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DE POEMAS & ÓPERAS – (Imagem
Loja Maçônica Fraternidade Palmarense, do artista Cícero Santos). - Numa certa manhã de um dia qualquer, tinha lá eu
por volta dos meus 12 ou 13 anos de idade, entretido curiosamente com a audição
na vitrola, de um álbum duplo com a antiópera Pelléas et Mélisande, do compositor francês Claude Debussy
(1962-1918), indicação do meu primo-guru Afonso Paulo Lins, quando percebi a
presença de um certo senhor na sala da minha casa. Voltei pra ele e disse: -
Sim? Ao que ele insinuou: - Isso é...?!? – Debussy. -, respondi-lhe. – Sim.
Você gosta de Debussy? Sim, gosto da música dele – falei com certa empáfia
peculiar aos da minha idade -, mas não conhecia esta obra, nem sabia que ele
compunha óperas. Já tinha ouvido outras de outros autores, como Wagner, Mozart,
Berlioz, Verdi, Bizet, mas essa não. Aí ele me disse: - Vou ali conversar com
seu pai e volto já. Você gostaria de ouvir algumas óperas? Tenho algumas comigo
e gostaria de dividir com você, pode ser? – Sim -, disse-lhe, voltando à
audição. Meia hora, mais ou menos, depois, ele retornou: - Já conversei com seu
pai e acertei com ele que lhe pegaria depois no cartório pra gente fazer umas
audições, está certo? Respondi positivamente e me despedi dele com um aperto de
mão. Nem sabia quem era, recorri ao meu pai: - É o professor Eliseu, advogado
amigo meu, cantor lírico, poeta, professor do Senai e de outras escolas daqui.
Sim, sim. Tempos depois folheando a antologia organizada pelo poeta Juareiz
Correya, Poetas dos Palmares, de 1973,
vi dois dos seus poemas e fiquei sabendo que ele escrevia e publicava no jornal
local A Notícia. Uma manhã, dias depois, ele chegava ao cartório, falando com
meu pai: - Rubinho, permita que eu leve seu filho para umas audições? Sim,
claro, professor. Ele, então, me levou até o carro e me conduziu para a Fazenda
Cachoeira Dantas, na vizinha cidade Água Preta, enquanto me falava a respeito
de uma ópera que rolava no toca-fitas do veículo. Chegando ao local, chamou-me
e adentramos na casa grande da fazenda, até uma sala em que um certo senhor de
idade ouvia atentamente uma ópera que eu não conhecia. Silêncio absoluto, só a
música reinava até o final. Foi aí que o professor me apresentou ao deputado
Joaquim Coutinho, que me olhou com surpresa com as palavras que me davam como
ouvinte de ópera. – Tão jovem! -, disse ele. E entabulou uma conversa até chegar
a hora do almoço, quando nos reunimos à mesa com perguntas sobre os meus
compositores preferidos, ao que falei que gostava de boa música, sim, nomes,
Beethoven, Mozart, Haydn, Häendel, muitos. O inquérito prosseguiu e eu tive que
falar de obras pianísticas, sinfonias, mas não só, apreciando bossa-nova, xote,
armorial, baião, rock, jazz, enfim, desde tenra idade eu sempre tive o ouvido
colado no rádio e apreciava música de todo tipo. – Eclético -, disse o deputado
pro professor, enquanto solfejavam um pro outro alguns trechos de valsas,
concertos, sinfonias, algumas até eu já tinha ouvido. Depois do almoço nos
despedimos e o professor me levou de volta pro expediente no trabalho. Isso se
repetiu uma vez por mês ou a cada chegada do deputado à fazenda, mandando me
chamar pelo professor para novas audições. Foi com isso que estreitei amizade
com o professor Eliseu, com quem, tive o prazer de aprimorar meu conhecimento
musical, vez que ele era integrante do elenco do Teatro de Ópera de Pernambuco,
bem como dos mais diversos assuntos comprovando a sua erudição. Lembro bem da
notícia do seu falecimento em 1979, fato que muito lamentei e que me trouxe à
memória os últimos 6 anos, entre os quais, os momentos dos nossos encontros mensais
regados à música e literatura. Lembro-me bem, certa vez, quando ele sacou um
volume de folhas e recitou-me vários de seus poemas, entre eles Gênesis e Pelagia. Gostava da sua companhia, da impostação da voz ao recitar,
nos solfejos e cantos à capela de trechos belíssimos de óperas, das instruções
na introdução da teoria musical e, sobretudo, das brincadeiras eruditas –
muitas que eu nem entendia direito o que queria dizer -, mas que me levavam às
gargalhadas com o seu jeitão afetado de enfatizar determinadas palavras com o
rigor prosódico que ele sabia imprimir, abrindo os olhos para flagrar o meu
espanto e riso no final. Soube, durante as vezes que retornava dos nossos
encontros, que ele era envolvido com política, assunto que jamais rondou nossas
conversas, sempre levadas pelos prazeres da música e poesia, tão somente.
Saudades de sua alegre pessoa e do seu tom professoral dedicado de instruir e
esclarecer dúvidas que porventura rondassem meu olhar intrigado sobre qualquer
coisa no andamento musical ou num verso, ou mesmo numa afirmação filosófica que
fizesse. Saudades do professor. © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.
PROJETO MUSEU DO HOMEM DO CAMPO
O Projeto Museu do Homem do Campo 2017, realiza
exposição a partir de hoje na Biblioteca Pública Municipal Fenelon Barreto,
Palmares – PE. O projeto foi classificado no prêmio Educador Nota 10 e divulgado na revista Nova Escola (247-Nov, 2014), realizando exposições desde o ano da
sua criação em 2013, na cidade de Xexéu – PE, com o objetivo de desenvolver
pesquisas sobre fontes histórias da área, organizado pelo professor,
psicopedagogo e poeta Janilson Sales,
autor do cordel O dia em que choveu na
terra dos poetas e dos livros de poesia Famosos
Pés e Viver Livre.
A MULHER
RURAL - A abordagem sobre a condição da
mulher na sociedade envolve um vasto leque de questões e possibilidades.
[...] a característica praticamente
universal da desigualdade entre homens e mulheres, que se manifesta com maior ou
menor intensidade segundo as condições históricas. [...] As circunstâncias que marcaram a organização
das relações sociais, como a exclusão da mulher da linha de sucessão e de
gestão do patrimônio da família, e as limitações impostas na área da educação,
criaram condições para que as relações entre homens e mulheres fossem
hierarquizadas. [...] A expansão do
capitalismo no campo, particularmente na Zona da Mata, contribuiu para reduzir
a agricultura familiar e as oportunidades de trabalho nesse âmbito. Em
decorrência, cresce a luta pelo trabalho e se expandem as reivindicações pelos
direitos sociais naquele meio, desde que o tipo de modernização adotado excluía
pequenos produtores e estimulava a concentração fundiária. [...] Ao colocar-se no seio da luta pelo acesso à
terra, a mulher adquire senso critico para rever princípios de vida que guiaram
sua visão de mundo e dessa forma ameaçar a hegemonia da relação de gênero.
[...] a luta movida para ocupar a terra
tem profundo reflexo na questão de gênero. É possível introduzir mudanças nos
espaços de dominação, começando pelos valores. A mulher (re)constrói a
identidade de gênero no movimento de luta pelo acesso à terra. As mulheres do
acampamento estão investindo na mudança de cultura e, através de sua história,
estão construindo outra história de mulheres. Trechos extraídos da obra O protagonismo da mulher rural no contexto
da dominação (Massangana, 2006), da pesquisadora Isaura Rufino Fischer.
Veja mais aqui e aqui.
CORPO & CONSUMO -- O
mundo começou sem o homem e provavelmente desaparecerá sem ele. Resultado de
processos naturais, o homem é uma das manifestações do mundo. Faz parte,
portanto, da natureza. Mas o homem não pode apreender o mundo tal qual ele é em
sua objetividade: a percepção humana está limitada à sua humanidade,
restringe-se às dimensões e ao alcance do olhar, do paladar, tato, olfato
humanos... A percepção que o homem tem do mundo é irremediavelmente parcial:
indissoluvelmente antropocêntrica, como é bovinocêntrica a apreensão do mundo
por parte desses animais. [...]
Cada cultura “modela” ou
“fabrica” à sua maneira um corpo humano. Toda sociedade se preocupa em imprimir
no corpo, fisicamente, determinadas transformações, mediante as quais o
cultural se inscreve e se grava sobre o biológico. Arranhando, rasgando,
perfurando, queimando a pele, opõem-se nos corpos cicatrizes-signos, que são
formas artísticas ou indicadores rituais de posição social: mutilações do
pavilhão auricular, corte ou distensão do lóbulo, perfuração do septo, dos
lábios, das faces, decepamento das falanges, amputação das unhas, alongamento
do pescoço, incrustações, apontamento dos dentes, extração dos mesmos,
deformação cefálica, atrofiamento dos membros, musculação, obesidade ou magreza
obrigatória, bronzeamento ou clareamento da pele, barbeamentos, cortes de
cabelo, penteados, pinturas, tatuagens... Em suma, um sem-fim de práticas que
se explicam por razões sempre sociais, de ordem ritual ou estética [...] Enfim, o meu corpo – sem que o possessivo contenha
pleonasmo. Finalmente, todos com seus corpos: eis a utopia maior. Cada um com a
sua originalidade, genuinidade, especialidade; cada um, então, com sua
individualidade, com seus próprios limites, seu território à parte, que deve
ser preservado. O direito de cada um começa onde termina o do outro: é por isso
que, nas línguas das sociedades industrialmente desenvolvidas, devemos pedir
desculpas ao interlocutor desconhecido, quando lhe dirigimos a palavra, quando
tocamos involuntariamente em seu corpo ou em algo seu. É preciso não misturar e
confundir as identidades individuais: no final do processo, não mais todos com
seus corpos e suas sepulturas, mas com seus xampus, seus vestimentos, seus
apartamentos, seus grilos, seus direitos, seus para-brisas, seus pneus, seus
inconscientes, seus amores, seus tempos, seus, seus, seus... Enfim, o corpo
meu, individual. Mas também o corpo banal, medíocre, corriqueiro, comum. O
corpo “original”, da sociedade em que a originalidade, procurada por todos,
banalizou-se. O corpo “extraordinário”, do mundo em que a excepcionalidade,
buscada por cada um, se transformou em regra geral. O corpo “individual”, de um
contexto em que a coisa mais comum e coletiva é exatamente o individualismo.
[...] Trecho da obra Corpo e consumo: roteiro de estudos
e pesquisas (PUC-Rio, 2012), de Everardo Rocha e José Carlos Rodrigues, destacando o
pensamento do Dr. D. Hacket, acerca da saúde nos anos de 1925: [...] A saúde dos trabalhadores deve ser mantida e
melhorada enquanto meio de produção... Frangos, cavalos de corrida, macacos de
circo são alimentados, alojados, treinados e mantidos no mais alto nível de
força física para assegurar um rendimento máximo em suas funções respectivas. O
mesmo princípio se aplica aos seres humanos. Um aumento da produção só pode ser
esperado dos trabalhadores se se atribuir uma grande atenção a seu ambiente
físico e às suas necessidades.
CONTINHO
– Era uma vez um menino triste, magro e
barrigudinho, do sertão de Pernambuco. Na soalheira danada de meio-dia, ele estava
sentado na poeira do caminho, imaginando bobagem, quando passou um gordo
vigário a cavalo: - Você aí, menino, para onde vai essa estrada? – Ela não vai
não: nós é que vamos nela. – Engraçadinho duma figa! Como você se chama? – Eu
não me chamo não, os outros é que me chamam de Zé. Conto extraído da obra Crônica (Ática, 2002), do
escritor e jornalista Paulo Mendes Campos (1922-1991). Veja mais aqui.
GARANTO
QUE FOI POR ELA QUE O MEU JUMENTO RINCHOU - Jumentinha
viajada / de andar esquipador / melhor que égua baixeira / ou de andar andador
/ de trote baixo ou xotão / pelo rudado ou cardão / parece ruça na cor / é
jumentinha donzela... / garanto que foi ela / que meu jumento rinchou! Poema
extraído da obra Agruras da lata d’água
(Bagaço, 2012), do poeta, compositor e intérprete Jessier Quirino, autor de
excelentes livros como Paisagem do interior (1998), Além de
Paisagem do Interior (1998), Prosa Morena (2001), Política de Pé de Muro
(2002), Bandeira Nordestina (2006), Berro Novo (2010), Papel de Bodega (2013),
além dos infantis Chapéu
Mau e Lobinho Vermelho e Miudinha, entre outros CDs e DVDs, acompanhado dos
filhos que são os músicos Vitor Quirino (no violão) e Matheus Quirino
(percussão).
Veja
mais sobre:
&
DOIS POEMAS DE ELISEU PEREIRA DE MELO
GÊNESIS
Crise de paroxismos de luz / ofuscando seres
vivos e inermes / cegando brilhos eternos de estrelas candentes, / espargindo
reflexos de prata fundente. / Tudo é luz que se liberta de prisões hélias; /
tudo é luz que fecunda coisas e gentes; / tudo é luz que germina óvulos
dormentes; tudo é luz que amplia células viventes. / Uma vez te vi no clarão
ofuscante / e eras uma intenção sem brilho e cor. / Toquei de leve o teu seio.
/ E foste envolvida pelas luzes ; de todos os arco-íris das regiões conhecidas
e ignotas / e mais um mundo foi criado.
PELAGIA
Quando te conheci foi diante do mar. / A água
no vai e vem da maré vazante / beijou os nossos pés nus aprovando o nosso amor
/ e retirou-se para observar e suspirar conosco. / Uma gaivota solitária passou
sobre nossas cabeças / e grasnou desaprovando o nosso idílio / - por inveja ou
ciúme talvez - / compreendi que fora traído por amor. / Depois o mar voltou em
revolta / pois lá já não estávamos; / restava somente a forma do teu corpo
sobre a areia. / Em fúria apagou a lembrança da tua presença / e voltou ao seu
leito para repousar, / enquanto minha alma absorvia todo o seu desespero.
Poemas
extraídos da antologia Poetas de Palmares
(Palmares, 1973), organizada por pelo poeta e editor Juareiz Correya. Veja mais aqui.
A ARTE DE CÍCERO SANTOS