sábado, janeiro 10, 2009

MARGARET CAVENDISH, THORNTON WILDER, MAXWELL MALTZ, PIERRE NORA, ENO TEODORO WANKE & LITERÓTICA.



LITERATURA ERÓTICA - BIBLIOTECA EROTOLÓGICA: A MODERNIDADE: DA RENASCENÇA ATÉ O SÉCULO XIX - Merece registro que entre os séculos XV, XVI e XVII, a ocorrência de versos curtos obscenos e de natureza sexual, utilizados em Nursery Rhymes e praticados nos pubs britânicos. Inclusive, alguns deles, encontrados nas obras de William Shakespeare, a exemplo dos expressos na sua obra “Rei Lear”. Mas acredita-se que foi no século XVIII que se desenvolve a popularização desses poemas curtos, chamados de Limeriks ou limeiriques, uma composição burlesca, jocosa e epigramática, atribuída à invenção de soldados irlandeses de retorno à França, nos anos de 1700. Porem, tal fato se deu mesmo na literatura britânica quando foi lançado em 1846, por Edward Lear (1812-1888), no seu livro “The book of nonsense”. Este tipo de composição contém hipérboles, onomatopéias, trocadilhos, expressões idiomáticas e outros dispositivos figurativos, tendo uma forma popular sempre obscena, essencialmente violando tabus e transgressivo. Neste período surge o poeta italiano Pietro Aretino (1492-1556) que foi um dos expoentes mais espantosos da Renascença italiana, autor dos “Sonetos luxuriosos”, inspirados nos quadros eróticos do pintor Giulio Romano e o “Diálogo das prostitutas”. Além desses, também escreveu Cartas (1553-1557) com o registro da vida política e cultural de sua época, e Juizos (1534) analisando a instituição cortesã como um fenômeno da prostituição moral e física da sociedade em crise. O poeta francês Clement Marot (1496-1544) escreveu sonetos petrarquianos com o humor rabelaisiano, interessado mais pela forma que pelo conteúdo, modelo denominado "retoriquismo". Apesar de ser o poeta da corte francesa, teve muitos problemas com a justiça e com a igreja, fatos que o levaram a reconhecer o amor como seu único mestre. O “Heptameron” é publicado em 1558, por Margaria de Angoulême (1492-1549), também conhecida como Margarida de Navarra ou de Valois, irmã do rei Francisco I, filha de Carlos I de Valois, que foi duquesa de Alençon e Berry, Condessa de Rodez e rainha de Navarra. Este livro reune 72 pequenas novelas seguindo o modelo do Decameron de Boccacio. A sua escrita prenuncia o aparecimento de importantes figuras femininas das letras francesas dos séculos XVII e XVIII, como Madalena Scudery e Madame Lafayette, numa altura em que o romance e a novela eram ainda considerados gêneros literários menores. O volume aborda temas sociais e humanos como as relações entre sexos, a virtude e o vício, clérigos lúbricos, maridos enganados e triângulos amorosos. Também no século XVI, conforme Tannahill (1980), surge “O perfumado Jardim para a recreação do espírito”, escrito por Shaik Muhammad ibn Muhammad al Nefzawi por instigação do vizir do bei de Túnis. Trata-se de um manual de sexo, apresentando opiniões sobre quais qualidades os homens e mulheres devem ter para ser atraente, dando conselhos sobre técnicas sexuais, avisos sobre a saúde sexual, e receitas para algumas doenças sexuais. Ele também contém uma lista de nomes para o pênis e a vagina, uma seção sobre a interpretação de sonhos, e descreve sucintamente o sexo entre animais. O poeta renascentista francees Pierre de Ronsard (1524-1585) escreveu diversos sonetos petrarquianos, dedicados a liberdade, alegria de viver e os prazeres do amor, que lhe valeram a consagração de principal poeta da França do séc. XVI. Integrou o grupo La Pléiade, o qual foi seu princial representante seguindo o modelo dos liricos greco-romanos e italianos. Descendente de nobres, tentou seguir carreira religiosa decidindo-se pela literatura, escrevendo uma obra poetica recheada de lirismo, sátiras, sensualidade, religiosidade, percorrendo caminhos pela mitologia, filosofia e história. O poeta e dramaturgo francês Etiene Jodelle (1432-1573) escreveu varios sonetos, odes, epistolas, elegias, tragédias e comédias em verso, dedicando-se à poesia erótica com seus sonetos priápicos. Deixou inconcluso em longo poema sobre a sodomia. O poeta francês François de Malherbe (1555-1628) escreveu sonetos, estancias, canções e odes, tendo se tornado o poeta oficial da corte de Henrique IV. Dedicou-se, também, à escrita de versos carregados de sensualidade e erotismo. O poeta, religioso e dramaturgo castelhano, Luis de Argote y Gongora (1561-1627) foi o corifeu do barroco literário espanhol. Voltando-se para o lirismo amoroso, escreveu as “Soledades”, um longo poema composto por silvas que enfatizam a alegoria da vida humana, tentando impressionar os sentidos do corpo e da alma, causando escândalo pelo atrevimento estético e obscuridade hiperculta. Durante a Renascença e no Barroco inglês são dadas mais evidentes as tendências a uma literatura declaradamente erótica e não apenas de amor, como se observa em John Donne e Thomas Carew. O poeta jacobino inglês John Donne (1572-1631) foi pregador e pastor anglicano, considerado o maior poeta metafísico do seu tempo. Sua obra é composta de sonetos religiosos e amorosos, epigramas, elegias, sátiras, sermões e canções de natureza realista e recheada de estilo sensual. O poeta ingles Thomas Carew (1595 - 1640) produziu poemas sensuais por meio canções, pastorais e elegias elegantes que só foram publicadas após sua morte. O poeta satírico francês, Mathurin Régnier (1573-1613) foi um boêmio libertino que defendeu os boulevards da poesia lirica e um cinico indignado com os costumes de sua época. O poeta inglês Robert Herrick (1591-1674) foi joalheiro e religioso, sendo forçado a abandonar seu cargo por divergências políticas, quando passou a publicar sua produção poética. Foi com “Hespérides” que ele mostrou suas graciosas, maliciosas, liricas e obscenas criações poéticas, valendo-lhe o tratamento do mais abertamente pagão dos poetas ingleses. O poeta alemão Friedrich von Logau (1604-1655) pertence ao periodo barroco da literatura alemã, dedicando-se à produção de epigramas que criticavam o cosmopolitismo dos costumes, a intolerância religiosa e os desregramentos eróticos. O escritor e poeta francês Jean de La Fontaine (1621-1695) ficou famoso por suas fábulas. Entretanto, escreveu também em verso “Contos” licenciosos sobre temas amiude tomados de emprestimos a Boccaccio, além de epigramas eróticos de relevo. Em torno de 1620 e 1635, surge a lenda de Don Juan, um libertino ficticio que seduzia, estrupava e matava mulheres, registrado na história do “El burlador de Sevilha y convidado de piedra”, na Espanha. Surge então o poeta brasileiro Gregório de Matos Guerra (1633-1696), tido, conforme Brasil (1978), como canalha ou genio, o Boca do Inferno, sendo responsavel pelo primeiro momento alto da poesia brasileira, praticamente na época de sua origem e formação. Critico mordaz da sociedade, gravou os escandalos da época, os roubos, os crimes, os adultérios, devassidão, boemia, moralismo, pecado e pureza. O escritor e poeta John Wilmot (1647-1680) foi o segundo conde de Rochester, um libertino ingles que possuiu muitas amantes e produziu uma poesia satirica e obscena. Dedicou-se ao espiritismo e foi uma célebre figura na corte da Restauração inglesa. Morreu ateu. O escritor britanico Samuel Butler (1612-1680) foi um destacado poeta satirico da Restauração inglesa, que foi influenciado pelas experiencias na Nova Zelândia. O poeta Jean-Baptiste Rousseau (1671-1741) foi considerado um dos grandes líricos do séc. XVII francês. Ele teve de viver no exilio devido à acusação de ter escrito versos ofensivos às instituições, além de odes, cantatas, epigramas, epistolas e outros generos poéticos picantes, afora várias comédias. No século XVIII houve uma ascensão do gênero quando da publicação de “Fanny Hill” do escritor inglês John Cleland (1710-1789), obra esta que estabeleceu um novo padrão literário. Ele era escritor de aluguel e também jornalista que viveu em extrema dificuldade, sendo preso diversas vezes, ocasiões que revisava e re-escrevia sua principal obra, um misto de paródia, entretenimento sensual e conceito filosófico de sexualidade emprestado dos romances libertinos franceses. “Fanny Hil ou Memórias de uma mulher de prazer” tornou-se um dos grande clássicos da literatura do século XVIII, narrando a história de uma prostituta e sua ascendência à respeitabilidade. O jornalista, escritor, politico e orador parlamentar francês, Honoré Gabriel Riqueti, o conde de Mirabeau (1749-1791), escreveu a iniciação sexual de uma jovem com o próprio pai resultando na publicação do “The Lifted Curtain or Laura´s Education”. Na sua vida inclui acontecimentos que vão desde passagens pela maçonaria e pela diplomacia, além de agente secreto, prisões e exilio e uma vida amorosa complexa e apaixonada, participando, inclusive, com relevância da Revolução Francesa. É quando aparecem as memórias eróticas do escritor e aventureiro italiano Giácomo Girolamo Casanova (1725-1798). Ele havia se dedicado às carreiras militar e eclesiastica que foi interrompida quando ele se dedicou à aventura e aos relatos das memórias, tornando-se debochado, libertino, colecionador de mulheres, escroque e conquistador frequente dos bordéis de Londres, levando uma vida dissoluta com acusações de possuir livros proibidos e de fazer propaganda anti-religiosa, que o levou à prisão e à fuga da masmorra. Depois, envolve-se com a Inquisição onde está diante de 50 relatórios onde ele acusa nobres e banqueiros de adultério, da posse de livros cabalisticos e proibidos, de deboche, de conjura contra o Estado e vigarices. Foge dos inquisidores para Paris onde se reune com eruditos transformando-se em enciclopedista e realiza viagens pelas mais diversas paisagens nos seus 73 anos de vida. No final do século XVIII, surgiu o escritor libertino e aristocrata francês Donatien Alphonse François de Sade, o marquês de Sade (1740=1814), com a obra “Justine”, abordando o tema sado-masoquismo. Conta-se que muitas das suas obras foram escritas enquanto estava em um hospício, encarcerado por ordem de Napoleão Bonaparte, que se sentiu ofendido com uma sátira que o Marquês lhe escrevera. De seu nome surge o termo médico sadismo, que define a perversão sexual de ter prazer na dor física ou moral do parceiro ou parceiros. Foi perseguido tanto pela monarquia, como pelos revolucionários vitoriosos de 1789 e depois por Napoleão. Para Bataille (2004): “Sade – o que ele quis dizer – geralmente causa horror mesmo àqueles que fingem admirá-lo e não reconhceram esse fato angustiante: que o movimento de amor, levado ao extremo, é um movimento de morte (...) o homem é um anomal que permanece probido diante da morte e diante da unisão sexual”. O escritor e livre-pensador alemão Cristopher Martin Wieland (1733-1813) é autor de romances, dramas e narrativas em versos, sendo um libertino alegre cujo erotismo não temia ofender a todos, sendo considerado o Boccaccio alemão por sua obra “Contos cômicos” e pela peça lírica “Pequena louvação”, Em 1748 aparece o romance Thérèse Philosophe atribuído a0 francês Jean-Baptiste de Boyer, Marquis d'Argens (1704-1771). A obra foi logo considerada pornográfica por expressar um transporte público e perversão discutivelmente para algumas idéias do Philosophes. O escritor e pensador alemão Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) foi uma das mais importantes figuras da literatura do Romantismo alemão, sendo lider, ao lado de Schiller, do movimento Sturm und Drang. Também escreveu epigramas picantes nos “Epigramas venezianos” O comediografo, fabulista e poeta satirico espanhol, Tomás de Iriarte (1750-1791) possui tendências neo-classicas e influencias de Horacio, escrevendo obras picantes e eroticas. Entre 1757 e 1795 surgiram as listas de prostituição que serviram para educação sexual, tais como a “Harris´s listo f Convent Garden Ladies”. A partir de 1790, o poeta portugues e maior representante do Arcadismo lusitano, Manuel Maria de Barbosa du Bocage l´Hedois (1765-1805), aparece com suas epístolas, sonetos, idilios, odes, canções, cançonetas e cantatas, além de sátiras ferozes e irreverentes, notabilizando-se como repentista, poeta satírico, erótico e pornográfico de verve brilhante, o que ligou seu nome a episódios que enchem seu anedotário popular, o que lhe valereu a condenação por impiedade e perseguição pela Inquisição, resultando trancafiado nas masmorras. O poeta, libretista e letrista francês, Pierre-Jean de Béranger (1780-1857), foi participante ativo como poeta e compositor de canções emblemáticas que foram introduzidas no momento de convulsão social da Revolução Francesa e o fim do império. Foi um cançonista que se tornou poeta popular, com temas que celebram o amor e a juventude em diapsão báquico. O poeta italiano Giuseppe Gioachino Belli (1791-1863) ficou famoso por seus mais de 2 mil sonetos em romanesco, um dialeto de Roma, retratando a vida patricia e plebeia da cidade do seu tempo. Muitas de suas satiras pintam a corrupção do clero e da corte papal. Sua musa obscena acentua o aspecto mecanico do coito. O escritor, poeta, jornalista e critico literário francês Pierre Jules Theophile Gautier (1811-1872) retrata uma paixão erótica em termos de celebração à beleza pagã no seu romance “Mademoiselle de Maupin”. No prefácio desta obra, ele afirma sua posição estética, seu culto da arte pela arte, seu desdém pela moral, sustentando a tese de que a arte e a moral nada têm em comum. O poeta norte-americano Walt Whitman (1819-1892) foi o cantor da democracia e da liberdade sexual, tendo sua obra uma sensualidade cósmica sem fronteiras, celebrando o amor heterossexual e invocando a homossexualidade. Em 1824 o filosofo e filólogo alemão Friedrich Karl Forberg (1770-1848), publicou o “De figuris veneris – Apophoreta”, um manual da erotologia antiga, reunindo uma coleção dos escritos de autores antigos sobre as práticas sexuais greco-romanas, contendo posições sexuais ilustradas pelo artista Edouard-Henri Avril. A obra foi publicada como suplemento do livro “Hermaphroditus” de Antonio Beccadelli que reunia epigramas obscenos. Em 1844, o poeta e dramaturgo espanhol José Zorilla (1817-1893) traz de volta a sua versão da lenda de Don Juan Tenório, contando na velhice as seduções de conquistador, disputando com o amigo o coração da noiva do outro. Em 1857 é lançado Madame Bovary do escritor francês Gustave Flaubert (1921-1880), que foi acusado de atentar contra a moral e a religião, sendo absolvido pela Corte mas condenado pelos críticos da época. O texto fala sobre adultério e foi considerada a primeira obra da literatura realista. Foi, então, a partir do naturalismo, que as descrições do amor físico em romances passaram a ser admitidas, atitude publicamente secundada pela discussão aberta dos problemas sexuais, iniciadas pela divulgação da Psicanálise. E segundo Carpeaux (1978) a função critica naturalista degenerou em literatura de escândalo. O poeta e teórico da arte francêsa, Charles-Pierre Baudelaire (1821-1867) foi um dos precursores do Simbolismo que teve uma vida desregrada vivendo entre drogas e álcool. Em 1857 lança “As flores do mal” contendo 100 poemas que foram acusados de imoralidade e de ultraje à moral pública, rendendo um processo judicial que recolheu os exemplares. Com sua vida atribulada descobriu pioneiramente nos vicios e na feiura industrial, o frissom de uma nova beleza toda feita de contrastes gritantes. Conforme Paes (2006), “(...) No dominio desses constrastes se inclui o proprio satanismo do poeta, cristão às avessas que, cultivando com refinamentos perversos o seu erotismo, encontra na aguda consciencia do pecado o mais excitante dos ingredientes”. O poeta francês Paul Marie Verlaine (1844-1896) é considerado um dos mais populares da França, sendo bem-nascido, bem-educado e bem-casado, porém seu encontro com Rimbaud levou-o à vagabundagem e a ser vitima de uma lesão provocada por um tiro desferido pelo jovem poeta. Rompe com Rimbaud e se converte ao catolicismo, mantendo-se vagabundo e miseravel alcoolatra. Além de se dedicar à criação de uma obra religiosa e simbólica, Verlaine também escreveu poemas eróticos pronunciados. O poeta francês Jean-Nicolas Arthur Rimbaud (1854-1891) foi um precoce revolucionário artistico que investiu sua vida no tráfico de armas de fogo. Sua precocidade poética se misturava com a fuga dele da mãe e da companhia de Verlaine numa vida rebelde, boemia e vagabunda, atraves de versos proféticos, notações hermeticas, violências verbais, exploração do subconsciente, cultivo do alucinatório e do irracional, preparando o dadaismo e o surrealismo. Rimbaud escreveu os versos: “Ela foi reencontrada. O que? A eternidade. É o mar que estrada junto com o sol, unidade”, verso este que, segundo Bataille (2004): “A poesia leva ao mesmo ponto que cada forma de erotismo, à indistinção, à confusão dos objetos distintos. Ela nos leva à eternidade, ela nos leva à morte, à continuuidade: a poesia é a eternidade. É o mar que estrada junto com o sol, unidade”. No período vitoriano, surgiu a obra do popular romancista ingles Charles John Huffam Dickens (1812-1870) que abordava o tema erótico articulado com distinções sociais, introduzindo a critica social na literatura de ficção. Muitas obras anônimas ilustram o universo literário erótico como “The way of a man witch a maid”, “Beatrice”, “The autobiofraphy of a Flea”, de 1887; “The lustful turk”, de 1828; “The romance of lust”, de 1873; e “The pearl”, uma coleção de contos, músicas, rimas e paródias eróticas publicadas entre 1879 e 1880, em Londres. O escritor austríaco Leopold von Sacher-Masoch (1836-1895), publicou em 1870 a novela “Vênus castigadora”, que traz uma cena de masoquismo, retratando as suas inclinações e relações sexuais. Em 1875, o escritor português Eça de Queiroz (1845-1900), publica a sua polêmica obra “O crime de padre Amaro”, chocando a sociedade da época com sua denuncia da hipocrisia social e religiosa, causando protestos da Igreja Católica. O nobre inglês vitoriano Henry Spencer Ashbee (1834-1900), publicou “My secret life”, em 1888, apresentando os costumes e moralidade de 2.500 mulheres de todos os países em que esteve e com as quais manteve relações sexuais, contando uma vida alegre, livre, libertina, imoral, sensual e sexual com uma violência cínica, uma escrita sem pudores, múltipla e criativa. O autor foi escritor, colecionador de livros e bibliógrafo, adotando o pseudônimo de Pisanus Fraxi. Neste mesmo ano, o escritor e gramático brasileiro, Julio César Ribeiro Vaughan (1845-1890), provoca escândalo ao publicar o seu romance “A carne”, contando a paixão ardente entre uma jovem, Lenita, e o engenheiro de meia-idade, Manuel, abordando temas como amor livre, divorcio e sexualidade. Veja mais aqui, aqui e aqui.


DITOS & DESDITOS - Os grandes momentos da vida vêm por si mesmo. não tem sentido esperá-los. Só podemos dizer que estamos vivos nos momentos em que nosso coração está consciente dos tesouros que possui. Pensamento do escritor estadunidense Thornton Wilder (1897-1975).

ALGUÉM FALOU: A vida está cheia de desafios que, se aproveitados de forma criativa, transformam-se em oportunidades e vitórias. Pensamento do cirurgião estadunidense Maxwell Maltz (1899-1975), criador da psicocibernética, sistema empregado para melhorar a autoimagem e a autoconfiança, de modo a conduzir a uma vida mais bem sucedida, afirmando que todos nós, desde crianças, temos dentro de nós mesmos formada uma imagem pessoal, que funciona como um objetivo para o inconsciente, e acaba nos levando para uma determinada direção, querendo nós conscientemente ou não. Dessa maneira, uma imagem positiva acaba levando para um caminho favorável uma imagem negativa para um caminho desfavorável.

MEMÓRIA & HISTÓRIA – [...] os lugares de memória nascem e vivem do sentimento que nao há memoria espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios fúnebres, notariar atas, porque essas operações não são naturais. É por isso a defesa, pelas minorias, de uma memória refugiada sobre focos privilegiados e enciumadamente guardados nada faz do que levar à incandescência a verdade de todos os lugares de memória. [...]. Trecho extraído da obra Entre memória e história: a problemática dos lugares (Projeto História, 1993), do historiador francês Pierre Nora.

MUNDO RESPLANDESCENTE - […] embora eu tenha feito de meu Mundo Resplandecente um mundo pacífico, permitindo apenas uma religião, uma língua, um governo; ainda posso fazer outro mundo tão cheio de facções, divisões e guerras como este é de paz e de tranquilidade, além de que os personagens racionais da minha mente devem expressar tanta coragem para lutar [...] Mas estimando a paz antes da guerra, a sabedoria antes da política, a honestidade antes da beleza; [...] e, se alguma alma gostar do mundo que eu criei e estiver disposta a ser minha súdita, pode imaginar-se de tal forma e o será, quero dizer, em sua mente, fantasia ou imaginação; mas, se não puder suportar ser súdita, pode criar seu próprio mundo e governá-lo como lhe aprouver. Por fim, ainda é necessário ter cuidado, para não revelarem-se serem usurpadores injustos e me roubarem do meu, pois, em relação ao mundo filosófico, eu sou Imperatriz de mim mesma e, como já há uma Imperatriz para o Mundo Resplandecente, que o domina com grande sabedoria e conduta e é minha querida amiga platônica, nunca revelar-me-ei tão injusta, traiçoeira e indigna para com ela, a ponto de prejudicar seu governo, muito menos para depô-la de seu trono imperial para o bem de qualquer outro, mas sim escolher criar outro mundo para outro amigo. Trechos extraídos da obra O Mundo Resplandescente (Penguin, 2004), da filósofa, poeta, romancista e dramaturga britância Margaret Cavendish (1623-1673), que foi defendida e criticada como uma mulher única e inovadora, renegando o aristotelismo e o mecanicisto do séc. XVII, preferindo o modelo vitalista, defensora dos direitos dos animais e uma das primeiras a se opor aos testes em cobaias. Em conformidade com o estudo O mundo resplandecente, de Margaret Cavendish:estudo e tradução (Unicamp, 2014), de Milene Cristina Silvabaldo:  [...] A inglesa Margaret Lucas Cavendish (Colchester, 1623-1673) foi uma Duquesa, conhecida em sua época por seu caráter peculiar, o que lhe conferiu o apelido de Mad Madge, ou seja, Margaret louca. Tal caráter se refere tanto ao seu modo de vestir, marcado por extravagâncias em cores e formas (às vezes com o uso de vestuário similar ao masculino), quanto ao seu hábito de argumentar filosoficamente com homens e utilizar a própria assinatura em suas publicações, costume incomum até o século XVII. Prolífica autora, publicou onze obras, em um século no qual as mulheres tinham pouco espaço na esfera erudita, razão pela qual é considerada uma das mais importantes figuras femininas do século XVII. Dentre suas composições, encontram-se poemas, peças, novelas, cartas, autobiografia, biografia, utopia e proposições sobre filosofia natural. Este último é um fato bastante notável e a fez ser classificada como uma das primeiras mulheres a se envolver nos debates científicos que ganhavam cada vez mais espaço no âmbito intelectual. [...]


O sol nasce para todos. Mas a maioria prefere dormir um pouco mais.

Deus põe inimigos em nosso caminho para quebrar sua monotonia. Que chatura seria a vida sem eles!

O amor não se divide nem se diminui. O amor verdadeiro só se soma e se multiplica.

A sabedoria da água! Quando a água nasce em qualquer parte do continente, ela imediatamente se dirige para o mar, onde quer que o mar esteja.

À medida que envelhecemos, nossa vida vai enchendo mais de fantasmas – nossos companheiros tombados no caminho.

Mulher bonita tem obrigação de ser como rosa de roseira: jovem, bela e perfumada.

Todos têm direitos e deveres iguais perante a lei. Mas ser chato não é direito nem dever. É só chatice.

Os amigos são, às vezes, mais detestados que os inimigos.

Empinar papagaios é mandar mensagens coloridas para o céu azul.

Arte é privilégio de menino arteiro.

O que vale nesta vida não é o que sonhamos, o que desejamos ou o que planejamos. O que vale é o que fazemos.

Por que as coisas sadias têm que ser sempre tão insossas?

Durante a segunda guerra mundial, os americanos descobriram o átomo. E para quê? Só para explodi-lo em cima dos laboriosos japoneses.

E o fim da picada – fica longe?

As areias de Ipanema são apropriadas para colher as bundinhas de suas garotas.

Ficou tão morto de medo que, dali a sete dias, foi rezada a sua missa de sétimo dia.

Há um dia em que a lagarta se cansa e decide sair fantasiada de borboleta.

Claro que Papai Noel existe! Quem pode duvidar disso? – Admirava-se o filho do meu amigo Noel.

Horóscopo: os de Leão gostam de atividades furtivas. Mas devem se abster de obedecer seus impulsos de ler à noite com todas as luzes da casa apagadas.

O tempo inexorável vai nos maquiando pela vida afora, aos poucos, mas inexoravelmente. Quando nos damos conta, nosso rosto, tão jovem e puro, virou esse abominável Retrato de Dorian Gray.

Durante o sono, as coisas perdem-se de si mesmas.

Durante a tempestade, o sol fica sem ter o que fazer e vai tirar um ronco por trás das nuvens. É o chamado ronco dos trovões.

O Dom Quixote é a bíblia dos quixotescos.

A moça pintou-se. O auto-retrato não ficou devendo nada ao original.

Aquele comandante tinha o ronco tão pesado que, quando ele dormia, o navio economizava apito.

O único defeito das mulheres realmente bonitas é sabermos da existência dos seus esqueletos por dentro daquilo tudo.

Noé deveria ser o patrono dos ecologistas. Foi o primeiro a se preocupar com a preservação da fauna do seu tempo ante o perigo de uma inundação exterminadora.

Há livros cuja leitura parece a leitura de um jornal. Não deixam marcas e no dia seguinte estão esquecidos.

Poetas são uns caras de cabelos compridos, sempre irresponsáveis, boêmios e bêbados. Quando vão fazer versos, botam um ramo de louro na cabeça e começam a tanger uma lira daquelas antigonas.

As estrelas cadentes não caem de dia porque desejam ser vistas.

Vagabundo é um que estica tanto os fins-de-semana que eles acabam emendando.

Alguns casamentos por aí nem parecem ter sido a vitória de um grande amor, mas sim a vitória de uma grande vingança.

A televisão enobrece o lixo eletrônico que mostra. Daí porque está na sala em lugar de honra.

Quanto melhor o humorista, mais mal-assombrado, pois mais espírito possui.

Era um inventor regular. Inventou, por exemplo, o dedal para o dedão do pé. Faltou-lhe, no entanto, inspiração para inventar o que fazer com o dedão do pé do dedal posto.

Se assovio fosse alfinete, o traseiro daquela moça estaria todo furadinho.

Quiprocó conjugal se dava porque a mulher do Xá da Pérsia não gostava de chá da Pérsia.

O reumatismo das aranhas é oito vezes mais dolorido.

Era uma vez um rapaz que se transformou numa barata. Mas não teve a sorte do rapaz de Kafka (que durou um livro inteir0< pois tinha um pai exímio. E o pai, sem reconhecer, naquela barata de antenas apavoradas, sem saber para onde fugir, o seu próprio filho, sangue do seu sangue, carne de sua carne, acabou-lhe com a carreira de barata através de uma eximia chinelada.

Um cheque sem fundos é uma triste criatura, pois tem sua vida normal de cheque interrompida no momento em que alguém verifica sua condição marginal de sem fundos. Aí, passa a ser execrado, humilhado, carimbado, marginalizado, a vergonha dos cheques com os quais havia travado amizade nas gavetas dos bancários.

O círculo é um ponto com mania de grandeza.

ENO TEODORO WANKE – O poeta, engenheiro civil, tradutor, antologista, pesquisador, historiador e polemista paranaense, Eno Teodoro Wanke (1929-2001), é autor de inúmeros livros, quase 800 deles publicados, entre eles “A gaia essência”, de 1986, e “O que Nário não disse”, de 1997. Editou por vários anos o zine impresso KÇYW! – Um boletim pessoal, onde publicava seus haicais, palíndromos, trovas, entre outras dicas e intercâmbios que mantinha com o Brasil inteiro e com o exterior. Sobre ele escreveu Filemon F. Martins: quem foi Eno Teodoro Wanke?

FONTE:
WANKE, Eno Teodoro. A gaia essência. Rio de Janeiro: Folha Carioca, 1986.
______. O que Nário não disse. Rio de Janeiro: Plaquette, 1997.



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