A SÍNDICA DOS
SEIOS ONÍRICOS - Imagem: Luis Mendonça
- Geruza enviuvara, ficando triste aquele rostinho lindo de Fernanda
Abreu. Fora trágica para quem soubera sempre amante, duvidando, se fora,
possivelmente amada no mesmo tanto. Dava para imaginar a sua dor naqueles seios
com cheiro de mar no decote pronunciado que sempre exibia. Parece uma dor sem
fim, seis anos de ininterrupta e enclausurada viuvez. Não dava nem as caras pro
mundo, só recebendo, quando muito, familiares com advogado para resolver-lhe
questões do falecido. Dava, também, para notar seu encabulamento ao tratar de
apólices de seguro, pensão e bens inventariados a partilhar. Por certo, não era
do seu feitio essas coisas de justiça, porque sempre fora das lides domésticas,
quando muito acompanhava o marido nas compras, reduzindo-se, apenas, a cuidar
da casa, estudar, embelezar-se e fortuitamente participar de alguma comemoração
com casais amigos. Não tivera filhos nos dois anos de vigência do matrimônio.
Resultara viúva e só. Uma misantropia flagrante, o que, misteriosamente, ainda
mais realçava na sua beleza. E a cada dia mais exuberante ficava no apetite dos
meus olhos. Ah, se me fosse dado o privilégio de provar de sua reclusa. Não,
ela não dava espaço. Leseira minha de sonhar acordado. Raramente via-lhe sair
para algum lugar. Até que certa noite, uma reunião ruidosa e cheia de
querelantes, destituiu-se o síndico e abriram um pleito eleitoral para a
escolha de um outro representante para tomar conta do nosso prédio. Geruza nem
se dera conta do que sucedia, chegara ali para saber apenas das providências
tomadas quanto a algo do seu apartamento, quando de sopetão seu nome entrou na
roda. Vi-lhe ruborizada, intrigando-se com o assédio para que se colocasse seu
nome em votação. Aí, eu que sempre me fizera alheio a tudo em reunião de
condomínio, pois que até então só ouvira baixaria, pendenga mesquinha,
interesses escusos, agora, encontrava um motivo para melhor participar daquela
chateação, avalizando o nome dela naquela votação. Eu fora o primeiro a votar e
percebi-lhe os olhos aboticados em minha direção e, depois disso, não desgrudou
mais. A unanimidade fez-lhe síndica sem mais delongas. Tudo ventava a seu
favor: dedicada aos afazeres domésticos, tempo integral no ambiente,
disponibilidade para se ocupar com alguma coisa além do cotidiano. Satisfeito
com tudo, eu exultava com a solidariedade de todos enquanto ela não conseguia
ver-me menos imantada, atraída com intriga no olhar. A noite para mim seguia em
polvorosa sem que ela ao menos insinuasse um mínimo sorriso, como que ainda não
entendendo tudo aquilo acontecer à sua revelia. Era cada vez mais lindo aquele
jeito desprotegido de ver o mundo se transformando na sua frente sem poder
sequer sugerir nada. Estava realmente surpresa com aquilo. Foi aí que me
aproximei em seu auxílio, tentando-lhe explicar e, ao mesmo tempo, oferecendo
meu irrestrito apoio. Ela, assustada, nada entendia. A votação correra
tranqüila e fim de papo. Dei-lhe meus parabéns afetuosos, seguido de todos os
cumprimentos dispensados pelos presentes. Eu que falei por ela, aceitando a
empreitada e já marcando a retomada dos trabalhos normais para o dia seguinte.
Nisso ela nem balbuciara nada e me olhava com um ar ainda mais de esquisitice,
interrogativa com o meu procedimento. Um a um dos presentes se despedindo,
restando, ao final, apenas nós dois. Ela muda fisgada em mim, eu dissimulado
acenando para a despedida de todos que se evadiam para seu regaço. Chamei o
porteiro, entreguei os livros de ocorrências e anunciei que daquele momento em
diante, Geruza era a síndica, esperando que ele passasse a colaborar de forma
com maior afinco a partir de então, ao que ele positivamente acenou com a
cabeça. Retornei ao seu encontro e desejei-lhe uma boa noite e até amanhã.
Percebi que ela seguiu rumo ao elevador ainda tocada pelos acontecimentos. Ao
cabo de dias não pude disfarçar a constatação do condomínio mais limpo, mais
florido, mais cheio de vida, parece que ela resolvera dar o seu toque em tudo
ali. Certa ocasião eu avexava para jantar fora e ao deixar algumas
recomendações ao porteiro, vi Gerusa descer magnificamente linda, num vestido
bege, decotado, discretamente maqueada, fantasticamente linda, de me abestalhar
e não conseguir desgrudar-lhe o olhar, ao que, notando, dirigiu-me um
cumprimento de boa noite afetado de mexer com as minhas entranhas e deixar-me
abobadado. Meu deus, meus olhos vira a manifestação perfeita do milagre vital.
Esqueci da fome, perdi a hora de jantar, acompanhei-lhe abrir a porta,
sentar-se comodamente, acionar o motor e sutilmente sair em seu veículo.
Acompanhei o seu trajeto até perdê-la de vista. - Dona Geruza botou para
abafar, num foi? -, era o porteiro roubando a minha imaginação. - Pelo amor de
deus! -, respondi com a maior cara de babaca. Ora, se ela já se encontrava no
centro da minha cobiça, agora conseguia enlouquecer-me de vez. E enquanto
pensava nela, não conseguia sair dali para lugar algum. Dei-me a vaguear pelo
canteiro, pelo estacionamento, abestalhado e consumido pela sua beleza. Não sei
por quanto tempo fiquei assim, sei que só me dei conta quando ela estacionava
de volta o seu veículo. Disfarcei e, meio atabalhoado, rumei direção para o
elevador. E ao aguardá-lo eis que ela se aproxima com seu perfume – ah,
senti-lhe a fragrância viçosa de sua vagina acendendo meus sentidos - e, ao que
parece, ela notando a minha embriaguês com todo o seu espetáculo. - Tudo bem?
-, disse-me ela altiva e desleixadamente. - Tudo bem. Nossa, não conseguia
dizer mais nada, estava embasbacado e boquiaberto com o seu reluzente decote
abissal. A porta do elevador abriu-se, despejou fora dois vizinhos e esperei
que ela entrasse para que a seguisse. Assim fez, adentrou-se, recostando-se no
canto do elevador, desprotegida, pronta para a minha fúria de ataque. Apertei o
indicador do sexto, o andar dela, e esqueci de acionar o meu andar. Nem bem
quando o elevador deu partida, deu-se a escuridão. Ficamos presos, assustados,
acompanhando o zoadeiro que se ouvia vindo do lado de fora. - Que foi isso? -,
perguntou-me. - Sei lá. Não consigo entender nada. Senti-lhe um nervosismo e
uma leve aproximação nervosa. Não sabia se me esforçava por sair dali ou se
mantinha uma posição de ali ficar em sua companhia, esperando melhor momento. -
Vamos aguardar –, disse-lhe tentando acalmá-la já que não se continha em si. Nada
dizia, sentia-lhe a respiração, o nervosismo, o perfume, tudo embaralhando
minha cabeça que nessa hora não conseguia conciliar as idéias. Senti sua mão no
meu braço, tímida e trêmula. Foi aí que minha incoerência buscou-lhe a
presença, alcançando a sua cintura perfeita. - O fornecimento de energia
normaliza já, viu? -, repeti-lhe mais uma vez, tentando tranqüilizá-la. Enquanto
eu tentava oferecer-lhe segurança tateava suas formas curvilíneas, o seu corpo
palpitando, os seus seios arfantes, sua alma trêmula, eu frente a frente, a
mesma altura, o mesmo tope, aproximando-me mansamente, nenhuma resistência.
Busquei-lhe o pescoço com uma das mãos e ao encontrá-lo, trouxe seu rosto na
direção do meu e beijei-lhe os lábios carnudos, acordando uma fera furiosa que
me agarrou com sofreguidão. Fui intensamente invadindo sua viuvez,
remexendo-lhe as intimidades, até que alcancei sua saia, puxando-a para cima
até chegar-lhe na calcinha e notar-lhe fuviando úmida e desejosa. Removi-lhe
para o lado alcançando-lhe o corte íntimo e enfiando-lhe o dedo devagar até
sentir-lhe abrindo-se mais, escancarando para a melhor ser penetrada,
levantando uma de suas pernas até ao lado da minha cintura, matando minha sede
com o arriar do zíper, até alcançar-lhe as mais profundas águas saborosas. Acompanhei
o seu gemido louco, investi irresponsavelmente por sua intimidade gostosa,
enfiei-lhe toda minha loucura apressadamente até alcançarmos o ápice do
orgasmo. Aaaaaaaaah! Depois de um longo tempo desligado do mundo e de todos,
notamos o silêncio que circundava, ouvindo-se apenas a nossa respiração. Foi aí
que tentamos aos poucos nos recompormos satisfeitos, quando o fornecimento de
energia fora restaurado, dando para ver-lhe o modo saciado de carente secular
com que me fitava. Ouvimos o porteiro instando por nós, ficamos escondidos. E
em pouco tempo, tudo normalizado, e nos despedíamos daquela louca e adorável
situação. © Luiz Alberto Machado.
Direitos reservados. Veja mais aqui, aqui e aqui.
DITOS & DESDITOS - Da
janela espio estrelas pisando na ponta dos pés para não acordar o céu. Estou
cansado da minha sombra. Pensamento do pintor, fotógrafo, gravurista
e artista gráfico e industrial Geraldo de Barros (1923-1998).
ALGUÉM FALOU: É coisa
mais ilustre e mais louvável deixar após si muitos benefícios, do que deixar
muitos troféus. Pensamento do historiador e discípulo socrático, Xenofonte (430-355aC), autor da obra Anábase (Sementes De Mudança, 2008),
contando a jornada de um grupo de soldados gregos que, em 401 a.C,
marcharam desde a costa até o interior do império persa, governado pelo rei Artaxerxes
II. Ela é composta por sete livros, contando a saga do Exército dos Del Mil e a
marcha desde o campo de batalha de Cunaxa até ao mar, correspondendo ao termo
grego Catábase, ainda reunindo os livros da Parábase, que narram a marcha ao
longo da costa desde Trapezunte até o Helesponto. Veja mais aqui e aqui.
SOB O PESO DAS SOMBRAS - [...] Se a escrita serve de remédio para os nervos,
conforme palavra dos entendidos, se é expelida pelos nossos gemidos interiores,
e salva a gente dos naufrágios, decerto a minha página de ontem deve ter se
nutrido da frustração que me acompanha [...] um fantasma persistente que tem me prejudicado, que procura se encarnar
fora de horas. [...]. Trechos extraídos da obra Sob o peso das sombras (Planeta, 2004), do escritor e professor Francisco Dantas, contando a história
de um burocrata provinciano apaixonado por literatura e que é humilhado durante
toda sua vida pelo superior, decidindo escrever sua história carregada de
amargura e lucidez.
UM POEMA
- A MINHA MUSA antes de ser / a minha Musa
avisou-me / cantaste sem saber / que cantar custa uma língua / agora vou-te
cortar a língua / para aprenderes a cantar / a minha Musa é cruel / mas eu não
conheço outra. Poema da poeta, cronista e tradutora portuguesa Adília Lopes – Maria José da Silva Viana Fidalgo de Oliveira.
TATARITARITATÁ NO PALCO ABERTO – No próximo dia 19 de maio, às 20hs, no Espaço Cultural Linda Mascarenhas, em Maceió, acontecerá o show poético-musical Tataritaritatá de Luiz Alberto Machado.
O SHOW - Show autoral poético-musical de Luiz Alberto Machado e banda, será realizado com 17 músicas de diversos gêneros como xotes, baiões, martelo agalopado, sertanejo de raiz, toada, balada, rock, pop, frevos, poemas e causos. Na ocasião ocorrerá a gravação do cd e do dvd ao vivo do espetáculo.
O AUTOR – Luiz Alberto Machado é escritor, compositor musical e radialista, editor do Guia de Poesia do Projeto SobreSites no Rio de Janeiro, membro da Cooperativa dos Músicos de Alagoas - Comusa e escreve regularmente para jornais, revistas e alternativos além de blogs, sites e portais da internet. Já publicou 6 livros de poesias, 7 infantis, 2 de crônicas além de ter vários textos publicados em veículos impressos e virtuais do Brasil e do exterior. Parte do seu trabalho está reunido na sua home www.luizalbertomachado.com.br
O PROJETO – O Projeto Palco Aberto é um conjunto de ações e produtos para a valorização da cultura e, em especial, da música produzida em Alagoas. Possui a visão de ser um centro de referência de capacitação e captação para a cultura alagoana. Tem a missão de promover atividades que permitam capacitar a cadeia produtiva e o mercado alagoano, criando um ambiente favorável para o desenvolvimento da produção artística e, cada vez mais, ampliar a visibilidade dessa produção. O projeto já realizou 4 Edições da Música Alagoana realizadas, com 01 DVD e 03 CDs publicados, mais de 100 shows realizados com 41 artistas que já participaram c/ shows individuais e autorais.
SERVIÇO: Show Tataritaritatá no Palco Aberto de Luiz Alberto Machado e banda. Dia 19 de maio, às 20 hs, no Espaço Cultural Linda Mascarenhas (Av. Fernandes Lima, ao lado do CEPA), Maceió – AL. Informações: 82.8845.4611 ou acessando www.luizalbertomachado.com.br Veja os clipes do show no YouTube.
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(Arte by Ísis Nefelibata)
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