segunda-feira, junho 03, 2019

MARGUERITE YOURCENAR, RAIMUNDO CARRERO, LIGIA AMADO, MABELLE BATISTA & PERPETUUM MOBILE


PERPETUUM MOBILE – Ainda tarda de ontens o que me asfixia agora de manhã, apesar de mudar como mudas plantadas: o que habita em mim o vento açoita flores e folhas. A hora passa e os que atravessam não vivem, só olhadas pelos anúncios do rádio e da tevê nos luminosos multiplicados, comida rápida ao relógio, coisas do interesse e desperdício. Quantos se perdem na correria das desocupadas cabeças ocas desorientadas, ah, meu Deus, pelas ruas indecifráveis que desconheço, esquecidas pelos néscios que possuem ali seus endereços e não moram, só zombam dos defeitos alheios e os seus nem dão conta, entediados e mantidos pela estupidez. Todos me são como atletas vigorosos, acrobatas do mundo que se esquecem, tolos pelos ares com suas boas razões duvidáveis e mil maneiras diferentes ou mais etiquetas, só passam às cambalhotas com roupas tão iguais, provas cabais do decisivo por intemperança, tudo tão igual e isso não é vida. Para mim quanta mentira e equivoco, quanta coisa fora de lugar no teatro alvoroçado das bocas tagarelas, tudo é muito cinza no abuso das cores por dentro e fora, o castigo invisível. E ademais tudo se perde para sempre e me desarrumo entre o que apouca e o abundante. Como é pequeno o que se vê no meio de tão grandiosa expectativa: só cacos e frestas, nenhuma vogal solidária, nenhum verbo de amor. Cada qual seu desencanto com a cloaca da humanidade, as roupas na mala, o corpo desnudo, nem sei mais onde moro ou morro, nem sinto fome, ao menos desengasgado pelo anverso das coisas e pressinto entre a sede e o gole, versiprosa cotidiária de quem se perdeu na frase, trovador suicida, fabricando sílabas e ritmos para emprestar ao mundo o sentimento que morreu: a indignação. Ah, não, não era isso que eu queria dizer, meu pentimento. Queria mesmo era falar da tristeza dos citros e o declínio rápido da planta, como meu coração diante de tudo isso, mais pertinente ao ato de escrever: o que viu e viveu, desesperando na palavra, doendo no verso e não dissesse para ninguém o que resta de poeta, crescendo em silêncio. Ninguém tem mesmo nada a ver com isso. Uma vida apenas, nada mais. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

DITOS & DESDITOS:
Era no tempo do prato quente e gorduroso, suculento e salgado, muito salgado, fumegante e apimentando. Porque também era assim o centro do Recife, de muito sol e frevo. [...] Mas não acabou. Felizmente não acabou. O “era” fica por conta da mudança dos tempos – verbal e físico. Portanto, era no tempo em que o centro da cidade existia com toda a graça e movimentação. [...] Basta pedir e será logo atendido. Lembrando-se sempre da figurona de Ascenso Ferreira, o grande poeta, que depois de duas feijoadas, cantava grave e grosso: “Pernas pro ar que ninguém é de ferro”.
Trecho da crônica Uma cidade feliz. E gorda (FCCR, 2010), do premiado escritor, crítico, editor e jornalista pernambucano Raimundo Carrero. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

A ARTE DE MABELLE BATISTA
Arte da artista visual e consultora de RH, Mabelle Marie Batista, integrante da Rede de Hortas do Bem Comum e Felicidade Comunitária e edita o blog Atelier Azul & Rosa. Veja mais aqui e aqui.

A MÚSICA DE LIGIA AMADO
A música da premiada maestrina e engenheira Ligia Amado, atual regente-titular da Orquestra Sinfônica da Universidade de São Paulo (OSUSP) e da Orquestra Sinfônica da Universidade Nacional de Cuyo (Argentina). Ela atuou como produtora e apresentadora do programa Música e Literatura, da Rádio MEC-RJ. Veja mais aqui e aqui

A OBRA DE MARGUERITE YOURCENAR
Ninguém ainda sabe se tudo apenas vive para morrer ou se morre para renascer.
A obra da escritora francesa Marguerite Yourcenar (1903-1987) aqui, aqui & aqui.


PATRICIA CHURCHLAND, VÉRONIQUE OVALDÉ, WIDAD BENMOUSSA & PERIFERIAS INDÍGENAS DE GIVA SILVA

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