A VIAGEM DA VIDA (Imagem:
arte da gravdora, escultora, pintora, muralista, curadora, figurinista,
cenógrafa e professora Maria Bonomi – Pra quem vem ou vai, mesmo caminho,
tantas apreensões. Tal impressão digital, a íris do olho, somos tão iguais como
as águas na corrente, quão diferentes como os dias uns aos outros. Passo
adiante, viagens que já fiz. Quantas e tantas felicidades sonhadas, almejadas,
qual a minha, muitas. A paisagem é só minha, pros outros não é nada; se chove
ou ensolarado, sigo o que sinto, sorrio mesmo que me virem as costas ou me
ignorem, sem ao menos acenarem, sequer, com suas situações extremamente
difíceis, por vezes delicadas ou terríveis. São meus, apesar deles. Os guardo
no apreço, mesmo que assim não seja pra mim. Não me esquivo nem quero escapar
dos obstáculos; vivo, superá-los, sim, pra que outros venham e eu vença a mim
mesmo. Apesar dos pesares, tenho esperança e isso me faz viver e justifica a
minha existência. Ainda hoje não me conformo com a miséria nem infortúnios,
quero ser feliz, sei o que mereço e me permito ir embora para poder chegar. Se
me aceitam, uivo entre lobos pela floresta de erros, pelos vales de lágrimas,
tal como eu muitos, senão todos, voltaram de mãos vazias, mas não reclamo tanto
esforço por experiências cruéis, nem das cicatrizes que emergiram das
tribulações. Mesmo que pareça tudo em vão, mesmo que não tenha nenhum sentido
ou me veja entre saberes perdidos, renasço na capacidade do maravilhamento e
estarei lá como sempre estive e estou no ato da presença, aqui e agora, porque
penso e sou; do contrário, só existiria. Sempre haverá imagens nos pensamentos,
só escolho e me abandono ao árduo trabalho que me dá o prazer de criar. Quando
muito retorno às origens, pra raiz, a semente que fui e tornar a sê-la pra me
conciliar com tudo e todas as coisas. De bom grado lavo as mãos para me sentir
purificado, bebo a água límpida da fonte e respiro profunda e intensamente em
paz. A vida é uma longa viagem, voo pra Shamballa vibrar em uníssono com os
harmônicos cantos cósmicos sintonizados na minha freqüência e a estação divina me
faz sentir a atração do amor. © Luiz
Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.
FALANDO SÉRIO COM MÁVIO AVES
Nesta
terça, dia 29/08, a partir das 11hs, estarei Falando Sério com Mávio
Alves, na Rádio Cultura dos Palmares,
debatendo sobre o tema O Brasil pelo
avesso na hora da crise!
SOBREVIVI
PARA CONTAR - [...] Ouvi
quando os assassinos chamaram meu nome. Estavam do outro lado da parede, menos
de 2,5 centímetros de gesso e madeira nos separavam. Suas vozes eram frias,
duras e decididas. - Ela está aqui... Sabemos que está aqui em algum lugar...
Tratem de encontrá-la, encontrem Immaculée. Eram muitas as vozes, muitos os
assassinos. Eu podia vê-los com os olhos da mente: meus antigos amigos e
vizinhos, que sempre me haviam recebido com amor e bondade, andavam pela casa,
munidos de lanças e facões, e chamavam meu nome. – Já matei 399 baratas – disse
um deles. - Com Immaculée serão quatrocentas. Esse é um bom número para se
matar. Encolhi-me, sem mexer um músculo sequer, em um canto de nosso minúsculo
banheiro secreto. Assim como as outras sete mulheres que se escondiam comigo
para proteger suas vidas, prendi a respiração para que os perseguidores não nos
ouvissem. Suas vozes dilaceravam minha carne. Senti-me em fogo, como se
estivesse deitada sobre um leito de carvões ardentes. Uma avassaladora onda de
medo tomou conta de mim; milhares de agulhas invisíveis penetraram meu corpo.
Eu nunca havia imaginado que o medo pudesse provocar tamanho sofrimento físico.
Tentei engolir, mas minha garganta se fechou. Não havia saliva em minha boca,
que parecia mais seca do que areia. Fechei os olhos, na tentativa de
desaparecer, mas as vozes soavam cada vez mais alto. Eu sabia que eles não
teriam piedade, e um único pensamento ecoava em minha mente: Se me pegarem,
eles vão me matar. Se me pegarem, eles vão me matar. Se me pegarem, eles vão me
matar. [...] Ela me levou até um
galpão numa área restrita e abriu uma caixa de força de alta voltagem. - Há
mais de 1.500 volts de eletricidade aqui – explicou. – Se os hútus extremistas
invadirem a escola e não tivermos como escapar, podemos vir aqui, puxar essa
alavanca e pôr as mãos lá dentro. Nós morreríamos imediatamente. É melhor ser
eletrocutada do que torturada, estuprada e morta. Não vou permitir que
selvagens se aproveitem do meu corpo antes de me matar. Não faça essa cara de
surpresa... Já ouvi histórias demais de mulheres tútsis que foram estupradas e
brutalizadas em tempo de guerra para não ter um plano de fuga. Concordei com a
cabeça. Era estranho falar em acabar com nossas vidas aos 19 anos de idade
apenas, mas essa parecia uma saída melhor do que a outra alternativa.
Clementine e eu fizemos um pacto e juramos não dizer nada a ninguém, para que
as autoridades escolares não ficassem sabendo e trancassem a caixa de força. Trecho da obra Sobrevivi para contar: o poder da fé me
salvou de um massacre (Objetiva, 2008), da escritora e palestrante ruandesa
Immaculée Ilibagiza, com o relato
sobre o confinamento num banheiro minúsculo com mais sete mulheres famintas e
aterrorizadas, sem condições mínimas de higiene, saúde e alimentação, lutando
contra o desespero e ouvindo as vozes dos assassinos que queriam matá-la
cruelmente durante o genocídio de Ruanda em 1994. Trata-se de depoimento de
como ela conseguiu sobreviver emocionalmente ao massacre de sua família, cujos
detalhes ela também revela em sua narrativa.
MESTIÇAGEM
& CAMPESINATO - [...] Uma das
interpretações – de que uma nociva mestiçagem retardava o progresso do povo
brasileiro, uma vez que o mestiço era tido como racial e fisicamente
desequilibrado, - não resistiu aos estudos efetuados dentro e fora do Brasil,
pouco a pouco foi sendo destruída. Os crimes terríveis cometidos pelos
nazistas, indivíduos de “raça pura”, muito contribuíram para pôr em cheque
preconceitos raciais que se voltavam não apenas contra o mulato e o mestiço,
mas também contra negros, contra judeus e contra outras minorias étnicas.
Assim, a explicação de que o meio rural brasileiro era atrasado e conservava
costumes arcaicos porque povoado de mestiços, inaptos a uma evolução
socioeconômica, não encontrou mais base de sustentação em teorias científicas.
[...] O reconhecimento, descrição e
explicação dos vários processos que compõem a dinâmica da sociedade rural
brasileira parecem destinados a conhecer uma expansão mais lenta do que os
trabalhos efetuados do ponto de vista da organização e da estrutura. Trecho
extraído da obra O campesinato
brasileiro: ensaios sobre civilização e grupos rústicos no Brasil (Vozes,
1973), da premiada socióloga, professoras e escritora Maria Isaura Pereira de
Queiroz. Veja mais aqui, aqui e aqui.
MEIO
AMBIENTE – [...] O desconhecimento dos
efeitos resultantes do uso intensivo do carvão deu origem às primeiras
ocorrências de doenças profissionais e à contaminação das regiões onde
predominavam as atividades de mineração. Acidificação dos solos, emissões de
particulados, degradação das condições de vida nos núcleos populacionais
próximos das minas e usinas foram os primeiros efeitos dessa industrialização
nascente, desordenada, que envolvia riscos ainda desconhecidos par a saúde
humana e o meio ambiente. O relacionamento entre causas e efeitos da poluição
ambiental era então precário. Embora os acidentes de trabalho fossem, nessa
fase inicial da industrialização, muito freqüentes, os acidentes ambientais,
como hoje são conhecidos, não eram tão evidentes. [...] Os acidentes urbanos exercem grande impacto
sobre a sociedade não somente devido a sua proximidade e ingerência sobre a
vida de cada cidadão, como também pelo temor de que possam se repetir. Para que
essas tensões remanscentes possam ser eliminadas ou, pelo menos, reduzidas com
o passar do tempo, algumas providências de largo espectro devem ser tomadas
pela comunidade, encabeçadas pela administração municipal e pelas instituições
locais voltadas à proteção ambiental e à manutenção da qualidade de vida. Essas
providências devem incorporar a conscientização da população para os riscos de
acidentes, a busca de participação pública em programas de prontidão, a
formação de fundos especiais para fazer frente a emergências, o desenvolvimento
de recursos humanos treinados para participar de equipes de emergência e, muito
importante, o fortalecimento das instituições ligadas ao bem público e ao
atendimento emergencial de acidentes. [...]. Trechos extraídos da obra Meio ambiente: acidentes, lições, soluções
(Senac, 2003), de Cyro Eyer do Valle e Henrique Lage. Veja mais aqui, aqui,
aqui e aqui.
MULHERES
& SEXUALIDADE - A espécie humana
levou dois bilhões de anos para atingir o primeiro bilhão de habitantes. Isto
aconteceu por volta da metade do século XIX. Mas, de 1850 para 1980, este
número se elevou para quatro bilhões. Portanto, em pouco mais de cem anos, a
população do planeta quadriplicou. Esta curva exponencial do aumento de
população deve-se ao avanço tecnológico, principalmente ao avanço da tecnologia
médica, que baixou as taxas de mortalidade, sem ter tocado nas de natalidade.
Este instantâneo apinhamento de seres humanos sobre a face da Terra está
causando problemas da maior gravidade, seja para a sobrevivência da espécie,
seja por motivos políticos, ideológicos e econômicos. O crescimento
populacional aconteceu dentro de um sistema socioeconômico baseado na
exploração de alguns seres humanos sobre outros: o capitalismo. É dentro deste
conceito de exploração capitalista que o problema populacional torna-se, a nosso
ver, o mais grave da época atual. [...] São os homens dominados também, quando
dão aos atributos físicos da mulher maior valor erótico. Quanto mais excitante
o físico, mais condições dá a sexualidade masculina, mais localizada no físico,
de “funcionar” melhor. Em outras palavras, quanto maior o domínio do homem pelo
homem, maior, também, o da mulher pelo homem. Mais impessoal, mais objetivada
também a relação que vai do homem para a mulher, e maior ressentimento desta.
Na Zona da Mata, por exemplo, em que a mulher já tem outro status, apesar da
grande miséria, os homens falam mais em atributos pessoais (mesmo que sejam
tradicionais) do que os operários e camponeses do Agreste, e as mulheres
parecem ser mais donas de suas decisões. [...]. Ao invés de denegar o corpo que é hoje o apanágio da burguesia, é
preciso tomar da burguesia o corpo e fazer dele um corpo de todos, um corpo
liberto. Tomar o corpo como ele é, aqui e agora, com todos os seus desejos
contraditórios, e começar a criar a partir do povo novos padrões de
comportamento de corpo que nada tenham a ver com os da burguesia, e que lhes
permita perceber que eles também são seres humanos inteiros e desmascarar,
assim, todo o jogo da sociedade burguesa. Trechos extraídos da obra Sexualidade da mulher brasileira: corpo e
classe social no Brasil (Vozes, 1983), da escritora e feminista Rose Marie
Muraro (1930-2014). Veja mais aqui.
NO
SILÊNCIO QUE O SOL QUEIMA - No meio do
trigal, pernas abertas, abrigava pássaros. Era sempre assim. Com a chegada do
verão sentia-se fértil, ensolarada de desejo, mãe da terra. E deitava-se entre
as hastes rígidas, as espigas túrgidas, à espera. Logo, pardais vinham
aninhar-se entre suas coxas, fazendo-a suspirar com a doce caricia das asas.
Esmagava entre os lábios pétalas de papoulas, e gemia. Fremir de plumas,
pequenos bicos, breves pios, delícias. E as línguas do sol sobre seus seios.
Mas era só ao entardecer, quando o gavião em voo desenhava círculos de sombra
sobre o ouro, lançando-se como pedra entre suas carnes para colher o mais tonto
dos pardais, que as hastes estremeciam enfim, inclinando as espigas ao supremo
grito. Conto extraído da obra Contos
de amor rasgados (Rocco, 1986), da escritora e jornalista
ítalo-brasileira Marina Colasanti. Veja
mais aqui.
FISIONOMIA E ESPIRITO DO MAMULENGO - O boneco tem uma vida. É uma transferência na infância e uma fixação na
idade madura. A boneca de pano pode ser tudo: desde a filha à mãe, desde a
comadre à irmã, amiga ou inimiga. O boneco é um ser misterioso, feito, às
vezes, à nossa imagem e semelhança, mas de qualquer modo um entre à parte em
torno do qual podemos construir um mundo. É também um ser arbitrário e poético.
Isto o simples boneco mudo, manejável de acordo com as nossas forças. O boneco
visto no espetáculo transforma-se de ser passivo, dependente, obediente às
nossas mãos, numa criatura de vida própria e atuante, porque, em nossa condição
de espectadores, colocamo-nos em face do inesperado. Toda arte é uma surpresa.
[...]. Trecho extraído da obra Fisionomia
e espírito do mamulengo (Brasiliana, 1966), do escritor, dramaturgo e
advogado Hermilo Borba Filho (1917-1976). Veja
mais aqui, aqui e aqui.
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mais sobre:
&
MINHA PALMARES
Nesta terra de cultura e de grandeza,
Onde o belo é sempre belo a cada dia,
Onde o sonho é mais que encanto e magia,
Onde a vila tem mais vigor e leveza,
Não me sinto só poeta, sou alterza,
Sou palmarense: alma,sangue e raça;
Aqui tudo é verso, é poesia,
Tem sempre um poeta em cada praça.
O açúcar dos teus verdoengos canaviais
Seduz muito mais que adocica.
Quem de outras plagas vem, aqui fica,
Quem bebe de tua água, quer mais,
Quem se vê desesperado encontra a paz
Ao banhar-se em teus rios Una e Pirangy;
Rejuvenesce quanto mais o tempo passa,
E apenas tu, Palmares, tens em cada praça
Um poeta declamando versos p’ra ti.
Serás sempre decantada em lindas canções
Porque deste à luz muitos bons cantores
E graça à pena dos teus escritores
Tua história marcará nossas recordações;
Teus pintores nos dão novas emoções
Com as belas paisagens do teu universo.
Aqui o bem prevalesce se o mal ameaça
É comum avistar-se em qualquer praça
Uma musa e um poeta rabiscando um verso.
Poema do
poeta, advogado e serventuário de Justiça, Luciano
França, extraído da antologia Poetas de Palmares (FCCHBFD, 2002), autor
dos livros Retalhos poéticos (2006), Escritura pública: seu valor
jurídico-social no cotidiano (2012), Renascendo em poesia (2014) e Academia
Palmarense de Letras: a perseguição de um sonho (Bagaço, 2016). Veja mais aqui.