Ao som do álbum Light (Decca, 2016), da pianista e maestrina italiana Vanessa Benelli Mosell, interpretando obras Scriabin e Stockhausen.
TRÍPTICO DQP:
- A vida entre o placebo das dores e a panaceia dos simulacros... - Mais que esperar o destino se faz na hora da vez. Por enquanto, são e
salvo na Torre de Babel enlouquecida que confirma o que disse Guy Debord: a
imagem se tornou a forma final da reificação.
Lá voo e vendem a Terra Prometida na impostura reiterada:
jogam tudo fora no dia mais banal. Submeter-se ou morrer, nada mais para ser,
só plágio, escárnio, crença, a privação e o invertido, a reinversão do sentido:
a miséria e o pavor, a destruição e o insalubre, e me sinto despejado no limiar
do atraso, no vazio da roleta, na sorte do cassino - só cisão e banir-se ao
grau zero, eis a questão. Afora isso nada mais adiantasse, a vitória tornou-se com
o tempo uma fragorosa derrota: não é aquilo que sequer parece. As coisas reinam
com suas máscaras e a violência permanente mutila o visinvisível e nem era novembro,
outroubo pelas mutamorfoses e obsolescências, aporias entre o céu e a terra. Resta apenas o cansaço diante da Não-Coisa, da morte
da alteridade e da infocracia de Byung-Chul Han: Não
precisam mais curvá-lo. Você foi convencido a se submeter voluntariamente! Sei que qualquer coisa acontecerá a qualquer momento na memória do
morto enquanto vivo trabalha: perde uma e encontra outra entre o vil e os
podres prazeres. E ressuscita Pamela McCorduck irônica: Máquinas ainda não pensam como Einstein, mas a maior das
pessoas também não e nem por isso questionamos sua humanidade. E com ela um verso da Aranha pendurada de Antonio Cisneros: Se você não tomar
cuidado você vai acabar acreditando que este é o mundo - Que ar resta para
respirar... De
repente o eco de Fannie Lou Hamer: O ódio não vai apenas nos destruir. Vai
destruir essas pessoas que estão odiando também. É somente quando falamos
o que é certo que temos a chance de ser explodidos à noite em nossas casas. É só um triz de alívio e
esperançar no meio da fatalidade
democratizada que o terror absoluto imprime e quebra o sigilo mais íntimo
publicizado com as similaridades e escondendo hipocrisias e o asco de outra bem
mais desprezível. O espetáculo é a última instância e a verdade jamais, resta
apenas salvar as aparências na permanente ruina - um poço sem fundo e nenhuma
revelação para as almas enfermas dos fracos. Quem sonha precisa acordar no meio
da noite...
Asfixia
doutras fumaças invisíveis... Imagem
da artista australiana Sylvie Coupé Thouron. - Do outro lado daqui não reconheço mais ninguém, estranhos se
fizeram, hostis quase feras que rugem ou grunhem a exalar asfixiante fumaça dos
seus corpos que atraiçoam todos. Ao meu lado tosse Magda Szabó: Você não brinca com a morte, ela impõe suas próprias leis. O tempo que
se foi e o que se perdeu nem faço questão, porque sei e sou porque não tenho;
ao ter deixo de ser e só resta aparecer e o que não quero. Por isso, Anne Rice me chama atenção: Você tem uma história dentro de você; ela
está articulada e esperando para ser escrita - por trás do seu silêncio e
sofrimento. Era preciso prevenir, tarde
demais: o Quibungo já soltou seus
filhotes mandonistas por todos os birôs do poder. Tarde demais para ouvir Marguerite Radclyffe Hall: O mundo escondeu sua cabeça nas
areias da convenção, para que, ao não ver nada, pudesse evitar a Verdade. Neste
mundo há apenas a tolerância para o chamado normal. E sei que não há desvio necessário porque o desprezo corrompeu a todos e pulverizou-se na
mentira de si próprio em cada um e o não-vivo comanda o coração da irrealidade.
Tardia solidariedade de Louise Fitzhug:
Às vezes você tem que mentir. Mas para si mesmo você
deve sempre dizer a verdade. Estou feliz por não ser perfeita - eu ficaria entediada até a morte. Já
sinto o que se diz inimigo radiante se aproximando, e quase desconsolado abraço
Abasse Ndione que segreda: Em sua busca desenfreada pela felicidade, ele encontrará
apenas a loucura.
Se não dá pra visualizar a arquitetura da totalidade,
mesmo assim, há muito a ser feito, apesar do
afastamento de todos: a solidão sem ilusão...
Onde o amor
jamais o ódio... - Longe
da manhã escapo pela suicida madrugada do Recife,
como se o nordestino tivesse a cabeça a prêmio no meio do estremecimento
envenenado Brasil afora. No meio da implacável ventania as pálpebras dela
realçam quase perto e ela feito a musa Pagu
linda e estabanada medusa solta das heresias e refrações - sabia que quem a visse cegaria de paixão. E me abraçou lua cheia que acende a noite e me
beijou agarrada ao meu tronco exasperando paixão
e cicatrizes no Parque Industrial. Soluçou impropérios contra a garganta da máquina
decadente tão imperiosa por agora, enquanto todos desconheciam ao relento o
grito que apodreceu de fome e insônia pelas chamas da máscara insultuosa
protegida por capacetes esdrúxulos. E se lamentou com O homem do povo, de
Malakabeça, Fanika e Kabelluda, provocando os ventos e olhares no deboche da
anarquia para me perguntar: Quem é o
maior bandido vivo do Brasil? E se esgoelou como o espetáculo solar de todas as manhãs contra os dos caducos corações devastados engrossando os decrépitos e desmiolados
algozes, como se ferida de morte pela sordidez. Viu-se temperamentalmente inadaptada
para me beijar novamente desmesurada e tumultuosa. Estava disposta a ir às
últimas consequências como se enfrentasse indispensável caos, e se sentisse capaz
de enfrentar a histeria em massa do fungo de centeio com todos os psicogênicos,
catatônicos e indiferentes na poeira da desgraça. Ah, não. Agora não. Ela
novamente me abraçou terna e soluçante: Lê nos meus olhos todos os consentimentos. Mata tua sede na pedra que se
fez fonte. E te encanta com a paisagem contraditória do meu ser. Sonhe, tenha
até pesadelo se necessário for, mas sonhe. Esse crime, o crime sagrado de ser
divergente, nós o cometeremos sempre. E transpirei sua voz, seu hálito quente, seu cheiro de vida e entrei para nunca mais sair - enquanto eu existir onde quer quer que ela esteja. E nela o chão se fez o que restou do
paraíso e eu sabia: onde o amor, jamais o ódio. Até mais ver.
[...] Num mundo assim, a última coisa que um
professor precisa dar a seus alunos é informação. Eles já têm informações
demais. Em vez disso, as pessoas precisam de capacidade para extrair um sentido
da informação, perceber a diferença entre o que é importante e o que não é, e
acima de tudo combinar os muitos fragmentos de informação num amplo quadro do
mundo. [...] As decisões que tomarmos nas próximas
décadas vão moldar o próprio futuro de vida, e só podemos tomar essas decisões
com bases na visão atual do mundo. Se esta operação não tiver uma visão
abrangente do cosmo, o futuro da vida será decidido aleatoriamente. [...].
Trechos extraídos da obra 21 lições para o século 21 (Cia das Letras,
2018), do historiados e filósofo israelense, Yuval Noah Harari. Veja mais Educação & Livroterapia aqui e
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