DITOS & DESDITOS - Não devemos ceder a
visões desfavoráveis da humanidade, pois
fazendo isso, fazemos os homens
maus acreditarem que eles não são piores que os outros, e ensinamos aos bons
que eles são bons em vão. A solidão é a sala de audiência de Deus. Pensador do escritor britânico Walter
Savage Landor (1775-1864).
ALGUÉM FALOU: A biblioteca não é apenas um lugar, mas também uma
instituição. Sua função não é outra senão a de um projeto utópico de fazer
coexistir, no mesmo espaço, todos os momentos do saber humano, o traço de seu
pensamento nas suas formas mais variadas e plurais. Pensamento do filósofo espanhol Francisco
Jarauta. Veja mais aqui e aqui.
O MITO DA DEMOCRACIA DIGITAL – [...] Os impactos políticos da Internet têm sido
frequentemente avaliados por meio de lentes providas
por democratas deliberacionistas. A esperança tem sido que a Internet iria expandir a
esfera pública, ampliando tanto o alcance de ideias discutidas quanto o
número de cidadãos cuja participação é permitida [...] A abertura da Internet permitiria aos cidadãos competir com
jornalistas pela criação e disseminação de informações políticas [...] ao considerar discurso político online,
devemos ter em vista a diferença entre falar e ser ouvido [...] Do ponto de vista da política de massa,
preocupamo-nos mais não com quem posta, mas com quem é lido — e há
várias barreiras formais e informais que obstam a capacidade de cidadãos
comuns atingirem uma audiência. A maior parte do conteúdo online não
recebe links,
não atrai olhares e tem mínima relevância política. Reiteradamente, este
estudo encontra poderosas hierarquias moldando um
meio que continua a
ser celebrado por sua abertura. Essa
hierarquia é estrutural, tecida nos hyperlinks que
compõem a Internet; é econômica, sob domínio de corporações como Google, Yahoo!
E Microsoft; e é social, no pequeno grupo de profissionais homens
brancos, altamente instruídos que são vastamente super-representados nas
opiniões online. [...].
Trechos extraídos da obra The Myth Of Digital Democracy
(Princeton, 2009), do professor e pesquisador estadunidense Matthew Hindman,
defendendo que a Internet
está apenas
reforça as vozes da elite política ao invés de abrir o
processo político para uma diversidade maior de vozes,
ao advogar que vivemos em
um "Googlearchy" governado por motores
de busca que concentram a atenção em apenas um punhado de sites "winner-take-all", sites “vencedores
que levam tudo”, ao considerar que se trata de um mito a ideia de que a
Internet pode abrir espaço para as pessoas comuns se tornarem
participantes mais ativas nos processos políticos.
O COMPLEXO DE PORTNOY - [...] Ela
estava tão profundamente entranhada em minha consciência que, no primeiro ano
na escola, eu tinha a impressão de que todas as professoras eram minha mãe
disfarçada. Assim que tocava o sinal ao fim das aulas, eu voltava correndo para
casa, na esperança de chegar ao apartamento em que morávamos antes que ela
tivesse tempo de se transformar. Invariavelmente ela já estava na cozinha
quando eu chegava, preparando leite com biscoitos para mim. No entanto, em vez
de me livrar dessas ilusões, essa proeza só fazia crescer minha admiração pelos
poderes dela. Além do mais, era sempre um alívio não surpreendê-la entre uma e
outra transformação - muito embora eu jamais deixasse de tentar; eu sabia que
meu pai e minha irmã nem faziam ideia da natureza real de minha mãe, e o peso
da traição que, imaginava eu, recairia sobre meus ombros se alguma vez a
pegasse desprevenida seria de mais para mim, aos cinco anos de idade. Creio que
eu chegava a temer a possibilidade de ser eliminado caso a flagrasse ao entrar
voando pela janela do quarto, vindo da escola, ou então surgindo pouco a pouco,
um membro de cada vez, emergindo do estado de invisibilidade, com avental e tu
do. Claro que, quando ela pedia que lhe contasse como tinha sido meu dia no
jardim de infância, eu obedecia sem hesitação. Não tinha a menor pretensão de
compreender todas as implicações de seu dom de ubiquidade, mas que ele ser via
para descobrir que espécie de menino eu era em sua ausência - disso não havia
dúvida. Uma consequência dessa fantasia, que sobreviveu (dessa forma
específica) até a primeira série, foi que, julgando não ter alternativa, me
tornei um menino honesto. Ah, e brilhante, aliás. A respeito de minha irmã mais
velha, uma menina gorda, de tez amarelenta, minha mãe costumava dizer (mesmo na
presença da própria Hannah, é claro: também minha mãe adotava a honestidade
como política): "A menina está longe de ser um gênio, mas a gente não pede
o impossível. Que Deus a abençoe, ela é esforçada, dá tudo o que pode, e assim
o que ela conseguir está mais do que bom". De mim, que herdara dela o
nariz egípcio afilado e a boca inteligente que jamais se calava, de mim ela
dizia, com sua moderação característica: "Esse /bonditt/? Esse não precisa
nem abrir o livro - é dez em tudo. É o Albert Einstein Segundo!". E como
meu pai encarava tudo isso? Ele bebia - claro que não uísque, como faria um
gói, e sim Nujol e leite de magnésia, e mastigava pastilhas laxantes; e comia
All-Bran de manhã à noite; e consumia quilos e quilos de frutas secas. Sofria -
e como! - de prisão de ventre. A ubiquidade de minha mãe e a prisão de ventre
de meu pai, minha mãe voando pela janela do quarto adentro, meu pai lendo o
jornal da tarde com um supositório enfiado lá naquele lugar... São essas,
doutor, as primeiras impressões que guardo de meus pais, de seus atributos e
segredos. Ele preparava chá de folha de sena seca numa panela, e a isso, junto
com o supositório que se derretia invisível em seu reto, se resumia toda a
bruxaria dele: fervia aquelas folhas verdes cheias de nervuras, mexia com uma
colher o líquido fedorento, coava cuidadosamente e por fim ingeria a beberagem,
na tentativa de desbloquear o organismo, com uma expressão de cansaço e
sofrimento no rosto. E então, debruçado em silêncio sobre o copo vazio,
aguardava o milagre... Quando era bem pequeno, às vezes eu ficava sentado a seu
lado na cozinha, esperando também. Mas o milagre nunca acontecia, pelo menos
não do modo como imaginávamos e rezávamos para que acontecesse - a suspensão
daquela pena, a libertação final daquela praga. Lembro que, quando deu no rádio
a notícia da explosão da primeira bomba atômica, ele disse em voz alta:
"Quem sabe isso não resolvia meu problema". Mas, para aquele homem,
toda e qualquer catarse era inútil: suas /kishkas/ viviam comprimidas pela mão
de ferro da indignação e da frustração. Entre outros infortúnios seus, eu era o
favorito de sua mulher. Para complicar ainda mais as coisas, ele me adorava.
Também ele via em mim a oportunidade de que a família se tornasse "tão boa
quanto qualquer outra", de que conquistasse honra e respeito - se bem que,
quando eu era pequeno, toda vez que ele falava sobre as esperanças que
depositava em mim, praticamente só se exprimisse em termos de dinheiro.
"Não seja burro como seu pai, não", ele gracejava, com o menino no
colo, "não case por beleza, não case por amor - case por dinheiro."
Não, não, ele não gostava nem um pouco de ser encarado com desprezo. Trabalhava
feito um camelo - para um futuro que estava destinado a jamais atingir. Ninguém
jamais lhe proporcionou a satisfação que ele desejava, que estivesse à altura
do que ele lhes dera - nem minha mãe, nem eu, nem mesmo minha irmã, que o
adora, e cujo marido ele até hoje considera um comunista (embora tenha se
tornado sócio de uma lucrativa fábrica de refrigerantes e seja proprietário da
casa em que mora, em West Orange). E por certo nem aquela bilionária empresa
(ou "instituição", o termo preferido dentro da própria empresa)
protestante que o explorava até não poder mais. "A Instituição Financeira
Mais Benévola dos Estados Unidos", meu pai proclamou, ainda lembro, quando
me levou pela primeira vez para conhecer o quadrilátero exíguo de mesa e
cadeira que ele ocupava nos amplos escritórios da Boston & Northeastern
Life. Sim, diante do filho se referia com orgulho à "Companhia"; não
faria sentido se humilhar falando mal dela em público - afinal de contas, ela
pagara seu salário durante a Depressão; dava papel timbrado com o nome dele
impresso abaixo do desenho que representava o /Mayflower/, a insígnia da
empresa (e, por extensão, dele, ha ha); e todos os anos, na primavera, num
requinte de benevolência, a empresa presenteava a ele e minha mãe com um fim de
semana gratuito em Atlantic City, num hotel chiquérrimo de góis, onde ele
(junto com todos os outros agentes de seguros atuantes nos estados da região do
Meio Atlântico que haviam ultrapassado a expectativa média de vendas daquele
ano) se sentia intimidado pelo recepcionista, pelo garçom e pelo mensageiro,
para não falar nos perplexos hóspedes pagantes. [...]. Trecho extraído da
obra Complexo de Portnoy (Companhia das Letras, 2004), do escritor Philip Roth, contando a história de um personagem
que se masturba obsessivamente, ao ponto de usar um fígado cru, compreendendo a
narrativa uma confissão do protagonista no divã de seu terapeuta. Veja mais
aqui e aqui.
UM POEMA - A necessidade nos acossa como acusação de impotência: / Você
pode ou não falar mais alto, / Provar que está presente? / O que você precisa
encontrar para dizer, / Para passar o saber que você existe / À revelia dos
crentes ou descrentes / Da nossa espécie em cada um, / Você pode chegar junto
ao chegar perto deles / E deixar o assunto de aceitação / Suspenso entre sua
oferta / E seu destino com eles no tempo. / (Isto se chama "prosà'!) / Ou
você pode convidar ouvintes, / Sem esperar por eles ─ / Fazendo do que você
acha para dizer / Um testemunho de si, se ausente de ouvintes. / (Assim o poema
se constrói: / Para ser entregue numa distância curta. / Mesmo sem platéia,
fala.) / A realidade num poema é inextensível. / Abrange a vontade de falar
mais alto, / Mas, se presume incluir / A vontade visitante de ouvir o que é
dito, / Finge ser uma / Presença além da sua mesma. / o que mais pode ser
feito? / Não falamos mais um com o outro? / Pomos palavras no ar e no papel / Que
viajam entre nós como se o real, / Sob a proteção do tempo, / Com nem tudo
perdido entre uma e outra, / Estas, aquelas e suas outras, / Ou perdidas de uma
vez? / Não fosse isto um poema / Eu falaria sobre o falar, / Escreveria sobre o
falar (e sobre o escrever), / Que se guardaria para o outro, outros, / Se
construiria para todo mundo, / Ou para ninguém, contendo em si sua força
viajante, / Sem precisar de uma graça de tempo para resgatá-lo / De uma perda
total. / Ou eu falaria, escreveria, assim, / Esforçando-me para construir,
quero dizer, / Algo ligando nossos entendimentos / Numa realidade de palavras,
de eus, de outros, / Mais dizível, mais penetrável, habitável, aberta. Poema da poeta estadunidense Laura Riding (1901-1991).Veja mais aqui.
LUST EROTIC ART – O volume
Lust Erotic Art (VAMzzz Sweet Rebel Magazine), organizado por Sylvia Carrilho e Benjamin Adamah, reune centenas de obras de autores geniais, desde Egon Schiele, obras de Friedrich
Wilhelm Kleukens, as bruxas alemãs de Baldung-Grien, obras menos conhecidas de
Franz von Bayros, o satânico Félicien Rops e o fetichista Bruno Schultz, aos esboços clínicos de Tom Poulton, dos desenhos de
dominatrix de Montorguiel e German Jim, ao erotismo gótico masoquista de Henry
Fuseli. Dezenove artistas diferentes são
retratados em seus estilos característicos, abrangendo cinco séculos de
criatividade, com Lust como o leitmotiv atemporal. Veja mais aqui e aqui.