AS PRESEPADAS DE CAMÕES CAMONGE – Muitas me contaram desde menino das
presepadas de Camões e Camonge que, no frigir, era um só. Lembro-me bem de
algumas delas, outras nem tanto. Só sei que ria demais, quantas lorotas
versejadas ou amiudadas jocosamente sobre mulheres perdidas e taradas, viúvas
reboculosas e prinspas afogueadas; muitas pinoias sobre princesos destronados, cavalo-mago,
pederastia, fodelança, vivacidade, acerto de contas, quiprocós e lá vai teibei,
tudo levado no tom do risível para entretenimento das patotas mais libertinas.
Aquela mesmo dele entrar num desafio com um sábio que expôs uma maçã e ele, em
resposta, um pão. Depois um dedo, ele dois; três dedos e ele a mão fechada como
enfiando, remexendo e, por fim, dando uma banana. O sábio reconheceu ser ele a
maior sabedoria já encontrada. E não era, né? Quem sabe dessa vai achar
arretada a anedota. Também a que ele aprontou com o padre: precisando de
dinheiro, achou ele de cagar na frente da catedral da matriz. Excretando aquele
tolotaço, colocou o chapéu por cima, escondendo o crime. Lá vinha o padre: Meu
filho, aquele chapéu num é seu? É sim, senhor. Oxe, por que não o põe nesse sol
quente? É que peguei um passarinho e quero achar uma gaiola. Um passarinho?
Sim, uma sabiá que além de cantora é compositora, das boas. Ah, quer vender?
Vendo. Pago 100. Se me der 200 tá fechado. Então vá pegar a gaiola na casa do
sacristão. Só se o senhor me pagar logo e emprestar o cavalo para eu ir buscar
lá. Então, tá. E lá foi ele atrás do sacristão. E demorou, nem voltou mais. O
padre perdeu a paciência e quanto foi pegar o passarinho, melou as mãos na
maior fedentina. Amaldiçoado! Fidapeste! Uma senhora ia passando: Padre,
chamando nome feio? Ora, ora. Ah e as apostas dele com o rei, venceu todas.
Findou numa trama de ser aprisionado num saco e levado por caboetas para ser
jogado num poço fundo. No meio do caminho, pararam para descansar.
Aproveitando-se disso, ele começou a gritar que não queria casar com a filha do
rei. Um boiadeiro ia passando e ouviu aquilo: Como é que é, hem? Tô nesse saco
porque não quero casar com a prinspa! Oxe, eu quero. E libertou Camões Camonge e
ficou no lugar dele: Eu quero casar com a filha do rei! Eu quero! A trupe dos
capangas quando viu aquilo, sacudiu-lo no poço e era uma vez. Por sua vez,
Camões Camonge saiu com uma boiada bonita e foi mostrar ao rei: Como pode você
estar aqui? Ah, Deus ajuda a quem só faz o bem. Como assim? Fui jogado num poço
dentro de um saco e cada vez que eu dava uma timbungada pegava um boi e sou
dono, agora, dessa boiada. Ah, eu quero, vá me bote num saco e me jogue nesse
poço. Ora, o senhor já é rico, tem tudo! Quero mais, vá! Olhe lá, seu rei. Vá,
tô mandando. Tudo bem. O rei mandou a cabroeira carregá-lo até o poço que
jogaram o suposto Camões e, como líquido e certo, era uma vez um rei. E Camonge
casou com a rainha. Aí veio a festa no céu. Seguinte: São Pedro estava
recebendo muitas reclamações dos animais. Ele foi ter com o Todo-Poderoso que
disse que ele resolvesse com os animais, que não mudaria nada da sua criação.
São Pedro então resolveu convidar todos os animais, excetuando os macacos que
são trelosos demais e os cachorros que na horagá do metiê fica enganchado na
cadela. Aí Deus, justo como sempre, disse: Ou faz uma festa para todos ou para
nenhum. Atrapalhou os planos de São Pedro. Aí lá vinha Camões Camonge recebendo
reclamação dos cachorros e macacos, então sabendo da armação do santo: Ah, isso
não pode. Vamos lá. E foi interceder em favor deles. Subiu pro céu e lá foi
logo dizendo: Queéqueéisso, SumPedo? Ah, não se preocupe, eles já podem entrar,
Deus liberou. Os cachorros mais que afoitos logo tentaram entrar, mas foram
barrados! São Pedro advertiu: Só se deixarem o fiofó pendurado na entrada para não
atrapalhar a festa. Aí cada cachorro foi, pendeurou o oiti-goroba lá no cabide
certo e danou-se lá pra dentro, deixando Camões Camonge do lado de fora: Bando
duns fi duma chola perdida. Aí, armando das suas, reuniu os macacos e
cochichou: Quando vocês entrarem, troquem os frosquetes dos cachorros, uns dos
outros; eles vão ver. Assim fizeram: trocaram os furicos dos cachorros e saíram
aprontando das suas no meio da festa. Três dias depois, os cachorros saíram com
o toba trocado, um cheirando o cu do outro para conferir até hoje. Camões
Camonge só na risada! Ah, depois conto mais, tá? Vamos aprumar a conversa, fui!
© Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais abaixo e aqui.
DITOS & DESDITOS
[...] Estamos
diante de uma escolha ética crucial: ou se objetiva, se reifica, se
“cientifica” à subjetividade ou, ao contrário, tenta-se apreendê-la em sua
dimensão de criatividade processual. [...] A análise não é mais interpretação transferencial de sintomas em função
de um conteúdo latente preexistente, mas invenção de novos focos catalíticos
suscetíveis de fazer bifurcar a existência. Uma singularidade, uma ruptura de
sentido, um corte, uma fragmentação, a separação de um conteúdo semiótico – por
exemplo, à moda dadaista ou surrealista – podem originar focos imitantes de
subjetivação. [...] Cabe à função
poética recompor universos de subjetivação artificialmente rarefeitos e
re-singularizados. [...] O capital
esmaga sob sua bota todos os outros modos de valorização. O significante faz
calar as virtualidades infinitas das línguas menores e das expressões parciais.
O ser é como um aprisionamento que nos torna cegos e insensíveis à riqueza e à
multivalência dos universos de valor que, entretanto, proliferam sob nossos
olhos. [...] a máquina fala com a
máquina antes de falar com o homem e os domínios ontológicos que ela revela e
secreta são, em caso, singulares e precários. [...].
Trechos extraídos da obra Caosmose: um novo paradigma estético
(34, 1992), do filósofo, psicanalista e militante revolucionário francês Félix
Guattari (1930-1992). Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
A ARTE DA BAILARINA MAYARA MAGRI
A premiadíssima jovem bailarina brasileira Mayara Magri é a primeira solista do The Royal Ballet. Nascida na
comunidade carente de Maracaí, num
morro do Rio de Janeiro, conseguiu
iniciar seus estudos artísticos por meio do projeto social “Dançar a Vida”, que
beneficia crianças e adolescentes moradores das comunidades carentes da Tijuca,
no Rio de Janeiro, com dança e arte. Daí ela ganhou uma bolsa de estudos aos oito
anos de idade, seguindo para a P'tetite Danse School, no seu estado. Depois ganhou
o Senior Age Division do Youth America Grand Prix e o Prix de Lausanne
Scholarship and Audience Prize em 2011. Em seguida foi para a The Royal Ballet
School e se formou na Companhia em 2012. Ela foi promovida a First Artist em
2015, a Soloist em 2016 e a First Soloist em 2018. Hoje ela conta com 25 anos
de idade e segue conquistando o mundo com a sua arte. Veja mais aqui, aqui,
aqui e aqui.
O MITO CAMONIANO DE GILBERTO MENDONÇA TELES
[...] A existência no folclore brasileiro de entidades de natureza pícara,
como a de Pedro Malasarte, do "Menino Sabido", da raposa, do coelho,
do jabuti (que vence pela astúcia), misturada com as personagens de natureza
mítica, como o Saci, o Caipora, o Romãozinho e tantas outras, concorrem para a
criação de uma figura móvel e generalizada que age como anti-herói, juntando
astúcia e malandragem, inteligência e sensualidade e dando esse notável
sincretismo mítico-lingüístico do Nordeste - o Camonge, mistura dos
significantes e dos significados concernentes a Camões e a Bocage. Daí, se não
um "ciclo", pelo menos uma "corrente" camoniana na
literatura oral e de cordel do Nordeste brasileiro, onde se criam, talvez por
compensações biográficas, alguns parentes (irmão, filho) de Camões. Vejamos
então como através desses aspectos o nome e a obra de Camões se foram "da
lei da morte libertando" e se tornando cada vez mais popular, embora, como
o confessava Mário de Andrade, a obra mesmo nem sempre tenha sido convenientemente
lida e estudada. [...] E se há realmente um episódio a que ele está
preso, só pode ser o do Camões cuja vida foi cheia de contrastes: de gentil-homem
e trinca-forte, de herói e mendigo, de soldado e náufrago. Esses elementos
biográficos juntaram-se aos elementos antitéticos da epopéia (sobretudo os da
luta de mouros e cristãos) e ganharam repercussão na alma coletiva [...] De qualquer forma, o termo é o mesmo - um Camonge cujo significante e
significado provém da mistura mitológica de Camões e Bocage, os escritores
portugueses que mais atuaram na cultura popular do Brasil. [...]
Trechos de O mito camoniano: a influência de Camões na
cultura brasileira (Revista de Letras, 1980/81), do poeta,
advogado e professor universitário de Teoria da Literatura e Literatura
Brasileira, Gilberto Mendonça Telles. Veja mais Lendas aqui e aqui. E mais do autor aqui, aqui,
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