TRÍPTICO DQP – Quem
dera o seio materno... - Ao som de Pace, pace mio dio, da ópera La forza del destino (1835 – Sony, 2004),
de Giuseppe Verdi, na interpretação
da soprano italiana Anna Caterina Antonacci,. – Do outro lado do rio a paisagem idílica da mata enevoada, entre o visível e invisível,
a tarde suave e transparente na dissonância da vida, o tempo escorria na
existência e eu não sabia, memento mori. O braço da
ama-seca me levava pela beirada e das águas os peixes seguiam nossos passos:
era a infância envolvida
numa camada de algodão, não poderia jamais ser um conto de fadas, nem de heróis.
Tudo se parecia com as pinturas de Caspar David Friedrich. A saudade da mãe presente estava em todos os momentos,
sobretudo no momento de folganças entre madrinhas, tias e achegadas. Ela distante,
como sempre. E eu me via hoje na sua ausência eterna, como nas cenas de Mother and Son (Mat i syn - 1997), de Aleksandr Sokurov. Em mim o véu
dissolvia a bolha em que tudo fracassou ou foi abortado no meio das ruínas que
a turbulência adolescente jamais conseguira perceber, só na nebulosa dos
horrores recônditos, o sigilo ameaçador e o desamparo da promessa não cumprida.
O reencontro com o improvável útero em perigo nas andanças da eterna primavera
e o interstício para a queda outonal que viria depois, antes de renascer e na
hora errada, era a nossa história de amor com profundos laços emocionais, a
pietá reversa, e nunca nos vimos reclinados sobre o silêncio de nossas
distâncias, ela sempre exausta. Nunca penteei seus cabelos, nem alimentei sua
fome, muito menos a cobri com um casaco nem a tomei em meus braços, eu que fui
dependente de toda sua dedicação, mas nunca ouvi falar de amor, porque
estávamos isolados por um céu de chumbo. Foi por isso que nunca voltei para
casa depois da minha longa caminhada e só me restou o choro e a sentimento de
falta. Eu ouvia sua voz no vazio de nosso encontro silencioso como se me
recitasse um verso de Erik Axel Karlfeldt: ...tudo está esperando aqui, guardado a salvo por ti, ano
após ano, Lindas canções aos milhares; Onde você esteve, onde, onde? Nem eu sabia onde estive nem para onde vou, sei que
voo...
Contra a parede – Desamparado de sempre, seguia. Quase nem vi quando ela
surgiu como se fosse a suicida Sibel do drama Gegen
die Wand (2004), escrito e dirigido por Fatij Akm. O que sei é que era linda, muito linda, a linda atriz
turco-alemã Sibel Kekilli, para
salvar minha existência perdida de bar em bar. A salvação duma muçulmana na
minha solidão: não havia esperança alguma. Não havia clínica de recuperação e
ela fugia da opressão familiar conservadora. E nos amamos até perdermos o controle,
loucuras de amor ao chuveiro, a noite desencontrada, as manhãs torrenciais, o
amor se precipitava porque ela gritava como se fosse o Zé-Ninguém de Reich: Um protesto contra os desígnios secretos e
ignotos da peste emocional que, bem entrincheirada e em segurança, vem
capciosamente envenenando o investigador honesto e estrênuo com suas setas
ervadas... Dão-te o futuro, mas não te perguntam pelo passado. Tu és herdeiro
de um passado terrível! E eu ouvia seus gritos e morríamos juntos como se
nada mais restasse. O que seria de nós depois disso tudo, não sei, jamais
saberia: a sua estrada perdeu a minha e sequer sei por onde vai.
Mestre Nuca... – Até que me vi só novamente e sempre. Não fosse
a surpresa de dar de cara com Nuca dos Leões... sim, a arte do artesão
ceramista Mestre Nuca de Tracunhaém (Manoel Borges da Silva – 1937-2014), e
reviver a infância como se fosse aquele do engenho Pedra Furada de Nazaré da
Mata, eu do outro lado, ainda criança levada para cidade sem descobrir seu
oficio: ainda menino já fazia suas esculturas de cerâmica para vender na feira.
Enquanto eu só brincava com os presentes que me trazia o avô, enrolando
mané-gostoso, pipas, boi de barro, cavalo de pau, brinquedos tantos que me fez dizer
do estalo da esposa Maria: O leão é meu. O cabelo é dela. Havia tudo
para reviver a infância perdida na herança que ele deixou pros seus filhos
artesões, Marco de Nuca e José Guilherme. Eu nem pudera demorar no sonho, havia
muito por fazer rua estrada afora, onde nem sempre é possível chegar. Até mais
ver.
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