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segunda-feira, abril 21, 2025

MALALAI JOYA, SARAH HOLLAND-BATT, ESTHER GROSSI & MÁRCIA MEIRA BASTO

 

 Imagem: CoLAM – Acervo ArtLAM.

Ao som dos álbuns The Naked Violin (2008) e Elgar: Violin Concerto (2011), da violinista, recitalista e musicista de câmara inglesa Tasmin Elizabeth Little.

 

Meu coração, ave de arribação pelas pedras de Madalena... - Da beira do rio ganhei o mundo como quem nasceu na enchente às margens perdidas e o umbigo na correnteza escorresse do agreste à deriva singrando a mata pro litoral atlântico. Do que boiava ao léu, juntava ais porque não era trinta-réis-ártico ou papagaio-do-mar, ao menos um pintassilgo-goianinho ou merganso, nada, reles xexéu náufrago e o que poderia ter sido porque mergulhava incapaz do que circundava na exaltação de latitudes, na perdição longitudinal do Antártico ao Ártico. Era errante sem ter onde semear nem colher, ao sabor dos ventos e temporais, a rotação da Terra às próprias translações, o rastro cislunar, os sinais estelares pela subida de morro, descendo serras, pelas marés, correntes, quedas d’água, vicinais, torrentes e insolações. Era mas que cúmplice da hora pelas rotas migratórias, todas as precipitações no frio da barriga pelas correntes de ar, a perder de vista o prumo, o leme, a proa, a popa, o reino de nenhuma bússola ou embarcação, ao passo que nascia no dia e já era fim de tarde, alagados e pântanos no mapa da sobrevivência. Cada viagem revivia a ancestralidade e era o que me valia a resistência e adaptação pelas estações, desafios e perigos de nenhum pouso na solidão maciça, mastigando lonjuras e engolindo o país e o dia seguinte, esculpindo calendários a mudar de lugar e a cada chegada oferecia minhas vísceras ao espetáculo de partir e voltar. Em vão perscrutava as estrelas porque não havia cicerone algum às cascatas e soava o alarme para mimetizar percursos inventados. Bastava um fiapo de coragem e a jornada épica aos suspensos bocados de comoção pungente pelas demoras eclipsadas e o horror logo ali adiante: o mundo era um turbilhão e o tempo a serpente devoradora. Meus olhos choviam na aridez do mormaço e foi o bastante para que ela aparecesse com veraneio no sorriso e o cheiro das coisas, quantos sabores para quem não tinha nenhum. Era ela elevada como se chegasse da torre longínqua de Magdala, com a Pistis Sophia para que eu aprendesse a vencer a morte implacável e partilhasse talvez o que quisesse dizer às pedras conjugadas. E ela me fez beija-flor no seu êxtase de Caravaggio, mãos servidas à mesa, porque ali era-me lícito saber-me na Paranoia de Piva, no Catatau de Leminski, voleios e iterações, fadigas e alucinações, curvas e volteios, o que se dilatava e contraía, sem que precisasse saber de mais nada. Era pleno domingo no peito: um eco e aliterações de feriado na pedraria, porque nela o lugar propício, o tempo certo, o momento preciso: a plenitude da plenitude, a conclusão da conclusão. Até mais ver.

 

Jennifer Weiner: Você tem que se abrir para as possibilidades do universo... Veja mais aqui & aqui.

Jane Hawking: Minha filosofia é que enquanto há vida, há esperança. Simples assim... Veja mais aqui.

Silvia Federici: Nossa luta não terá sucesso se não reconstruirmos a sociedade... Veja mais aqui & aqui.

 

ESTA PAISAGEM DIANTE DE MIM

Imagem: CoLAM – Acervo ArtLAM.

Não é escrito, embora tenha vivido na violência. \ Primeiro a fábrica ficou de pé, silenciosa como um asilo. \ Então o mallee aniquilador com seus punhos vermelhos de flores \ e as cinzas da montanha rastejando sobre ela como uma mancha. \ Não tenho provas, mas te digo \ Antigamente havia janelas de vidro aqui, com grades. \ Elas lançam uma pequena luz listrada sobre as mulheres. \ Agora, em arbustos e vassouras amarelas, estou em uma história \ trançados e desfeitos por pulsos rígidos irlandeses. \ A corda, o vão e a lã cardada são desfiados \ assim como seus rostos e nomes. \ Londonderry, Cork, Galway, Kildare— \ enquanto eu digo as palavras elas são sugadas \ para um hemisfério na escuridão. \ Não vou presumir dizer \ o que é sofrimento ou como ele foi distribuído neste lugar. \ Não sei dizer em que ponto um corpo se rompe. \ Mas esta manhã eu vi um coelho jovem \ curvado no mato e na sombra. \ Eu vi seu rosto ferido, suas pernas finas demais para escalar, \ a crosta vermelha e rosa do olho. \ Ele havia contraído a doença \ nós trouxemos aqui para isso \ e queria um lugar tranquilo para morrer. \ E teve sorte, ou tanta sorte quanto possível. \ havia tempo e luz, os falcões e os cães \ ainda não tinham sido escritas e ainda estavam fora de vista.

Poema da premiada poeta, crítica, editora e acadêmica australiana Sarah Holland-Batt, autora de obras como Aria (2008), The Hazards (2016) e The Jaguar (2022).

 

LEVANTANDO A VOZ - [...] Não tenho medo da morte; tenho medo de permanecer em silêncio diante da injustiça. Sou jovem e quero viver. Mas digo àqueles que querem silenciar a minha voz: estou pronta, onde e quando vocês atacarem. Podem cortar a flor, mas nada pode impedir a chegada da primavera. [...]. Trecho extraído da obra Raising my Voice: The extraordinary story of the Afghan woman who dares to speak out (Ebury, 2009), da escritora e ativista afegã Malalai Joya, que no documentário Uma mulher entre senhores da guerra: a história extraordinária de uma afegã que ousou levantar a voz, ela expressa que: [...] Os direitos não são fáceis de obter e, uma vez que entendamos isso, devemos trabalhar com atenção e persistência - e nunca nos tornarmos descuidados ou preguiçosos. [...].

 

TODOS PODEM APRENDER... - [...] o principal é a dimensão social do ser humano e das aprendizagens. O fato de que a gente aprende com os outros e com o nosso Outro, porque nós somos geneticamente sociais. Mas, um segundo aspecto importante do pós-construtivismo é que a gente aprende a partir das situações, ou seja, que a aprendizagem é intrinsecamente antropológica. [...] Eu penso que um outro aspecto importante do pós-construtivismo é a questão de que não aprendemos diretamente na forma predicativa, mas que essa forma predicativa normalmente é precedida de uma forma operatória: eu sei agir, eu sei fazer coisas, mas eu não sei explicar porque eu sei fazer. [...]. Trechos da entrevista Todos podem aprender, mas não é fácil (Dossiê, 2018), concedida às professoras e pesquisadoras Nair Cristina da Silva Tuboiti e Candy Estelle Marques Laurendon, pela educadora Esther Pillar Grossi, que no livro Democracia e Educação em Tempos de Caos (Geempa, 2017), expressou que: [...] Um dos componentes para democratizar as aprendizagens, é de que aprende-se na e com a vida e que a escola precisa identificar que saberes os alunos já trazem do seu dia a dia. [...]. Essas interpretações são um dos grandes trunfos pedagógicos hoje, porque, conhecendo-se, o professor pode intervir de maneira muito direta e eficiente [...]. E na obra A teoria dos campos conceituais é algo extraordinário (Geempa, 2017), expressou que: [...] Pensar não é fácil. Exige a humildade de confrontar-se com nossas ignorâncias e a ousadia de transgredir, deixando o velho, aceito socialmente, pelo novo, elaborado pessoalmente. A primeira transgressão que um professor pós-construtivista precisa fazer é por em prática o pós-construtivismo, pois ele não é aceito ainda socialmente [...]. Veja mais aqui & aqui.

 

AMAR ELOS VERMELHOS

[...] Talvez o tempo quisesse entrar em sintonia com suas emoções. Na alma, um inverno de ventanias pressentindo chuvas. Águas que não lavariam mágoas e formariam uma correnteza, carregando o que fosse encontrando pela frente: lembranças e emoções. [...].

Trecho do conto O caminho, extraído da obra Amar elos Vermelhos (Labrador, 2024), da premiada escritora, advogada, arte-terapeuta e pesquisadora Márcia Meira Basto. Veja mais aqui.

 

ITINERARTE – COLETIVO ARTEVISTA MULTIDESBRAVADOR:

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segunda-feira, setembro 25, 2017

FAULKNER, PIVA, BOURDIEU, FUREDI, LIA CHAIA, VITOR DA FONSECA, PALHAÇOS, SOCORRO DURÁN & AMANDA DUARTE

POETASTRO METE AS CATANAS SEM ENTENDER DO RISCADO – Imagem: Xilogravura de Amanda Duarte. - Nada dava certo mesmo pras bandas do Doro, tudo gorava de choco e ele nem se emendava: partia pra outra. Dessa vez abandonou a candidatura a presidente, queira mais saber não de política, isso é lá coisa prum sujeito como eu! Que se danem! E saiu vasculhando o que danado ele ia fazer da vida dagora em diante. Perambulando pela feira, ele deu de cara com dois repentistas glosando o maior mote. Ficou de mutuca e acompanhando tudo: vamos sapecar umas parcelas? Vamos de galope à beira-mar, compadre! Agora um desafio malcriado! Uma taboada pequena, uma carretilha, um quebra cabeça, um gabinete repetido, nove palavras por seis, língua d’Angola, dez de adivinhação, coqueiro da Bahia, martelo alagoano, desmancha, rojão pernambucano, trava-língua, ligeira, oitava, dez de queixo caído, quadrão perguntado, mourão voltado, gemedeira, e de pé quebrado, chega, vamos emborcar a viola! Ele prestou atenção em tudo perdendo a noção do tempo: oxe, esses cabras não cantam nada. Vou ser o melhor cantador, ah, se vou! E foi ver os preços das violas, não tinha um tostão furado; valeu-se de duas folhas de compensado e caiu no maior teitei: agora vou me danar no dedilhado da maior violada. Nessa hora chega Robimagaiver e ele ensaia pra ele: ah, se quer ser poeta, o doutor lá do banco disse que a melhor poesia é o soneto. Gostei do nome, vou ser sonetista! Danou-se! E castigou no blem blem desafinando a goela das tripas coração. Foi, então, que cometeu uns versos, logo se achou o pencó do trupé, lascando uns cordéis desajeitados, até cair nas graças dum abastado comerciante que apadrinhou sua empreitada: publicar um livro. Vixe! O bocó cresceu os olhos misturando rimas de nenhuma métrica, decorando tudo a dizer como improviso – na verdade o pior goteira, um meia-tigela. Foi se deparar com o embolado do coco: ah, vou ser o mais afamado coquista! Não deu outra: garranchou numa tuia de folhas de papel na maior das garatujas, juntou tudo e foi ter com o mecenas que empurrou o calhamaço pruma gráfica e, tempos depois do ajustado e aprazado, estava ele com o opúsculo embaixo do sovaco, pra cima e pra baixo, todo ancho e virado da breca! Topou com uns doutores que se diziam poetas e logo estava reunido com o tabelião, o tenente, o contador e outros embecados que recitavam seus plectros e loas como se vates de calibre, bardos da melhor cepa. Falaram duma academia que ele fez de tudo para participar. A exigência era a publicação de um livro, oxe, moleza pra ele, depositou o seu na hora, nem leram, muito menos abriram uma página só que fosse e já deram por acadêmico. Dia lá de reunião, intrometeu-se no meio, viu de tudo que foi zoada e já se imaginava desfilando sobre o tapete vermelho da fama: agora esse povinho terá de me bajular porque virei especial dos especiais, todos terão que lamber o solado dos meus pés. Ufanou-se, maior venta empinada, peito estufado com ar desprezo e indiferença para todos, do Afredo esconjurá-lo por cu doce: agora só todo metido com um deus no bucho, metido a cheio das pregas. Doro nem nem, nada lhe atingia o espinhaço pronto pra desancar o primeiro que lhe aparecesse, só nos compadrios com letrados, dado a ser tal qual beletrista de respeito. Já não cumprimentava mais ninguém, só os seus doutos achegados, mais nada: essa bugrada só merece desprezo! Não me misturo mais não com essa gentinha porqueira. Destá. Era chegada a hora prele se amostrar diante de todos na academia, cobravam-no uma apresentação e não se fez de rogado: abriu a caixa dos peitos e lascou mastigado torando aço, rompendo pé-de-parede como se cantasse ciência, fugia da mira no meio do trabalho feito, mas mantinha a toada própria no maior caqueado da obrigação repetida e enrolada, até rapar a violada, esperando a paga e aplausos. Maior burburinho inquietante, quando um lá se levantou: isso é lá desgraça de coisa que se apresente, homem? Não deu, maior opróbrio, rabinho entre as pernas, Doro escafedeu-se de nunca mais dar as caras. Diziam maldizentes: bem empregado praquele desinfeliz, todo castigo pra corno é pouco! © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especiais com os álbuns Coisa mais maior de grande, Moleque Gonzaguinha & Caminhos do Coração, do cantor e compositor Luiz Gonzaga Junior – o Gonzaguinha (1945-1991); o Concerto para Violino de Bach, Chiacona Bertali & Elbo Telemann da violinista e maestro britânica Rachel Podger; Do samba e do jazz, The Man, Diamante verdadeiro e Sway com a atriz, locutora, escritora, cantora e compositora Bia Sion; e os poemas Quem transou com a Madonna no Brasil?, Nada vai apagar meu sorriso, Sexo em Moscou, 100 Vitrines & Picareta Cultural do poeta, ator e roteirista Mano Melo. Para conferir é só ligar o som e curtir.

ERA DA INCERTEZA: TERAPIA & VULNERABILIDADE -  [...] A invasão do ethos terapêutico nas outras profissões e formas de autoridade é particularmente admirável na relação com seus antigos competidores – as instituições religiosas. Recentemente, o Arcebispo de Canterbury afirmou que a terapia está substituindo o cristianismo nos países do ocidente. De acordo com o Arcebispo Carey, “Cristo, o Salvador” está se transformando em “Cristo, o conselheiro” [...] A politização da emoção emergiu como um importante tema na vida política contemporânea. A intromissão no sentimento das pessoas se tornou institucionalizado sob o presente sistema de governança terapêutica. Há pouca oposição a essa tendência e dificilmente alguma preocupação com as potenciais implicações autoritárias de um sistema de governo que tem como objetivo dizer às pessoas como devem se sentir [...]. Trechos extraídos da obra Cultura da Terapia: cultivando a vulnerabilidade em uma Era de Incerteza (Routledge,2004), do sociólogo britânico Frank Furedi, defendendo que a terapia deixa de se referir a estados mentais exóticos e problemas atípicos para se tornar comum em situações do cotidiano e encarada como um ideologia com objetivos que proporcionem uma espécie de reencantamento da experiência subjetiva, suprindo a vivência emocional com um significado especial, uma vez que o “emocionalismo” ajuda a reconstruir uma forma de espiritualidade bastante inusitado.

CAPITAL SOCIAL –[...] O capital social é o conjunto dos recursos reais ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de interconhecimento e de interreconhecimento mútuos, ou, em outros termos, à vinculação a um grupo, como o conjunto de agentes que não somente são dotados de propriedades comuns (passíveis de serem percebidas pelo observador, pelos outros e por eles mesmos), mas também que são unidos por ligações permanentes e úteis. [...] acumulação de capital cultural desde a mais tenra infância – pressuposto de uma apropriação rápida e sem esforço de todo tipo de capacidades úteis – só ocorre sem demora ou perda de tempo, naquelas famílias possuidoras de um capital cultural tão sólido que fazem com que todo o período de socialização seja, ao mesmo tempo, acumulação. Por consequência, a transmissão do capital cultural é, sem dúvida, a mais dissimulada forma de transmissão hereditária de capital. [...] Trechos de O capital social: notas provisórias, do sociólogo francês Pierre Bourdieu (1930-2002), extraído da obra Escritos de educação (Vozes, 1998), organizado por Maria Alice Nogueira e Afrânio Catani. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.

A EDUCAÇÃO, A FAMÍLIA E A ESCOLA - [...] Como a vida familiar se constitui na primeira escola de aprendizagem, os pais devem investir mais na interação mediatizada para tornar as crianças e os jovens socialmente mais hábeis. Também na escola os professores, por meio da mediatização, podem criar adultos mais solidários e mais aptos a responder aos desafios complexos da sociedade futura. Em síntese, se queremos uma sociedade mais solidária, a família e a escola tem de ser mediatizadoras. [...] Trecho da obra Pedagogia mediatizadada: transferências das estratégias para novas aprendizagens (Salesiana, 2002), do professor catedrático Vitor da Fonseca, defendendo que a mediatização é a chave do desenvolvimento social e cognitivo da espécie humana, tornando-se fundamental a aplicação da pedagogia mediatizada na família e na escola. Veja mais aqui, aqui e aqui.

PALHAÇOS & PALHAÇADAS - [...] O Palhaço é a figura cômica por excelência. Ele é a mais enlouquecida expressão da comicidade: é tragicamente cômico. Tudo que é alucinante, violento, excêntrico e absurdo é próprio do palhaço. Ele não tem nenhum compromisso com qualquer aparência de realidade. O palhaço é comicidade pura. O palhaço não é um personagem exclusivo do circo. Foi no picadeiro que ele atingiu a plenitude e finalmente assumiu o papel de protagonista. Mas o nome palhaço surgiu muito antes do chamado circo moderno. Aliás, seria melhor dizer “os nomes”. Uma das grandes dificuldades que a maioria dos autores encontra ao estudar a origem dos palhaços está na profusão de nomes que essa figura assume em cada momento e lugar. Clown, grotesco, truão, bobo, excêntrico, tony, augusto, jogral, são apenas alguns dos nomes mais comuns que usamos para nos referir a essa figura louca, capaz de provocar gargalhadas ao primeiro olhar [...] Esse nosso personagem imaginário sobreviveu a todas as catástrofes naturais, inclusive às construídas pelos homens. Esteve presente nas batalhas, nas festas e nos rituais mais sagrados, sempre cumprindo o mesmo papel: provocar o riso. [...] O palhaço é o sacerdote da besteira, das inutilidades, da bobeira... Tudo o que não tem importância lhe interessa. É corriqueira a cena em que o palhaço vai fazer alguma coisa muito séria e importante - como, por exemplo, tocar uma peça de música clássica - e acaba nos entretendo com algum detalhe absolutamente insignificante. [...] Durante milênios e até nos dias de hoje valorizamos a sabedoria e a capacidade para vencer, seja lá o que isso signifique. Por isso, a apologia do trabalho, da moderação, do equilíbrio. Grandes valores, sem dúvida, mas a vida não é só isso: existe a farra, a festa, o prazer! E assim o homem vai vivendo, equilibrando-se entre os contrários, compreendendo a necessidade de “ganhar o pão com o suor do seu rosto”, mas criando mecanismos para escapar das pressões cotidianas, reagir aos exageros dos puritanos e se contrapor à tristeza e à violência do mundo. Millôr Fernandes complementou Aristóteles dizendo que “o homem é o único animal que ri e é rindo que ele mostra o animal que é”. Pronto. A principal função do riso é nos recolocar diante da nossa mais pura essência: somos animais. Nem deuses nem semi-deuses, meras bestas tontas que comem, bebem, amam e lutam desesperadamente para sobreviver. A consciência disso é que nos faz únicos, humanos. [...] Palhaço não dá lição de moral, mas também não é amoral. Mas quem sabe a diferença? Quem conhece o limite? Acho que tudo depende do lado que escolhemos na vida e de compreender que, a todo instante, é como se um espelho aparecesse, o muro andasse, trocando os lados de lado. O que é justo num determinado momento ou situação pode ser muito injusto no momento seguinte. A Verdade nunca é absoluta, a bondade nem sempre é o melhor caminho, e por aí vão as coisas, exigindo atenção, sabedoria e um firme exercício de fidelidade aos princípios que norteiam a vida dos que escolhem ter princípios na vida. [...]. Trechos extraídos da obra Elogio da bobagem: palhaços no Brasil e no mundo (Família Bastos, 2005), da atriz, diretora de teatro e especialista em circo, Alice Viveiros de Castro.

ENQUANTO AGONIZO – [...] Foi Albert quem me contou o resto da história. Ele disse que a carroça estava parada na frente da loja de ferragens do Grummet, com as mulheres espalhadas pela rua com lenços presos ao nariz, e um bando de homens e rapazes de narizes grandes ao redor da carroça, ouvindo o xerife discutir com o homem. Era um homem alto e esguio sentado na carroça, dizendo que era uma rua pública e ele achava que tinha tanto direito como os outros, e o xerife lhe dizendo que ele teria que ir andando; as pessoas não agüentariam aquilo. Ela estava morta havia oito dias, Albert disse. Eles vinham de algum lugar lá no condado de Yoknapatawpha, tentando chegar a Jefferson com aquilo. Deve ter sido como um pedaço de queijo podre entrando num formigueiro, naquela carroça toda desconjuntada que Albert disse que o pessoal temia que de repente caísse aos pedaços antes que eles pudessem deixar a cidade, com aquele caixão feito em casa e outro sujeito com uma perna quebrada deitado num catre em cima do caixão, e o pai e um menino sentados e o xerife tentando fazê-los sair da cidade [...]. Trechos extraídos da obra Enquanto agonizo (L&PM, 2010), do escritor estadunidense e ganhador do prêmio Nobel de Literatura em 1949, William Faulkner (1897-1962). Veja mais aqui, aqui e aqui.

DOIS POEMAS DE PARANOIA - A piedade: Eu urrava nos poliedros da Justiça meu momento / abatido na extrema paliçada / os professores falavam da vontade de dominar e da / luta pela vida / as senhoras católicas são piedosas / os comunistas são piedosos / os comerciantes são piedosos / só eu não sou piedoso / se eu fosse piedoso meu sexo seria dócil e só se ergueria / aos sábados à noite / eu seria um bom filho meus colegas me chamariam / cu-de-ferro e me fariam perguntas: por que navio / bóia? por que prego afunda? / eu deixaria proliferar uma úlcera e admiraria as / estátuas de fortes dentaduras / iria a bailes onde eu não poderia levar meus amigos / pederastas ou barbudos / eu me universalizaria no senso comum e eles diriam / que tenho todas as virtudes / eu não sou piedoso / eu nunca poderei ser piedoso / meus olhos retinem e tingem-se de verde / Os arranha-céus de carniça se decompõem nos / pavimentos / os adolescentes nas escolas bufam como cadelas / asfixiadas / arcanjos de enxofre bombardeiam o horizonte através / dos meus sonhos. Boletim do mundo mágico: Meus pés sonham suspensos no Abismo / minhas cicatrizes se rasgam na pança cristalina / eu não tenho senão dois olhos vidrados e sou um órfão / havia um fluxo de flores doentes nos subúrbios / eu queria plantar um taco de snooker numa estrela fixa / na porta do bar eu estou confuso como sempre mas as / galerias do meu crânio não odeiam mais a batucada dos ossos / colégios e carros fúnebres estão desertos / pelas calçadas crescem longos delírios / punhados de esqueletos são atirados no lixo / eu penso nos escorpiões de ouro e estou contente / os luminosos cantam nos telhados / eu posso abrir os olhos para a lua aproveitar o medo das nuvens / mas o céu roxo é uma visão suprema / minha face empalidece com o álcool / eu sou uma solidão nua amarrada a um poste / fios telefônicos cruzam-se no meu esôfago / nos pavimentos isolados meus amigos constroem  / [um manequim fugitivo / meus olhos cegam minha mente racha-se de encontro a / uma calota minha alma desconjuntada passa rodando. Poemas extraídos da obra Paranóia (Massao Ohno, 1963), do poeta Roberto Piva (1937-2010).

SOCORRO DURÁN
Com a escritora, professora e acadêmica da APLE, Maria do Socorro Barros y Durán, na Biblioteca Fenelon Barreto. Veja mais aqui e aqui.

Veja mais:
A música de Gonzaguinha aqui, aqui e aqui.
A arte musical de Raquel Podger aqui e aqui
A arte de Bia Sion aqui.
A poesia e a entrevista de Mano Mélo aqui, aqui e aqui.
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A ARTE DE LIA CHAIA
A arte da artista plástica, performer, fotógrafa & multimídia Lia Chaia. Veja mais aqui.

VERA IACONELLI, RITA DOVE, CAMILLA LÄCKBERG & DEMOROU MUITO

    Imagem: Acervo ArtLAM . Ao som dos álbuns Tempo Mínimo (2019), Hoje (2021), Andar com Gil (2023) e Delia Fischer Beyond Bossa (202...