
A UNIVERSIDADE DE GIANNOTTI
Foi-se o mundo de antigamente. A revolução tecnológica alterou por
completo nossas relações com a natureza e com o outro. Vivemos mergulhados numa
segunda natureza constituída de máquinas sábias, verdadeiros raciocínios
ambulantes dos quais pegamos o começo e o fim. O protótipo da máquina moderna,
o computador, não tem nada a ver com a ferramenta, que prolonga o gesto e poupa
esforços; consiste na encarnação duma teoria, saber feito material volátil, que
por si só a verifica e abre um espaço inédito que o conhecimento do indivíduo nunca
poderia desenhar. O computador é um cientista coletivo posto à disposição do
pesquisador ou da dona-de-casa. Por isso reúne, no seu pequeno intervalo, a teoria
e a prática, sendo o exemplo mais extraordinário de como a ciência neste século
se transformou numa força produtiva. Se, na verdade, pode ser objeto de consumo
individual, jogo de salão moderno, é quando se integra numa fábrica ou numa
instituição prestadora de serviços que cumpre seu destino social. Mas nem só de
computador vive o homem moderno. O telefone, a televisão, o processador de
palavras, o avião ultrarápido são peças de sistemas diante dos quais cada um se
põe isoladamente, fascinado pela máquina como se ela fosse uma tela de cinema
que, no escuro, abole o pensamento próprio. Nada mais próximo do que a voz que
fala do outro lado da linha, ouvimo-la como se estivesse ao lado. Enquanto
porém o outro visível foge de nosso arbítrio e resiste a nossos caprichos, a
voz alheia no aparelho depende duma ligação desejada e está sempre à mercê
daquela ira que bate um telefone na cara. Desse modo, a confissão mais íntima
vive sob a ameaça dum corte abrupto, que empresta à individualidade contemporânea
o caráter duma mônada sem janelas. A ilusão narcísica é contraparte da
cientificação da natureza. [...] A
Universidade é coisa perigosa em países subdesenvolvidos. Só o fato de possuir
hoje mais de 1.600.000 estudantes dá uma idéia da revolução intelectual que
haveria se a maioria deles fosse eficaz e inventiva. Daí a funcionalidade da infra-estrutura
precária e da incompetência. [...] Não
se trata de separar uma Universidade que o Estado organiza como uma comunidade
de sábios, de outra que se identifique com uma empresa capitalista. Nem uma nem
outra são viáveis em sua pureza. A questão crucial é saber como se vai
controlar a relação da Universidade com a comunidade e quem vai desempenhar
essa função. O departamento estatal isonômico pode converter-se num ninho de burocratas,
aquele intimamente ligado ao Governo ou à empresa privada, num inferno
competitivo. O primeiro perigo a evitar é que ambos se julguem a si mesmos. Só
me parece sair do impasse se a Universidade aprofundar seu processo de democratização,
obviamente evitando o assembleísmo dum lado, e a farsa parlamentar de outro.
Criar um sistema efetivo e eficaz de representação, eis a tarefa mais urgente.
[...] No imaginário das sociedades ocidentais
reside o impulso para o conhecimento racional. Por isso, estamos mal acomodados
neste conhecer que se resolve num fazer de conta de conhecimento. [...].
Trechos
extraídos de A universidade e a crise
(Novos Estudos, 1984), do filósofo e professor universitário José Arthur Giannotti.
Autor de
A universidade em ritmo de barbárie (Brasiliense, 1986), entre outras obras.
Veja
mais sobre:
Palco da
vida, A terceira mulher de Gilles Lipovetsky, Toda palavra de Viviane Mosé, A vida mística de Jesus de Harvey Spencer Lewis, a música
de Andersen Viana, Roseli
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a pintura de Maria Szantho & Katia Kimieck,
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Errâncias
da paixão aqui.
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levanta de Ernest
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Mathis, Programa Tataritaritatá & muito mais aqui.
Entre as
pinoias duns dias de antanho & a pintura
de John La Farge aqui.
A vida é
uma canção de amor & a arte
de Milo Manara aqui.
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SABIÁ
COM TREVAS DE MANOEL DE BARROS
Me abandonaram sobre as pedras infinitamente
nu,
e meu canto.
Meu canto reboja.
Não tem margens a palavra.
Sapo é nuvem neste invento.
Minha voz é úmida como restos de comida.
A hera veste meus princípios e meus óculos.
Só sei por emanações por aderência por incrustações.
O que sou de parede os caramujos sagram.
A uma pedrada de mim é o limbo.
Nos monturos do poema os urubus me farreiam.
Estrela é que é meu penacho!
Sou fuga para flauta e pedra doce.
A poesia me desbrava.
Com águas me alinhavo.
Meu canto reboja.
Não tem margens a palavra.
Sapo é nuvem neste invento.
Minha voz é úmida como restos de comida.
A hera veste meus princípios e meus óculos.
Só sei por emanações por aderência por incrustações.
O que sou de parede os caramujos sagram.
A uma pedrada de mim é o limbo.
Nos monturos do poema os urubus me farreiam.
Estrela é que é meu penacho!
Sou fuga para flauta e pedra doce.
A poesia me desbrava.
Com águas me alinhavo.
Sabiá
com trevas, poema extraído obra Arranjos para assobio (Companhia das Letras,
2016), do poeta Manoel de Barros
(1916-2014). Veja mais aqui, aqui & aqui.
RÁDIO
TATARITARITATÁ:
Hoje é dia de especiais com o
compositor, arranjador, produtor musical e guitarrista Toninho
Horta;
a cantora, violonistak, compositora e percussionista Badi
Assad;
o compositor alemão Max Richter; e a cantora e atriz
franco-inglesa Charlotte Gainsbourg. Para conferir é só ligar o som
e curtir.
A ARTE DE
GROMAIRE
A arte do pintor francês Marcel Gromaire (1892-1971).