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quinta-feira, outubro 19, 2017

VINICIUS, MIGUEL ASTURIAS, ORTEGA Y GASSET, CAMILLE CLAUDEL & RICHARD MARTIN

IARA, IARAVI – Um dia Fiietó se apaixonou. E ele com a sua força e firmeza no braço, altivez de porte e agudez de vista, dominava a mataria brava, seguindo a caça e afrontando o inimigo, aremessando o arco de sua flecha certeira cortando as carreiras ou os pulos dos animais, abatendo o voo de carniceiros, estava perdidamente apaixonado. Justo aquele que ao vogar sobre as águas silenciosas do Una, velejava alteroso, braços abertos e, ao passar junto ao barranco do rio, as brisas folionas sacudiam os galhos e derramavam uma chuva de flores sobre seus cabelos negros e todos os peixes, pássaros e demais seres viventes das profundezas e das margens fluviais, saudavam-no nas suas peripécias. Justo ele, estava enamorado. Por conta disso, todas as tardes a sua canoa aparecia no poente, seguindo solitário pelas sombras da noite adentro, pescaria essa que todos interrogavam pela vigência dos fantasmas noturnos saltarem das profundas dos infernos para atomentarem seres viventes que jaziam medrosos escondidos nas suas moradas. Indagavam do intrépido Fiietó se não ouvira os temerosos presságios pelos ventos gemedores com suas dores que matam, ele quase nem ouvia sua mãe aos prantos pela audácia do filho de desafiar os gênios malignos que se aproveitavam da indomável juventude de suas presas nas horas mortas. Contavam pra ele histórias repetidas vezes de quantos não houveram encontrados insones com seus olhos fundos e tristes, cotovelos fincados nos joelhos, pernas pendentes da rede selvagem, aprisionados pela má sorte, pungentemente hipnotizados na escuridão. Até sua mãe lamentava com enternecidas palavras, meu filho, não vejo alegria nos seus olhos, só vagos gestos de quem fora picado no coração, aquele a quem as moças admiravam, os velhos e guerreiros festejavam as astúcias com seus cantos entoando seu nome que um dia gozaria supremo na mansão dos bravos. O que está havendo, meu filho? Estou amando, mãe, quero encontrá-la. Não me diga que é a Iara! Mãe, quero encontrá-la. Não, meu filho, a Iara não, ela envenenou seu coração? Mãe, eu a vi, eu a vi, mãe, boiando em flor, linda como a lua nas noites claras, eu vi, mãe, os cabelos de flores, brilho do Sol, era ela, mãe! Meu filho! As suas faces, mãe, são formosas que ninguém jamais viu! Ela olhou pra mim, mãe, estendeu-me os braços, repartiu as águas e me levou encantado pelas estrelas do céu. Meu filho! Foge, meu filho, foge! Aquela que você viu é a Iara, aquela que canta a agonia e dos seus olhos só a morte espia. Mãe, eu vi, é linda! A mãe chorava a perda de filho tão valoroso. Não vá, meu filho, fuja, fuja enquanto pode, foge da Iara. E ele resoluto, pisou na água e começou a deslizar mansa e tranquilamente, estava decidido, estava verdadeiramente apaixonado. E todos na tribo caeté viram-no passar como quem vai pescar nas trevas. E seguia sozinho no espelho das águas. Logo depois, ouviam-se gritos: Vem ver, gente! Vem ver, corre, gente, vem ver! Todos pararam atônitas à beira do Rio Una, Fiietó fendendo as águas, braços abertos como se fosse voar, quando surgiu ao lado do jovem guerreiro, enlaçando-o a beijá-lo, completamente ensolarada com sua majestade e corpo harmonioso coroado por sua beleza indescritível de tão grandiosa maravilha, cabelos esvoaçantes e a jurar de amor por ele, aquela que cativara o seu coração. A Iara! É ela, a Iara! Todos gritavam estupefatos com a cena, em uníssono: É Iara! É ela mesmo! E todos correram para acompanhar o trajeto do casal que iluminava todos os arredores, escondendo-se para não serem flagrados pela deusa. Dali mais um pouco, Fiietó abraçou-a e beijaram-se ardentemente, provocando faíscas, relâmpagos e trovões vindos dos céus e retumbando por toda redondeza. Beijavam-se e o amor celebrava a festa dos amantes, enquanto os nativos fugiam para mais distante, amedrontados com a cena e tudo que acontecia. Era Iara, na verdade, era Iaravi, a índia caingang que é bela como as frescas manhãs de Sol nas águas do Una, transformada em Iara para demonstrar o seu amor e para ser aquela a quem Fiietó, perdidamente apaixonado, jurava morrer de amor. (Recriação a partir de A Iara (Selva, 1947), de Afonso Arinos. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especiais com a música do cantor e compositor Geraldo Azevedo: De outra maneira, A luz do solo, Inclinações musicais, Adoro você & Tanto querer; da pianista e compositora Fernanda Chaves Canaud interpretando Radamés Gnatali & Lua Branca de Chiquinha Gonzaga; do compositor e educador musical Mario Ficarelli: Parasinfonia, O poço e o pêndulo & Tempestade óssea; da cantora Joan Baez: Al star 75th Birthay Celebration Live, Live Concert & Line in the New York. Para conferir é só ligar o som e curtir.

PENSAMENTO DO DIAO importante é a lembrança dos erros, que nos permite não cometer sempre os mesmos. O verdadeiro tesouro do homem é o tesouro dos seus erros, a larga experiência vital decantada por milénios, gota a gota. do filósofo e ativista político espanhol José Ortega y Gasset (1883-1955). Veja mais aqui.

SONETO DA MULHER AO SOL
A bordo do Andrea C, a caminho da França
Uma mulher ao sol - eis todo o meu desejo
Vinda do sal do mar, nua, os braços em cruz
A flor dos lábios entreaberta para o beijo
A pele a fulgurar todo o pólen da luz.
Uma linda mulher com os seios em repouso
Nua e quente de sol - eis tudo o que eu preciso
O ventre terso, o pêlo úmido, e um sorriso
À flor dos lábios entreabertos para o gozo.
Uma mulher ao sol sobre quem me debruce
Em quem beba e a quem morda e com quem me lamente
E que ao se submeter se enfureça e soluce
E tente me expelir, e ao me sentir ausente
Me busque novamente - e se deixa a dormir
Quando, pacificado, eu tiver de partir...
Extraído do livro Para viver um grande amor (Companhia das Letras, 1984),
do poeta, dramaturgo, jornalista, compositor e diplomata brasileiro Vinicius de Moraes (1913-1980). Veja mais aqui, aqui & aqui.

SENHOR PRESIDENTE - [...] A cidade grande, imensamente grande para a sua fadiga, foi ficando pequena para a sua aflição. Noites de espanto, seguidas por dias de perseguição. Acossado pela gente que, não satisfeita em gritar-lhe: “Bobalhãozinho, domingo você vai casar com sua mãe... aquela velhinha... seu pirado... animal, vagabundo!”, batiam nele, arrancavam-lhe a roupa a pedaços. Perseguido pela molecada, refugiava-se nos bairros pobres, mas ali sua sorte era pior; ali, onde todos andavam às portas da miséria, era não só insultado, mas quando o viam correr apavorado atiravam-lhe pedras, ratos mortos e latas vazias. Vindo de um desses bairros, chegou ao Portal do Senhor num dia qualquer, na hora da missa, ferido na testa, a cabeça descoberta, arrastando a rabiola de uma pipa que, arremedando um remendo, haviam-lhe grudado atrás. Assustava-se com as sombras dos muros, os cachorros passando, as folhas que caíam das árvores, o rodar desigual dos carros... Quando chegou ao Portal, quase de noite, os mendigos, virados para a parede, contavam e recontavam seus ganhos do dia. Mulamanca discutia com o Mosquito, a surda-muda esfregava a mão na barriga, para ela inexplicavelmente grande, e a cega se remexia, sonhando-se dependurada em um gancho, coberta por moscas, como carne de açougue. [...] E mais não disse. Arrancado do chão pelo grito, o Bobalhão saltou em cima dele e, sem lhe dar tempo para usar suas armas, enterrou-lhe os dedos nos olhos, despedaçou-lhe o nariz a dentadas e golpeou-lhe as partes com os joelhos, até deixá-lo inerte. Os mendigos fecharam os olhos horrorizados, a coruja passou de novo e o Bobalhão fugiu pelas ruas escuras enlouquecido e tomado por espantoso paroxismo. Uma força cega acabava de tirar a vida do coronel José Parrales Sonriente, vulgo o homem da mulinha. Amanhecia. [...]. Trechos da obra O senhor presidente (Mundaréu, 2016), do escritor, jornalista, diplomata guatemalteco Miguel Angel Asturias (1899-1974), ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 1967. Veja mais aqui.

ARTE DE CAMILLE CLAUDEL
A arte da escultora francesa Camille Claudel (1864-1943). Veja mais aqui e aqui.

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ARTE DE RICHARD MARTIN
Imagem: arte do artista plástico australiano Richard Martin.

terça-feira, setembro 22, 2015

ASTURIAS, FARADAY, LÖWI, HERMILO, GONZAGUINHA & PROGRAMA TATARITARITATÁ!



VAMOS APRUMAR A CONVERSA? JOÃO SEM TERRA – (Imagem: matéria do Diário de Pernambuco, coluna Teatro, do Jornalista Valdi Coutinho, Caderno Viver, 13 de outubro de 1985; foto Leonilda Silva e Valter Portela em cena, ingresso do espetáculo, panfleto e autorização do inventariante Paulo Cavalcanti, então presidente da União Brasileira de Escritores (UBE-PE). Tudo começou numa conversa entre Juareiz Correya, então presidente da Fundação Casa da Cultura Hermilo Borba Filho, e os membros da Revista A Região, Gilberto Melo, Paulo Caldas e Arnaldo Afonso Ferreira, me convocando para encenar a peça teatral João sem terra, de Hermilo Borba Filho. Providenciaram o texto e me sacudiram na caixa dos peitos. Li, reli, resolvi topar e comecei a fazer uma adaptação, já bolando uns temas musicais com o Fernandinho Melo Filho. Isso era 1983, mais ou menos. Gilberto falou de um grupo de jovens palmarenses que estavam interessados em encenar algo parecido; era o Grupo Terra. Acertamos que no final de semana eu iria para Palmares conhecer o pessoal. Cheguei lá tinha para mais de 40. Comecei conversando e fui fazendo uns testes, uma peneirada na verdade. Ali mesmo comecei um curso de formação de ator e fui realizando oficinas até findar em apenas 10 atores que se encontravam aptos para a empreitada. Fui severo porque eu tinha que castigar nas marcas, realizando exercícios, experimentações e laboratório para que a turma entrasse no clima da peça. Foram quase dois anos de oficina e de ensaios todo final de semana que eu virava noite de sábado pro domingo. Durante a semana, em Recife, eu ensaiava a trilha sonora que compus com Fernandinho e já organizávamos tudo pra gente entrar no estúdio com os músicos e deixar tudo prontinho. Mas faltava uma coisa: cadê a autorização da família de Hermilo? Foi quando encontrei o escritor e advogado Paulo Cavalcante e ele, na condição de inventariante, demonstrou favorável pela encenação e, no dia seguinte, me entregou a devida autorização. Tudo pronto, tudo nos conformes. Mas... nem tudo corria bem: o teatro Apolo ainda não estava pronto. Corriam com as obras da reforma até mesmo horas antes da estreia do espetáculo. Uma correria. O grupo Terra era formado por Walter Portela, Leonilda Silva, Roberto Quental, Nazaré Silva, Erivaldo Guerra, Katia Cilene, Clecio Roberto, Silvania Conceição, Celia Santos e Andrea Silva, tudo no ponto. Tudo pronto praquele sábado que marcaria o retorno do Teatro Cinema Apolo. Pra nossa felicidade o Valdi Coutinho emplacou uma matéria na sua coluna do Diário de Pernambuco e fizemos uma boa entrevista na Radio Cultura dos Palmares. Nem bem deu 19hs e o público já se esgueirava se aboletando na plateia, enquanto o pessoal técnico ainda estava findando as obras da reforma no meio da afinação das luzes e som, ajuste do cenário, tudo pronto, mesmo assim, e... vingou! Tudo conforme o combinado: o elenco estava primoroso superando tudo! Tudo deu certo na estreia! Aplausos. Valeu por tudo. E veja mais aqui, aqui e aqui

 Imagem: Odalisque, do pintor austríaco Franz Russ Jnr. (1844 – 1906)


Curtindo o álbum De volta ao começo (EMI, 1980), do cantor e compositor Luiz Gonzaga Junior – o Gonzaguinha (1945-1991), com participações de Milton Nascimento, MPB-4, Marília Medalha e As Frenéticas.

LEI DA INDUÇÃO ELETROMAGNÉTICA - O físico e químico inglês Michael Faraday (1791-1867) verificou que os magnetos exercem ação mecânica sobre os condutores percorridos pela corrente elétrica. Para chegar a essa constatação, ele colocara um imã verticalmente sobre um banho de mercúrio, fazendo que uma de suas extremidades ficasse imersa no liquido. Ligando um fio condutor ao mercúrio, fechando o circuito, verificou que, quando o fio era móvel em torno de seu ponto de suspensão, descrevia círculos em volta do imã. Caso contrário, fixando-se o fio e liberando o imã, este girava em torno do fio. Com experiência singela, mas de extraordinárias consequências para a tecnologia, Faraday criara o primeiro motor eletromagnético. Em 1831, após memorável experiência, descobriu a indução eletromagnética, utilizando um anel de ferro doce, no qual enrolou duas espiras, uma na metade superior e outra na inferior, uma das quais ligada a um galvanômetro. Ele verificou que, se uma corrente elétrica passava na primeira espira, a outra era igualmente percorrida pela corrente, nos exatos momentos em que se abria ou se fechava o circuito. Demonstrou, ainda, que as correntes induzidas não são criadas por influência do campo eletromagnético, mas pelas variações do campo ou pelos deslocamentos do circuito no campo. Da Lei da Indução Eletromagnética, ele estabeleceu as leis da eletrólise que são duas: a primeira enuncia-se que a massa de substância decomposta pela eletrólise é proporcional à quantidade de eletricidade que atravessa o eletrólito; a segunda, as massas de diferentes substancias liberadas pela mesma quantidade de eletricidade são proporcionais aos respectivos equivalentes-grama de qualquer substância. Além disso, descobriu que o plano de polarização de um feixe de luz polarizada, que atravessa um bloco de vidro, gira quando submetido a um forte campo magnético, denominando-se este fenômeno de Efeito Faraday. Veja mais aqui.

IDEOLOGIAS E CIÊNCIAS SOCIAIS - O livro Ideologias e ciências sociais: elementos para uma análise marxista (Cortez, 2010), de Michael Löwy, trata sobre ideologia, positivismo, historicismo e marxismo, entre outros assuntos. Da obra destaco o trecho do Capítulo IV – Marxismo: o que caracteriza a questão do conhecimento científico e do conhecimento verdadeiro?: O que define a ciência como tal é a tentativa de conhecimento da verdade. Nesse sentido, há uma relação entre ciência e conhecimento da verdade. Porém, a verdade absoluta jamais será conhecida, todo o processo de conhecimento é um processo de acercamento, de aproximação da verdade. Dentro do conhecimento científico há níveis maiores ou menores de aproximação da verdade. Desse modo, quando eu digo ciência, eu não estou dizendo verdade, estou simplesmente dizendo processo: a ciência é um processo de produção do conhecimento da verdade. Tambem para mim, existe uma relação entre conhecimento da verdade e luta de classe. Isto quer dizer que um elemento que aparentemente não tem nada a ver com ciência, na realidade tem um papel fundamental. Retomando a análise que foi feita, é a partir da luta de classes que se dão aos condições mais favoráveis para um conhecimento cientifico da realidade, da verdade. Veja mais aqui.


TOROTUMBO – No livro Torotumbo: la audiência de los confines (1972), do escritor, jornalista, diplomata guatemalteco Miguel Angel Asturias (1899-1974), ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 1967, destaco os trechos: [...] O Torotumbo entrou na capital. Bandas de música, marimbas, sereias, sinos, foguetes e cerimonias do encontro, a saudação, a apresenta e a entrega das chaves entre os língua-de-trapo da cidade, para quem tudo9 aquilo não passava de uma alegre festa de carnaval fora de tempo, e os dançarinos que chegavam em torrentes de homens do mesmo sangue, igualados por ideias e sentimentos. Sob a proteção das cerimonias, circulou a primeira ordem de ocupar os lugares estratégicos assinaldos, de boca em boca dos dançarinos de pele queimante de urtiga, alfanjes de piteira e lanças de cana brava, esquadrões de guerreiros em formação cerrada de dançarinos de mascara de argila cozida, de casca de coco, de pedra porosa, mais leve do que a água, seus penachos de três sangues, vermelho, verde e negro, e sapatios de rio de espelho que no dançar tremulante levantavam poeira de sonho sob a chuva metálica dos chocalhos adormecidos. [...] Mas à turba que o pavor impelia a por-se a salvo, seguiu-se a passagem dos que sem dançarem acompanhavam o ritmo do Torotumbo na conquista das posições que tinham sido determinadas e a voz de Tizonello que anunciava não serem disfarçados os que tinham morrido no sinistro. A notícia quebrou a resistência. Os agentes de polícia arrancavam os uniformes ou os conservavam como disfarces. Pela 12ªAvenida avançou um tanque, disparando nas esquinas, fazendo as ruas ficarem desertas; depois aproximou-se, por entre as casas que trepidavam à sua passagem, até o lugar do atentado, enfocou um refletor sobre os escombros, apagou-o ao dar com os despojos dos que em verdade pareciam disfarçados, silenciou seu tiroteio e desapareceu. Mais tarde foi visto nas proximidades do quartel, abandonado junto com os uniformes dos homens que o tripulavam e os tinham despido e deixado atirados pelas ruas, como outros tantos disfarces. Ecos de morteiros. Algum estrondo de artilharia. A noite fulgurava. Ouviam-se os gritos de Tizonello: - Não eram mascarados, eram eles mesmos!... Não eram mascarados, eram eles mesmos!... Eu pus a bomba na cabeça do Diabo!... Eu pus a dinamite sob os pés de Tamgás!... O povo subia para a conquista das montanhas, de suas montanhas, ao compasso do Torotumbo. Na cabeça levavam as plumas que o furacão não domou. Nos pés, os calçados que o terremoto não gastou. Nos olhos, há não levavam as sombras da noite, mas a luz do novo dia. Nas costas escuras e desnudas, o manto de suor dos séculos. Seu andar de pedra, de raiz de arvore, de torrente de água, deixava para tras do lixo, todos os disfarces com que a cidade se vestia para enganá-lo. O povo subia para suas montanhas sob as bandeiras de plumas azuis do quartel, dançando o Torotumbo. Veja mais aqui.


ETERNIDADE & DEUS MILHÃO – Na antologia Poetas de Palmares (Fundarpe/FCCHBF, 1987), organizada pelo poeta Juareiz Correya, destaco os sonetos do poeta palmarense Fernando Griz, o primeiro deles Eternidade: Fantasia banal pensar a gente / na alma emigrante, erguendo-se da terra, / para infinda habitar po além que encerra / a utopia da vida transcendente. / A vida é só o eterno transformismo: / nascer, viver, morrer, voltar ao nada, / nascer de novo – a carne transmutada / em planta ou verme – e recair no abismo. / Na transição contínua da matéria / a alma – essa função do sangue ardente - / vai se perder na lama deletéria... / Nessa lama de carne apodrecida, / de onde ressurge aquilo que foi gente / disseminado em tudo que tem vida. E também Deus Milhão: Da mina infeta ao antro pavoroso / descem sombras, rudes operários, / os escravos da fome e dos salários / que o Deus Milhão explora em próprio gozo. / E sempre e sempre aos círios funerários / do pestilento abismo tenebroso, / como as visões de um sonho monstruoso, / baixam da morte aos lúgubres cenários. / E enquanto assim, no fato miserando, / nas entranhas da terra lutulenta / pragueja e chora o produtivo bando. / Ao brilho imenso dos salões doirados, / como escárnio cruel à dor violenta / o Deus Milhão sorri dos desgraçados. Veja mais aqui e aqui.

AS MULHERES E O CHIFRUDO – A trajetória da atriz Yara Cortes (1921-2002), começou ainda na escola básica representando em atividades extracurriculares e em festa, seguindo-se ao trabalho como enfermeira do Exército na base de Parnamirim, em Natal (RN), durante a II Guerra Mundial e trabalhou como aeromoça. Em 1948, quando foi aprovada num teste para trabalhar na Companhia de Teatro Dulcina e estreou no mesmo ano o espetáculo Mulheres, que lhe rendeu um prêmio. Seguiram-se, então, as peças teatrais As solteironas dos chapéus verdes (1949), Loucuras de Madame Vidal (1950), Diabinho de saias (1953), Figueira do inferno (1954), O mambembe (1959), A profissão da senhora Warren (1960), Apegue meu spotlight (1961), Antes tarde do que nunca (1964) e O chifrudo (1978). Ela também atuou no cinema com os filmes O palhaço, o que é? (1959), Viver de morrer (1971), Jerônimo, o herói do sertão (1972), Obsessão (1973) e Rainha diaba (1974). Ela já atuava na televisão em novelas da TV Tupi, a partir de 1951, passando pela TV Record (1969) e entrando na TV Globo, em 1971. Aqui a nossa homenagem para esta grande atriz. Veja mais aqui.


THE MAGUS – O filme de mistério The Magus (O Mago), dirigido pelo cineasta britânico Guy Green (1913-2005), com roteiro e baseado no livro homônimo do escritor e novelista britânico John Fowles (1926-2005) que também atua como capitão do navio, contando a história de um escritor inglês em crise existencial que aceita o posto de professor de língua inglesa numa distante ilha, aproveitando para terminar o seu relacionamento com uma aeromoça francesa. Ao chegar na ilha, ele encontra um homem misterioso a quem os habitantes não o conhecem por ser dado como morto durante a II Guerra Mundial, após ser acusado de colaboracionismo com os invasores nazistas. Ao visitar a casa de um amigo, ele descobre a presença de uma bela mulher americana, quem a princípio vira em retrato que seu anfitrião informara ser de uma pessoa que morrera durante a Primeira Guerra Mundial. Ao se certificar de que a mulher existe e não é um fantasma, ele acha que está sendo vítima de um jogo doentio, disposto a continuar por se sentir atraído pela bela mulher e quer descobrir a verdadeira relação dela com o homem misterioso. O destaque do filme fica por conta da atriz dinamarquesa Anna Karina, que começou sua carreira como modelo até conhecer Jean-Luc Godard, com se casaria posteriormente, passando a atuar em filmes, até se tornar uma das atrizes-símbolo da Nouvelle vague. Em 1967, ela foi homenageada por Serge Gainsbourg no filme musical, “Anna”. Veja mais aqui.

IMAGEM DO DIA
 A arte do desenhista inglês Thomas Rowlandson (1756-1827)


Veja mais no MCLAM: Hoje é dia do programa Tataritaritatá, a partir das 21hs, no blog do Projeto MCLAM, com a apresentação sempre especial e apaixonante de Meimei Corrêa. Na programação: Especial Gonzaguinha & mais Duofel, Tom Jobim, Djavan, Elis Regina, Zizi Possi & Edu Lobo, Vanessa da Matta, Toquinho, Maria Rita, Jorge Vercilo, Sonia Mello, Gilton Della Cella & Horácio Barros Reis, Danny Calixto, Wagner Ponzo & Wander Ponzo & Duethos Acústicos, Elisete Retter & Edward Brown, Julia Crystal & Mônica Brandão, Mazinho, Colette Dereal, Carlos José, Marlena Shaw, Toni Basil, Kirka, Oliver Mtukudzi, Debby Boone, Andrea Bocelli & muito mais. Em seguida, o programa Mix MCLAM, com Verney Filho e na madrugada Hot Night, uma programação toda especial para os ouvintes amantes. Para conferir online acesse aqui.

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quinta-feira, maio 29, 2008

OSMAN LINS, MIGUEL ASTURIAS, LANGSTON HUGHES, MASTRO-VALERIO, LITERATURA & DORO

 
A arte do pintor italiano Alessando Mastro-Valerio


DORO: TESTAMENTO DE BOCÓ - O trio maloqueiro - Doro, Robimagaive e Zé Corninho -, passou pela maior humilhação. Já dá para se imaginar a besteirada. É o seguinte: por ser a única candidatura presidencial clandestina mas levada a sério pelos postulantes, possuía um candidato com dois vices e meio mundo de leseira, já se davam com mais votos nas pesquisas que o segundo colocado e menos que o primeiro. Quer dizer: garantidos no segundo turno onde iam deslanchar de vez. Bote pabulagem nisso. Esses parceiros das porcarias conseguiram, pasmem, ser a vitima do próprio feitiço: fecamepa! Ôxe, contavam com milhões mas chegando a ter apenas dois dos três votos certos. Resultado: - Aiguém de noisis num votô em noisis. Danou-se. Doro estava fulo. Os olhares de desconfiança pairavam sobre Zé Corninho, o mais broco da trupe. E a pressão? No grau. De Zé Corninho ter um troço: morre mas num morre. Vote! Robimagaive no pé da cama, vigilante. Maior esculacho. - Ocê vai ter que cuspir verdade, cabra-safado! Se morrê mordendo a língua eu te mato de novo, fi´-duma-égua! Aí era que Zé Corninho dava de morrer de verdade. Doro providente para matá-lo do coração insinuou fazer-lhe um testamento ainda em vida. Tomou de umas folhas de papel para que o de cujus redigisse a sua carta sigilada de próprio punho, voluntariamente compulsório, intato, sem vícios, sem suspeita, nulidade ou falsidade, depois autenticá-lo em lavratura de oficial público, devidamente registrado, arquivado e cumprido a sua última vontade. Como o Zé era desprovido de alfabetização, Doro mesmo garranchou sua vontade. - Como é mermo o nome desse apaideguado? - Quem sabe. Bota aí Zé Corninho mermo. - Pronto. - Afiliação? - Ôxe, tu inda qué saber da vida regressa desse sujeitim mais amaldiçoado. Bota aí, como é mermo? - Ingrinorados. - Isso, ingrinorados. F´io de chocadeira. - Bem, agora vumo dar uma partilhada nos bem dele -, asseverou Doro. - Agora é qui vai cumeçar o estrupício. Ele só tem dele mermo é muita gaia. Mais nada. Contudo, no levantamento constou dois penicos, um radinho de pilha mudo, uma prótese dentária rachada, um cachorro guenzo murcho e cheio de carrapato, meia bisnaga de dentifrício de marca nunca dantes descoberta, uma cueca samba-canção com um buraco enorme no furico, uma coleção de calendários de anos passados com mulheres nuas, um brasão com o escudo do Flamengo, um Padre Cícero impresso, três pule do bicho de anteontem, uma espingarda soca-tempeiro sem gatilho, um prato plástico, uma colher torta, um caneco de alumínio desgastado, um crucifixo envergado e sem corrente, um comprimido vencido, um farrapo de calção, duas camisas bufentas e uma carteira plástica com um ou dois documentos comprobatórios da existência dele. Isso sem contar com o sapo cururu véio de estimação coaxando nada. Vasculhado tudo, nenhum centavo nem mais teréns. - Vamo começá o serra-véia. Os penico fica com quem? - Essas coisa de nada de imprestáve devia de dá nem prá pobre de Jó. Só quem qué isso é o lixo! Joga fora essas catrevagem. Ôxe, Zé Corninho se agoniava. Dava ataques de quase num ter quem controlasse a apertura espremida do cara. - S´acalme, frebento, tu vai morrê pro bem ou pro mal. Diga logo sua vontade finá. As única coisa que tu tem demais é gaia, isso ninguém qué! Vamo repartir as tranqueiras bem certinho. Na verdade, além das gaias, Zé Corninho tinha uma coleção de mulher, ao todo catorze, ou melhor, dezesseis, com uma penca de menino buchudo, tudo filho dele - isto é, nunca se passou na sua cabecinha tola de fazer um teste de DNA. Melhor assim, com certeza, morreria do coração com a participação de anônimos muitos na confecção de sua prole. Robimagaive mesmo já dizia o resultado: pai não identificado. Como Zé Corninho num se pronunciava, Doro, de comum acordo com Robimagaive e na presença de mais três testemunhas catadas na rua, saiu presenteando alheios e, depois de lido, relido e confirmado à força, tascou a impressão digital do Zé, assinando ele e o Robimagaive a rogo, mais as três testemunhas. Pronto, testamento cerrado, foi aí que Zé Corninho botou prá chorar o maior pranto desolador. - Tome, disgraçado! Castigo em gente é pió do que em bicho. Isso é pr´aprendê! Se num morrê dessa, a gente interra vivo mermo. Num teve quem controlasse o desespero dele de se ver divorciado de seus preciosos e estimados teres. Nem as mulheres e nem os bruguelos todos doíam distanciar-se. Dos pertences? Ora, tudo tido na maior conta da sua estimação. Era como roubar a sua alma. Por isso fez um último esforço e se justificou: - Eu vortei, maisi a máquina lá do voto, cancelô tudo. Eu quiria era votá só n´eu. Num achei meu retrato lá. Danei o dedo nas tecras. A máquina imbucetô tudo. Num deu, bufe. Apagaru tudo e disseram que meu voto era de um tá de nulo, sei lá quem é esse fi´o-da-peste, fiquei brabo e fui ispulso do locá. A gente tem qi si vingá desse nulo, esse desaforado que votô pru eu. Héhéhéhéhéhé. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados.
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PENSAMENTO DO DIASou latino-americano. Isso não significa que não me orgulhe do sangue indígena que herdei. Sou mestiço com muito sangue índio; pode-se perceber isso em meus traços. Mas me sinto mestiço porque o futuro da América Latina depende da mestiçagem. Que também significa equilíbrio, compreensão mútua. Pensamento do escritor, jornalista, diplomata guatemalteco Miguel Angel Asturias (1899-1974). Veja mais aquiaqui

A LITERATURA – [...] a literatura é fonte de si mesma enquanto escrita de uma sensibilidade, enquanto registro, no tempo, das razões e sensibilidades dos homens em um certo momento da história. Dos seus sonhos, medos, angústias, pecados e virtudes, da regra e da contravenção, da ordem e da contramão da vida. A literatura registra a vida. Literatura é, sobretudo, impressão de vida. [...]. Trecho extraído de História & Literatura: uma velha-nova história (Debates, 2006), de Sandra Jatahy Pesavento.

OS GESTOS – [...] Para sempre exilado – pensou. Minhas palavras morreram, só os gestos sobrevivem. Afogarei minhas lembranças, não voltarei a escrever uma frase sequer. Igualmente remotos os que me ignoram e os que me amam. Só os gestos, pobres gestos. Os pensamentos fatigaram-no. Veio, como de outras vezes, a idéia de que tudo aquilo poderia cessar, restituindo-o à companhia dos seus, mas ele recusou a esperança. “Nunca mais”, insistiu. “Nunca. Essa é que é a verdade.” Súbita, febril impaciência fê-lo agitar-se, trazendo-lhe à mente o seu despertar um mês antes e o horror ao perceber que estava sem voz, mas ele tentou afastar a lembrança. “Esquecer todas as palavras. Resignar-me ao silêncio”. [...] De olhos cerrados, ouviu-as murmurar. Três mulheres espantadas queriam que lhes dissesse algo. Deviam saber que isso era impossível: sua voz estava morta. Quando pereceriam os olhos? Quando seria a morte da memória? Afastaram-se os passos, confusos, entrelaçando-se como os fios de uma trança. Mariana, Lise e a mulher fundiram-se numa sombra vaga, dispersaram-se e mergulharam na chuva que as dissolveu. Ele corre na manhã invernal, os pés descalços cortando poças de água. A prima chama-o à janela; voam cabelos sobre o rosto infantil, que sorri. A viagem do barco de papel repousa nas mãos da menina. Ele toma-o, curva-se, entrega-o à enxurrada. Nascem veleiros, alvíssimos, libertos no mar. [...]. Trecho da obra Os gestos (Moderna, 1994), do escritor e dramaturgo Osman Lins (1924-1978). Veja mais aqui.

DOIS POEMAS - CANÇÃO DE AMOR NA VITROLA - Pegaria o Harlem à noite / pra torcê-lo a teu redor, / Pra fazer uma coroa pegaria luz de neon, / Pegaria carro e Avenidas, / E os táxis, e o metrô, / E por tua canção de amor à surdina iria o tom / E do Harlem o rubor / Pulsaria como tambor, / Que gravado em rodopio, / A girar e a ser ouvido, / Faz dançar o dia nascido / Com você, mulata doce, que no Harlem acaricio. EU, TAMBÉM - Eu, também, canto a América / Eu sou o irmão mais preto. / Quando chegam as visitas, / Me mandam comer na cozinha. / Mas eu rio / E como bem, / E vou ficando mais forte. / Amanhã, / Quando chegarem as visitas / Me sentarei à mesa. / Ninguém ousará, / então, / me dizer, / “Vá comer na cozinha”. / Além do mais, / Eles verão quão bonito eu sou / E se envergonharão – / Eu, também, sou a América. Poemas do poeta, ativista social, novelista e dramaturgo estadunidense Langston Hughes (1902-1967).


A arte do pintor italiano Alessando Mastro-Valerio



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