OUTRA PARA NÃO
DIZER NADA - Tantos caminhos percorridos e o
arrastado de malas deram por perdidas viagens, desencontros de goteiras do teto
pingando na cabeça e empoçando o piso escorregadio para desastradas venturas. Quantos
meses de chuvas e de sol, a quentura do pulso ao peito para tudo e a frieza das
portas e fisionomias. Das tentativas o alvo, a mira e o atoleiro: no balanço
das águas só se pode nadar, não há quem se segure de pé. Quem sabe pra onde o
dedo alheio no gatilho, não há de ser leso de ficar ali feito imã, plantado no
meio de campo, se para escapar tem que estalar os dedos e tomar pé da situação,
serei um garrancho qualquer na caligrafia de Deus, então. Mas se falo no
escuro, teor do anonimato: se fosse para todos seria premiado, um de cada vez,
todos; mas não, a implicância dos sonâmbulos tira vantagem de tudo, se ajeita
como pode e nem adianta vinte e quatro horas de vigília se às quedas quarenta e
oito vezes o aprendizado de dias e noites que se foram para nunca mais. Nem adianta
vinte e quatro sonhos se eram apenas um dia a cada dia, refeitos tantas quantas
vezes diante da boa vontade de se aprumar para vida e muita má vontade de sobra na
má-fé para que nada desse certo nem fosse feito. Dos caminhos percorridos,
lições de sobra do cabelo em pé e frio na barriga com as espalhadas nas curvas
e as sobradas de nunca chegar a lugar algum, guardando no quengo e toitiço uma
após outra cada lapada da vida. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS
[...] índices pouco
usuais de concentração fundiária refletem-se em precárias condições de acesso a
terra e asseguram às usinas, principalmente, uma situação de quase monopolistas
controladores da propriedade do solo, donde derivam relações econômicas e
sociais bastante assimétricas. Por outro lado, vale observar que diante do
elevado nível de endividamento das usinas para com os bancos oficiais,
atualmente existentes, esse elevado índice de concentração de terras entre as
usinas pode facilitar, por mais paradoxal que seja, um processo de negociação
de dívidas em troca de terras para fins de reforma agrária. [...] Afora isso, boa parte das usinas de açúcar e
álcool apresentam hoje problemas de endividamento que já levaram ao fechamento
de algumas delas e impedem a recuperação de outras tantas.
Trechos extraídos da publicação Zona da Mata de Pernambuco; estudo de alternativas de geração de
emprego e renda no meio urbano (Sebrae/Série Reflexões sobre a Zona da
Mata, 1995), coordenado por João Policarpo Rodrigues de Lima, Abraham Benzaquem
Sicsú, Osmil Torres Halindo Filho, José Biondi Ney da Silva e Maria Amália
Albuquerque Almeida. Veja mais aqui.
A POESIA DE MURILO MENDES
UMA MULHER – Ela estava no
círculo familiar como as outras, / folheando um livro de gravuras: / a noite
nos cercava com seus abismos azuis / e a ideia de quase uma floresta próxima. /
Alguém acendeu um candeeiro de petróleo, / as pessoas presentes recuaram no
tempo. / Ela se levantou para abrir uma vidraça, / e muito branca, toda
vestida de preto, / seus movimentos ao mesmo tempo lentos e velozes / fizeram
nascer um começo de dançarina ou de gaivota, / hélices mexendo, mãos a correr
no teclado. / Quando sentou-se era outra vez a mulher.
MULHER – Mulher / ora opaca
ora translúcida / submarina ou vegetal / assumes todas as formas, / desposas o
movimento. / Sinal de contradição / posto um dia neste mundo / tu és o quinto
elemento / agregado pelo poeta / que te ama e te assimila / e é bebido por ti. /
Tu és na verdade, mulher, / construção e destruição.
CERTA MULHER – A linha do
horizonte / passa pelos teus cílios / tua fonte a inquietação murmura / a alta
lâmpada do templo balançou / porque não brincaste nunca mais com o arco / nos
lânguidos terraços / a onda vai e volta / na esperança de te ver / o trevo de
quatro folhas / achou-te. / Estrelas gêmeas suspiram.
A MULHER ANÔNIMA – Lembra-te
daquela mulher / que um dia te acenou do alto de uma varanda, / daquela forma
admirável mas sem nome / que uma tarde te disse adeus / enquanto o automóvel
parou um minuto na estrada. / Lembra-te da mulher pouco decorativa, mulher
simples / que não tiveste coragem de arrancar violento ao espaço / e que
certamente nunca mais tornarás a ver: / lembra-te da bela mulher que estremeceu
por ti / e sê-lhe fiel até o último dia da tua vida.
Poemas extraídos da obra As
metamorfoses (Record, 2002), do poeta e prosador do Surrealismo
brasileiro, Murilo Mendes (1901-1975). Veja mais aqui.
A ARTE DE CARLA SALAZAR
A arte da ilustradora chilena Carla Salazar. Veja mais aqui.
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As ações
da enfermeira e ativista polaca Irena Sendler (1910-2008) aqui.
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