HÁ DOIS ANOS FLORESCIA
O AMOR – Imagem: Indian Corn, da pintora ucraniana Olga Krimon. - Há dois anos, olhar na escuridão imensa, nenhuma
porta aberta, o andar incerto, o sentimento à cata de arrimo, entre simulacros
caleisdoscópicos de quem desceu ao inferno, e labaredas nas águas até o
pescoço. O que sobrou de mim, um espantalho indômito com todos os fantasmas do
passado, remoendo as vísceras do coração despedaçado, roto, desalentado. Um
nada de mim restava a se dissolver, como quem a se desmanchar, a vida aos
pedaços. Ao longe, quase cego nas últimas, um aceno rutilante e breve, e eu
ressurgia das cinzas, fênix dilacerado diante de refulgente emanação.
Entreguei-me às suas mãos e só então as altas ondas do mar revolto se
apaziguaram, vendaval das nuvens delineando as correntes pro meu caminho perdido.
Sabia lá mais o que seria a vida, esquinas desertas no descampado das ruas
desaparecidas, nenhuma noção pra quem nada além ao rés do chão, no fundo do
poço. E as suas mãos me deram a direção no horizonte, segui seus passos, vivi
seu riso de Sol, seu jeito menina de quem me deu outra infância no quintal
jamais revisto, a recomeçar do zero, a reaprender do voo, folha seca
timidamente revitalizada. Das mãos seu corpo pro meu abrigo, terra firme pra me
segurar em pé e retomar o prumo. Não sei quantas noites e dias, embalado por
sua voz além dos confins, quantas tardes de sonho no seu jeito abissal, quantas
manhãs revividas de desacordado que teimava em desfalecer na solidão, até
salvar-me com sua inteira e imprevista chegada, fúria de naja pra me envolver como
se não houvesse tanto tempo passado nas errâncias nem depois de esperas em
claro e a vida há dois anos insistindo em se revelar mais que a plenitude de
tudo. Há dois anos eu me encontrei como quem nem mais sabia de si nem de nada,
há dois que eu não tinha nem onde cair morto, agora em suas mãos, carne que
refaz a minha, imantado por seus olhos de luz. © Luiz Alberto Machado.
Direitos reservados. Veja mais aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com o show ao vivo do cantor, compositor e violonista João Bosco & Tuscia in Jazz com Paula & Jaques Morelenbaum Trio. Para conferir é só ligar o som e curtir.
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com o show ao vivo do cantor, compositor e violonista João Bosco & Tuscia in Jazz com Paula & Jaques Morelenbaum Trio. Para conferir é só ligar o som e curtir.
PENSAMENTO DO DIA – [...]
o amor é irredutível a toda lei. Não há a
lei do amor. [...] Há um trabalho do amor,
e não apenas um milagre. É preciso estar em movimento, é preciso ter cuidado, é
preciso se reunir, consigo mesmo e com o outro. É preciso pensar, agir, transformar.
E então, sim, como a recompensa imanente do labor, há a felicidade. [...]. Trechos
extraídos da obra Elogio ao amor (Martins Fontes,
2013), do filósofo, dramaturgo e novelista francês Alain Badiou. Veja mais aqui e aqui.
A VIOLÊNCIA –[...] a oposição entre pessoas envolvidas, sua
expressão em termos de luta e solução por meio da força, irrompe de relações
cujo conteúdo de hostilidade e sentido de ruptura se organizam de momento, sem
que um estado anterior de tensãotenha contribuído. A agressão ou defesa à mão
armada, da qual resultam não raro ferimentos graves ou morte, aparecem com
freqüência entre pessoas que mantêm relações amistosas e irrompem no curso
dessas relações. [...] Nestas
existências inteiramente pobres, incipientes no domínio da natureza e
rudimentares nos ajustamentos humanos, pouco se propõe ao entendimento humano,
senão a sua própria pessoa. É ela que sobressai diretamente, solidária e
despojada, por sobre a natureza; ela apenas constitui o sistema de referência
através do qual, o sujeito consegue perceber-se. Desde que, nas realizações
objetivas de seu espírito, quase nulas, dificilmente lograria reconhecer-se, é
aquilo que pode fazer de si próprio e de seu semelhante que abre a
possibilidade de autoconsciência: sua dimensão de homem chega-lhe, assim,
estritamente como subjetividade. Através dessa pura e direta apreensão de si
mesmo como pessoa, vinda da irrealização de seus atributos humanos na criação
de um mundo exterior, define-se o caráter irredutível das tensões geradas.
[...] Em seu mundo vazio de coisas e
falto de regulamentação, a capacidade de preservar a própria pessoa contra
qualquer violação aparece como única maneira de ser: conservar intocada a
independência e ter a coragem necessária para defendê-la são condições de que o
caipira não pode abrir mão, sob pena de perder-se. [...]. Trechos extraídos
da obra Homens livres na ordem
escravocrata (IEP/USP, 1969), da sociológa e professora Maria Sylvia de Carvalho Franco. Veja
mais aqui, aqui & aqui.
ARTE & HISTÓRIA – [...]
Podemos, sob esta inspiração, nos remeter
a imagens pictóricas e a textos literários do passado, que falam de um não
acontecido, mas que registram sensibilidades sobre o mundo, sobre os quais o
historiador se debruça, com as suas indagações. E essas perguntas fazem
dialogar arte e história, nessa twilight zone que aproxima e separa as
representações construídas sobre o real. [...]. Imagens pictóricas, discursos poéticos e lendas são representações do
mundo que se oferecem ao historiador como portas de entrada ao mundo das
sensibilidades da época que as engendrou. [...]. Dessa maneira, se a arte se apresenta como fonte ao historiador – ou
seja, como marca de historicidade que guarda uma impressão de vida – ela é uma
fonte que diz sobre o seu momento de feitura e não sobre o tempo do narrado ou
figurado. [...]. Trecho do artigo Este
mundo verdadeiro das coisas de mentira: entre a arte e a história (Estudos
Históricos, 30, 2002), da historiadora, escritora e professora Sandra Jatahy Pesavento (1945-2009).
O BLOCO DAS MIMOSAS BORBOLETAS - [...]
Encarei-a com piedade e revolta:
gordinha, morenota, um leve buço enegrecendo-lhe o lábio superior. E
irresponsável, camaradinha, fácil, derrotada nas suas vaidades de princesa de
arrabalde por aquele complicado drama de fuga e morte. Olhando-me a fito, vi nos olhos dela
recordação da vida já antiga. [...] Agora,
tudo acabado, para nunca mais! Desabou a chorar sobre o meu ombro: que era
muito infeliz, que ia sofrer muito, que não sabia como perdera a cabeça, que
agora estava perdida, que queria morrer também... Consolei-a como pude,
segurando-a pelos pulsos. [...] A
rua! A rua deserta, vazia, livre, para os meus passos e para o meu rumo.
Corripor ali afora, corri para alcançar o bonmde para desentoprpecer. E
enquanto corria levava a sensação de fugir a uma coisa fascinante e ameaçadora,
de que eu me libertava enfim... uma coisa suave e horrenda que não poderia mais
acontecer na madrugada pura do arrabalde... Trechos extraído da obra Bailarinha e outras mulheres (Anuário do
Brasil, 1927), do escritor, jornalista, diplomarta e magistrado Ribeiro Couto. Veja mais aqui.
DUAS BALADAS DE VILLON – Balada
das damas dos tempos idos: Dizei-me em que terra ou país / Está Flora, a bela romana; / Onde Arquipíada
ou Taís, / que foi sua prima germana; / Eco, a imitar na água que mana / de rio
ou lago, a voz que a aflora, / E de beleza sobre-humana? / Mas onde estais,
neves de outrora? / E Heloísa, a mui sábia e infeliz / Pela qual foi
enclausurado /Pedro Abelardo em São Denis, / por seu amor sacrificado? / Onde,
igualmente, a soberana / Que a Buridan mandou pôr fora / Num saco ao Sena
arremessado? / Mas onde estais, neves de outrora? / Branca, a rainha, mãe de
Luís / Que com voz divina cantava; / Berta Pé-Grande, Alix, Beatriz / E a que
no Maine dominava; / E a boa lorena Joana, / Queimada em Ruão? Nossa Senhora! /
Onde estão, Virgem soberana? / Mas onde estais, neves de outrora? / Príncipe,
vede, o caso é urgente: / Onde estão elas, vede-o agora; / Que este refrão
guardeis em mente: / Onde estão as neves de outrora? Balada das damas do tempo antigo: Ora dizei-me em que país / Flora estará, bela
romana, / Arquipiades ou Taís / que sua prima foi germana. / Eco a falar,
quando um som plana / por rio ou lago, e que já tem o / dom de formosa mais que
humana? / Mas onde estão neves de antanho? / Onde é mui sábia Heloísa / por
quem castrado e monge pena / Pedro Balerdo em S. Dinis? / Amor lhe deu provação
plena. / E assim também onde é que reina / essa que a Buridan por banho / mandou
deitar num saco ao Sena? / Mas onde estão neves de antanho? / Rainha Branca
como um Lis, / voz que a sereia em canto irmana, / Berta pé-grande, Alis,
Biatriz, / Aremburgis que foi menana, / e de Lorena a boa Joana / qu’ingrês em
Ruão queimou no lenho. / Onde estão, Virgem Soberana? / Mas onde estão neves de
antanho? / Senhor, cuidar de ano ou semana / onde elas são, não voz traz ganho,
/ nem meu refrão a vós engana: / Mas onde estão as neves de Antanho? Poemas
do poeta francês François Villon
(1431-1463). Veja mais aqui.
BASE PARA UNHAS FRACAS
O curta-metragem experimental erótico Base para unhas fracas: ou a pintura como assunto (2011), dirigido pelo pintor Alexandre Vogler, com a atriz Marcela Maria, conta a história de uma mulher nua que percorre as ruas do centro do Rio de Janeiro, durante a madrugada, intervindo em luminosos e espalhando cartazes autobiográficos pelos muros.
O curta-metragem experimental erótico Base para unhas fracas: ou a pintura como assunto (2011), dirigido pelo pintor Alexandre Vogler, com a atriz Marcela Maria, conta a história de uma mulher nua que percorre as ruas do centro do Rio de Janeiro, durante a madrugada, intervindo em luminosos e espalhando cartazes autobiográficos pelos muros.
Veja mais:
Procuramos um lugar digno para chamar de lar,
mas só o encontraremos quando o mundo estiver livre de preconceitos. Somos
todos iguais independente da cor da pele, da religião, da sexualidade, da
necessidade de cuidados especiais ou idade. Dentro de nós o sangue eé vermelho
e a alma imortal é Luz.
Poema/foto
da poeta, artista visual & blogueira Luciah
Lopez. Veja mais aqui.
A arte de Vik Muniz aqui.
A literatura de James Hilton aqui.
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