ESCRITOS NA AREIA – Para quem sabe ou não, o Sol nasce para todos de uma
forma ou de outra: cada um presta atenção como pode ou quer. O que sei é que quando
me dei conta de que tudo sabia, parecia nada, apenas um fantasma enredado, um
mudo sonhador diante: “A grande senda não
possui portões. Milhares de estradas entram nela. Quando alguém atravessa o
portal sem portões caminha livremente entre o céu e a terra”. Ora, era tudo
muito complicado ao entendimento, sempre. Então, segui a estrada que pude para encontrar
a entrada certa: quando não houver portões, para entrar é preciso inventá-los e
depois suprimi-los, só assim o verdadeiro portal será atravessado. E me
reinventei com a primeira flecha, leve; a segunda, penetrou profundamente. Aí o
mundo era outro: tão amplo pra quem vê o som, ouve a luz e nada diz, cheira a
vida, digere a tigela com as cascas e sementes de todas as coisas, toca tudo na
concha da mão vazia: como é lindo testemunhar os pássaros cantando entre as
flores perfumadas de todos os matizes. Quase sabia que pro cego de nariz alto tanto
faz a luz ou a escuridão; e mesmo que ele leve uma lanterna, também será pro
outro se estiver apagada: ninguém saberá dele. Um pouco mais: pra quem
determinado ou pretendente das amenidades, algo pode se abrir a qualquer momento,
o ouro do pó ou iluminação: só quem souber será premiado. E eu me vi no embarque
do aeroporto pra imensidão do céu, do cais pras profundezas dos oceanos, da
porta de casa pra ganhar as ruas e rodovias do fim do mundo. Enfim, a vida é a
confluência de todos os caminhos e nenhum. As ilusões perturbam e, quando menos
se espera, fenecem e se dissolvem, só assim se sabe do engodo: navios em águas
rasas, sandálias na cabeça, o osso da língua - o tolo não sabe qual a primeira
ou a última verdade, o erro sai pela boca e a fala tagarela é como o peixe
encontra o anzol. Isso sou eu, patético. De outra forma, o drama jamais seria
comédia porque não se luta com as armas alheias, não se cavalga com o cavalo de
outro. É preciso perdoar e não só pancadas por não se saber digerir a verdade,
qualquer que ela seja. Só depois de quinhentos renascimentos, o coração realiza
pelas dez partes do mundo, seguindo as pegadas dos 10 Touros para entrar no
portal sem portões. Sim, tentei, segui. Procuro escrever cartas legíveis, meus
garranchos se escondem aos relâmpagos, as palavras não resistem a um piscar de
olhos: ninguém ouve entre o instante e o infinito tempo, meus pés pisam a Terra
pura: onde houver lógica não haverá graça, nada faz sentido. Dentro da minha
casa os sábios me desconhecem e ninguém, muito menos, sabe do jardim invisível que
cultivo iluminando cada uma das minhas vértebras para aprender que o caminho é
a vida diária e o outro que continue o poema. © Luiz Alberto Machado.
Direitos reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS
Ir à praia cedo, como na infância. as ilhas no
horizonte ainda estão veladas pela névoa da madrugada. O mar andou bravo esta
noite, arrancando algas e mexilhões das pedras, em seu grande assanhamento de
lua; respirar seu hálito acre; dar um mergulho na água fria, na praia ainda
solitária, levar umas pancadas de onda, voltar para o sol na areia. E andar à
toa ao longo da praia, chapinhando na espuma branca. Mas encontro, com
surpresa, uma senhora conhecida. [...] Eu me
afasto mais; longe, me sento na areia, e fico olhando o quadro. Contra a luz,
já não distingo as feições nem ouço a voz da mulher. Assim, com a silhueta
cortada contra a luz que se reflete no chão molhado, ela parece estar nua com o
seu menino. É apenas uma jovem fêmea que ensina o mar e o mundo à sua cria;
transmite-lhe a experiência da espécie e o sentimento dos deuses; na sua graça
matinal esse batismo tem uma beleza solene.
Crônica Batismo (Rio, setembro, 1959), extraída da obra Ai de ti, Copacabana (Record, 2006), do
escritor Rubem Braga (1913-1990). Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui
e aqui.
DEZ CASOS DE AMOR DE JOÃO CÂMARA
Dez casos de amor e uma pintura de
Câmara (1977) é o
título de uma série reunida em um caderno de fontes com diversas litografias,
um tríptico, pinturas, gravuras, montagens e objetos do premiadíssimo pintor
paraibano residente em Olinda – PE, João
Câmara. Veja mais aqui.
RÁDIO
TATARITARITATÁ:
Hoje curta na Rádio Tataritaritatá a música da pianista e professora Lídia Bazarian: Poemeto, Miragem, Manhã e Segundo Solo para
Cortázar. Para conferir é só ligar o som.
E mais:
O Sol nasce
paratodos aqui.
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Vale do Una aqui.
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Missiva do
Esconjurado, Walter Benjamin, Uma Carta de
Miguel Jasseli, A musa sem máscara de Maria Áurea Santa Cruz, Um poema de
Lourdes Sarmento aqui
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