DIÁRIO DO GENOCÍDIO NO FECAMEPA – UMA: SABE
AQUELA... DOS UMBRAIS DE MIM... - O meu país arde
como se o meu povo fosse o desespero dos acrófobos à beira do abismo, no cortejo de Paddy Digman do Joyce e eu pseudOdisseu
errasse à procura de uma das sete vidas de Tirésias
para reencontrar a Ítaca perdida, o meu Paraíso de Milton. Essa a coragem do passo adiante quando tudo é precipício na
fumaça sem maçaneta, arrimo, apoio ou paredes: o rio de sudorese excessiva e a
tremedeira no sorvedouro nas pontes dissolvidas para tudo despencar no frio da
barriga perambeira. Desnudo no sonho o rei entre meras catábases por aclives íngremes, não olho para baixo nem posso
voltar porque tudo ficou para trás com o pânico larófobo, porque caio para o báratro
com o inútil instinto de sobrevivência de Ícaro
sem paraquedas, alpinista nas cataratas do inevitável tropeço pelas escadas de
nuvens. E ouço os versos do Soneto infernal de Bocage: Dizem
que o rei cruel do Averno imundo e seja isto já; que é curta a idade, e as horas de prazer voam ligeiras... são os fios que se
soltam na minha eterna corda bamba pelo meio-fio entre a vida e a morte. Ainda vivo,
voo.
DUAS CENAS DE FILMES – Depois de ter assistido o documentário Memória para uso diário (2007), da premiada cineasta Beth Formagini, tive a oportunidade de ainda ver o documentário Angeli 24 horas (2011), que trata sobre
a obsessão pelo trabalho do cartunista Angeli
e o seu dilema de artista, como também o premiado Xingu Cariri Caruaru Carioca (2016), que trata a respeito das
origens e evolução do pífano na história do Brasil. Ela é formada em História, especializou-se
em documentário na Universidade de Roma, foi presidente da Associação
Brasileira de Documentaristas no Rio de Janeiro e trabalhou na produção e
pesquisa de alguns filmes de Eduardo Coutinho. Foi dela que captei: Estamos infelizmente dominados. Se não
discutirmos isso, entraremos de novo nesse período vivido no passado. Espero
que a juventude de agora não volte a experimentar aquilo tudo. Tenho esperança
de que as pessoas resistam, que se imponham. Esse é o alerta de que
precisamos fazer alguma coisa aqui e agora, vambora.
TRÊS CONTAS NOS DEDOS SEGUINDO - (Imagem:
escultura de Nicolina Vaz) – Ah, os
meus dias, eram ventanias de tempestades terríveis com o esquecimento e nenhuma
vontade de errar pela vida dentro de um odre de poderosos ventos e aberto para
festa das sereias enlouquecedoras que me deixaram boiando num pedaço de madeira
mar afora, para que findasse mendigo no meu próprio reinado em ruínas. Assim as
funduras insondáveis da solidão e ao me deparar com as inscrições da tabuleta
chinesa no meio dos antros do cabo Averno: Ande
com calma na estrada escorregadia, pois nela se embosca o demônio do desastre.
Eu sabia, um pé na frente e outro atrás, todos os caminhos levavam ao inferno. É
como se do fundo do Érebo surgissem todos os pálidos espectros da minha
convivência de ontens, com os seus castigos do julgamento e a minha veneranda
mãe a testemunhar minha tribulação pela escuridão de charcos umbrosos.
Presenciava tudo e quedava de terror como quem havia sido expulso do éden para
invocar a musa, porque só havia em mim a imagem de Penélope a me esperar distante
quase sem esperança, a tecer sua manta com as palavras de Rubem Alves: Não
haverá borboletas se a vida não passar por longas e silenciosas metamorfoses. A
vida não pode ser economizada para amanhã. Acontece sempre no presente. Vivo
agora e voo pra ela. Até mais ver.
A ARTE DE DEYSON GILBERT
A arte do
artista Deyson Gilbert, que é
graduado em Artes Visuais pela Universidade de São (USP), fundador e editor da
revista Dazibao e que já participou
de mostras e exposições no Brasil e exterior. Veja mais aqui.