quinta-feira, agosto 10, 2017

JOSUÉ DE CASTRO, LOU SALOMÉ, MUNIZ SODRÉ, BOAVENTURA, PAULO PROFETA & SYLVIA BELTRÃO!

40 ANOS DE TEIMOSIA PELA ARTE – Imagem: arte do poeta & artista plástico Paulo Profeta - Atuar na área artística não é fácil, eu que o diga. O ato de criar e de cometer arte, indubitavelmente, são coisas pra criança traquina mesmo, na maior peraltice. Sim, só é. Primeiro, porque é que reinando a gente brinca, se diverte e apronta de tudo sem a menor culpa – afora as lamboradas corretivas dos pais pra ver se a gente se emenda pra crescer feito gente direita, de colarinho e respeito. Só o tempo dirá que a gente não tem jeito mesmo, felizmente. Segundo, é cometendo arte que a gente aprende o quão dura são as relações humanas, tanto pela hipocrisia social, como pela formalidade escravocrata das relações laborais na multiplicidade complexa da ideologia capitalista, nas incompreensões do vamos juntos quando muitos sequer têm a mínima disposição de arredar um mínimo milímetro do lugar que se encontram confortavelmente escorados; nos desentendimentos das múltiplas coisas que não passam da mesma coisa dita de maneira diferente – vá entender! -; das mesquinharias dos que se acham donos da razão com suas generosas formas de apoiar puxando o tapete na maior cama-de-gato – quando a gente vai ver, ah, passou batido no engodo, rá, e a cara lisa: ah, tá! Já foi! -; da gestão da loucura do bloco do eu sozinho de todos os que aparecem parceiros se arvorando a mudar o universo com todo mundo dentro e tome treta; enfim, somando-se todos os prós e contras – quais prós? Só a vontade de fazer mesmo, teimosamente -, no fim dá tudo certo porque a gente se divertiu e aprendeu que só a poesia torna a vida suportável. Afora isso, balaio cheio de experiências e aprendizagens, com todo mundo do contra passando na cara: coisa de doido! Nisso, falo por mim e por todos os meus, a exemplo do poetamigo Paulo Profeta – Paulo Menezes na certidão de nascimento -, que nem se deu conta –acho eu - que este ano completa 40 anos que ele, sergipano de nascimento, radicou-se em Palmares, Mata Sul de Pernambuco. E isto não é qualquer coisa, pelo menos pra mim: a cidade ganhou mais um aliado, se poucos ou ninguém entenderam isso, pouco importa, vale a iniciativa que ele sempre teve de somar, braços dados, adiante sempre. Tanto é que ao chegar à cidade, logo ele passou a lecionar em diversos colégios e na Faculdade de Formação de Professores da Mata Sul (Famasul), iniciando, a partir disso, toda uma trajetória de teimosia, resistência e dedicação, pois, constituiu família e além de cometer versos noites e dias, criou seus filhos palmarenses da gema, os quais, como ele, beberam das águas do Rio Una, e aprenderam que além de lutar pela vida, havia também de relevar coisas e pantins, a poetar aos quatro cantos esperneando pela vida. No ano seguinte, ele publicava o seu primeiro livro de poesias: Marcas no silêncio. Com isto demonstrava ao que veio. Passou a participar do movimento das Noites da Cultura Palmarense, comandado por José Duran y Duran, reunindo gente que fazia arte nas mais diferentes vertentes artísticas, culminando com a publicação dos cadernos Nova Caiana. Logo depois, em parceria com o poeta Felipe Maldaner, publicou em 1980, o livro Jogo Vivo e não parou mais. A teimosia falava alto: era a sua interação com a cidade a quem dedicou cânticos de tantos versos, cores de todos os matizes. Por conta disso, enveredou na militância política local, resultando na publicação do livro Sindicalismo x Repressão: a história de Zé Eduardo, o líder do maior sindicato camponês do Brasil, um libelo sobre as relações conflituosas entre produtores açucarocratas e camponeses dos canaviais da região, coisas que o tempo parecia ter esquecido, mas não. Foi mais além: atuou no Conselho Editorial da Revista A Região e das Edições Bagaço, das quais foi membro fundador. Engajou-se na luta do projeto desenvolvido pelo poeta e editor Juarez Correya, por ocasião da criação da Fundação Casa da Cultura de Hermilo Borba Filho. E, por tabela, ainda escreveu a apresentação do meu primeiro livro de poesias, Para viver o personagem do homem, em 1982. Com o pé sempre em Palmares, iniciou ele suas andanças Brasil afora, até tornar-se o criador e primeiro presidente da Museu da Cidade e da Fundação de Cultura de Serra Talhada – PE. Lá e cá, também acolá, publicava ele, em 2001, o livro Governo de sonhos, pelas Edições Bagaço, da qual se desligara do Conselho Editorial, reunindo prosas e poesias. Participou da antologia Poetas do ano 2000 e foi incluído na antologia Poetas de Palmares (EdFCCHBF, 2002), organizada por Juarez Correya. De quebra, lançou o cd Sonhos & Profecias, reunindo seus poemas de viva voz. Foi, então, que ele resolveu realizar um sonho: a de se tornar artista plástico de verdade, enveredando no mundo acadêmico e desenvolvendo uma atividade pictórica figurativa. Foi mais longe com o sonho e criou o Instituto Belas Artes Vale do Una, pelo qual desenvolve o projeto Pintando na Praça, atualmente na quarta edição de realização. Bem, isso não é tudo, nem será jamais, porque a teimosia sobra e, de parceria em parceria, às vezes nem mesmo vingadas e quase sempre, senão só às próprias expensas, ele prossegue o seu caminho: a trajetória de quem teima que viver pode ser muito melhor para todos. Eu acredito nisso, como acredito na força, na coragem e na abnegação de Paulo Profeta, a quem devo todos os aplausos de pé e a gratidão de privar da sua amizade encorajadora na promoção de realizar sonhos, provando que é possível viver transformando esses sonhos em realidade. Aplausos! © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

AMANHÃ


Amanhã pode ser que eu detone
Hoje não!
Estou fraca demais pra jogar a granada
Ela poderá explodir em mim.

Amanhã talvez eu chore
Hoje não!
Eu já implodi por hoje
Meu estoque lacrimal está em crise
Secaram num prévio sarau.

Amanhã talvez eu vá à praia 
Hoje não! 
Já não há em mim Sol à vista
Nessa noite interna tão fria.

Amanhã talvez eu te esqueça
Hoje não!
Porque a minha ira por ti
Não me deixa te esquecer.

Mas falta pouco tempo
Para o amanhã chegar:
Fração de minutos!
Isso é só um aviso para você
Meu amor de hoje,
De ontem
E provavelmente de vidas passadas
Mas possivelmente não mais de...
...amanhã.

Porque o teu hoje me deixou claro
Que teu amanhã não me pertence
Já que não vives nele.
Até hoje apenas! Adeus!
Poema extraído do blog Livreto Mágico, editado pela poeta Sylvia Beltrão - A poetisa do pavão, que é graduada em Letras pela FAMASUL, especialista em Literatura, acadêmica da Academia Palmarense de Letras (cadeira número 29, cujo patrono é Ezequias Pessoa de Siqueira) e autora do livro Mistura heterogênea (Livro Rápido, 2014).

A FOME & O NORDESTE - [...] É constatando hoje a profunda verdade contida na frase de um estadista do império britânico – “o custo da ignorância geográfica tem sido incomensurável” -, e não querendo ser tomado de surpresa pelos fatos históricos em seu acelerado suceder que os dirigentes do mundo de hoje estão interessados em atualizar a sua carta do mundo e em precisar nela os traços mais significativos destas áreas de maior tensão social onde as forças de transformação ameaçam romper os diques das forças de contenção, alterando os desenhos da carta atual. O Nordeste brasileiro é, sem nenhuma dúvida, uma destas áreas. Daí o interesse do mundo em obter um,a imagem mais exata de sua realidade social, uma imagem isenta de preconceitos e de falsas noções. Em obter, numa palavra, uma carta atualizada da região. [...] hoje tanto se fala do Nordeste, sem se dizer quase nada do verdadeiro Nordeste e dos seus autênticos problemas humanos. [...] É este o nosso principal objetivo: fazer penetrar um pouco de luz nesta densidão, embora esteja o autor certo de que esta luz só chegará aos olhos daqueles que realmente querem enxergá-la, porque os outros, aqueles que se negam a ver a evidencia, diante de livros como este ficarão ainda mais cegos – cegos de raivas ou cegos de medo. Trechos extraídos da obra Fome: um tema proibido (CEPE, 1996), do médico, professor catedrático, pensador, ativista político e embaixador do Brasil na ONU, Josué de Castro (1908-1973). Veja mais aqui, aqui & aqui.

O TERRITÓRIO E O ESPAÇO - Não é raro ver-se à beira de uma estradinha de interior um individuo que passa horas cortando a canivete um pedaço de madeira. Daí não resultará qualquer utensílio ou objeto de arte. Apenas fragmentos e aparas. É bem mesmo provável que não seja uma atividade regida inteiramente pela consciência do autor, mas tã0-somente um automatismo suscitado por uma experiência particular do espaço ou de uma temporalidade mais lenta. No entanto, por meio desse “jogo” com essa “coisa”, cria-se um lugar, onde se exerce uma força, uma intensidade, capaz de solicitar a ação repetida (como num ritual de um sujeito. Pouco importa a significação ou finalidade desse ato de desbaste da madeira. Ele se insere provavelmente numa tradição e realiza-se, fora de qualquer intenção de sentido, numa pura tensão entre o lugar-espaço e a força de realização. [...] O território como patrimônio simbólico não dá lugar à abstração fetichista da mercadoria nem à imposição poderosa de um valor humano universal, porque aponta o tempo inteiro para a abolição ecológica da separação (sofistica) entre natureza e cultura, para a simplicidade das condutas e dos estilos de vida e para a alegria concreta do tempo presente. A presença do júbilo tanto na raridade do valor de uso como no vazio da onipotente acumulação do valor de uso como no vazio da onipotente acumulação do capital coincide com a atitude em que conhecer implica abraçar. Trechos extraídos da obra O terreiro e a cidade: a forma social negro-brasileira (Imago/FCEB, 2002), do jornalista, sociólogo, professor e tradutor Muniz Sodré, tratando sobre relação espaço e modernidade, estratégias territoriais, cidade e colonização, um território segregado, lógica do lugar próprio, força e território, jogo como libertação, atitude ecológica, entre outros assuntos. Veja mais aqui & aqui.

A GLOBALIZAÇÃO & AS CIÊNCIAS SOCIAIS - Nas últimas três décadas, as interações transnacionais conheceram uma intensificação dramática, desde a globalização dos sistemas de produção e das transferências financeiras, à disseminação, a uma escala mundial, de informação e imagens através dos meios de comunicação social ou às deslocações em massa de pessoas, quer como turistas, quer como trabalhadores migrantes ou refugiados. A extraordinária amplitude e profundidade destas interações transnacionais levaram a que alguns autores as vissem como ruptura em relação às anteriores formas de interações transfronteiriças, um fenômeno novo designado por “globalização”. [...] Expressam apenas a turbulência temporária e o caos parcial que acompanham normalmente qualquer mudanças nos sistemas rotinizados. [...] A turbulência inevitável e controlável para uns é vista por outros como prenuncio de rupturas radicais. E entre estes últimos, há os que vêem perigos incontroláveis onde outros vêem oportunidades para emancipações insuspeitáveis [...]. Trecho do ensaio Os processo da globalização, do jurista e professor Boaventura de Sousa Santos, extraído da obra organizada por ele A globalização e as ciências sociais (Cortez, 2002), tratando sobre a economia e as migrações, mal-estar e risco social, políticas sociais, solidariedade internacional, direito dos trabalhadores, ciência e cidadania, educação, transnacionalização e cosmopolitismo, práticas culturais e identitárias, entre outros. Veja mais aqui e aqui.

MINHA VIDA DE LOU SALOMÉ - Todos, alguma vez na vida, empenham-se em começar de novo, como num renascer: tem razão a tão citada frase que chama a puberdade de um segundo nascimento. Depois de alguns anos, quando já se conseguiu uma adaptação ao desenrolar da existência que nos cerca, a seus regramentos e modos de julgar que dominam, sem preâmbulo, nosso pequeno cérebro, sobrevém-nos, de repetente, com a maturidade corporal que se aproxima, uma força primitiva contrária de tal veemência, que é como se apenas agora começasse a tomar forma o mundo em que a criança foi posta – desinformada, fanática na busca da satisfação de seus desejos. [...] A pessoa que possui o poder de nos fazer crer e amar continua sendo, para nós, no mais íntimo, o ser humano-rei, ainda que depois se torne nosso adversário. Por isso, mesmo na consumação do amor mais normalmente orientada, temos que perdoar o abuso de nossos exageros mútuos [...] Amando, empreendemos juntos como que exercicios de natação com salva-vidas, fazendo com que o outro, enquanto tal, seja o próprio mar que nos carrega. Por isso ele nos parece tão único e precioso como a terra natal e, ao mesmo tempo, tão desconcertante e confuso como o infinito. Nós, universo tornado consciente e por isso fragmentado, temos que nos deter e suportar-nos reciprocamente no vaivém desse estado – temos que consumar nossa unidade fundamental simplesmente com uma demonstração: a física, em carne e osso. Mas a realização positiva, material, não passa de afirmação sonora, que contrasta com o iniludível isolamento de cada um em seus limites pessoais. E é por isso que, precisamente quando estamos empenhados no amor anímico-espiritual, podemos sucumbir à maravilhosa ilusão de pairar no ar, “livres do corpo”, unidos quase por cima deste [...].Trechos extraídos da obra Minha vida (Brasiliense, 1985), da escritora russa Lou Andreas-Salomé (1861-1937). Veja mais aqui & aqui.

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A ARTE & A ENTREVISTA DE PAULO PROFETA
Imagem: arte da série Nebulosas, do poeta & artista plástico Paulo Profeta. Veja a entrevista e a poesia aqui.