domingo, agosto 29, 2021

DUGPA RIMPOCHE, NAOMI SHEMER, SILVIO TENDLER & VITAL CORRÊA DE ARAÚJO

 

 

 

TRÍPTICO DQP – O retrato de avô... - Ao som da Full Performance (Live on KEXP, 2019) do projeto teatro-musical ucraniano Dakh Daughters, formado pelas artistas Nina Garenetska, Ruslana Khazipova, Tanya Havrylyuk, Solomia Melnyk, Anna Nikitina, Natalia Halanevych e Zo. – O meu avô era eu menino paparicado pelas mulheres da família, verdadeira idolatria, dele e minha. Segui os passos daquele que tornou-se o protótipo de tudo e crescia embalado aos regalos das mãos bobas e buliçosas com cheiradas beijoqueiras de todas as saias e lábios impudentes, afagos de tias, primas, comadres e vizinhas no meu sexo juvenil. Ele o meu ídolo e de todos os que eu conhecia, até vê-lo tombar sepultado nos meus olhos inocentes para o mais honroso dos mausoléus. Homenagens pelos nomes das ruas, bairros, prédios e memórias servis por toda região e nisso adolesci espantado. Ia a vida e por décadas o suntuoso perfil imaculado, nobreza atravessando os anos. Aonde chegasse, ele antes reverenciado até por desconhecidos, antecipava minha recepção: portas escancaradas. Até que um dia alguém maldisse o seu retrato. Quis saber qual a razão. A resposta fulminante na Constituição de Capistrano de Abreu (1853-1927): Todo brasileiro deve ter vergonha na cara. Artigo 2º - Revogam-se as disposições em contrário. Quem? Era o advogado João Roberto A. Neves que reiterava: Todo brasileiro está obrigado a ter vergonha na cara... Os velhacos do serviço público, os magistrados venais, os particulares que enriquecem cometendo os mais diversos atos ilícitos em conluio com agentes públicos, enfim, todos os que usam a máscara da probidade, geralmente tiveram bons professores em casa. E o exemplo de casa vai à praça. Nem sequer entendia direito o que ele falava. Não foi possível qualquer diálogo e procurei os meus a respeito. Fora dos domínios avoengos, o filme era outro: cenas horrorosas, desumanas. Não podia ser, mas era. Aquele a quem venerei era outro e nunca existiu, a não ser na íntima convivência. Fora das vistas e existência, decepcionante. A ponto de repudiar aquela pose no centro da sala.

 


Cenas esclarecedoras... - Era eu muito jovem quando assisti Os anos JK – Uma trajetória política (1980), do cineasta Silvio Tendler. Só aí comecei ligar as coisas e foi tão logo haver sacado as cenas do premiado Castro Alves – Retrato falado do poeta (1999). Liguei as coisas e fui me aboletar na poltrona do primeiro cinema para assistir Jango (1984). A ficha caiu – ah, meu avô. Depois disso, assisti outros: Milton Santos, pensador do Brasil (2001), Memória do Aço (1987), Glauber o filme – Labirinto do Brasil (2003), Utopia e barbárie (2009), Josué de Castro – Cidadão do mundo (1994), Conceição das Crioulas: Vestígios de Quilombo (1996), e muitos outros longas, documentários e series. Dele ouvi: O cinema sempre foi político. E absorvi. (Se quiser, veja mais aqui, aqui e aqui).

 


Desapontamento e consternações... – Imagem: A arte da artista argentina Ides Kihlen. – Mal tinha soletrado páginas dos Princípios de vida (Best Seller, 2004) do lama tibetano Dugpa Rimpoche (1938-1987) e ali grafado: O Universo fica equilibrado quando duas mãos se juntam. Sabia, o solidário me apetece. Foi aí que ele apareceu e me disse ao ouvido: Há um mistério do amor. Aqueles que se amam experimentam no seu coração a força de atração dos astros, a queimadura dos sóis, o começo e o fim dos mundos. Eles morrem e renascem num mesmo corpo. O amor é a outra vertente da solidão, o seu lado iluminado. Parecia restabelecer o ânimo, mas a vida passa entre ventos que vão e voltam...

 


Outras quedas, que coisa!... – Imagem: a arte do escultor, artista plástico e designer gráfico Amilcar de Castro (1920-2002). – A surpresa na cena: era a comédia Seis personagens à procura de um autor. Naquele tempo eu tinha uma vaga ideia a respeito do autor. Logo outra, a Assim é: se lhe parece, me chamou atenção. Tornei-me assíduo, onde entrasse em cartaz ou encontrasse livros, lá estava eu curioso: O conto d’A senhora Frola e o senhor Ponza, o Vestir os nusAh, Ercília nua, a comédia A patente, os relatos d’O falecido Mattia Pascal e o que ele dissera a respeito da arte. Lá estava eu envolvido com o que ele convencionou chamar de teatro do espelho, porque nele retratava a vida real, amarga e sem a máscara da hipocrisia. O inacreditável era que ele havia participado da campanha “coleta de ouro” organizada pelo ditador, doando inclusive a sua medalha de Prêmio Nobel. Como poderia? Tanto ele quanto Pound lá estavam engrossando aquelas fileiras detestáveis. Inacreditável. Era como se revisse o que se dera com meu progenitor.

 


Da desolação ao ânimo ressurreto... – Imagens: a arte do fotógrafo sul-africano Sam Haskins (1926-2009). – Não fosse a chegada inesperada da poeta cantante israelita, Naomi Shemer (1930-2004), não saberia eu o que fazer da vida. Chegou-me com um poema, Ainda não amei o suficiente: Com estas mãos / ainda não construí uma aldeia, / ainda não encontrei água / no meio do deserto, / ainda não desenhei uma flor, / ainda não descobri como / o caminho me levará / ou para onde vou. / Eu ainda não amava / o suficiente o vento e o sol / no meu rosto. / Ainda não amei o suficiente / e se não for agora, quando? / Ainda não plantei erva, / ainda não construí uma cidade, / ainda não plantei vinhas / em todas as colinas, / ainda não fiz tudo / com as minhas próprias mãos, / Eu ainda não tentei tudo que / ainda não amei o suficiente... E suas mãos alisaram-me a face e me abraçou ternamente e me beijou ardentemente para dançar nua, coxas, lábios e sexo por todo meu ser, como se fosse a coreógrafa francesa Janine Charrat (1924-2017), viva entre meus sonhos e divagações pelas ruas e desertos.

 


Mandíbula eleata... – Lá estava eu errante solitário e era uma epígrafe de Octávio Paz (alicerces do poema absoluto): Para o homem moderno, tudo lhe é estranho (inclusive o humano?) e em nada ele se reconhece. Eram as ressonâncias de ontens e amanhãs, o texto no corpo e a crença de que a poesia salva a alma do romance: Amanhã vou roubar um espelho com o sol dentro e dois simulacros de esmeralda distraída além de um turbante e uma chávena. Era o fluxo noturno de inconsciência sem alma, que se tecia num soneto primeiro: Amanhã não é outro dia, é a noite que dorme. E quatro poemas brotaram com outros tantos que eclodiram em seguida porque Sempre morremos à noite. Prove o contrário. E saltaram haicais com todas as náuseas de Sartre e a fórmula do caos Einstein & Freud verdades sem máscaras porque como Rilke O poeta combate com o anjo, ao louco e sublime Holderlin. A poesia é noturna na mandíbula: confesso que costumo roubar crepúsculos e moedas de lua velha (de prata encarquilhada), e eleata: o silêncio de Pitágoras contempla as planícies de alma, olha sais nascendo, é a lua bebendo o leite celeste entre os catetos do universo. E era como se olhos de Heráclito nos sussurros de Parmênides pelas lembranças lascivas das eternidades e mineração de infinitudes, filosofopoemas e naufrágios. E esta mandíbula eleata na dedicatória: Ao ancho côncavo cálice profundo lúcido lustroso e ilustre umbigo estrela do corpo. E Admmauro Gommes foi além da poesia e o Zé Ripe perplexo poema Vital. Nada mais que um Coração de areia num verbete do Dicionário anticrítico de êmbolos e lampejos na Pálpebra de pedra e era a Prosa do futuro arcaico na Insólita clepsidra dos 50 poemas escolhidos peloautor. E se era Borges & Eugénio era um Bando de Mônadas no Dado Acaso e no Catálogo de ângulos, para que se desse o Crepúsculo do pênis no Hímen de Mallarmé, só porque Kant não estuprou a camareira com todas as Confissões de Ave sólida, Ora pro nobis Scania Vabis. E eram as Inesperadas nêsperas na Fractália lírica do Id no Atanor da poesia absoluta do Vate vital. Poesia absoluta sim, Poesia Absoluta no Título provisório em que Ana de Amsterdam inaugurava a Gesta pernambucana em que tudo fosse uma Segunda edição da Semata e da Burocracial exasperação, para que outras tantas Mônadas testemunhassem Palpo a quimera e o tremor. E o poeta olhos acesos pedisse mais que lúcido no meio da noite: Quiçá, menos luz. Porque Só às paredes confesso, porque A poesia salva a alma. E viva a vida! Até mais ver.

 

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