segunda-feira, outubro 15, 2012

RUMI, GOLDSWORTH, GÉRARD VINCENT, SURREALISMO & CRÔNICAS PALMARENSES

Foto: Givanilton Mendes, na quadra do Colégio Diocesano, Dia Mundial da Poesia, em 1976.



GRATIDÃO AOS PROFESSORES




Ilustrando o que eu já contei aqui, tudo, então, começa com minha tia-prima saudosa Sonia Cabral Ferraz, responsável por minha alfabetização ainda criança peralta, afastado que fui por causa do achocolatado no recreio do Grupo José Bezerra. Toda tarde, lá na casa de Pai Lula & Carma, ela se dedicava a me ensinar as primeiras letras e administrando minha inheta algazarra e a mania de grandeza já revelada de gastar cadernos por dia. É que ela tão dedicada me apresentava as vogais e consoantes, e eu, com a minha já desastrada forma de me expressar maior que meu próprio tamanho, usava a página inteira do caderno para exercitar na escrita. Quer dizer, para copiar cada letra eu me expandia cheio das pregas a desenhá-la ocupando a página inteira do caderno. Imagine quantos cadernos eu consumia por dia, mesmo tendo ela a preocupação de pacientemente me fazer apagá-las, vez que, não fosse isso, meu pai e parentes teriam que comprar uma fábrica de cadernos para dar vencimento ao meu disparate.

Daí, ao ser matriculado na Escola Fraternidade Palmarense, deu-se os ensinamentos com a maravilhosa professora Hilda Galindo Correia, aquela mesma responsável pela minha iniciação literária descabida, resultando na publicação das minhas primeiras quadrinhas no suplemento Júnior, do Diário de Pernambuco.

Dos exames de Admissão até repetir o segundo ano no Ginásio Municipal dos Palmares, tive excelentes professores. Os de Português: Elias Sabino de Oliveira, João José do Nascimento, Mariazinha Quaresma e a responsável por minha formação intelectual, afetiva, humana e que dedicou momentos preciosos do seu tempo para me encaminhar pra ser gente que preste pra alguma coisa, a professora e bibliotecária Jessiva Sabino de Oliveira. Também Brivaldo Leão de História, Edson Matos de Francês, bem como os demais que testemunharam minhas presepadas saindo da infância pra adolescência.

Os terceiro e quarto anos do ginasial eu concluí no Colegio José Ferreira Gomes que funcionava no horário noturno, no mesmo prédio do Ginásio Municipal. Lá encontrei o meu amigo Tininho, o Joventino de Melo Filho, que apesar de ser professor de Matemática, foi uma das pessoas mais importantes na minha vida e que foi responsável por minha formação educacional, literária e musical. Além dos outros professores, destaco a figura humana e boníssima de Lael Borba de Carvalho, o King, meu professor de Inglês, figura das mais queridas na minha estima.

Fui então pro Colégio Diocesano e lá Inalda Cavalcanti, Erivan Félix, João da Silva e José Duran y Duran, além do bispo que era diretor, Dom Acácio Rodrigues Alves, deram asas à minha imaginação, proporcionando espaço para que eu e minha trupe pudéssemos fazer recitais de poesia, shows musicais, apresentações de teatro e melodramas, enfim, foram eles que muito contribuíram para que eu me dedicasse às artes. Culpa deles mesmo. Também o professor Pedro Victório Paiva que era meu professor de Física e substituto no cartório da mãe dele, Dona Dulce, que foi outro que nos momentos de fuga nos afazeres do Fórum e nos espaços da escola, me iniciou na Filosofia com seus ensinamentos científicos, afora aprofundar meus conhecimentos na música erudita. Além disso, devo contar as tardes de finais de semana na casa do amigo José Duran y Duran que dedicou atenção especial para minha formação na arte espanhola, sobretudo a Literatura, Teatro e Artes Plásticas.

Foto: Wilson Fotografias, durante apresentação de show musical no auditório do Colégio Nossa Senhora de Lourdes, em 1977.

Depois de três anos no Diocesano, fui concluir o 2º grau no Colégio Nossa Senhora de Lourdes, depois até me tornando professor de Literatura, Filosofia e Sociologia. Lá, enquanto estudante concluinte do científico, a Madre Maria do Espírito Santo manteve a abertura de todo espaço para comentimento das minhas aspirações artísticas, possibilitando que eu e minha trupe fizéssemos shows, recitais e exposições de poemas e pinturas. Entre os professores, destaco a figura estimada e folclórica do professor e vizinho Barbosa que era professor de Desenho, mas que atuou ministrando aulas de Matemática, Física, Química, OSPB, Moral e Cívica, Religião e que, um dia, abriu a porta e sapecou na maior animação: “Vamos aprendê ingrês qui portugueis nós já sabe!”.

Daí fui pro curso de Letras na Famasul onde, ainda estudante, fui incubido pela professora titular da cadeira, de ministrar aulas de Literatura Brasileira e Portuguesa aos sábados, fato que me levou a ser mesmo antes de concluir o curso, professor em diversas escolas de Palmares, Novo Lino e Joaquim Nabuco. Lá aprendi Latim com o professor Helmut Raimundo Gress. Fui, então, concluir o curso em Recife, depois fazer Relações Públicas na Esurp e Jornalismo na Unicap, cursos não concluídos. Mas foi na Faculdade de Direito que conheci um professor que me influenciou positivamente: Ivan Brandão, de Sociologia. Pude privar da sua amizade dentro e fora da faculdade, o que me valeu ter tino e discernimento para melhor me aprumar artística e profissionalmente.

 Foto: Luiz Gulú Santos Braga, na varanda da sua casa, em 1975.

Claro que não foram somente os professores da educação formal quem contribuíram de verdade. Além deles, devo colocar no rol dos gurus as pessoas do meu parente poeta Afonso Paulo Lins, do meu parente e figura das mais queridas que é o advogado Paulo Roberto Cabral de Souza, o saudoso poeta e advogado Eliseu Pereira de Melo, o empresário Gilsádio Santana que dias e noites dedicava seu tempo para me falar das atividades teatrais palmarenses, sobretudo de Hermilo Borba Filho, bem como dos da minha a trupe de birita e vida, com quem aprendi e, consequentemente, ensinamos uns aos outros, como Fernando Bigodinho Melo Filho, Marquinhos Cabral, Vavá de Aprígio, Mauricinho Melo Júnior, Luiz Gulu dos Santos Braga, Célio Carneirinho, os compadres Javanci Bispo e Sandra Lustosa, Ozi dos Palmares, Zé Ripe, Chico Âneglo Meyer, Mazinho Jucimar Siqueira, Marco Hippie, Juareiz Correya, Wilson Fotografias, Paulo Profeta, o saudoso Givanilton Mendes, o pianista Sérgio David e, principalmente, meu pai, Rubem que era um boêmio poeta que vivia a dar colorido a tudo que eu queira de Literatura e Música.

A todos esses mestres, a minha gratidão. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui e aqui.

A arte do pintor russo Viktor Lyapkalo.

 

DITOS & DESDITOS - Muitas vezes esquecemos que NÓS SOMOS NATUREZA. A natureza não é algo separado de nós. Então, quando dizemos que perdemos nossa conexão com a natureza, perdemos nossa conexão com nós mesmos. Pensamento do escultor, fotógrafo e ambientalista britânico Andy Goldsworth.

 

ALGUÉM FALOU: Fugi do homem para morar na floresta. Não pertenço a movimentos. Os únicos movimentos são os dos astros, marés e ventos. A Natureza é a minha arte! – Como posso fugir desta realidade?... Pensamento do pintor, escultor, gravador, fotógrafo e artista plástico polonês Frans Krajcberg (1921-2017).

 

DE GATOS & SENTIMENTOS - Eu cresci tão acostumado a ter um gato mal-humorado, mas bonito que eu preciso alertar os visitantes sobre. Ela sobreviveu a todos os gatos que eu amava e todos os gatos que eu me liguei. E eu acho que ela cresceu se aproveitando de mim. Quando Zoe morreu, foi muito fácil de explicar às pessoas o quanto dói você perder um gato doce, gentil, que não passava de uma bola de amor total. Eu vou ter muito mais dificuldade em um dia, meses ou mesmo anos explicando a falta que me faz a perda da gata grumpiest mais perigosa e mais malvada que eu já encontrei... Depoimento do quadrinista, escritor e roteirista britânico Neil Gaiman. Veja mais aqui.

 

UM GATO CONTA – [...] Aos gatos, que os intrigam e inquietam, os homens consagraram inumeráveis obras... [...] O homem atira-se aos títulos e às coisas. O gato satisfaz-se com o que é, contenta-se com o que tem. Ignora a inveja. A grama é sempre mais verde na margem fronteira, diz o japonês. Nossa própria margem nos basta. Sabemos que a idade de ouro não está atrás de nós, que o eldorado não está adiante. Não somos desesperados. Não esperamos nada, senão repetição... [...]. Trecho extraído da obra Akhenaton, a História do homem contada por um gato (Siciliano, 1995), do sociólogo, historiador, escritor e artista francês Gérard Vincent (1922-2013).

 

DESDE QUE CHEGASTE AO MUNDO DO SER, UMA ESCADA... - Desde que chegaste ao mundo do ser, / uma escada foi posta diante de ti, para que escapasses./ Primeiro, foste mineral; / depois, te tornaste planta,/ e mais tarde, animal. / Como pode isto ser segredo para ti? / Finalmente, foste feito homem, / com conhecimento, razão e fé. / Contempla teu corpo - um punhado de pó - / vê quão perfeito se tornou! / Quando tiveres cumprido tua jornada, / decerto hás de regressar como anjo; / depois disso, terás terminado de vez com a terra, / e tua estação há de ser o céu. Poema do poeta, jurista e teólogo sufi persa Mawlānā Jalāl-ad-Dīn Muhammad Rūmī (1207-1273). Veja mais aqui e aqui.

 

UM CÃO ANDALUZ & O SURREALISMO – O filme surrealista Un chien andalou (1928), dirigido e escritor por Luís Buñuel & Salvador Dali, passa de "era uma vez" direto para "oito anos depois", utilizando a lógica dos sonhos, baseado na psicanálise de Freud, sobre o inconsciente e as fantasias. Representa uma reunião de imagens oníricas, encadeadas como se fossem um pesadelo, repleto de cenas metafóricas. A primeira cena mostra uma mulher que tem seu olho cortado por uma navalha por um homem. O homem com a navalha é interpretado pelo próprio Buñuel. Numa cena seguinte aparecem formigas saindo da mão do ator, uma possível alusão literária à expressão francesa fourmis dans les paumes (formigas nas mãos) que significa "um grande desejo de matar". A ideia do enredo seria uma viagem à mente perturbada de um assassino e as suas confissões traduzidas em imagens, porém, o propósito passa pelo senso e a ordem natural das coisas ausentes, constituindo-se numa importante tentativa de rompimento com toda a lógica e linearidade narrativa com forte apelo e referência à dimensão onírica. A ideia derivada dos próprios sonhos dos autores, complementada pela justaposição de imagens apontadas pelos dois, criou um curta cheio de imagens desconexas, e algumas até chocantes, como a do globo ocular sendo seccionado. Em se tratando de Surrealismo, Maurice Nadeau, na sua Histoire du Surréalisme (Seuil, 1958), assinala que "O surrealismo é concebido por seus fundadores não como uma nova escola artística, mas como um meio de conhecimento, em particular de continentes que até então não tinham sido sistematicamente explorados: o inconsciente, o maravilhoso, o sonho, a loucura, os estados alucinatórios, em resumo, o avesso do que se apresenta como cenário lógico”. Foi por esse período que foi adotada a experiência da escrita automática d’Os campos magnéticos (1920), de Breton e Philippe Soupault, enquadrando o movimento como sendo: “Automatismo psíquico em estado puro mediante o qual se propõe exprimir, verbalmente, por escrito, ou por qualquer outro meio, o funcionamento do pensamento. Ditado do pensamento, suspenso qualquer controle exercido pela razão, alheio a qualquer preocupação estética ou moral”. Neste sentido, Sarane Alexandrian, na obra Le surréalisme et le rêve (Gallimard-Littérature, 1974) observa que: O Surrealismo repousa sobre a crença na realidade superior de certas formas de associação desprezadas antes dela, na onipotência do sonho, no desempenho desinteressado do pensamento. Tende a demolir definitivamente todos os outros mecanismos psíquicos e a se substituir a eles na resolução dos principais problemas da vida. Segundo ela os surrealistas foram precursores do psicodrama de Moreno, tendo-se a perspectiva embasada nos depoimentos dado por Aragon, Baron, Boiffard, Breton, Carrive, Delteil, Desnos, Éluard, Gerard, Limbour, Malkine, Morise, Naville, Noll, Péret, Picon, Soupault e Vitrac. Na obra Lambeaux maudits d'une phrase absurde", in Folie et psychanalyse dans l'expérience surréaliste (Z'Éditions, 1992), de Fabienne Hulak, encontra-se que: "As atividades de escrita automática serão constantemente a prática deste `ser cortado em dois'". Para conhecer melhor o Manifesto do Surrealismo (Nau, 2001), acesse aqui, aqui, aqui e aqui.

A arte do pintor russo Viktor Lyapkalo.

 


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