TRÍPTICO DQP – Entre devires e distopias... - Ao som
do álbum Dedicado a você (1967), de Rogério Duprat. – Ouço a música do dia,
as ruas dão nas estradas caminhos afora e se por trás das
montanhas ao redor da minha cidade, o dia dorme, a noite é viva para que
ninguém, ninguém mesmo, Anteu vunerável arrede dali - resíduos que sobram de
mim entre o latente e o que se perdeu. Não vejo ninguém e voo perdido, até que a
escritora estadunidense Laura Ingalls Wilder (19867-1957)
me saúda com um sorriso: Uma boa risada
supera mais dificuldades e dissipa mais nuvens negras do que qualquer outra
coisa. Estou começando a entender que são as coisas simples e doces da vida,
que são as verdadeiras. Entendo o que fala,
mas sei que meu povo teima temores de certo fantasma vermelho que atenta suas
vidas e pode se danar pelo precipício. Nada mais bizarro porque não enxergam
nada mais além do colorido das vitrines ou imersos nos seus rancores por
desejar o ócio da riqueza dos seus sonhos triturados queimando a carne,
enquanto singram pela milenar mentira do crucifixo entre as mãos, pedintes de paz
que só fazem guerrear porque a escola é a grande vaca reprodutora dos estúpidos
que se escondem medrosos com a tela acesa na sala. É só o que veem e não vivem.
Eu sei que a vergonha do meu país não é de hoje! Como disse Antônio Cândido: A vergonha do Brasil sobreviveria até em páginas de
poetas imortais, como uma de Heine em que o
poeta fala no capitão negreiro que deixou trezentos escravos no Rio. É tudo tão deprimente, quando nem me dou conta de cruzar com
Michel Laub que me
fala: ... sobre o que era ser jovem numa
América tomada por corporações, individualismo e falta de perspectivas...
Bem que me lembro que me vivi ilhado por tudo isso, nada mais sem graça e os
que passam e voltam logo somem nas sombras que se
alimentam do meu sangue e não viverei tanto para ver este século 21 seguir à
revelia de todos.
Duas ou três coisas de nada... – Imagem: Arte de Carybé – Mas que dia é hoje e nem
sei das horas, faz tempo que ontem se repete cabisbaixo por quantos anos de
escuridão e incúria. Vivo de acenos esporádicos, quando não abruptos encontros,
a exemplo do escritor hondurenho Augusto Monterroso
Bonilla (1921-2003) que de longe traz suas dores: Você sofre de uma das doenças mais normais da raça humana: a
necessidade de se comunicar com seus pares... Sim? E prossegue: Acredite em si mesmo, mas não tanto; duvide
de você, mas nem tanto. Quando você sentir dúvida, acredite; quando você crê,
duvide. Nisto reside a única sabedoria verdadeira que pode acompanhar um
escritor. Sim, eu sei, e como apareceu, sumiu. Às vezes um ou outro aparece
sem novidades, a exemplo de Amos Oz que me dizia baixinho coisas que gritava
dentro dele a me surpreender: Às
vezes é exatamente a fala tranquila que desperta a ira e a agressão dos
opositores... Nossos ancestrais
inventaram o sentimento de culpa. Depois vieram os cristãos e fizeram o
marketing com um sucesso colossal por todo o mundo. Mas a patente é nossa. Eu,
como judeu, tenho sentimentos de culpa terríveis por termos inventado o
sentimento de culpa. E mais adiante apenas o canavial de nenhuma esperança.
Ele deu-me as costas para que a pesquisadora Izaura Rufino Fischer alertasse: O problema tem raízes na concentração da terra e se expressa de forma
diferenciada nos vários recantos do país. Na Zona da Mata de Pernambuco, a
cultura própria do latifúndio dá nitidez às desigualdades sociais e ao
antagonismo de classes... O que resta de dor, pés no chão, olhar no
horizonte, voo sem rota prevista porque a tarde é quase a mesma no calendário.
De pés e caminhos... - Imagem: Arte de João
Câmara. - O tempo sangra e mais adiante o que poderia ser e não é. Se não tenho onde cair
morto, resta penar vida afora, tropeços e falência. A mãe que se foi ainda vive
em mim órfão da vida. De um lado pra outro a soberba deselegante, vozes do
umbigo e desfile da indiferença. Quase não reconheço ninguém porque tudo é
muito estranho e hostil, exceto sorrisos amigáveis e passageiros que logo se
vão sem deixar rastro. E se uma ou outra vistosa me chama a atenção, logo
fenece pro meu desinteresse. Outra é a Mamie Van Doren: Eu nunca
quis ser uma esposa troféu. Eu queria fazer sozinha. Eu não queria depender de
um homem... O meu melhor trunfo é o meu cérebro. Sem meu cérebro, não acho que
o resto de mim estaria muito quente. Sou solidário e compreendo a milenar
imposição patriarcal. Surpresa agradável é dar de cara com a professora e atriz Rita
Von Hunty: Precisamos
visibilizar os corpos e vozes ainda tão invisíveis... Ao mesmo tempo eu tento
quebrar o estereótipo também de que todo professor é homem, branco e pedante.
Não existe só um jeito de ser intelectual... Com a possibilidade da morte,
podemos criar mecanismos para realizar os próprios desejos, antes que seja
tarde demais. E isto pode ser positivo. Ouço dela o eco que povoa minhas
ideias insistindo que não temos nada a perder, a não ser quebrar
de vez e definitivamente todos os nossos grilhões: não ceder à paralisia do medo nem à tristeza da
maldade é o primeiro passo... O que sei é que
certeza alguma ditará o que fazer, as dúvidas me fazem respirar e sinto que
posso renascer a cada momento. Até mais ver.
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