SOLILÓQUIO VESPERTINO - A tarde é viva inteira nesta quinta,
enquanto o Sol reina inextinguível em mim e emigro às doze horas como quem
singra o ignoto a me projetar adiante do que posso e voo. Quatrocentas estrelas
brilham no meu sorriso, tudo é tão imenso e real. Ninguém sabe, eu sei, onde
está quem procuro o coração revelado na escolha da voz doce para celebrar seja
qual for o seu nome bendito além do que espero. Às treze horas digo ponteiro
impreciso que não posso viver livre se das entranhas privo o que anseio, como
se me bastasse uma benção da mãe morta por refúgio, entregue às feras, atirado
ao penhasco, entre o propício ou nefasto, não importa mesmo que à tarde o céu
risonho nuble as florescidas cores da vida e eu tenha errado de mim sem saber
pra onde na tempestade repentina que se anuncia. Tudo é tão estranho,
quatrocentos sonhos tombados no caminho, a glória entre blasfêmias. Chegar onde
estou não é pouco, quase um cidadão da cidade das ideias, pelo menos uma janela
aberta e tanta coisa pra fazer. Valho-me do encorajamento das fisionomias
carrancudas e nenhuma coroa de louros, o que há de ser minha vida mendigando
afetos entre malogros, súplicas e lamentações de fracos e risíveis, porque às
quinze e cinco a luz no quarto fechado, o postigo e à porta estou para que às
dezesseis eu saiba o tempo passar imperceptível, anos e décadas que esqueci
desde às dezessete e trinta de ontem, desabotoando o peito, olhos no espelho,
detritos que preciso varrer, funerais, sepulturas, às duras penas com a frescura
do entardecer refrescando o calor da intérmina solidão e tarda a noite à
alvorada, ninguém responde, nenhum consolo e uma mão toca ao ombro e não vi
pálpebras curiosas as quatrocentas cicatrizes do corpo. Voo só, nada é mais
preciso que o imprevisível. Quem, às quatorze em ponto chamou por meu nome e
não vejo se bem ouvido familiar menção que não lembro dalgum tempo longe como a
lembrança perdida. Não há porque me apegar com a esperança imprescindível e hei
de viver a cada ausência o que me resta e ser levado a morrer longe em terra
estrangeira numa invernada de extrema urgência que sou aqui mesmo pelo que foi
de reinos e nações, para ressurgir na primaveril salvação de naufrágio com
sonhos podres que nem amanheceram. E se demoro agora de outono a verão com ar
de pouco caso pelas difusas sensações fustigantes e os calafrios solitários medindo
os astros e as obras do amor nos mil pedaços de mim, só para que eu tenha vida
o porvir. É que não hesito entre a chance e a adversidade, o que me inquieta
são às dezoito horas ter de hastear a noite ao crepúsculo, e sorrir de bom
grado, grato ao ventre em que fui gerado com todos os tormentos humanos e um
suspiro se esvaindo ao derradeiro aceno do tempo de areia a escorrer entre os
dedos. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS
[...] As pessoas que, como eu, amam a vida acham que é idiota suicidar-se.
[...] Anuímos à vida: vamos dar-lhe nossa
anuência até o fim. [...] Ajuda-se
uma pessoa mostrando-lhe que não é um pária por pensar nisso. Ela achava que
isso era ruim, mas vê que faz parte da cultura, que é exprimível, é o drama
humano de todos. A solidão não é evitável, a angústia não é evitável, as
fantasias de suicídio não são evitáveis. Todos temos de passar por isso. Não é
nem bom nem mau. É a condição humana. Então, podemos colaborar uns com os
outros. É viver. Que nem sempre se consegue, é verdade. [...] A solidão está mais no desamparo de não ter
linguagem, muito mais do que no fato de não ter complemento físico para
produzir frutos. [...] A maior dor,
quando amamos alguém, é não podermos impedir que ela sofra da solidão. Sofrer
de solidão faz parte da existência humana. Pessoas que se amam não podem
impedir que o outro sofra de solidão. Não é uma questão de amor de uma pessoa
pela outra, mas da qualidade da falta, que a outra não pode suprir. [...]. Trechos
extraídos da obra Solidão (Martins
Fontes, 1999), da médica e pediatra francesa Françoise Dolto
(1908-1988). Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.
A ARTE DE GENINHA ROSA BORGES
A premiadíssima atriz Geninha da Rosa
Borges – a Grande Dama do Teatro Pernambucano -, construiu uma trajetória
iniciada com sua formação em Pedagogia e Letras na Faculdade de Filosofia do
Recife, realizando na sua carreira exitosa iniciada em 1941, resultando na
realização de 63 peças teatrais, 10 filmes e dirigiu 21 espetáculos. Participou
do Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP), coordenou a partir de 1968 a equipe do
Sistema Nacional de TV e Rádio Educação, designada pelo Ministério da Educação
e Cultura (MEC), participando de programa pioneiro de aulas teatralizadas para
o rádio. Atuou, entre outros filmes, de Parahyba Mulher Macho, em 1983, e Baile
Perfumado, em 1997. Participou do elenco das novelas A Favorita e Da cor do
pecado, da Rede Globo. Ocupa a cadeira 33 da Academia de Letras e Artes do
Nordeste.
Veja mais aqui.
A
FOTOGRAFIA DE FRANCESCA WOODMAN
A arte da fotógrafa estadunidense Francesca
Woodman (1958-1981). Veja mais aqui & muito mais na Agenda aqui.