UM POEMA PARA
EMMY – À memória da matemática alemã Amalie
Emmy Noether (1882-1935) – A menina da Fracônia nascia na família judia
da bávara Erlangen. A sua mãe era filha de um grande comerciante e herdou do
pai descendente de uma família de mercadores de lã, o gosto pela matemática,
embora tenha planejado inicialmente ensinar inglês e francês depois dos exames.
Era míope, gostava de dançar e apesar de esperta e muito inteligente não se
destacou academicamente. Adorava resolver quebra-cabeças, aprendendo piano
enquanto realizava seus afazeres de cozinhar e limpar. Ao invés, mudou de
planos e estudou matemática onde o pai lecionava e fez seu doutoramento para
trabalhar no Instituto sem remuneração. E isto por sete anos seguidos, porque
as mulheres eram excluídas dos cargos acadêmicos. Apesar dos obstáculos ela se
graduou e escreveu sua tese Em Sistemas Completos de Invariantes para Formas
Biquadráticas Ternárias, em 1907. Depois disso foi convidada para o centro
de pesquisa de outra universidade de renome mundial, no qual passou quatro anos
lecionando sob o nome de homem – no caso Hilbert. Passou a primeira grande
guerra, publicou sua Teoria dos Ideais em Anéis e tendo sua habilitação
aprovada permaneceu no departamento por mais de doze anos, ensinando aos
meninos de Noether: suas ideias formaram a base para a Moderne Algebre,
publicada em 1932. Depois de trabalhar com Pavel Alexandrov, em Moscou, foi
despejada da pensão e considerada uma judia com tendências marxistas. Dos três irmãos
restou apenas um que também fez grandes feitos acadêmicos na matemática
aplicada. Com o governo nazista instalado no seu país, teve seu cargo revogado
e migrou pros Estados Unidos. Mas Princeton era uma universidade de homem,
mulheres não eram bem-vindas. Além do mais, médicos descobriram um tumor na sua
pélvis. Morreu jovem, aos 53 anos, vítima das consequências de uma cirurgia de
cisto ovariano. Ela nunca foi eleita para a Academia de Ciências de Göttingen
nem promovida ao cargo de professora catedrática. O teorema por ela criado
explicou a conexão fundamental entre a simetria na física e as leis de
conservação, uma entre as suas contribuições de fundamental importância aos
campos da física teórica e da álgebra abstrata, considerada por Albert
Einstein, David Hilbert e Hermann Weyl, entre outros, como aquela que foi a
mais importante na história da matemática, por revolucionar as teorias sobre
anéis, corpos e álgebra. Na verdade, ela mudou a cara da álgebra com a sua
Teoria: os objetos da cadeia ascendente são nomeados Noetherian. Veja mais aqui
e aqui.
DITOS &
DESDITOS - Um escritor no terceiro mundo pode ser considerado todas as bocas
daqueles que são silenciados. Ele é, também, um olho para a miríade de olhos
que são incapazes de distinguir por si mesmos. Ele é um guardião da dignidade
deles. Pensamento do
escritor e cineasta senegalês Ousmane Sembène (1923-2007). Veja mais
aqui e aqui.
ALGUÉM FALOU: Uma sociedade justa oferece
igualdade de oportunidades a todos. Mas não pode prometer e não deve tentar impor a mesmice. Esse
é o paradoxo corrosivo da postura misândrica do feminismo de gênero: nenhum
grupo de mulheres pode fazer guerra aos homens sem, ao mesmo tempo, denegrir as
mulheres que respeitam esses homens. Pensamento da escritora e filósofa estadunidense Christina Hoff Sommers, autora de obras como
Who Stole Feminism?: How Women
Have Betrayed Women (Simon & Schuster, 1995) e The War Against Boys ( Simon & Schuster,
2015). Veja mais aqui.
EMBURRECIMENTO
PROGRAMADO – […] Há trinta anos,
não tendo nada melhor para fazer, eu experimentei dar aulas. A licença que eu
tenho certifica que eu sou um instrutor da língua inglesa e literatura inglesa,
mas isso não é o que eu faço de forma alguma. Eu não ensino inglês; eu ensino
escola — e eu ganho prêmios fazendo isso. Ensinar significa diferentes coisas
em diferentes lugares, mas sete lições são universalmente ensinadas do Harlem a
Hollywood Hills. Elas constituem o currículo nacional pelo qual vocês pagam de
mais maneiras do que imaginam, então por que não saber de quê se trata. Vocês
têm a liberdade, é claro, de considerarem estas lições da maneira que quiserem,
mas acreditem em mim quando eu digo que não tenho intenção nenhuma de ser
irônico nesta apresentação. Estas são as coisas que eu ensino; estas são as
coisas que vocês me pagam para ensinar. Entendam como quiserem. 1 CONFUSÃO: Uma
moça chamada Kathy escreveu isto para mim de Dubois, Indiana, há um tempo
atrás: "Quais grandes idéias são importantes para criancinhas? Bem, a
maior ideia que eu acho que elas precisam é que o que elas estão aprendendo não
é idiossincrático — que há algum sistema nisso tudo e ele não está simplesmente
chovendo sobre elas enquanto elas não podem fazer nada senão absorver. Essa é a
tarefa, entender, tornar coerente." Kathy não entendeu direito. A primeira lição que eu ensino é confusão.
Tudo que eu ensino está fora de contexto. Eu ensino a não-relação de
tudo. Eu ensino desconexões. Eu ensino demais: a órbita dos planetas, a lei dos
grandes números, escravidão, adjetivos, desenho arquitetônico, dança, ginásio,
canto coral, assembleias, convidados-surpresa, treinos de incêndio, linguagens
de computador, noite dos pais, dias de desenvolvimento de corpo docente,
atividades extraclasse, aconselhamento com estranhos que meus alunos podem
nunca mais ver, testes padronizados, segregação etária como nada que se vê no
mundo exterior... O que é que essas coisas têm a ver uma com a outra? Mesmo nas
melhores escolas, um exame atento do currículo e suas sequências demonstra uma
falta de coerência, uma série de contradições internas. Felizmente as crianças
não têm palavras para definir o pânico e raiva que elas sentem com as constantes violações da ordem natural e
sequência que lhes são vendidas como qualidade em educação. A lógica da
mente-escolar é a de que é melhor deixar a escola com um conjunto de jargões
superficiais derivados da Economia, Sociologia, Ciência Natural, e assim por
diante do que com um entusiasmo genuíno. Mas qualidade em educação implica
aprender a fundo sobre algo. A confusão é empurrada sobre as crianças por
adultos estranhos demais, cada um trabalhando sozinho com apenas o mais fino
relacionamento um com o outro, fingindo, na maior parte, terem uma mestria que
eles não possuem. Significado, e não fatos desconexos, é o que seres humanos
sãos buscam, e educação é um conjunto de códigos para transformar dados brutos
em significado. A antiquíssima busca humana por significado fica bem escondida
por detrás da manta de retalhos das sequências escolares e da obsessão escolar
por fatos e teorias. Isto é mais difícil de se ver na escola elementar, onde a
hierarquia da experiência escolar parece fazer mais sentido porque apenas se
supõe que o relacionamento simples e bem-humorado de "vamos fazer
isso" e "vamos fazer aquilo" faz algum sentido, e a clientela
ainda não discerniu conscientemente quão pouca substância existe por trás da
brincadeira e do faz-de-conta. Pense nas grandes sequências naturais — como
aprender a andar e aprender a falar; a progressão da luz do nascer ao pôr do
sol; os procedimentos antigos de um fazendeiro, um ferreiro, ou um sapateiro;
ou a preparação de uma festa de fim-de-ano. Todas as partes estão em perfeita
harmonia umas com as outras, cada ação justificando a si mesma e iluminando o
passado e o futuro. Sequências escolares não são assim, nem dentro de uma só
aula e nem entre o menu total de aulas diárias. Sequências escolares são
malucas. Não há razão em particular para nenhuma delas, nada que suporte um
exame minucioso. Poucos professores ousariam ensinar as ferramentas com as
quais os dogmas de uma escola ou um professor possam ser criticados, uma vez
que tudo deve ser aceito. Matérias escolares são aprendidas, se elas podem ser aprendidas, do modo como
crianças aprendem catecismo ou memorizam os Trinta e nove Artigos do
Anglicanismo. Eu ensino a des-relação de tudo, uma infinita fragmentação, o
oposto de coesão; o que eu faço está mais relacionado a programação televisiva
que a criar um esquema de ordem. Em um mundo onde o lar é apenas um fantasma
porque ambos os pais trabalham, ou por causa de muitas mudanças de endereço ou
de emprego ou ambição demais, ou porque alguma outra coisa deixou todos
confusos demais para manterem uma relação familiar, eu ensino aos estudantes
como aceitarem a confusão como seu destino. Esta é a primeira lição que eu
ensino. 2 POSIÇÃO NA CLASSE - A
segunda lição que eu ensino é posição na classe. Eu ensino que
estudantes devem ficar na classe a qual eles pertencem. Eu não sei quem decide
que minhas crianças devem ficar lá, mas isso não é da minha conta. As crianças
são numeradas para que se alguma escapar elas possam ser devolvidas à classe
correta. Com o passar dos anos a variedade de maneiras em que crianças são
numeradas aumentou dramaticamente, até ficar difícil ver os seres humanos
plenamente sob o peso dos números que eles carregam. Numerar as crianças é um
empreendimento grande e muito lucrativo, embora o objetivo desta estratégia
seja elusivo. Eu nem sei por que pais e mães permitiriam, sem lutar, que isto
fosse feito a suas crianças. De qualquer forma, não é da minha conta. Meu
trabalho é fazê-las gostarem de estar presas junto com crianças que carregam
números como os seus. Ou pelo menos aguentarem com esportiva. Se eu fizer bem o
meu trabalho, as crianças não conseguem nem se imaginar em outro lugar porque eu lhes mostrei como invejar e
temer as classes melhores e como ter desprezo pelas classes burras. Sob esta
eficiente disciplina a classe na maior parte policia a si mesma e se põe em boa
ordem de marcha. Essa é a real lição de qualquer competição fraudada como a
escola. Você vem para saber o seu lugar. Apesar do diagrama geral de classes
que determina que noventa e nove por cento das crianças estão em suas classes
para ficar, eu entretanto faço um esforço público para estimular as crianças a
níveis maiores de sucesso nos testes, insinuando uma eventual transferência das
classes mais baixas como recompensa. Eu frequentemente insinuo que chegará o
dia em que um empregador os contratará com base nas pontuações em testes e
notas, embora minha própria experiência seja de que empregadores são
acertadamente indiferentes a tais coisas. Eu nunca minto inteiramente, mas eu
percebi que verdade e ensino escolar são, no fundo, incompatíveis, tal como
Sócrates disse há milhares de anos. A lição de classes numeradas é que todo
mundo tem um lugar adequado na pirâmide e que não há escapatória da sua classe senão
por mágica numérica. Falhando isso, você deve permanecer onde está. 3
INDIFERENÇA - A terceira lição que eu
ensino é indiferença. Eu ensino as crianças a não se importarem demais
com nada, embora elas queiram dar a aparência de se importar. Como eu faço isso
é muito sutil. Eu faço isso exigindo que elas se tornem completamente
envolvidas em minhas lições, pulando pra cima e pra baixo em suas carteiras de
tanta empolgação, competindo vigorosamente uns com os outros pelo meu
favoritismo. É comovente quando elas fazem isso; impressiona a todo mundo, até
a mim. Quando eu estou no meu melhor eu planejo as lições muito cuidadosamente
para poder produzir esse show de entusiasmo. Mas quando o sino toca eu insisto
que eles larguem o que quer que seja que estamos fazendo e prossigam
rapidamente para a próxima estação de trabalho. Eles devem ligar e desligar
como um interruptor de luz. Nada importante é jamais finalizado na minha classe
ou em qualquer classe que eu conheça. Estudantes nunca têm uma experiência completa
exceto o plano de mensalidade. De fato, a lição dos sinos é que nenhum trabalho
merece ser terminado, então por que se importar muito profundamente sobre
qualquer coisa? Anos de sinos irão condicionar todos senão os mais fortes a um
mundo que não pode mais oferecer trabalho importante para se fazer. Sinos são a
lógica secreta do tempo escolar; sua lógica é inexorável. Sinos destroem o
passado e o futuro, tornando todo intervalo igual a qualquer outro, assim como
a abstração de um mapa torna todas as montanhas e rios vivos iguais, mesmo que
não o sejam. Sinos inoculam cada atividade com indiferença. 4 DEPENDÊNCIA
EMOCIONAL - A quarta lição que eu
ensino é dependência emocional. Por meio de estrelas e marcas vermelhas,
sorrisos e caras feias, prêmios, honras e desgraças, eu ensino as crianças a
renderem seu livre-arbítrio à cadeia de comando predestinada. Direitos podem
ser cedidos ou retidos por uma autoridade sem direito a apelação, porque
direitos não existem dentro de uma escola – nem o direito de liberdade de
expressão, como a Suprema Corte decidiu – a menos que as autoridades escolares
digam que existem. Como um professor escolar, eu intervenho em muitas decisões
pessoais, emitindo um passe para aqueles que eu considero legítimos e iniciando
confronto disciplinar por comportamento que ameace meu controle. A
individualidade está constantemente tentando se afirmar entre crianças e
adolescentes, então meus julgamentos vêm aos montes e rápido. Individualidade é
uma contradição da teoria de classe, uma maldição para todo sistema de
classificação. Aqui estão algumas maneiras comuns em que a individualidade
aparece: crianças saem sorrateiramente para um momento privado no banheiro sob
o pretexto de necessidades fisiológicas, ou elas roubam um instante privado no
corredor alegando precisar de água. Eu sei que elas não precisam, mas eu
permito-lhes que me "enganem" porque isso as condiciona a depender
dos meus favores. Às vezes o livre-arbítrio aparece bem na minha frente em
grupinhos de crianças com raiva, deprimidas, ou felizes sobre coisas fora do
meu alcance; direitos em tais questões não podem ser reconhecidos por
professores escolares, apenas privilégios que podem ser retidos, reféns do bom
comportamento. 5 DEPENDÊNCIA INTELECTUAL - A quinta lição que eu ensino é dependência intelectual. Bons
estudantes aguardam que um professor lhes diga o que fazer. Esta é a mais
importante lição de todas elas: nós devemos esperar que outras pessoas, mais
bem-treinadas que nós mesmos, dêem sentido às nossas vidas. O expert toma todas
as decisões importantes; apenas eu, o professor, pode determinar o que minhas
crianças devem estudar, ou melhor, apenas as pessoas que me pagam podem tomar
essas decisões, que então eu faço cumprir. Se me disserem que evolução é um
fato e não uma teoria, eu transmito isso como ordenado, punindo rebeldes que
resistem àquilo que me mandaram lhes mandarem pensar. Este poder de controlar o
que as crianças vão pensar, me permite separar estudantes de sucesso das falhas
muito facilmente. Estudantes de sucesso
pensam aquilo que eu lhes designo com um mínimo de resistência e uma
demonstração satisfatória de entusiasmo. Das milhões de coisas válidas para se
estudar, eu decido para quais poucas nós temos tempo. Se bem que, na verdade,
isso é decidido pelos meus empregadores desconhecidos. As escolhas são deles –
por que eu deveria discutir? Curiosidade não tem lugar importante no meu
trabalho, somente conformidade. Crianças más
lutam contra isso, claro, apesar de lhes faltarem os conceitos para saberem
contra o quê estão lutando, esforçando-se para tomarem decisões por si próprias
sobre o que aprenderão e quando o aprenderão. Como nós podemos permitir isso e
sobrevivermos como professores escolares? Felizmente existem procedimentos
comprovados para quebrar a força-de-vontade daqueles que resistem; é mais
difícil, naturalmente, se as crianças têm pais respeitáveis que vêm em seu
auxílio, mas isso acontece cada vez menos apesar da má reputação das escolas.
Nenhum pai ou mãe de classe média que eu já conheci na vida realmente acha que
a escola dos filhos deles é uma
das ruins. Nenhum pai ou mãe sequer em muitos anos de ensino. Isso é incrível,
e provavelmente o melhor testemunho do que acontece com as famílias quando os
próprios pai e mãe foram bem-ensinados na escola, aprendendo as sete lições. Boas
pessoas esperam que um expert lhes diga o que fazer. Não é nenhum exagero dizer
que toda a nossa economia depende de que esta lição seja aprendida. Pense no
que poderia colapsar se as crianças não fossem treinadas para serem
dependentes: os serviços sociais mal poderiam sobreviver – eles desapareceriam,
eu penso, junto com o recente limbo histórico do qual se ergueram. Conselheiros
e terapeutas observariam com horror o desaparecimento da sua fonte de inválidos
psíquicos. Entretenimento comercial de todos os tipos, incluindo televisão,
iria enfraquecer-se à medida que as pessoas aprendessem novamente como criar
sua própria diversão. Restaurantes, a indústria de alimentos preparados, e toda
uma série de outros diversos serviços alimentícios seriam dramaticamente
reduzidos se as pessoas retornassem a fazerem suas próprias refeições em vez de
dependerem de estranhos para plantar, colher, cortar e cozinhar para eles.
Muito do direito moderno, medicina e engenharia também iriam embora, bem como o
ramo de vestuário e ensino escolar, a menos que se garantisse que continuasse a
brotarem pessoas indefesas de nossas escolas a cada ano. Não se apresse demais
para votar por uma reforma escolar radical se você quer continuar ganhando um
salário. Nós construímos um modo de vida que depende de que as pessoas façam
aquilo que lhes mandam porque elas não sabem como dizerem a si mesmas o que fazer. É uma das
maiores lições que eu ensino. 6 AUTO-ESTIMA PROVISÓRIA - A sexta lição que eu ensino é autoestima
provisória. Se você já tentou forçar uma criança a entrar na linha cujos
pais a convenceram a acreditar que ela será amada apesar de qualquer coisa,
você sabe o quanto é impossível fazer espíritos autoconfiantes se conformarem.
Nosso mundo não sobreviveria a uma avalanche de pessoas confiantes por muito
tempo, então eu ensino que o auto-respeito de uma criança deve depender da
opinião de um expert. Minhas crianças são constantemente avaliadas e julgadas. Um
relatório mensal, impressionante em sua disposição, é enviado à casa do
estudante para obter aprovação ou marcar exatamente, com a precisão de um ponto
percentual, o quanto os pais deveriam estar insatisfeitos com a criança. A
ecologia da "boa" escolarização depende de perpetuar a insatisfação,
tal como a economia comercial depende do mesmo fertilizante. Embora algumas
pessoas possam ficar surpresas com quão pouco tempo ou reflexão vai na
confecção desses registros matemáticos, o peso cumulativo desses documentos
aparentemente objetivos estabelece um perfil que compele as crianças a chegarem
a certas decisões sobre si mesmas e seus futuros com base no julgamento casual
de estranhos. Auto-avaliação, o cerne de todo grande sistema filosófico que já
apareceu no planeta, nunca é considerada como um fator. A lição dos boletins,
notas e testes é que crianças não devem confiar em si mesmas ou em seus pais,
mas devem em vez disso depender da avaliação de oficiais certificados. As
pessoas precisam que lhes digam o que elas valem. 7 NINGUÉM PODE SE ESCONDER - A sétima lição que eu ensino é que ninguém
pode se esconder. Eu ensino aos estudantes que eles estão sempre sendo
observados, que cada um está sob constante fiscalização minha e de meus
colegas. Não há espaços privados para crianças; não há tempo privado. A mudança
de classes dura exatamente trezentos segundos para manter fraternização
promíscua em níveis baixos. Estudantes são encorajados a tagarelar e bisbilhotar
uns aos outros ou até a delatarem seus próprios pais. É claro, eu encorajo pais
a enviarem relatórios sobre a desobediência de seus próprios filhos também. Uma
família treinada para dedurar a si própria não é propensa a guardar quaisquer
segredos perigosos. Eu passo aos estudantes um tipo de escolarização estendida
chamada "lição-de-casa", para que o efeito da fiscalização, se não a
fiscalização em si, viaje para dentro dos próprios lares, onde estudantes
poderiam de outra forma usar o tempo livre para aprenderem algo não-autorizado
de um pai ou uma mãe, por pesquisa, ou tornarem-se aprendizes de alguma pessoa
sábia na vizinhança. A deslealdade à ideia da escolaridade é um demônio sempre
pronto a achar trabalho para mãos ociosas. O significado da fiscalização
constante e negação de privacidade é que não se pode confiar em ninguém, que
privacidade não é legítima. Fiscalização é um imperativo antigo, esposado por
certos pensadores influentes, uma prescrição central estabelecida em A
República, A Cidade de Deus, As Institutas da Religião Cristã, Nova Atlantis,
Leviatã e uma série de outros lugares. Todos os homens sem filhos que
escreveram estes livros descobriram a mesma coisa: crianças devem ser
observadas de perto se você quer manter uma sociedade sob forte controle
central. Crianças seguirão um baterista privado se você não conseguir
coloca-las em uma banda de marcha uniformizada. II - O grande triunfo da
escolarização governamental compulsória e monopólica de massa é que mesmo entre
os melhores de meus colegas professores, e entre até os melhores dos pais de
meus estudantes, apenas um pequeno número consegue imaginar um jeito diferente
de fazer as coisas. "As crianças têm que saber ler e escrever, não
têm?" "Elas têm que saber como somar e subtrair, não têm?"
"Elas têm que aprender a seguir ordens se elas esperam ter um
emprego." Há apenas algumas gerações as coisas eram muito diferentes nos
Estados Unidos. Originalidade e variedade eram moeda comum; nossa ausência de
arregimentação nos tornou o milagre do mundo; barreiras de classe social eram
relativamente fáceis de cruzar; nossos cidadãos eram maravilhosamente
confiantes, inventivos, e capazes de fazer muito por si mesmos
independentemente, e de pensar por si mesmos. Nós éramos algo especial, nós americanos,
totalmente por conta própria, sem governo metendo seu nariz e medindo cada
aspecto de nossas vidas, sem instituições e agências sociais nos dizendo como
pensar e sentir. Nós éramos algo especial, como indivíduos, como americanos. Mas
nós tivemos uma sociedade essencialmente sob controle central nos Estados
Unidos desde logo após a Guerra Civil, e uma sociedade assim requer
escolarização compulsória — escolarização governamental monopólica — para se
manter. Antes deste desenvolvimento, escolarização não era muito importante em
lugar algum. Nós a tínhamos, mas não demais, e apenas o quanto o indivíduo
queria. As pessoas aprendiam a ler, escrever, e fazer aritmética muito bem de
qualquer forma; há alguns estudos que sugerem que a alfabetização na época da
Revolução Americana, pelo menos para não-escravos no litoral leste, era perto
de total. Senso Comum, de Thomas Paine, vendeu 600.000 cópias para uma
população de 3.000.000 dos quais vinte por cento eram escravos e cinquenta por
cento eram serventes não-assalariados. Os Colonos eram gênios? Não, a verdade é
que ler, escrever, e aritmética levam apenas cerca de cem horas para transmitir
desde que a plateia esteja ávida e disposta a aprender. O truque é esperar até
alguém perguntar e então ser rápido enquanto o interesse dura. Milhões de
pessoas ensinam a si mesmas estas coisas — realmente não é muito difícil. Pegue
um livro didático de quinta série de matemática ou de retórica de 1850 e você
verá que os textos eram na época de um nível que hoje seria considerado
universitário. O contínuo apelo pela prática de “competências básicas” é uma
cortina de fumaça por atrás da qual escolas se apropriam do tempo das crianças
por doze anos e as ensinam as sete lições que eu acabei de descrever para
vocês. A sociedade que tem caído cada vez mais sob controle central desde logo
antes da Guerra Civil se mostra nas vidas que levamos, as roupas que vestimos,
a comida que comemos, e os sinais verdes de autoestrada pelos quais passamos de
costa a costa, tudo dos quais são os produtos deste controle. São também, eu
penso, a epidemia de drogas, suicídio, divórcio, violência, e crueldade, bem
como a solidificação de classe para casta nos Estados Unidos, produtos da
desumanização de nossas vidas, da diminuição da importância do indivíduo, da
família e da comunidade — uma diminuição que procede de controle central.
Inevitavelmente, grandes instituições compulsórias querem mais e mais, até que
não haja mais para dar. A escola tira nossas crianças de qualquer possibilidade
de um papel ativo na vida comunitária — de fato, ela destrói comunidades
relegando o treinamento de crianças às mãos de experts certificados — e ao
fazê-lo ela garante que nossas crianças não podem crescer completamente
humanas. Aristóteles ensinava que sem um papel completamente ativo na vida
comunitária ninguém poderia esperar se tornar um ser humano saudável.
Certamente ele estava correto. Olhe em volta de você da próxima vez que você
estiver perto de uma escola ou uma casa de repouso para idosos se você deseja uma
demonstração. Escola, da maneira como foi construída, é um sistema de suporte
essencial para um modelo de engenharia social que condena a maior parte das
pessoas a serem pedras subordinadas em uma pirâmide que se estreita ao ascender
a um terminal de controle. Escola é um artifício que faz tal ordem social
piramidal parecer inevitável, apesar de tal premissa ser uma traição
fundamental da Revolução Americana. Desde os dias coloniais passando pelo
período da República nós não tínhamos escolas — leia a Autobiografia de
Benjamin Franklin para um exemplo de um homem que não tinha tempo para
desperdiçar na escola — e no entanto a promessa de democracia estava começando
a ser realizada. Nós demos as nossas costas a essa promessa ao trazer à vida o
antigo sonho faraônico do Egito: subordinação compulsória para todos. Esse foi
o segredo que Platão relutantemente transmitiu em A República quando Glauco e
Adimanto extorquem de Sócrates o plano para o total controle estatal da vida
humana, um plano necessário para manter uma sociedade na qual algumas pessoas
tomam mais do que lhes pertence. “Eu mostrarei a vocês,” diz Sócrates, “como
criar tal cidade febril, mas vocês não irão gostar do que eu irei dizer.” E
assim o modelo da escola das sete lições foi esboçado pela primeira vez. O
atual debate sobre se devemos ou não ter um currículo nacional é fabricado. Nós
já temos um currículo nacional inserido nas sete lições que eu acabei de
delinear. Tal currículo produz paralisia física, moral, e intelectual, e nenhum
currículo de conteúdo será suficiente para reverter seus efeitos hediondos.
Aquilo que atualmente se discute em nossa histeria nacional sobre queda de
desempenho acadêmico não é a questão. Escolas ensinam exatamente o que elas
foram feitas para ensinar e elas o fazem bem: como ser um bom egípcio e
permanecer no seu lugar na pirâmide. [...]. Trechos extraídos da obra Dumbing Us Down: The Hidden Curriculum of Compulsory Schooling (New Society Publishers, 2002), do escritor e professor
estadunidense John Taylor Gatto (1935-2018), que em outra obra, Eu desisto, eu acho (1991), assinala que:
Não existe uma maneira certa de ser
educado; há tantas maneiras quanto há impressões digitais. Não precisamos de
professores certificados pelo estado para fazer a educação acontecer – isso
provavelmente garante que não acontecerá.
O INCONSCIENTE ESTÉTICO – [...]
Para mim, estética não designa a ciência
ou a disciplina que se ocupa da arte. Estética designa um modo de pensamento
que se desenvolve sobre as coisas da arte e que procura dizer em que elas
consistem enquanto coisas do pensamento. De modo mais fundamental, trata-se de
um regime histórico específico de pensamento da arte, de uma ideia do pensamento
segundo a qual as coisas da arte são coisas de pensamento. […]. Trecho
extraido da obra Inconsciente estético
(34, 2009), do filósofo e professor francês Jacques Rancière. Veja mais
aqui e aqui.
TRÊS POEMAS – 1 - Um tipo diferente de nascimento te
empurrou para longe saindo daqui a casca volumosa do corpo. Você tem a
sonolência da neve um silêncio que semeou como uma cidade de vaga-lumes em um
campo preto. Aqui somos floresta, você e eu sozinho, não somos árvores não
somos arbustos, não os pássaros, nem nós as pegadas dos animais mas os espaços
entre as árvores, os pássaros, as pegadas dos animais: Liga para mim. Nós éramos irmãs e agora
refreando meu coração em aperto apertado, com qualquer nome enfim, me ligue. 2
- Me chame das sombras altas me chame de comandante intimamente, me chame para
fora dessas leis graves, das âncoras na corrente sem corredeiras, de opiniões
razoáveis. Me chame como uma criatura assustada folha de grama na respiração
tensa das florestas da cidade das casas empilhadas no sono dos carros
abandonados nas ruas como os esqueletos de dinossauros tristes. Sussurre para
mim isso em casa agora é hora de acender as luzes deixe-me sentir o cheiro de
pão e jasmim, então rasgue, suavemente, do meu bom burro o que resta de mim.
Nossa mãe tão delicadamente feroz. 3 - Eu acredito no perfume de jasmim que
sobe para o segundo andar e me lembra. eu acredito nas folhas da árvore do pagode que estão
prestes a chegar minha mão na janela e que à noite eu conheço fique de guarda
para mim. Eu acredito no choque repentino que nos leva no segredo das ações e
nos prepara para corar e para remediar. Eu acredito nas árvores estéreis que se
inscrevem no céu, nos versos que desaceleram ao sono dos pássaros. Eu acredito
em linhas e precário atos de equilíbrio, ao ar livre emoções, testadas por
nevascas quebrado por vezes de dureza e abandono. Eu acredito quando você me
ouve agachado em torno do futuro como um grão de arroz e quando você fala sem
qualquer intenção. Eu acredito nas vírgulas, em pontos e no branco que cria
silêncio e entrega a seguinte palavra. Eu acredito em parar agora com os braços
abertos, minúsculo na paisagem de nossa complexidade. Poemas da poeta italiana Chandra Livia Candiani. Veja mais aqui.