SHIRIN, HERBERTO & MATRIZ DE CAMARAGIBE –
Imagem: Women of Allah, da artista visual iraniana Shirin Neshat. - Passado de anos, quase nem lembrava mais disso. Ruas
de sábado do Zé-pereira por Matriz de Camaragibe e um olhar de Shirin Neshat na
esquina que passou. Quase nem vi no meu coração tipo escritor da ordem de
pagamento dos Transcontos de Herberto. Olhei para trás e revi de relance, a Brasília
do pintor Ângelo fazia voltas no meu sequestro, enquanto Gulu ajeitava o
braquearo no porta-luvas e prometia goles carnavalescos. No banco de trás, meio
que na maior sem graça, eu retomava a ler a injúria daquele que não recebia
seus direitos autorais extraviados na burocracia bancária. Tal e qual eu
amargava o bolso desendinheirado o meu constrangimento, uma folia a mais ou de
menos, não fazia a menor questão. Para me animar, o Ângelo anunciava a chegada
de Mauricinho lá de Brasília, a capital distante que nem ousava sonhar, há
quanto que nem mais sabia. Ruas, becos, pra lá e pra cá, ao encontrá-lo deu pra
farra de Gulu e fomos pro Timbungue com a sua piscina amarelo-mijo, rodadas de
cervejas e pinga, tira-gosto de caju, tripa de porco, patas de caranguejo,
sururu, e eu perdido com o olhar agora no fim do corredor, o mesmo da esquina
que passei. Era sim aquele olhar. Não podia ser, mas era. Eu mais me perdia, música
de Stravinsky no pé-do-ouvido, outras de dor-de-corno no coral quase ébrio
sacudido pelo maestro agulha nas alturas. Cada qual sua ousadia, apostas de não
sei quê, façanhas de trancoso, contos da carochinha, pilhérias e renhenhem. O olhar
de antes, sim, aquele mesmo olhar agora num canto recostado flagrava o meu
silêncio no meio do fuzuê dos que misturavam frevos de antanho com piadas
cabeludas, prometendo mais tarde o desfile da macharia no Bloco das Virgens. Eu
convocado pela trupe, dedilhar viola com dedinho de prosa, coisa que valha,
não, não queria nada. A cabeça rodava nas rodadas da bebida em busca do olhar
vigilante que mudava de lugar vez ou outra, enquanto um batalhão aos goles
brindava o vira-vira-virou! A tarde se consumia com arroubos e bafafás. Lá pras
tantas, cabeça cheia, álcool na canela esborrando acima das pestanas, mergulho
sem saída no fundo da piscina. Não havia mais nada, era o meu abismo deslizando
no piso, engolindo mais água do que devia. E duas mãos salvadoras me recolheram
da despedida: rente aos meus, os olhos, sim, aqueles olhos embaixo do chuveiro.
Era o que nem sei. Nem deu tempo de saber, cantávamos Noite dos Mascarados na boquinha
da noite de Matriz de Camaragibe, anos de décadas atrás que se perderam no
tempo e na lembrança. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja
mais aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com a música do maestro, pedagogo musical, ensaísta
e compositor francês Pierre Boulez (1925-2016): Le Marteau Sans Maitre, Structures I e II,
Répons & Anthèmes 2; da pianista estadunidense Lynelle James: Sonata nº 4 Scriabin & Gaspard de La Nuit de Maurice
Ravel; & muito mais nos mais de 2 milhões de acessos ao blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir.
PENSAMENTO DO DIA – [...] Quantos
homens sabem observar? E entre os poucos que o sabem – quantos observam a si
próprios? Cada um é para si próprio o mais distante. [...] Os mais preocupados hoje indagam: ‘como se
conservará o homem?’ Zaratustra foi o primeiro e único que indagou: ‘como se
superar o homem?’[...] Isso pergunta e
não cessa de perguntar: ‘como poderá o homem conservar-se melhor, mais longamente,
mais agradavelmente?’ Com tal pergunta — eles são os senhores de hoje. Superai,
meus irmãos, esses senhores de hoje — esses pequenos homens: eles são o maior
perigo do super-homem. [...]. Pensamentos extraídos da obra Assim falou
Zaratustra: um livro para todos e ninguém (1883-85), do filósofo e poeta
alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900). Veja mais aqui.
LOGOTERAPIA - [...] A
tese que nos serviu de ponto de partida: Ser homem é ser livre e ser
responsável [...] a consciência e a
responsabilidade constituem precisamente os dois fatos fundamentais da
existência humana. O qual, traduzido numa forma antropológica fundamental,
podia expressar-se assim: ser-homem
equivale a ser-consciente-e-responsável [...] são os dois aspectos
juntos e combinados que oferecem a imagem total e verdadeira do homem
[...]. Trecho extraído da obra Psicoanálisis y existencialismo (Fondo de
Cultura Económica, 1967), do neurologista e psiquiatra austríaco Viktor
Frankl (1905-1997). Veja mais aqui.
O ENTERRO DO LOBO BRANCO – [...] Haverá
um tempo em que penetrarei à força pelas extremidades do seu corpo lúcido me
embrenharei nas ramificações dos seus vasos sanguíneos forçarei cada minúscula
veia até encontrar a de maior calibre introduzirei minhas presas na sua jugular
esperarei o sangue jorrar amordaçarei sua boca algemarei sua língua e depois te
farei engolir meus pensamentos e quando você imaginar que está tendo uma ideia
originalíssima destruirei os espelhos ao redor da sua casa e você descobrirá
que o homem não passa de um simulacro pretensioso do monstro e o monstro habita
embaixo da sua cama [...] Em poucos
segundos minha garganta terá os músculos relaxados a respiração se tornará
ruidosa e tomará o ritmo vagaroso dos animais agonizantes a presença
dissimulada do estertor da morte meu coração não mais se repartirá entre
ventrículo direito e ventrículo esquerdo a aorta não possuirá privilégio sobre
as artérias menores meu membro conhecerá a lucidez das coisas flácidas e sem
vida minha carapaça romperá com o mesmo vigor que se despedaçam as carapaças
dos caranguejos azuis minhas pernas se quebrarão e sem ossos tomarão a forma de
nadadeiras e eu poderei experimentar a letargia de mergulhar nas águas das
cidades litorâneas enquanto cavalos marinhos copulam ao lado do meu corpo morto
[...]. Trecho extraído do romance O
enterro do lobo branco (Patuá, 2017), da escritora Márcia Barbieri.
UM POEMA – Cuidado
com a bandalheira, as olheiras! O poeta revolve o caldo, o saldo. O poeta
mantém o sentimento, o pensamento Contra a máquina que devora as horas, Contra
o massacre do homem pelo lobisomem. O poeta é carbonário, panfletário. Cuidado
com a cordilheira da Mantiqueira! Cuidado com o Santuário do Rosário! Poema
Ofício de advertência, do poeta, jornalista, publicitário e advogado Iremar Marinho. Veja mais abaixo.
ARTE DE SHIRIN NESHAT
A arte da artista visual iraniana Shirin Neshat.
O escritor Vital Corrêa de Araújo faz doação de livros à Biblioteca Fenelon
Barreto, a poesia de Iremar Marinho &
muito mais na Agenda aqui.
&
Vivo
& a vida com tudo e todos, o pensamento de
Helena Antipoff, a música de
Dominguinhos, a escultura de Gutzon Borglum, a pintura de
Angel Otero, a fotografia de Roman Pyatkovka & Nayana Andrade aqui.