DITOS & DESDITOS - Como vivemos nossas
vidas não depende, infelizmente, apenas de nós. Circunstâncias, boas ou ruins, intervêm constantemente. Uma pessoa próxima a nós morre. Uma pessoa não tão próxima de nós continua vivendo. Todas essas coisas afetam a forma como vivemos. Pensamento do escritor, roteirista e cineasta paquistanês Tariq Ali. Veja mais aqui e aqui.
ALGUÉM FALOU: Nenhum pensamento
carregava sentimentos: eu podia pensar, com calma, em coisas tristes: eram
apenas pesadas. Agora as lembranças me vinham como se eu estivesse
deitado debaixo de uma árvore e as folhas caíssem sobre mim: eu as via e me
lembrava delas porque caíram sobre mim e porque estavam sobre mim...
Pensamento do escritor
uruguaio Felisberto Hernández
(1902-1964), autor da obra Cavalo
perdido e outras histórias ( Cosac
& Naify, 2004), do qual destaco o trecho: [...] Agora se passaram alguns momentos em que a imaginação,
como um inseto da noite, saiu do quarto para recordar os sabores do verão e
voou distâncias que nem a vertigem nem a noite conhecem. Mas a imaginação também não sabe quem é a noite, quem
escolhe lugares na paisagem dentro dela, onde um escavador revira a terra da
memória e a semeia de novo. Ao mesmo tempo, alguém faz pedaços do passado aos pés da
imaginação e a imaginação escolhe às pressas com uma pequena lanterna que move,
sacode e mistura as peças e as sombras. De repente a pequena lanterna cai na terra da memória e
tudo se apaga. Então a imaginação volta a ser um inseto que voa esquecendo
as distâncias e pousa no limite do presente.[...].
OUTRAS FALAS: Somos
todos mais vaidosos de nossa sorte do que de nossos méritos. Um pessimista não
consegue nada além de surpresas agradáveis, um otimista nada além de
desagradáveis. Quem não lê não consegue pensar. Ele pode ter bons processos
mentais, mas não tem nada em que pensar. Você pode sentir pelas pessoas ou
fenômenos naturais e reagir a eles, mas eles não são ideias. Você não pode
pensar sobre eles. Quanto mais você coloca em seu cérebro, mais ele aguenta -
se você tiver um. Pensamento do escritor estadunidense Rex Stout (1886-1975). Veja mais aqui.
AS TRÊS MULHERES - [...] Não há dias verdadeiramente felizes, exceto aqueles em que a imprevidência é total. O prazer em si não é tão doce prever que é ainda mais doce não prever nada. [...] Cogitans dubito: Pensar é duvidar. Considere que desde o nosso nascimento estamos no mundo ao mesmo tempo espetáculo e espectadores, julgados e juízes, constantemente misturando a ideia do que nos convém que nossos semelhantes sejam e façam, com a do que 'convém a eles que nós ser e fazer; para que se crie em nós uma consciência da qual nos é impossível reconhecer os elementos. [...] Ninguém faz tudo o que deveria. [...] Trechos extraídos da obra (Âge d'homme, 1997), da escritora neerlandesa
DOIS AMANTES – Sonhei
estar no alto de uma pequena colina / E diante de mim abria-se o terreno,
análogo / a um jardim baldio, que a seu alvitre produzia / botões e flores.
Havia sonhadores lagos / de breu sereno e lírios de cor inocente, / flores de
açafrão e violetas rubras e brancas, / e os lilases com aparência de serpente /
mal eram vistos sobre a relva e a verde trama. / Olhos azuis de pervincas ao
sol piscavam; / havia flores pitorescas, antes incógnitas, / tingidas pela lua,
ou que do caprichoso / espírito da Natureza se sombreavam, / enquanto esta
outra bebeu a nota transitória / de um breve momento do entardecer radioso. / Folhas
de grama que em cem primaveras foram / nutridas por estrelas, primorosamente; /
e banhadas no mesmo orvalho perfumado / que a taça dos lírios enche, e que
vislumbraram / pelos raios de sol a glória de Deus, tão somente, / pois o
amanhecer não torna o Céu maculado. / Mais além, brusco, erguia-se um muro de
pedra / sob musgoso veludo. Ali fiquei, perplexo / a observar lugar tão bonito
e doce e estranho. / Enquanto me assombrava, da parte oposta a esta / chegou um
jovem, que levantou a palma num gesto / contra o sol, suas madeixas em
desarranjo / ao vento ornadas de flores; na mão levava / um cacho roxo de uvas
roliças; seus olhos / eram claros de cristal. Branco como a neve / intacta dos
montes gelados, nu ele estava./ Lábios da cor do vinho que caíra no soalho / de
alabastro; de calcedônia era sua pele. / De mim se aproximou, amáveis lábios
cindidos, / Segurou minha mão e minha boca beijou, / deu-me de comer suas uvas
e disse: “Vem, / te mostrarei imagens da vida, doce amigo, / e as sombras do
mundo. Repara desde o sul / como o espetáculo sem fim previsto vem. / E — oh! —
vi caminhar nos jardins do meu sonho / duas figuras na luz dourada da campina /
fulgurante. O que parecia lindo, risonho / e exuberante ecoava doce melodia / cujo
refrão enaltecia as damas mais galhardas / e o jovial amor de um menino e uma
menina. / Com olhos brilhantes, sobre a grama dourada / dançante, seus pés
trotavam com alegria. / Trazia nos braços um alaúde de marfim, / as cordas de
ouro como o cabelo das moças, / e cantava com voz de harmonioso clarim. / Em
volta do pescoço, três cordões de rosas. / Mas havia um colega caminhando ao
seu lado, / terno e lastimoso, com olhos esquisitos / pois eram tão
assombrosamente iluminados. / Destarte me olhou e suspirou vários suspiros / que
me comoveram. Possuía lábios rubros / feito papoulas; e suas faces eram pálidas
/ como os lírios. As mãos se crispavam em punhos, / mas vez ou outra se
rendiam. De flores da lua alva / era a sua coroa, na cor dos lábios da morte. /
Sua túnica rubra ostentava o áureo bordado / de uma grande cobra de hálito
flamejante. / Quando o vi, para ele gritei, desconsolado: / “Amável jovem,
dize-me por qual razão / andarilhas por este reino encantador / tão triste e
suspirante? Conta de antemão, / qual é teu nome?” E ele diz: “Meu nome é Amor.”
/ De imediato, o primeiro se voltou pra mim / e gritou: “Ele mente, pois
Vergonha é seu nome! / Amor sou eu, e estava habituado a neste jardim / andar
sozinho, até que ele veio sem que a noite / o invitasse. Sou a chama do amor
verdadeiro, / que mutuamente o rapaz e a moça consome.” / E diz o outro,
suspirante, “Pois como queiras, / eu sou o amor que não se atreve a dizer seu
nome. Poema do poeta e tradutor britânico Alfred Douglas (1870-1945),
poema que é referente à famosa frase de Oscar
Wilde: O amor que não ousa dizer seu
nome.