas não acabou. Felizmente não acabou. O “era”
fica por conta da mudança dos tempos – verbal e físico. Portanto, era no tempo
em que o centro da cidade existia com toda a graça e movimentação. [...] Basta pedir e será logo atendido. Lembrando-se
sempre da figurona de Ascenso Ferreira, o grande poeta, que depois de duas
feijoadas, cantava grave e grosso: “Pernas pro ar que ninguém é de ferro”.
Trecho
da crônica Uma cidade feliz. E gorda
(FCCR, 2010), do premiado escritor, crítico, editor e jornalista pernambucano Raimundo
Carrero. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
A ARTE
DE MABELLE BATISTA
Arte da
artista visual e consultora de RH, Mabelle
Marie Batista, integrante da Rede de Hortas
do Bem Comum e Felicidade Comunitária e edita o blog Atelier Azul & Rosa. Veja mais aqui e aqui.
A MÚSICA DE LIGIA AMADO
A música da premiada maestrina e engenheira Ligia
Amado, atual regente-titular da Orquestra Sinfônica da Universidade de São
Paulo (OSUSP) e da Orquestra Sinfônica da Universidade Nacional de Cuyo
(Argentina). Ela atuou como produtora e apresentadora do programa Música e
Literatura, da Rádio MEC-RJ. Veja mais aqui e aqui
A OBRA DE MARGUERITE YOURCENAR
Ninguém ainda sabe se tudo apenas vive para
morrer ou se morre para renascer.