40 ANOS DE TEIMOSIA PELA ARTE – Imagem:
arte do poeta & artista plástico Paulo
Profeta - Atuar na área artística não é fácil, eu que o diga. O ato de
criar e de cometer arte, indubitavelmente, são coisas pra criança traquina
mesmo, na maior peraltice. Sim, só é. Primeiro, porque é que reinando a gente
brinca, se diverte e apronta de tudo sem a menor culpa – afora as lamboradas
corretivas dos pais pra ver se a gente se emenda pra crescer feito gente
direita, de colarinho e respeito. Só o tempo dirá que a gente não tem jeito
mesmo, felizmente. Segundo, é cometendo arte que a gente aprende o quão dura
são as relações humanas, tanto pela hipocrisia social, como pela formalidade
escravocrata das relações laborais na multiplicidade complexa da ideologia
capitalista, nas incompreensões do vamos juntos quando muitos sequer têm a
mínima disposição de arredar um mínimo milímetro do lugar que se encontram
confortavelmente escorados; nos desentendimentos das múltiplas coisas que não
passam da mesma coisa dita de maneira diferente – vá entender! -; das
mesquinharias dos que se acham donos da razão com suas generosas formas de
apoiar puxando o tapete na maior cama-de-gato – quando a gente vai ver, ah,
passou batido no engodo, rá, e a cara lisa: ah, tá! Já foi! -; da gestão da
loucura do bloco do eu sozinho de todos os que aparecem parceiros se arvorando
a mudar o universo com todo mundo dentro e tome treta; enfim, somando-se todos
os prós e contras – quais prós? Só a vontade de fazer mesmo, teimosamente -, no
fim dá tudo certo porque a gente se divertiu e aprendeu que só a poesia torna a
vida suportável. Afora isso, balaio cheio de experiências e aprendizagens, com todo
mundo do contra passando na cara: coisa de doido! Nisso, falo por mim e por
todos os meus, a exemplo do poetamigo Paulo
Profeta – Paulo Menezes na certidão de nascimento -, que nem se deu conta –acho
eu - que este ano completa 40 anos que ele, sergipano de nascimento, radicou-se
em Palmares, Mata Sul de Pernambuco. E isto não é qualquer coisa, pelo menos
pra mim: a cidade ganhou mais um aliado, se poucos ou ninguém entenderam isso,
pouco importa, vale a iniciativa que ele sempre teve de somar, braços dados,
adiante sempre. Tanto é que ao chegar à cidade, logo ele passou a lecionar em
diversos colégios e na Faculdade de Formação de Professores da Mata Sul
(Famasul), iniciando, a partir disso, toda uma trajetória de teimosia,
resistência e dedicação, pois, constituiu família e além de cometer versos
noites e dias, criou seus filhos palmarenses da gema, os quais, como ele, beberam
das águas do Rio Una, e aprenderam que além de lutar pela vida, havia também de
relevar coisas e pantins, a poetar aos quatro cantos esperneando pela vida. No
ano seguinte, ele publicava o seu primeiro livro de poesias: Marcas no silêncio. Com isto demonstrava
ao que veio. Passou a participar do movimento das Noites da Cultura Palmarense, comandado por José Duran y Duran,
reunindo gente que fazia arte nas mais diferentes vertentes artísticas,
culminando com a publicação dos cadernos Nova
Caiana. Logo depois, em parceria com o poeta Felipe Maldaner, publicou em
1980, o livro Jogo Vivo e não parou
mais. A teimosia falava alto: era a sua interação com a cidade a quem dedicou
cânticos de tantos versos, cores de todos os matizes. Por conta disso, enveredou
na militância política local, resultando na publicação do livro Sindicalismo
x Repressão: a história de Zé Eduardo, o líder do maior sindicato camponês do
Brasil, um libelo sobre
as relações conflituosas entre produtores açucarocratas e camponeses dos
canaviais da região, coisas que o tempo parecia ter esquecido, mas não. Foi
mais além: atuou no Conselho
Editorial da Revista A Região e das Edições Bagaço, das quais foi membro
fundador. Engajou-se na luta do projeto desenvolvido pelo poeta e editor Juarez
Correya, por ocasião da criação da Fundação Casa da Cultura de Hermilo Borba
Filho. E, por tabela, ainda escreveu a apresentação do meu primeiro livro de
poesias, Para viver o personagem do homem,
em 1982. Com o pé sempre em Palmares, iniciou ele suas andanças Brasil afora,
até tornar-se o criador e primeiro presidente da Museu da Cidade e da Fundação
de Cultura de Serra Talhada – PE. Lá e cá, também acolá, publicava ele, em 2001,
o livro Governo de sonhos, pelas Edições Bagaço, da qual se desligara do
Conselho Editorial, reunindo prosas e poesias. Participou da antologia Poetas
do ano 2000 e foi incluído na antologia Poetas de Palmares (EdFCCHBF, 2002),
organizada por Juarez Correya. De quebra, lançou o cd Sonhos & Profecias, reunindo seus poemas de viva voz. Foi,
então, que ele resolveu realizar um sonho: a de se tornar artista plástico de
verdade, enveredando no mundo acadêmico e desenvolvendo uma atividade pictórica
figurativa. Foi mais longe com o sonho e criou o Instituto Belas Artes Vale
do Una, pelo qual desenvolve
o projeto Pintando na Praça,
atualmente na quarta edição de realização. Bem, isso não é tudo, nem será
jamais, porque a teimosia sobra e, de parceria em parceria, às vezes nem mesmo
vingadas e quase sempre, senão só às próprias expensas, ele prossegue o seu
caminho: a trajetória de quem teima que viver pode ser muito melhor para todos.
Eu acredito nisso, como acredito na força, na coragem e na abnegação de Paulo
Profeta, a quem devo todos os aplausos de pé e a gratidão de privar da sua
amizade encorajadora na promoção de realizar sonhos, provando que é possível
viver transformando esses sonhos em realidade. Aplausos! © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
AMANHÃ
Amanhã pode ser que eu
detone
Hoje não!
Estou fraca demais pra
jogar a granada
Ela poderá explodir em mim.
Amanhã talvez eu chore
Hoje não!
Eu já implodi por hoje
Meu estoque lacrimal está
em crise
Secaram num prévio sarau.
Amanhã talvez eu vá à
praia
Hoje não!
Já não há em mim Sol à
vista
Nessa noite interna tão
fria.
Amanhã talvez eu te esqueça
Hoje não!
Porque a minha ira por ti
Não me deixa te esquecer.
Mas falta pouco tempo
Para o amanhã chegar:
Fração de minutos!
Isso é só um aviso para
você
Meu amor de hoje,
De ontem
E provavelmente de vidas
passadas
Mas possivelmente não mais
de...
...amanhã.
Porque o teu hoje me deixou
claro
Que teu amanhã não me
pertence
Já que não vives nele.
Até hoje apenas! Adeus!
Poema
extraído do blog Livreto Mágico,
editado pela poeta Sylvia Beltrão - A poetisa do pavão, que é graduada em Letras pela FAMASUL, especialista em
Literatura, acadêmica da Academia Palmarense de Letras (cadeira número 29, cujo
patrono é Ezequias Pessoa de Siqueira) e autora do livro Mistura heterogênea (Livro Rápido, 2014).
A FOME & O NORDESTE - [...]
É constatando hoje a profunda verdade
contida na frase de um estadista do império britânico – “o custo da ignorância
geográfica tem sido incomensurável” -, e não querendo ser tomado de surpresa
pelos fatos históricos em seu acelerado suceder que os dirigentes do mundo de
hoje estão interessados em atualizar a sua carta do mundo e em precisar nela os
traços mais significativos destas áreas de maior tensão social onde as forças
de transformação ameaçam romper os diques das forças de contenção, alterando os
desenhos da carta atual. O Nordeste brasileiro é, sem nenhuma dúvida, uma
destas áreas. Daí o interesse do mundo em obter um,a imagem mais exata de sua
realidade social, uma imagem isenta de preconceitos e de falsas noções. Em
obter, numa palavra, uma carta atualizada da região. [...] hoje tanto se fala do Nordeste, sem se dizer
quase nada do verdadeiro Nordeste e dos seus autênticos problemas humanos.
[...] É este o nosso principal objetivo:
fazer penetrar um pouco de luz nesta densidão, embora esteja o autor certo de
que esta luz só chegará aos olhos daqueles que realmente querem enxergá-la,
porque os outros, aqueles que se negam a ver a evidencia, diante de livros como
este ficarão ainda mais cegos – cegos de raivas ou cegos de medo. Trechos
extraídos da obra Fome: um tema proibido
(CEPE, 1996), do médico,
professor catedrático, pensador, ativista político e embaixador do Brasil na
ONU, Josué de Castro (1908-1973). Veja mais aqui, aqui & aqui.
O TERRITÓRIO E O ESPAÇO - Não é raro ver-se à beira de uma estradinha
de interior um individuo que passa horas cortando a canivete um pedaço de
madeira. Daí não resultará qualquer utensílio ou objeto de arte. Apenas
fragmentos e aparas. É bem mesmo provável que não seja uma atividade regida
inteiramente pela consciência do autor, mas tã0-somente um automatismo
suscitado por uma experiência particular do espaço ou de uma temporalidade mais
lenta. No entanto, por meio desse “jogo” com essa “coisa”, cria-se um lugar,
onde se exerce uma força, uma intensidade, capaz de solicitar a ação repetida
(como num ritual de um sujeito. Pouco importa a significação ou finalidade
desse ato de desbaste da madeira. Ele se insere provavelmente numa tradição e
realiza-se, fora de qualquer intenção de sentido, numa pura tensão entre o lugar-espaço
e a força de realização. [...] O
território como patrimônio simbólico não dá lugar à abstração fetichista da
mercadoria nem à imposição poderosa de um valor humano universal, porque aponta
o tempo inteiro para a abolição ecológica da separação (sofistica) entre
natureza e cultura, para a simplicidade das condutas e dos estilos de vida e
para a alegria concreta do tempo presente. A presença do júbilo tanto na
raridade do valor de uso como no vazio da onipotente acumulação do valor de uso
como no vazio da onipotente acumulação do capital coincide com a atitude em que
conhecer implica abraçar. Trechos extraídos da obra O terreiro e a cidade: a forma social negro-brasileira (Imago/FCEB,
2002), do jornalista,
sociólogo, professor e tradutor Muniz
Sodré, tratando sobre
relação espaço e modernidade, estratégias territoriais, cidade e colonização,
um território segregado, lógica do lugar próprio, força e território, jogo como
libertação, atitude ecológica, entre outros assuntos. Veja mais aqui &
aqui.
A GLOBALIZAÇÃO & AS CIÊNCIAS SOCIAIS - Nas últimas três décadas, as interações
transnacionais conheceram uma intensificação dramática, desde a globalização
dos sistemas de produção e das transferências financeiras, à disseminação, a
uma escala mundial, de informação e imagens através dos meios de comunicação
social ou às deslocações em massa de pessoas, quer como turistas, quer como
trabalhadores migrantes ou refugiados. A extraordinária amplitude e
profundidade destas interações transnacionais levaram a que alguns autores as
vissem como ruptura em relação às anteriores formas de interações
transfronteiriças, um fenômeno novo designado por “globalização”. [...] Expressam apenas a turbulência temporária e
o caos parcial que acompanham normalmente qualquer mudanças nos sistemas
rotinizados. [...] A turbulência
inevitável e controlável para uns é vista por outros como prenuncio de rupturas
radicais. E entre estes últimos, há os que vêem perigos incontroláveis onde
outros vêem oportunidades para emancipações insuspeitáveis [...]. Trecho do
ensaio Os processo da globalização, do jurista e professor Boaventura de
Sousa Santos, extraído da
obra organizada por ele A globalização e
as ciências sociais (Cortez, 2002), tratando sobre a economia e as
migrações, mal-estar e risco social, políticas sociais, solidariedade
internacional, direito dos trabalhadores, ciência e cidadania, educação,
transnacionalização e cosmopolitismo, práticas culturais e identitárias, entre
outros. Veja mais aqui e aqui.
MINHA VIDA DE LOU SALOMÉ - Todos, alguma vez na vida, empenham-se em
começar de novo, como num renascer: tem razão a tão citada frase que chama a
puberdade de um segundo nascimento. Depois de alguns anos, quando já se
conseguiu uma adaptação ao desenrolar da existência que nos cerca, a seus
regramentos e modos de julgar que dominam, sem preâmbulo, nosso pequeno
cérebro, sobrevém-nos, de repetente, com a maturidade corporal que se aproxima,
uma força primitiva contrária de tal veemência, que é como se apenas agora
começasse a tomar forma o mundo em que a criança foi posta – desinformada,
fanática na busca da satisfação de seus desejos. [...] A pessoa que possui o poder de nos fazer crer e amar continua sendo,
para nós, no mais íntimo, o ser humano-rei, ainda que depois se torne nosso
adversário. Por isso, mesmo na consumação do amor mais normalmente orientada,
temos que perdoar o abuso de nossos exageros mútuos [...] Amando, empreendemos juntos como que
exercicios de natação com salva-vidas, fazendo com que o outro, enquanto tal,
seja o próprio mar que nos carrega. Por isso ele nos parece tão único e
precioso como a terra natal e, ao mesmo tempo, tão desconcertante e confuso
como o infinito. Nós, universo tornado consciente e por isso fragmentado, temos
que nos deter e suportar-nos reciprocamente no vaivém desse estado – temos que
consumar nossa unidade fundamental simplesmente com uma demonstração: a física,
em carne e osso. Mas a realização positiva, material, não passa de afirmação
sonora, que contrasta com o iniludível isolamento de cada um em seus limites
pessoais. E é por isso que, precisamente quando estamos empenhados no amor
anímico-espiritual, podemos sucumbir à maravilhosa ilusão de pairar no ar,
“livres do corpo”, unidos quase por cima deste [...].Trechos extraídos da
obra Minha vida (Brasiliense, 1985),
da escritora russa Lou Andreas-Salomé (1861-1937). Veja mais aqui
& aqui.
Veja
mais sobre:
&
A ARTE &
A ENTREVISTA DE PAULO PROFETA
Imagem: arte da série Nebulosas, do poeta & artista plástico Paulo Profeta. Veja a entrevista e a poesia aqui.
Imagem: arte da série Nebulosas, do poeta & artista plástico Paulo Profeta. Veja a entrevista e a poesia aqui.