PAPAI
NOEL FOI PRESO!!!!!!!!!!!!!!
Desde
tenra idade que Doro guardava consigo uma das mais fortes imagens de toda sua
existência: os festejos natalinos. Como sempre fora desprovido de qualquer
possibilidade para participar dos eventos de fim de ano, claro, o pai era um
broco das costas ocas que só se ocupava em ganhar dinheiro para assar e comer;
a mãe, coitada, dividida entre a fileirinha dos quinze filhos e a igreja,
pudera, sobrava neres de nada mesmo para o Doro alimentar suas fantasias
infantis. Mesmo assim, ainda hoje sonha com Papai Noel, banquete de natal,
reunião de família às vésperas do dia da religiosidade cristã, essas baboseiras
todas ditas por ele mesmo.
Certo
dia, porém, Doro invocou-se, resolveu ele mesmo fazer o seu próprio natal pela
primeira vez na vida. Encarou a mulher, nossa, como sempre incrédula; os
filhos, meia dúzia de bruguelinhos com os olhos bem abertos para a banda dele;
e, ao lado, sempre broncas e broncas e mais tivesse no mundo de estrupício
estaria ali, nas cercanias de sua inditosa existência.
Pois
foi com esse panorama que ele franziu o cenho, coçou o cavanhaque, apertou o
nariz, pigarreou e uma luzinha de eureka brilhou das catracas do seu quengo.
- Mulé,
vou fazê o nosso natá!
- Lá
vem ess´ome cum invenção de novo!
-
Verdade, vou fazê pela premêra veizi a filicidade da gente e dum bucado de
criança no mundo!
- Ih!
Tem coisa!
E tinha
mesmo. Toda razão do mundo para Marcialita que já desconfiava do salseiro que
seria toda aquela invencionice do sujeito.
Dinheiro
que era bom, nada. E agora? Como fazer? Doro não se apertava nunca mediante
qualquer que fosse a adversidade e colocava suas doidices com bastante – e bote
muito além do bastante nisso, demais até – criatividade.
Primeiro,
passou uns dias só trancado, fazendo um cosimento nuns trapos e retalhos que
recolhia por todo canto onde passasse, só na concentração dos intentos.
Nem
vou falar, vocês já adivinham, né?
Já
tratavam o desmiolado por gari de tanta coisa imprestável que arregimentava,
tudo um verdadeiro lixo, mesmo.
Depois
se apossou dumas ferragens velhas, misturando um resto de velocípede aposentado
armado em cima de uns pedaços duma bicicleta destroçada, tudo num trabalho de
soldador engenhoso, resultando num bregueço lá que num tinha quem adivinhasse. Parecia
mais que o cara estava fazendo um excelente trabalho de funilaria, preparando
no meio das tranqueiras, alguma coisa por serventia. E parece que vai servir
mesmo, ninguém sabe ainda.
Imaginem
mesmo o rebuliço.
Quando
o mondrongo do negócio estava pronto, ele começou a pintar dando uma cara
multicolorida para o invento.
Com a
pintura pronta daquilo, se armou de cordas, barbantes e cabos de aço não se
sabendo ao certo para quê, só se sabia mesmo das marteladas, suadas,
enganchadas e presepadas noite adentro para concluir algo longe de se imaginar
o que pudesse ser.
Os
vizinhos reclamavam que não podiam dormir com a barulheira dele, sendo interpelado
diversas vezes pelos educados soldados da patrulha militar local. Com isso foi
persuadido a respeitar o silêncio alheio, senão seria trancafiado em nome da
paz pública.
Assim
foi mais jeitoso até quando deu por pronto, escondeu o que fazia de todo mundo
e saiu recolhendo os guenzos vira-latas mais maltratados que encontrava na
redondeza. Uns oito pulguentos estropiados que levou tudo para a sua
residência. Um escarcéu!
- Ô,
homi, bota essis viralata para fora! -, reclamava Marcialita.
-
Calma, muié, vancê vai gostá.
-
Isso num é cachoro, homi, é uma fábrica de carrapato, quero isso não aqui!
-
Calma, muié, cum certeza vancê vai gostá.
E
nesse chove num molha, Marcialita matou uns três de chutes, sem contar mais uns
cinco que morreram de fome, tendo Doro de arregimentar mais cachorros para o
seu intento, mesmo sob os reclamos mais retumbantes da vizinhança que não aguentava
mais. E, dessa vez, trouxe uns quinze, quase de matar a mulher do coração e de
impaciência os irascíveis sofredores das imediações.
- Prá
quê tanto cachorro, hem? Num basta tu aqui im casa?
-
Calma, muié, calma.
Marcialita
abufelou-se e amarrou os filhos no cós da saia, zarpando para longe dali.
Aí
Doro trabalhou em paz e deixava estampada aquela cara de satisfação, só
entristecida com as intervenções das autoridades policiais que agora estavam
curiosas para saber no que aquilo ia dar por fim.
Livre
da forma como ficou, Doro apoderou-se das outras dependências da casa,
principalmente a cozinha onde ele começou a fazer uns cozimentos com açúcar e
outros ingredientes peguentos no maior meladeiro.
Não deu
outra! Uma explosão do botijão de gás! Ele coçou o quengo e constatou suas
limitações com o trato de fogo e fogão naquelas horas. Ôxe, um desmantelo
mesmo.
Pacientemente,
depois da explosão e do entra e sai de gente até de um olho só para testemunhar
o sucedido, ele removeu o resto das coisas que ainda julgava por comestíveis e
que estavam apregadas nos mais diversos recantos das paredes, provando do
resultado o que parecia até gostoso, vez que ele mesmo saboreava com certo
deleite, quando não fazia uma careta inchada depois.
Uns
dias mais, Doro se acorda feliz!
- É
hoje!
Era
24 de dezembro de um ano lá pra trás.
Ele
começou seu expediente derrubando um pedaço do muro do quintal e escondendo
tudo com uma lona plástica preta para que ninguém visse o que estava fazendo.
Findada
a destruição, escondeu-se dentro do quartinho e só se via o zoadeiro dele
remanejando coisas daquele local pro quintal.
Nem
se comesse bosta de cigano da muita dava para se adivinhar o que ele se
propunha a fazer. Mas tome teitei.
Passou
toda manhã, transcorreu toda tarde e quando anoiteceu, Doro estava todo
aprontado com a cara de toda satisfação da vida.
Às
vinte horas em ponto, Doro arrebenta a lona do muro do quintal e sai berrando:
-
Jingle bell! É Natal! Hô hô hô!!!!
Quando
vi o estardalhaço, nossa! Fui o primeiro contemplado com a surpresa. Diga-se: a
coisa mais tresloucada que já vira na vida. Um monstro! Aquilo nunca fora papai
Noel, parecia mais assombração de esquálido e feioso ser dos quintos dos
infernos. Eu só identifiquei o Doro pela fala e pela maneirice de seus jeitos.
Imaginem
uma coisa estupidamente extravagante e duplicadamente horrorosa! Imaginaram?
Multipliquem por mil e ainda será pouco para dar uma ideia rala da estripulia
dele.
Pois
bem, ele fez um ar de riso para mim, meteu a mão no saco e entregou-me um
pacote dizendo que tinha um panetone dentro. Na verdade, era um cuscuz com meio
mundo de coisa que nem tive coragem e muito menos atrevimento nem de cheirar
quanto mais de digerir.
Aos
pulos e aos gritos Doro chamava as crianças do lado e danou-se a entregar um
nego-bom que ele mesmo fizera para a alegria delas. Alegria, agora; depois vocês
vão ver a desgraça.
Quando
fez as entregas ali, deu umas palavras de ordem de comandante daquela doidice e
partiu com seu hô hô hô.
A
catrevagem toda resultou num trenó; as renas, os guenzos; a vestimenta, uma
tristeza de dar dó; os presentes, nego-bom e outras guloseimas enjoativas. E o
barulho, ensurdecedor. Lá vai aquela desgraça rua afora se passando por papai
Noel.
Resultado:
dois problemas gravíssimos! Saúde e segurança públicas. Cadeia.
Até
então ele não havia inaugurado os serviços cinco estrelas duma delegacia. E
ainda insistia que era o papai Noel. Pode?
Acusação:
a primeira, por causa da assombração. Todo mundo se cagou de medo,
principalmente as criancinhas. Num ficou um pé de gente na rua por onde ele
passou.
A
segunda: caganeira. Os bruguelos que comeram o nego-bom que ele distribuiu,
estavam todos hospitalizados com uma diarreia braba, morre mais num morre. Uma
correria dos diabos. Verdadeiro infanticídio em massa.
Mediante
esse rebuceteio todo, tive que intervir em seu favor.
De
cara o delegado ameaçou que não haveria na face da terra advogado capaz de
retirar o sujeito daquelas ferrenhas grades. Deu trabalho. Não era só o
delegado, a população toda duvidava quem tivesse o desplante de requisitar
alvará de soltura para ser tão perigoso que se tornara o inimigo público número
1 daquele lugar.
Deu
trabalho, mas deu mesmo!
Por
sorte, as criancinhas depois de quinze dias de medicadas, se salvaram daquele
troço todo. Sorte das grandes. Apenas se intoxicaram em demasia. Ainda bem.
Consegui
que fosse relaxada a prisão dele e quando instei sobre o ocorrido, ele com a
maior cara lisa, ainda balbuciou:
-
Hem, hem, as criancinha nem pudero vê papai Noé direito.
É
mole? Tava ele já enganchado numa beldade todo libidinoso parecendo mais que nada tinha acontecido. Pode? Bié, bié, glup, glup!! © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo, aqui e aqui.
DITOS & DESDITOS – Ser humano significa
jogar toda a sua vida na escala do destino quando necessário, alegrando-se o
tempo todo em todos os dias ensolarados e em todas as nuvens bonitas. No meio das trevas, sorrio à vida, como se
conhecesse a fórmula mágica que transforma o mal e a tristeza em claridade e em
felicidade. Então, procuro uma razão para esta alegria, não a acho e não posso
deixar de rir de mim mesma. Creio que a própria vida é o único segredo. Não
estamos perdidos. Pelo contrário, venceremos se não tivermos desaprendido a
aprender. Quem não se movimenta, não sente as correntes que o prendem. A
Liberdade é quase sempre, exclusivamente a liberdade de quem pensa diferente de
nós. Pensamento da filósofa
e economista polaco-germana, Rosa Luxemburg (1871-1919). Veja mais aqui
e aqui.
ALGUÉM FALOU: A
felicidade é uma obra-prima: o menor erro falseia-a, a menor hesitação
altera-a, a menor falta de delicadeza desfeia-a, a menor palermice embrutece-a.
A felicidade é provavelmente uma infelicidade que se suporta melhor. O nosso
verdadeiro lugar de nascimento é aquele em que lançamos pela primeira vez um
olhar de inteligência sobre nós próprios. O nosso maior erro consiste em
tentarmos colher de cada pessoa em particular as virtudes que elas não têm, e
de nos esquecermos de cultivar as que de fato são suas. Cada vez que sofremos,
somos levados a acreditar que a dor presente é a dor maior. Creio que quase
sempre é preciso um golpe de loucura para se construir um destino. Somos mais
clarividentes no escuro, porque nele nossos olhos não nos podem enganar. Não é
difícil alimentar pensamentos admiráveis quando as estrelas estão presentes. A
sabedoria é a forma mais dura e mais condensada do ardor, a parcela de ouro
nascida do fogo e não da cinza. A história só se interessa pelos privilegiados. Pensamento
da escritora francesa Marguerite
Yourcenar (1903-1987). Veja aqui e aqui.
HUMANIDADE
– [...] Evolução bem gradual, passo
a passo, avançando e, finalmente, alcançando. Primeiramente eu disciplino,
controlo, uso de esforço e quando consigo mais capacidade, mais energia, mais
força, abandono tudo e sigo em frente.[...] Trecho da obra A humanidade pode mudar? (Nova Era, 2007), do filósofo, escritor e
educador indiano Jiddu Krishnamurti (1895-1986). Veja mais aqui e aqui.
POVO BRASILEIRO – [...] Não
há, nunca houve, aqui um povo livre, regendo seu destino na busca de sua
própria prosperidade. O que houve e o que há é uma massa de trabalhadores
explorada, humilhada e ofendida por uma minoria dominante, espantosamente
eficaz na formulação e manutenção de um próprio projeto de prosperidade, sempre
pronta a esmagar qualquer ameaça de reforma da ordem social vigente. [...] Trechos
extraídos da obra O povo brasileiro: a
formação e o sentido do Brasil (Companhia das Letras, 1995). do antropólogo
e escritor Darcy Ribeiro (1922-1997). Veja mais aqui e aqui.
LOGOSOFIA – [...] A
Logosofia é, justamente, a especialidade científica e metodológica que se ocupa
da reativação consciente do indivíduo. [...] O homem
jamais se arrependerá de haver proporcionado a seu espírito todo elemento de
juízo requerido pelo desenvolvimento pleno de suas aptidões e pelo exercício
sem limitações de sua inteligência. [...] A Logosofia prefere manter
intacto o livre arbítrio, porque é bem sabido que cada qual há de responder
sempre com firmeza aos ditados de sua consciência.[...].Trechos extraídos da obra Logosofia, Ciência e Método (Logosófica,
2012), do escritor, pedagogo e pensador humanista argentino Carlos Bernardo González Pecotche (1901-1963)–
o Raumsol. Veja mais aqui e aqui.
A TARDE
– [...] Então era assim que eu era e não
havia ninguém para me mudar, porque o tempo passou e eu envelheci e os dias se
passaram e se tornaram datas e os anos se tornaram efemérides e eu continuei
assim, ficando com as noites, colocando-as em um copo com gelo ou em um
negativo ou na memória. [...] Trecho extraído da obra José Olympio, 2009), do escritor cubano Guilhermo Cabrera Infante (1929-2005).
Veja mais aqui.
AOS AMIGOS: Amo
devagar os amigos que são tristes com cinco dedos de cada lado. / Os amigos que
enlouquecem e estão sentados, fechando os olhos, / com os livros atrás a arder
para toda a eternidade. / Não os chamo, e eles voltam-se profundamente / dentro
do fogo. / -Temos um talento doloroso e obscuro. / construímos um lugar de
silêncio. / De paixão. Poema do poeta português Herberto Helder
de Oliveira (1930-2015). Veja mais aqui.
Veja
mais sobre:
Aprendendo
com a lição do Natal aqui.
E mais:
Renascendo
das cinzas na véspera de natal, Goethe, Federico Fellini, Zygmunt Bauman, Harvey Spencer Lewis, Ana Maria Machado, Olivia
Byington, Yuri Krotov, Nikolaj Wilhelm Marstrand, Da Priapeia, Clara Redig & Maria Eduarda Rodrigues aqui.
Crônica
natalina, John
Keats, Lampedusa, Gregório
de Matos Guerra, Betinho, Chet Baker, Paulo Cesar Sandler, Franco
Zeffirelli, Willy Kessels, Hans
Makart & Teatro Renascentista aqui.
O
banquete natalino de Beliato aqui.
Papai
Noel amolestado aqui.
Quando o
Brasil dá uma demonstração de que deve mesmo ser levado a sério aqui.
A croniqueta de antemão aqui.
Todo dia é dia da mulher aqui.
Palestras: Psicologia, Direito & Educação aqui.
Livros Infantis do Nitolino aqui.
&
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra:
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.