REMEXENDO AS CATRACAS DO QUENGO E QUEIMANDO AS PESTANAS
COM COISAS, COISITAS E COISÕES!!!!!! – O que aprendi nos volteios da vida, coisas
que nem sei, coisitas que passaram, coisões que deixaram quase danos
irreparáveis. Foi, nada mais. De bom ficou o menino travesso da beira do rio
engolindo sapos, atravessando brejos e mares imensos, quase não tinha mais como
catar pra contar história. Sempre quase o menino cresceu, pintou e bordou. Fez quase
tudo: copista dos tomos e leis, bancário relapso, radialista folgazão e sorria
driblando com jeito quedas e escorregões, barreiras intransponíveis, bunda arrastada
no chão, esfolando a carne, livrando-se das lapadas, escapando aqui e acolá,
escorregando quase ileso, quase condenado, sobrevivendo e coexistindo com
desertos e infernos. Aprendeu um bocado, parece. Leitor compulsivo de horas a
fio sem bater a pestana e era nos livros o melhor de tudo. O que imaginou quase
tudo deu certo. Quase. Depois da escola caiu na vida e pras bancas retornou um
tanto de vezes para sacar o que havia dado errado. Virou mundo, conheceu muita
gente, muitas ou quase todas se foram ou deram as costas, restando alguns gatos
pingados na consideração. Parentes tudo longe ou do outro lado das coisas e do
mundo. Teve que aprender por si só: levando tudo nos peitos e na raça, do jeito
que desse. De relevante mesmo quase nada restou aqui ou ali uma coisinha que
seja. Recomeçou um tanto de vezes, ainda hoje, todo dia parte da estaca zero. Assumiu
fracassos, cônscio de sua inutilidade pro que prestasse. Bom de conversa e
serventia pra mais nadica. Falante que só o homem da cobra, até que impressionava,
mas é só: nada mais que só primeira impressão. Com o eterno retorno vai e
volta, nunca é tarde para reaprender. O que fez e o que foi feito, a mesma
coisa que não fizesse. Vale o que viveu e se aprendeu, pelo menos, parece que
leva jeito para contar hestórias. E só. Jogar conversa fora. Afinal tudo é
efêmero: a vida passa, a gente não sabe de onde veio nem pra onde vai, e o que
fica, no fim mesmo, lembranças e aprendizagens que um dia virarão cinzas e
ninguém mais nem saberá. Veja mais aqui, aqui e aqui.
DITOS
& DESDITOS –O mundo com suas regras, cada vez mais rígidas, e as
pessoas pequenas ou anãs tentando realizar um sonho. Resumindo, acho que os
problemas não são tantos, o problema é como nos imergimos neles e a sinceridade
com que os enfrentamos... O
tempo é um elemento fundamental para mim: ir, voltar, mudar, retomar… Mas estou falando de um período ativo em que muito trabalho é
feito. Gosto de pesquisas aprofundadas, não dou muito espaço para desculpas:
que ontem tive frio, que hoje estou atrasado, que não voltarei amanhã...
Procuro sempre sair desses lugares que te atolam, aquelas áreas superficiais
que costumam ser encontradas com frequência no teatro independente. Não gosto
nada desses lugares opacos. A gestão deve ser um lugar de compreensão, mas
também de promoção do trabalho com consciência... O teatro é
um compromisso constante, mobiliza, aproxima as pessoas com quem você trabalha
e longos períodos de pesquisa e busca. Preciso de tempo para desenvolver um
projeto de teatro. Pensamento da escritora, atriz e diretora
argentina Ana Katz. Veja mais aqui e aqui.
ALGUÉM
FALOU: Se não gerarmos resposta, as sacolas não ficarão tão
cheias na despensa... Pensamento da atriz e ativista estadunidense Linda
Lovelace (Linda Susan Boreman - 1949-2002), que no seu livro Ordeal
(Citadel, 2006), expressa: [...] Quando alguém precisa de ajuda, é
hora de ajudar. Não no dia seguinte. Não quando é seguro. [...] Ela
fez coisas para manter seu homem feliz. Fiz coisas para evitar que meu homem
me matasse [...] Eu era o tipo de garota que gostava de ir à
beira-mar e dar as mãos. Eu ainda estou. [...] Embora
eu tenha ficado terrivelmente decepcionada depois disso, houve um lado bom na
experiência. Quanto mais as pessoas decentes se
interessavam por mim por razões decentes, mais forte eu me tornava. [...]. A vida
dela foi uma tragédia: aos 19 anos, ela engravidou sem querer e teve o
bebê, que sua mãe repressora entregou para adoção. Pouco depois, sobreviveu a
um terrível acidente de carro. Foi aí, enquanto se recuperava do acidente, que
a deixou com um fígado em frangalhos, costelas e mandíbula quebradas, que ela
conheceu Chuck Traynor, seis anos mais velho que ela. Ela se casou outras duas
vezes e teve dois filhos, mas sempre enfrentou problemas de saúde. Em 87,
precisou fazer uma mastectomia dupla para retirar os seios, contaminados pelo
silicone que Chuck a forçou a colocar antes de Garganta. Durante a
preparação para a mastectomia, os médicos perceberam que seu fígado não dava
mais, consequência da transfusão de sangue após o acidente de carro de 69. Ela
teve que se submeter a um transplante de fígado. Um só remédio para a
não-rejeição do novo órgão custava 2,500 dólares por mês, que Linda não tinha
como pagar. Afinal, tudo que Linda havia recebido pela super bilheteria de Garganta
foi US$ 1,250 -- que foi direto pro bolso de Chuck. Sem ter como pagar as
contas, sem conseguir emprego por causa de sua fama/infâmia, Linda tentou
ganhar um pouco de dinheiro vendendo produtos referentes à Garganta,
como uma camiseta escrito "I made Linda Lovelace gag". Linda morreu
em 2002, num outro acidente de carro. Ela tinha apenas 53 anos. Veja mais aqui.
PENTIMENTO – [...] A tinta velha sobre uma tela, à
medida que envelhece, às vezes torna-se transparente. Quando isso acontece é possível, em
algumas fotos, ver os traços originais: uma árvore aparece através do vestido
de uma mulher, uma criança dá lugar a um cachorro, um grande barco não está
mais em mar aberto. Isso se chama pentimento porque o
pintor “se arrependeu”, mudou de ideia. Talvez fosse melhor dizer que a
concepção antiga, substituída por uma escolha posterior, é uma forma de ver e
depois ver novamente. Isso é tudo que quero dizer sobre as
pessoas neste livro. A tinta envelheceu e eu queria ver o
que estava lá para mim uma vez, o que está lá para mim agora. [...]. Trecho
extraído da obra Pentimento (José Olympio, 2010), da escritora estadunidense Lillian
Hellman (1905-1984). Veja mais aqui.
DOIS POEMAS - COMO UMA
NUVEM - Estou passando sem passar \como uma nuvem \Leve, tênue, insubstancial \
como uma nuvem \ Fazendo uma sombra fugaz \ como uma nuvem \ Mudando minha
solidão \ como uma nuvem \ Vaga muito branca \ como uma nuvem \ Estou passando
sem passar. ORDEM - Você tem que arrumar a casa \ lavar os azulejos vestir a
cama \ você tem que arrumar a casa \ plantar as flores de abóbora \ apagar o
rastro do mato \ procurar a música das coisas \ fazendo ordem arrumando a casa \
com as palavras para formá-las \ colocar a ordem \formar a casa \ com um
exército de palavras \ que ninguém sabe que ninguém vê \ que os gazebos estão
caindo \ temos que colocar ordem na casa \ para que o pássaro da tristeza \ vá
ao parque ou à avenida \ colocar ordem dentro de casa \ e que deixa crescer a
angústia \ cega que cresce nela quando amanhece, banha cada fenda dos cantos \ com
açúcar e sangue ímpio. Que Deus a proteja e a favor da melancolia traiçoeira do
mau-olhado e da vilania que deve ser cometida, \ ordenar, tirar o rastro, varrer
a poeira todos os dias \ limpar a casa dar a ordem que se nos derrotar \ nos
venderia a morte eterna a pena na vida matar a ordem cegar a ferida. Poema da
escritora, dramaturga e roteirista venezuelana Sônia Chocron.