sexta-feira, agosto 11, 2017

SARAMAGO, FRITJOF CAPRA, HERMILO, INCLUSÃO, ENTRE VERSOS, FLÁVIO MIRANDA & VILMAR CARVALHO

BRINCANDO DE MORRER – Zé-Corninho deu uma banguela na vida e logo engatou primeira numa paixonite nova pra cima duma reboculosa que revirou o seu quengo de pernas pro ar. Oxe, o cabra amorcegou as abundâncias colossais da distinta, de quase vê o tampo voar de tanto alvoroçamento da gamação. Coisa mais parecida com a primeira vez, abestalhado de ficar com os bicos dos beiços às beijocas pra ela. Coitado, logo ele já casado e ajuntado de muitas mancebias tortas e desajeitadas, o que tinha de tapeado na leseira de corno, tinha de bruguelo chamando pai prali e pracolá, douto de safadeza, sobrecarregado de todo tipo de moléstia, fosse blenorragia, gonorréia, cancro, abscessos nos testículos, afora furúnculos e perebas a fole distribuídas a granel do pau da venta ao solado dos pés, coisa de fazê-lo já inoculado para se remediar. Mas lá estava ele no cangote dela, quando, na horagá, o cabra começou a deslizar o disco de embreagem, envernizou e não deu prosseguimento, coisa de incapaz de cumprir seu dever. A mulher abusou-se, chamou na grande e reclamou como é que é. O cara lá, em cima no maior impado, dela perder a paciência e cuspir: ou fode, ou sai de cima! A coisa engrossou dela sair virada na pata choca, ele todo macambúzio, desconfiado e sacando todo mundo só de esguelha pra banda dele. Sai pra lá comboio de enxeridos, sou homem muito machão. Hummmm. Ainda dou no couro, magote de fresco. Hummmm. Um mês, dois, os familiares dela: e aí, quando vai aparecer o neto? Seis meses, um ano, como é, esse neto sai ou não sai? Ih! Pra emprenhar, mô fio, tem que dá umas três peiadas boa por dia. Ou você virou gala rala, hem? Sei não... a desconfiança já andava na geral. Ah, está caiando, é? Vem cá, desgraçado, você tocou na intimidade de mulher menstruada, foi? Se tocou, está impuro, aí nem Jesus do céu que dará jeito nocê, meu amigo. Que nada! Tenho certeza que isso é coisa da mulher, ela nunca me cheirou bem, toda avançadinha! Esse negócio de trabalhar, não dá pra mim, todas são muito donas do nariz e isso é meio caminho andado pra dor de cabeça e pro trupé dar errado. Vá ver, é isso mesmo. Como dizia minha mãe: a boa mesmo, pra valer, tem que se sujeitar ao marido, senão vira titia, uma vitalina de ninguém querer nem pra brincar. Já dizia Catão: mulher é um animal teimoso e descontrolado, tem partes com o diabo, tem que ser mantida na rédea curta, ali, no certinho e apurado, caqueou, pau no lombo ou deixa pra lá que serve mais não. Além do mais, mulher que não embucha, não presta! Mulher pra mim tem que ser virtuosa, casta e sensata. Mas me diga uma coisa: era virgem? Sangrou? É aquela é? Aquilo é um súcubo! Cruz-credo! Pior que Xantipa! Os pecados daquilo não tem penitência, chicoteado ou autoflagelo que dê jeito! Ligue pr’ele não, isso gosta de enredar, vá me conte. Sim? Ah, meu amigo, tome garrafada de melancia triturada com leite de mulher parida de filho homem. Dê pra ela também, se ela vomitar, conceberá; se arrotar, aí, meu, só com outro serviço que esse gorou. E onde achar leite de mulher parida numa hora dessas, hem? Tô frito! O negócio é sério, olhe só: coloque sementes de trigo e cevada em bolsos separados e depois mande a mulher passar nas partes pudendas dela. O que? Isso mesmo, lá nela. Se dois dias depois germinar, ela dará à luz. É tiro e queda. E se o trigo brotar, é menino; cevada, menina. Danou-se! Nem reza forte, despacho, mesa branca, catimbó dos brabos, cueca na caçola pela encruzilhada, não havia jeito. Quando alinhou as ideias, foi providenciar solução definitiva: Ah, doutor Zé Gulu, o senhor que sabe de tudo, pelo amor de Deus, me alumia que estou todo entronchado numa quizília que não tem mais fim. O que já tomei de cachete, chá de todo tipo de coisa que presta e imprestável, já tive troço e num só dia tive dois infartos, afora outros três que quase me mata de morte morrida assim no desassossego. O que o senhor me diz, hem, doutor? Zé-Corminho, se assunte, você tá brincando de morrer, desgraçado? Parece né, doutor? Tome tento, seu menino, isso é lá coisa que se faça! Pois é, doutor, eu não durmo mais, é um azucrinamento dos infernos no meu juízo, passou a fome, num cago mais, mijar até esqueci, estou encruado, enturido e com todo mundo dando pitaco na minha vida, sem falar na desgraçada da mulher assanhada como a praga a praguejar porque o brinquedo aqui não quer dar sinal de vida pra banda dela, como posso com tudo me azoando, me diga, como posso? Ou você manda tudo pra puta que pariu ou vai morrer de tanto azuretamento! Juízo, moço. Sorria, penteie as gaias e vá ser feliz, se puder. Segura a onda, Zé-Corninho, senão o pencó pega e aí babau! © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.


Com o Diretor da Pública Municipal Fenelon Barreto, João Paulo e alunos da Escola de Referência em Ensino Médio (EREM) João Vicente de Queiroz – Água Preta – PE, conversando sobre Hermilo Borba Filho.

POR UMA PALMARES SEM TRABALHO INFANTIL - Quanto mais oportunidade o aluno tiver de ouvir, ver, sentir e escrever, maior será o seu repertório e a sua sensibilidade para compreender o mundo em que vive. Essas produções, sejam elas um poema, um conto de fadas com príncipes, princesas e castelos, uma noticia de jornal, uma reportagem, uma prosa, etc., são experiências fundamentais par a formação do leitor, base para o exercício da cidadania e também para a construção de valores indispensáveis para a vida em sociedade. Ao relembrar Paulo Freire, que nos chamou atenção para a “leitura do mundo”, que antecede a leitura da palavra, podemos afirmar que é por meio da linguagem que o indivíduo reconhece os significados da cultura em que vive, estabelece relações entre as informações e constrói sentido para si e para o mundo [...]. Trecho da apresentação escrita pelo Professor Flavio Miranda de Oliveira para o livro Por uma Palmares sem trabalho infantil: coletânia de poesias de crianças e adolescentes (Instituto Brasileiro Pró-Cidadania/Tenda da Cidadania, 2015).

A TEIA DA VIDA - [...] Defrontamo-nos com toda uma série de problemas globais que estão danificando a biosfera e a vida humana de uma maneira alarmante, e que pode logo se tornar irreversível. Temos ampla documentação a respeito da extensão e da importância desses problemas. Quanto mais estudamos os principais problemas de nossa época, mais somos levados a perceber que eles não podem ser entendidos isoladamente. São problemas sistêmicos, o que significa que estão interligados e são interdependentes. Por exemplo, somente será possível estabilizar a população quando a pobreza for reduzida em âmbito mundial. A extinção de espécies animais e vegetais numa escala massiva continuará enquanto o Hemisfério Meridional estiver sob o fardo de enormes dívidas. A escassez dos recursos e a degradação do meio ambiente combinam-se com populações em rápida expansão, o que leva ao colapso das comunidades locais e à violência sistêmica e tribal que se tornou a característica mais importante da era pós-guerra fria. Em última análise, esses problemas precisam ser vistos, exatamente, como diferentes facetas de uma única crise, que é, em grande medida, uma crise de percepção. Ela deriva do fato de que a maioria de nós, e em especial nossas grandes instituições sociais, concordam com os conceitos de uma visão de mundo obsoleta, uma percepção da realidade inadequada para lidarmos com nosso mundo superpovoado e globalmente interligado. Há soluções para os principais problemas de nosso tempo, algumas delas até mesmo simples. Mas requerem uma mudança radical em nossas percepções, no nosso pensamento e nos nossos valores. E, de fato, estamos agora no princípio dessa mudança fundamental de visão do mundo na ciência e na sociedade, uma mudança de paradigma tão radical como o foi a revolução copernicana. Porém, essa compreensão ainda não despontou entre a maioria dos nossos líderes políticos. O reconhecimento de que é necessária uma profunda mudança de percepção e de pensamento para garantir a nossa sobrevivência ainda não atingiu a maioria dos líderes das nossas corporações, nem os administradores e os professores das nossas grandes universidades. [...] Nos ecossistemas, a complexidade da rede é uma consequência da sua biodiversidade e, desse modo, uma comunidade ecológica diversificada é uma comunidade elástica. Nas comunidades humanas, a diversidade étnica e cultural pode desempenhar o mesmo papel. Diversidade significa muitas relações diferentes, muitas abordagens diferentes do mesmo problema. Uma comunidade diversificada é uma comunidade elástica, capaz de se adaptar a situações mutáveis. No entanto, a diversidade só será uma vantagem estratégica se houver uma comunidade realmente vibrante, sustentada por uma teia de relações. Se a comunidade estiver fragmentada em grupos e em indivíduos isolados, a diversidade poderá, facilmente, tornar-se uma fonte de preconceitos e de atrito. Porém, se a comunidade estiver ciente da interdependência de todos os seus membros, a diversidade enriquecerá todas as relações e, desse modo, enriquecerá a comunidade como um todo, bem como cada um dos seus membros. Nessa comunidade, as informações e as idéias fluem livremente por toda a rede, e a diversidade de interpretações e de estilos de aprendizagem - até mesmo a diversidade de erros - enriquecerá toda a comunidade. São estes, então, alguns dos princípios básicos da ecologia - interdependência, reciclagem, parceria, flexibilidade, diversidade e, como consequência de todos estes, sustentabilidade. À medida que o nosso século se aproxima do seu término, e que nos aproximamos de um novo milênio, a sobrevivência da humanidade dependerá de nossa alfabetização ecológica, da nossa capacidade para entender esses princípios da ecologia e viver em conformidade com eles. Trechos extraídos do livro A teia da vida: uma nova compreensão científico dos sistemas vivos (Cultrix, 1996), do físico e escritor austríaco Fritjof Capra. Veja mais aqui e aqui.

INCLUSÃO E TRANSVERSALIDADE - [...] Ao falarmos de inclusão social, portanto, não estaremos nunca nos referindo apenas a um dos lados desta moeda de inestimável valor. A inclusão é dirigida a todos – abolidos aí os “normais” e os “diferentes”. A inclusão é direcionada aos seres humanos. Até porque, os denominados “normais” e “diferentes” possuem os mesmos direitos perante a sociedade, catalogados por leis e declarações universais. Mas a inclusão, como todas as transformações sociais em torno dos direitos humanos que ganharam corpo principalmente a partir da segunda metade do século XX, não pode ser assimilada e assegurada apenas por fatores externos. Ela deve nascer da conscientização, da mobilização e da sensibilização de cada um. Então, o primeiro passo é dentro de nós mesmos. E começa pelo questionamento do que consideramos normal e diferente, para chegarmos ao essencial – o ser humano. Trecho extraído da obra Transversalidade e inclusão: desafios para o educador (Senac, 2009), organizado por Nely Wyse Abaurre, Mônica Armon Serrão et al. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

ECONOMIA DO BRASIL - [...] O Brasil estará incluído, como não podia deixar de ser, entre as vítimas dessa brusca reviravolta da conjuntura internacional. Vã0-lhe faltar os recursos suficientes de créditos e inversões externas que vinham estimulando e assegurando o processamento normal de suas atividades econômicas. E o pais se verá na iminência de situação gravíssima, de conseqüências finais ainda imprevisíveis, mas que começam a despontar e de que já estamos sofrendo o antegosto. Será o resultado de uma inconseqüente política econômica – em termos das reais necessidades do país e da massa de seu povo – que iludida com as facilidades proporcionadas pelo abundante afluxo de recursos externos que uma conjuntura internacional muito mais especulativa que outra coisa qualquer tinha determinado, julgou – ou quis julgar, preferivelmente – que o Brasil entrara em nova etapa de sua evolução econômica, um take-of rostoviano, isto é, a decolagem descrita nos textos ortodoxos da teoria econômica, que em breve período elevaria o país à categoria de grande potência.... A dependência em que se encontrava e se encontra ainda o funcionamento normal da economia, tal como se acha estruturada, do financiamento do exterior, já não para alcançar qualquer coisa que mesmo longinquamente se assemelhe aos enganadores índices especulativa e artificialmente atingidos nestes últimos anos – pois isso nem pode entrar em cogitação -, mas simplesmente para subsistir normalmente, uma tal dependência do financiamento externo pode-se avaliar pela maneira como vem evoluindo e a situação a que chegaram nossas contas externas [...]. Trecho extraído da obra História econômica do Brasil (Brasiliense, 1979), do advogado, historiador, geógrafo, escritor, político e editor Caio Prado Junior (1907-1990). Veja mais aqui.

ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA – [...] Estavam muito perto do supermercado, em algum destes sítios se deixou ela cair, a chorar, naquele dia em que se viu perdida, grotescamente ajoujada ao peso de sacos de plástico por fortuna cheios, valeu-lhe um cão para a consolar do desnorte e da angustia, este mesmo que aqui vai rosnando às matilhas que se chegam demasiado, como se estivesse a avisá-las, A mim não me enganam vocês, afastem-se para lá. Uma rua à esquerda, outra à direita, e a porta do supermercado aparece. Só a porta, isto é, está a porta, está o edifício todo, mas o que não se vê são pessoas a entrar e sair, aquele formigueiro de gente que a todas as horas encontramos nestes estabelecimentos, que vivem do concurso das grandes multidões. [...]. Trecho extraído da obra Ensaio sobre a cegueira (Companhia das Letras, 1995), do escritor, teatrólogo, jornalista e dramaturgo português José Saramago (1922-2010). Veja mais aqui, aqui & aqui.

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PALMARES
 
Traça o tempo no teu rosto
esta ruga : velhos engenhos,
casarões e ruas são as marcas
da tua história centenária,
louvada incessantemente
por quem te vê,
pelo ângulo de teu suor e sangue,
pelo mistério de tuas entranhas
e simplicidade.
Soturna, tua voz grita de repente,
como num repente de viola,
a sábia rima popular.
Refugia-se o folclore
nas mãos estigmadas
de quem te faz continuar,
quando cultiva fazendo florescer,
quando da navalha busca a doçura
neste ofício tão anônimo
que alimenta tuas raízes mais profundas!
És teu próprio canto.
És tua própria poesia.
Tua rima mais concisa.
Tua consciência.
Teu povo mantendo,
nesta ruga do tempo,
a marca talvez triste,
mas legítima, pois se eterniza
no açúcar que tudo te custa :
paisagens, almas e crenças !
Poema do escritor e professor Vilmar Carvalho, autor dos livros Escritos: história, literatura e cultura letrada (Scortecci, 2008), Bordel Barroco: alegoria de Epicuro Soares (Bagaço, 2011), Letrados e ufanos: história do Club Litterario de Palmares 1882-1910 (Bagaço, 2011), O poeta que virou estante (Bagaço, 2011), entre outras obras, editor do blog História, prosa e poesia. Veja mais aqui & aqui.

ENTRE VERSO DE LUCIAH LOPEZ
Também neste sábado, 12/08, das 15 às 17hs, no Solar do Barão, lançamento do livro Entre Versos: a palavra branca é nua, da poeta, artista visual & blogueira Luciah Lopez, no sarau Café, poesia & canção, de Siomara Reis, em Curitiba - PR. Veja mais aqui & aqui.