TIRANDO DE LETRA
– Art by Carney Griffiths - Tenho dormido
bem, sonhado muito, inclusive, de olhos abertos, mantido uma dieta saudável,
acho, pois, não abuso de açúcar ou sal; tomo umas poucas cervejas vez em quando
e isso nos finais de semana quando muito, não faço uso de droga nenhuma, nem
lícita nem ilícita – às vezes me rendo ao tabagismo e a um chazinho caseiro
desses de raízes compradas na feira e só, também me acho filho de Deus, mesmo
cônscio de que não sou santo nem pretendo ser perfeito, valha-me. Todavia,
quando acordo e boto a cara na rua, desconfio que o dia está mais parecido ao de
ontem ou mesmo anteontem e disfarçados de amanhã. Tanto é que agora sempre corro
o dedo pelo calendário e mesmo que ele siga adiante por dias, semanas, meses,
anos, não me convence ser coisa do crástino: como se o futuro fosse passado ou
o tempo estivesse parado mesmo que o dia passe pra tarde, entre pela noite
madrugada adentro e tudo seja a mesma coisa. Pode uma coisa dessas? Peraí, ou
estou ficando doido – o que não seria nenhuma novidade para mim, juro que não
tenho sanidade mental -, ou esse filme eu já vi mais de uma vez, reprises
intermináveis. Será possível? Não, não estou assistindo muita televisão, sei
que tem quem se deixe influenciar por essa caixa idiota, que ensina a todo
mundo a ser pelo menos tagarela, só diga asneiras e veja o mundo quadrado de
cabeça pra baixo com tudo às avessas. Já desliguei faz tempo. Da mesma forma,
já estou ciente que tem cérebro subutilizado apenas para tirar proveito em tudo
e em qualquer ocasião, dando sempre a impressão de que há sempre um tolo de
plantão – e esse, com certeza, sou eu, ninguém mais. A desconfiança é tanta que
quase sempre constato, por exemplo, que quando um médico resolve um problema,
cria outros tantos da gente sucumbir feito uma boceta de Pandora ambulante,
sobrecarregados de cachetes e variando pra cima e pra baixo, à procura de um
advogado que nos deixará no fim da picada e tratando-nos como um minotauro
aprisionado aos labirintos da ilegalidade, uma vez que este só arruma mais
bronca e não resolve absolutamente nada. Por isso me sinto quase frito e sem
saída, cheio de nó pelas costas, mergulhado numa onda em que o que se aprende
não vale nada e que cada um – pelo menos eu mesmo – é apenas um inútil que está
na vida só pra dar trabalho à humanidade. Estou quase certo que Deus fez o
mundo em seis dias e isso todo mundo sabe; o que não se sabia é que a partir do
sétimo dia começou a aparecer pitaqueiro até de um olho só e com um rei na
barriga para dar um retoque ali, um consertinho aqui e outros tantos pra botar
tudo abaixo segundo seu próprio juízo, fazendo gambiarras sem fim, até dar um
nó cego tão grande de deixar todo mundo nessa zona insolvente. Até os dez
mandamentos que eram vinte, hoje estão todos quebrados. E já dizia Mark Twain:
se Jesus vivesse hoje não seria cristão. Ôpa! Ou eu não estou entendendo nada
ou a coisa disparatou de vez e a gente roda e não sai do lugar. Entramos naquela
de jurar que nunca faremos de novo e que seremos mais cuidadosos da próxima
vez, isso se não se aventurar de jogar com toda força a primeira pedra no
ventilador do teto só pra ver o circo pegar fogo. Que tem gente que não se
manca, a gente está careca de saber, todos autores das boas ideias que não
funcionam e que fazem do inferno uma tolerante convivência recheada de boas
intenções com ressentimentos prontos para golpear pelas costas. O que ocorre é
que por mais seguro que se ache, há sempre alguém olhando e pronto pra dedar e
se achegar na chantagem. Estou quase com a certidão de que não existe mais boa
vontade porque todos estão ocupados em se esconder das garras da Receita e
Polícia Federais e da Justiça Eleitoral – claro, qualquer coisa que fizer pode
ser enquadrado numa dessas fabricações legais extraordinárias que se formam pelas
jurisprudências das decisões mais casuísticas. É o que deixa claro a política
no Brasil: quando não é conversa pra boi dormir, é conto do vigário - alguém
sempre sai lesado, e não é outro senão o próprio eleitor iludido e mal-pago que
se vinga contra o primeiro otário que aparecer, e passa a ocupar cargos em
qualquer instituição das três esferas e em quaisquer níveis do Poder, só para
atrapalhar a vida dos outros, quando deveriam estar atendendo numa pizzaria ou
similar, ou mesmo atrás das grades, pelo menos. Com esses, só vale o que se
exije por escrito na disfuncionalidade burocrática, em papel assinado com duas
testemunhas e passado em cartório, registrado e carimbado para que vire um
litígio de séculos. Ainda bem que não sou Shaw, mas bem que podia. Como tenho
relevado muito desaforo que não respeita a minha cidadã morenice ameríndia
afrodescendente, tiro por menos e sorrio compreensivo para dizer que a minha
indignação está pelo gogó e que não sou palito de fósforo para sair por aí
tocando fogo em tudo que é monturo. Para aliviar minhas neuras, aprecio sem
moderação a Natureza, a imensidão dos céus, as belas mulheres que passeiam, o
colorido das coisas, tudo para fazer valer que vivo e vale a pena. Quer saber? Se
a vida está um bocado indigesta e cheia de catabís, faço por onde só me
alimentar daquilo que não me cause queimores no bucho e mal-estares na caixa
dos peitos, pois aprendi que se a gente se levar muito a sério, acaba tendo um
troço e acabou-se o que era doce. Amém & amem. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja
mais aqui.
DITOS & DESDITOS:
[...] A análise da evolução da posição
socioeconômica dos negros na sociedade global, formada pela cidade de São Paulo,
mostra que a consciência étnica, representada pelo aparecimento das associações
voluntárias, é sutil e móvel em estreita relação com o desenvolvimento sócioeconômico,
ameniza-se ou expande-se segundo haja facilidade ou não para os negros ascenderem [...] Agem,
pois, os preconceitos como racíonalizaçâo da abertura ou do fechamento do mercado de
trabalho da sociedade global, em cada uma de suas camadas, mas as causas da
abertura e do fechamento não se encontram na existência ou não de
preconceitos, e sim no interior da própria sociedade global como tal que, historicamente
formada de brancos e negros, estes ocupando historicamente um nível inferior, caracterizada
economicamente como uma sociedade capitalista,desenvolve para ambos as
possibilidades de ascensão sócioeconômica, conforme as necessidades internas do
seu mercado de trabalho [...].
Trechos extraídos da obra Cultura, sociedade rural, sociedade urbana
no Brasil (EdUSP, 1978), da sociológa e premiada escritora centenária Maria Isaura Pereira de Queiróz Veja
mais abaixo.
A ARTE DE BRYCE CAMERON
A arte do artista estadunidense Bryce Cameron.
AGENDA:
Canto pá Quentá –
Mundaré, Tambor de Crioula, Guriatã, Samba de Roda & Samba de Murixaba &
muito mais na Agenda aqui.
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A professora & a festa do espalhafato, Nitolino, Antonio Skarmeta, Iberê
Camargo. Jules Michelet, Alda Lara, Isonomia & Walbert de Moura Agra, Panelas, Elis Regina, Al Di Meola, Claudia Telles & Felipe
Coelho aqui.
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Conversa de sinal, Hermilo Borba Filho, Marcel Proust, Giorgio de
Chirico, A mundialização de François Chesnais, Educação & Capitalismo de Ladislau
Dowbor, Xexéu, Culto à Mawu, Gal Costa, Chico Buarque,
Geraldo Azevedo, Caetano Veloso, Lenine, Milton Nascimento, Gilberto Gil, Alceu
Valença, Ivan Lins, Adriana Calcanhoto, Elza Soares & Maria Bethania aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
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Vassiljeva interpretando Rococó
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de Arte Cidadã. Para conferir é só ligar o som e curtir. Veja
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