CHAMEGO É BOM, MAS DEPOIS... - Imagem: No pé do ouvido, xilogravura de Perron Ramos. - Ô compadre, o chamego é
bom demais, né? Bote bão nisso, compadre. É, mas dá uma dor de cabeça dos
diabos. Faz parte dos dividendos. Você compra o troço, vem tudo bonitinho e na
melhor embalagem. Bota o dedo pra funcionar, tudo direitinho. Com o tempo, já
sabe, né? Enguiça daqui, entorta dali, funciona na maciota, você arranca os
cabelos e não adianta: só faz o que quer. Assim é a mulher, quer queira, quer
não. Por isso digo: mulher consegue ser a melhor e a pior coisa de mundo,
compadre! No começo é tudo nos ajeitados, carinhos, esfregados, pega aqui, pega
acolá, tudo a maior satisfação. Quando o casório é firmado e o bruguelo nasce,
aí a coisa empreta! Pense num ser mais cheia de direito e do beiço virado. Pode
estar errada como for, mas quer estar certa na marra, de todo jeito. Se de um
lado você tem cama, comida e roupa lavada, de outro tem que aguentar todas as
xaropadas, TPM, implicâncias e choro de menino gasguento no maluvido. Pois é,
compadre, mas ninguém deixa de chambregar, a gente só vê os marmanjos pinotando
o pingolim na fulana, sarrando a sicrana, maior esfregado na beltrana,
arrebanhando as outranas, no fim das contas dá uma superpopulação de filhos da
puta no mundo, por isso que a vida está a maior desgraceira. Mas num é que é
mesmo, compadre! O que tem de mãe solteira e filhos sem pais não está no gibi!
Quem quer assumir paternidade de filho duma qualquer? Pronde você se vira é o
maior chamegado, maior fodelança! Como é que pode? Ô compadre, estás vendo
aquele ali? O filho bastardo do Coronel Leuterão? Sim, ele mesmo. Vixe, esse
botou catinga em bosta! O coronel é um santo homem, probo, direito, coração bom
até dizer basta; mas esse filho duma quenga, é um revestrés de gente ruim. É um
porqueira mesmo, farrapeiro chega derrapa afrouxado no primeiro acocho. Pois é,
filho de puta tira a mãe da culpa! Mas num é mesmo, o cara é talqualzinho,
cuspido e cagado, o coronel. Como é que um homem tão bom como aquele dá uma
pulada de cerca com uma desgraceira de mulher daquela, hem? É a safadeza,
compadre, quando a mulher bota pra enfeitiçar o homem, não tem que dê jeito, o
cabra vai feito hipnotizado se enterrar nos guardados dela. É, compadre, mulher
é bicho que tem parte com o cão mesmo. Oxe, ainda um dia desse eu vi o
Jaterlício, lembra dele? Lembro, um homem rico daquele, por causa de quenga,
quebrou na junta. Pois é, morreu do coração. Foi mesmo? Mal enterraram o
defunto e ele ressuscitou no outro dia mais rico do que antes. Como é que pode?
Dizem que quando ele chegou no céu, São Pedro brecou porque chegou antes da
hora e tinha que voltar. Só que ele negou fogo: voltar praquela miséria, volto
não. Aí depois de muita conversa no pé do ouvido e de ver uns tridentes
enfiados nos rabos dos condenados no inferno, entraram no acordo. Aí ele voltou
com a maior fortuna e danou-se a obrar caridade a torto e a direito. Não me
diga, compadre! É mesmo! E quando mais ele dava, mais ficava rico. Num brinca!
Oxe! Dizem que o prazo de retornar pro santo tinha vencido e ele não tinha
gastado a grana e teve de voltar outra vez. Foi mesmo? Aí quando ele encontrou
com o pariceiro dele, o Genebaldo, conhece? Conheço aquele trambiqueiro e gigolô
imprestável. Pois foi quem resolveu a bronca dele. Como assim? Jaterlício
estava aflito e contou a história amiudada pro comparsa, sem saber o que fazer
com tanto dinheiro, quanto mais filantropia, mais o dinheiro crescia e enricava,
perigando findar no inferno ricaço se não desse conta do dinheiro de uma vez
por todas. Eita! O que foi que ele fez? Seguiu o conselho do Genebaldo e
arrumou uma reboculosa duma piniqueira, não deu dois tempos, a grana acabou-se
na hora, dele buscar socorro no santo e nunca mais voltou! Danou-se! Deve de estar
pendurado pelo rabo de cabeça pra baixo assando nos quintos do inferno! Virgem
santa! Olha quem vai por ali, compadre? É o Totonho todo empenado. Aquilo é um
traste, não pode ver um rabo de saia, perdido todo, só na boêmia e traçando
mulher de zona. Disseram que ele estava morre mas num morre, num foi? Coisa
ruim não vai assim, fica durando pra pagar os pecados. Dizem que foi porque ele
se meteu com a mulher do Roseleno, catimbozeira macha que desacerta a vida de
qualquer cristão. Oxe, esse Roseleno é um corno da gaia mole, a mulher enfeita
com duas de quinhentos o dia todo, parece mais que na base do catimbó que o
cara não enxerga, só o corno não vê e, ainda por cima, é metido a brabo. Quando
ele quer dar uma de macho, ela dá uns bregues e ele fica murchinho com o rabo
entre as pernas. Por que chamam ele de corno-senão? É que ele diz que ela
apronte com ele direitinho, senão ele capa o pé-de-lã. Tudo dele é senão isso,
senão aquilo. Corno senão. Vixe! Lá vai a belezura da filha de João Pistolão,
como ela está ficando jeitosa, hem? Hum. Reboladeira, tinhosa, mulher bonita
filha de pai brabo, é a casa da peste. É mesmo, porta do inferno escancarada
chamando você pra torrar todinho. Mas olhando bem, uma mulher dessa não tem
quem não perca a cabeça e caia na esparrela, né não? Homem, seu menino, por uma
dessa eu deixaria o trubufu lá de casa na maior carreira, de nunca mais ver nem
lembrança de mim nas fotos. É um caso sério, compadre. Se é, oxe! Elas engraçam
e ficam toda manhosa e sonsa de deixar a gente doido, chamando a gente de
banguelo, ora! Ah, comigo não! Quem tiver suas éguas novas que guarde, o
garanhão aqui está pronto pra papar a primeira que der mole no saracoteado,
caiu na risada, eu saçarico sem dó nem piedade e seja lá o que Deus quiser.
Oxe, compadre, se aparecer uma rachadinha, eu meto as catanas, destá! Já
emprenhei umas e muitas. Então, compadre, a conversa está boa, mas está na hora
das obrigações. É, compadre, vamos embora que a gente não sabe o que diz nem o
que faz. Inté mais ver, inté. © Luiz Alberto Machado. Veja mais aqui.
A ILUSÃO DE SER DIFERENTE
Um ser humano é, psicologicamente, a
humanidade inteira. Ele não só a representa: ele é a totalidade da espécie
humana. Ele é essencialmente toda a psique da humanidade. Contra essa
realidade, várias culturas impuseram a ilusão de que cada ser humano é
diferente. Nessa ilusão a humanidade tem sido presa durante séculos, e essa
ilusão acabou se tornando uma realidade. Se a pessoa observar de perto toda a
estrutura psicológica de si mesma, descobrirá que, quando uma pessoa sofre,
toda a humanidade sofre em graus variados. Se você é solitário, a humanidade
inteira conhecerá essa solidão. A agonia, o ciúme, a inveja e o medo são
conhecidos de todos. Portanto, psicologicamente, interiormente, uma pessoa é
como a outra. Pode haver diferenças em termos físicos e biológicos; uma pessoa
é alta, baixa, etc., mas, basicamente, uma pessoa é o representante de toda a
humanidade. Assim, psicologicamente você é o mundo; você é responsável por toda
a humanidade, e não por si mesmo como ser humano à parte, o que é uma ilusão
psicológica... Se compreende todo o significado do fato de que uma pessoa é
psicologicamente o mundo, então a responsabilidade se torna amor irresistível.
Trecho
extraído do Letters to the Schools (1981 - vol I), do filósofo, escritor e educador indiano Jiddu Krishnamurti (1895-1986). Veja
mais aqui, aqui e aqui.
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dum bebão na teibei, A História do Brasil de Cláudio Vieira, Gênero
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democrático de Emir
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Carpeaux aqui.
O homem
ao quadrado de Leon Eliachar aqui.
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do Nitolino, Hino ao Sol de Akhenaton, a música de Kitaro, Manifesto Pau Brasil de Oswald de Andrade,
Medeia de Eurípedes, Belfagor de Nicolau Maquiavel, a poesia de Percy Bysse
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Quando
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Domingo
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Brown, a xilogravura de MS, a arte de Benedict Olorunnisomo & Paula Valéria de Andrade aqui.
&
A CABEÇA FEITA DE EDGAR
MORIN
[...] Conhecer
e pensar não significa chegar a uma verdade absolutamente curta, mas dialogar
com a incerteza. [...] O desenvolvimento de uma
democracia cognitiva só é possível com a reorganização do saber; e esta pede
uma reforma do pensamento que permita não apenas isolar para conhecer, mas
também ligar o que está isolado, e nela renasceriam, de uma nova maneira, as
noções pulverizadas pelo esmagamento disciplinar: o ser humano, a natureza, o
cosmo, a realidade [...].
Trecho extraído da obra A cabeça bem-feita: repensar a reforma,
reformar o pensamento (Bertrand Brasil,
2004), do antropólogo, sociólogo e filósofo francês Edgar
Morin. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na
Terra: a arte do fotógrafo israelense Nadav
Kander.
Recital
Musical Tataritaritatá - Fanpage.