quarta-feira, julho 05, 2017

JEAN COCTEAU, EGBERTO GISMONTI, ESCULTURA DE TEIXEIRA, GIL LOPES & VIVER É TÃO POUCO, É PRECISO SONHAR!

VIVER É TÃO POUCO, É PRECISO SONHAR - Imagem: Despertares, do artista plástico e professor português Gil Teixeira Lopes. - Ao espelho, à primeira vista, sou eu. Sim, sou eu, talqualmente sou agora. Olho melhor: será? Não, não sou eu, mas o que restou de mim. O que realmente sou ficou na infância, quando eu me via sorridente, olhos vivos, coração livre brincando de tudo. Precoce, não perdi de todo a infância, escondi apenas. Fui tragado pela pressa no desejo urgente de viver, malgrado eu sequer soubesse o que era o verdadeiro viver. Impaciente, construí sonhos e neles mergulhei para saber o doce e o amargo. Adolesci rápido e nela fiquei até quase maturidade provecta, indiferente a tudo. Tinha pra mim, lá pelos quinze ou dezesseis anos, que não passaria dos trinta, hoje quase ao dobro da idade. Obstinei-me aos meus propósitos, olvidando prescrições, rótulos, modas, um xexéu metido à besta. Por conta disso, sucumbi trocentas e reiteradas vezes. Aprendi a renascer das cinzas, movido pela determinação. Enfrentei apupos, reprovações. Na lona, recuperava o fôlego e vestia outras máscaras, tantos recomeços, outras feições. Até certo ponto desempenhava bem o papel imposto, enquadrado, contudo, chegava a hora em que das tripas coração não segurava mais, tudo pelos ares, viva sede de libertadade. Tantas quedas, recorrentes fracassos, de meter as mãos pelas pernas surfando pelos catombos, até findar estatelado em palpos de aranhas – todas elas insaciáveis prontas pra me devorar e eu gostando -, soprando os arranhões na epiderme dilacerada. Aprendia e reaprendia, não era nada do que pensava ou previa, estava redondamente enganado, como de costume. Encarei torpezas e astuciosas malandrices, não caí do cavalo, fazia às vezes na regra três, sem sujar as mãos. Às vezes, senão muitas, amarrava o bode entre o cuidado de evitar e o horror de sofrer. Como não investia dolosamente contra nada nem ninguém, perdia a parada e até me regozijava com isso, a consciência tranquila de nunca ter tentado contra quem quer que fosse. Pronto, partia pra outra, confiança no taco, batendo no peito a força da munheca, sem esmorecer jamais, mesmo quando não tinha nada mais além que o chão pra me cobrir. Até chegar diante do espelho com os meus muitos eus em mim mesmo, do que sonha ao que aterrissa na marra, pela força das circunstãncias. Ao me enfurecer, a lição de La Fontaine: paciência e tempo. Ao me deprimir saía à cata de portas abertas, mesmo que todas estivessem fechadas, braços abertos pra indiferença e dissimulações, compreensão diante da impaciência, uma lição aprendida de Kafka depois de perder o meu paraíso e não mais poder voltar. Havia o resquício da infância escondida e ao espelho a constatação: reduzi-me a sonhos, como todo passado, falando sozinho, pras paredes. Aprendi o visinvisível e me entendo no imprevisível e fora da lógica. No espelho o que sou e não, da lua, meta onírica; da alma, a vida, viver é tão pouco, é preciso sonhar e sempre. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

A DIFICULDADE DE SER DE JEAN COCTEAU
[...] Eu já passei dos cinquenta anos. Isso quer dizer que a morte não deve demorar a me encontrar. O teatro da vida está bem avançado e me restam poucas falas. Se olho à minha volta, no que me concerne, descubro somente lendas que sustentariam uma colher na vertical. Evito colocar o pé ali para não ficar preso nessa matéria viscosa. [...] não vejo nada que me reflita (quero dizer, que desvende a minha figura). Não encontro a mínima tentativa de separar o verdadeiro do falso, nem no elogio, nem na reprovação. [...] O excesso de tormentas internas, de sofrimentos, de crises de dúvida, de revoltas submetidas à força do punho, de bofetadas do destino me franziu a testa, cavou entre minhas sobrancelhas uma ruga profunda, entortou essas mesmas sobrancelhas, provocou dobras pesadas nas minhas pálpebras, amoleceu as minhas já cavadas bochechas, abaixou os cantos da minha boca, de tal modo que se eu me curvo sobre um espelho baixo, eu vejo minha máscara se desprender do osso e tomar uma forma informe. Minha barba nasce branca. Meus cabelos, perdendo a espessura, guardaram sua revolta. Disso resulta um buquê de mechas que se contradizem e não podem ser penteadas. Se elas se achatam me dão uma aparência horrível. Se elas se arrepiam, esse penteado desarrumado parece ser o sinal de uma afetação. [...].
Trechos da obra A dificuldade de ser (Autêntica, 2015), do escritor, cineasta, dramaturgo, desenhista e ator surrealista francês, Jean Cocteau (1889-1963), uma autobiografia – livro-testamento - sobre a dificuldade de estar no mundo cheio de fronteiras, regras e compartimentos, definindo-se por uma atividade múltipla que conjugou os novos e velhos códigos verbais, linguagem de encenação e tecnologias do modernismo para criação do paradoxo: um avant-garde clássico, trasnformando tudo em arte, desde a conversa frívola, o sonho, o riso, a beleza, a juventude, a amizade, os costumes, a responsabilidade, a leitura, o trabalho, as casas assombradas, a infância e a dor, a vida e a morte. Veja mais aqui e aqui.

Veja mais sobre:
Solilóquio das horas agudas, O mito de Sísifo de Albert Camus, Doença sagrada de Hipócrates, a música de Meg, Neurofilosofia e Neurociência Cognitiva, a pintura de José Manuel Merello & a arte de Luciah Lopez aqui.

E mais:
Cantarau Tataritaritatá, Mulher & criança de Candido Portinari, a música de Bach & Wanda Landowska, O vir-a-ser contínuo de Heráclito de Êfeso, A estrada morta de Mia Couto, Das casas e homens de Adolfo Casais Monteiro, Maria Peregrina de Luis Alberto Abreu, Quebra de xangô de Siloé Soares de Amorim, a pintura de Vicente do Rego Monteiro, Brincarte do Nitolino, a arte de Vlado Lima & Luciano Tasso aqui.
O sangue de um poeta de Jean Cocteau, a arte de Elizabteh Lee Miller, a música de Márcia Novo & Felipe Cerquize aqui.
A varanda na noite do amor aqui.
Proezas do Biritoaldo aqui.
O pós-moderno de Jean-François Lyotard, Decamerão de Giovani Boccaccio, Auto da Compadecida de Ariano Suassuna, a música de Ivan Lins, Erica Beatriz & Quasar Cia de Dança, a fotografia de Michael Helms, a  pintura de Julius Schrader, a poesia de Leila Miccolis & Programa Tataritaritatá aqui.
Tlön, Uqbar, Orbis Tertius de Jorge Luis Borges aqui.
Brincarte do Nitolino, A lógica do tomemismo & da história de Roberto DaMatta, a poesia de Fichte, A estética do teatro de Redondo Junior, a música de Igor Stravinski, o cinema de Laurent Cantet & François Bégadeau, a pintura de Aldo Bonadei, a gravura de Maurits Escher & a xilogravura de MS - Marcelo Alves Soares aqui.
Vamos aprumar a conversa: Desnorteio, A ideologia & a técnica e a ciência de Jürgen Habermas, Arte & condição mulher de Ana de Castro Osório, o cinema de David Lynch, a escultura de Bartolomeu Ammanati, Hora aberta de Gilberto Mendonças Teles, a Carta de amor de Maria Bethânia, a pintura de Joseph-Marie Vien, a arte de Arlete Salles & Isabella Rosselini aqui.
O aperto que virou vexame trágico, As estratégias sensíveis de Muniz Sodré, a poesia de Sophia de Mello Breyner Andresen, Tecnologias & memória de Maria Cristina Franco Ferraz, a pintura de William Mulready & Ângelo Hasse, a fotografia de Alexander Yakovlev, a arte de Doris Savard, a música de Asaph Eleutério, Ricardo Loureiro & Estrada 55 aqui.
Quando ela dança tangará no céu azul do amor, A condição pós-moderna de Jean-François Lyotard, Estética da desaparição de Paul Virilio, a música de Anna-Sophia Mutter, a pintura de Eloir Junior & Alex Alemany, a arte de David Peterson, Luciah Lopez, Isabel Furini & Carlos Zemek aqui.
Elucubrações das horas corridas, O pensamento comunicacional de Bernard Miège, O outro por si mesmo de Jean Baudrillard, a coreografia de Doris Uhlich, a gravura de Edilson Viriato, a pintura de David Lynch & Vicente Romero Redondo, a música de Sarah Brasil, Meu delírio de Érica Christiê, a arte de Efigênia Rolim & Sandra Hiromoto aqui.
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ESCULTURAS DE TEXEIRA LOPES
A arte do escultor português Texeira Lopes (1866-1942).

RÁDIO TATARITARITATÁ: EGBERTO GISMONTI
Hoje é dia do especial do compositor, arranjador, cantor & multinstrumentista Egberto Gismonti, reunindo seus álbuns Em família (1981), Circense (1980), Trem Caipira (1985), Feixe de Luz: todo começo é involuntário (1988), Corações Futuristas (1976), e apresentações ao vivo com a Orquestra Corações Futuristas, com o trio no Montreal Jazz Festival, com Jane Duboc, Al Di Meola, John McLaughlin, Paco De Lucia, Hermeto Pascoal, Naná Vasconcelos e Hamilton de Holanda. Veja mais aqui, aqui e aqui.

A ARTE DE GIL TEIXEIRA LOPES
A arte do artista plástico e professor português Gil Teixeira Lopes.
 

PATRICIA CHURCHLAND, VÉRONIQUE OVALDÉ, WIDAD BENMOUSSA & PERIFERIAS INDÍGENAS DE GIVA SILVA

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