O IMPERADOR & SEU GENRO MALQUISTO – O que possuía de terra, tinha de
ruindade. Era o Zé Imperador, antes só Zé: pobre, pedra-ruim. Revoltou-se
contra tudo e todos, pense num cabra injuriado; dava um berro, o mundo tremia, vento
parava, as águas se acovardavam. Venha cá, elas vinham. Cadê os peixes? Eles
chegavam. Onde fica a Pedra Funda? Ninguém sabia. Descubram! Maior correria, só
a piaba soube e disse. Foram pro fundo do mar. Chegando lá, a ordem: Vamos
arrastá-la, nem saiu do lugar. Convocou o que podia, baleias vieram, toda
força, a pedra à beira-mar. Pronto, voltem pros seus, cambada! Aí trouxe bodes,
bois, búfalos e outros chifrudos até de um olho só, cada marrada na pedra, chega
o chão estremecia. Arrocha! Ela racha ou eu não me chamo Zé. Sentou o cabelo
até que a pedra se ventou e acabaram de arrebentar. Aos farelos, ele pegou uma
coisa que tinha lá, ninguém sabia, desconversou, dispensou tudo e foi pro
escuro do quarto. Ninguém sabe, só que ele enricou daí por diante. Estibado e
mandão, casou com uma galegona jeitosa que o que tinha de quartos tinha de
formosura, coisa mais bonita de se ver, chega dava água na boca de tão formosa.
Do casal, um dia, a notícia: a filha nasceu. E ele lá nele: Tô mole. Era Fia, menina
virada, parecia menino de tão desassombrada, talqualzinha um cafuçu. Cresceu
feito macho, escritinha, num tinha quem não dissesse, era a peste, da pá
virada. Vencia qualquer peleja, destronava qualquer valentão, viesse quem
fosse, ela lá, vitoriosa. Isso até o dia em que enfrentou o filho do pescador
que também era Zé. Esse, um dia pegou um peixe destamanho que lhe falou: Você
vai me levar ou me jogar de volta pra trazer muitos outros peixes. Era o diabo,
fez o pacto, agora afilhado dele e da santa de devoção. Cabra sabido. Jogou-lo
de volta, um cardume ao seu dispor. Tangeu a tuia pra casa, não tinha tanta
precisão. Fez festa com todos, pirão e farinha, enriqueceu-se e mandava no que
era seu. Mas veio a bronca com a filha do Imperador, pensou que era outro, de
igual pra igual, golpe aqui, tome ali, socadas, pernadas, murro na venta, o pau
cantou por horas. Quando foi ver, era mulher. Mesmo assim, acochou e aprumou. Depois
da contenda, rendeu-la, botou-la na garupa e na primeira moita, ela fechou os
olhos e ele acunhou lavando a jega: ela se perdeu com ele. Emprenhou. Maior
armada. E uma bronca medonha: Filha minha não fica à toa. Vou capar esse
fidapeste. E a cabroeira ia e voltava. Toleimas, tudo frouxo. Ah, vai ser na
marra, a pulso. A pugna, os dois geniavam: Parace que veio mandado. E se
agarraram chega saía raio do litígio, acabaram os dois morre mas num morre. A Fia
embuchada foi lá ver os dois moribundos. Ao lado deles um sujeito estranho.
Quem é você? Vim buscar o que estão me devendo, a alma deles. Como é? Quando
ela armou-se toda para enfrentá-lo, ele disse: Esse menino que taí no seu bucho
serve, troco pelos dois, fechado? Mas, menino! Mesmo gestante, a mulher deu com
a brabeza e enfrentou o Coisa-ruim. Oxe, quem era doido? Mulher dessa, nem o
diabo podia e botou pra correr. Até agora ninguém sabe o fim da história, quem
morreu, quem ficou vivo; de certo mesmo é que entrou pela perna de pinto e saiu
pela perna de pato. Isso, quem souber que conte. © Luiz Alberto Machado.
Direitos reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS
[...] Aristóteles pensou o coração como sede do pensamento. Depois a cabeça
teve essa honra. Galiano designou diversas funções mentais para as diversas
partes do cérebro. Mas como continua sendo difícil pensar (imaginar,
apresentar, definir, mesmo questionar), esse lugar do pensamento! Sem dúvida, o
interior de nossa cabeça continua invisível a nossos olhos. Quanto às
impressões endógenas, às sensações kinestésicas, elas são pobres e sugerem
unicamente, segundo os psicólogos, “um domo ou uma caverna” que enchemos com
nossas imagens visuais e nossas invenções autoscópicas. [...] Nada saber disso, desse lugar. Mas como ele
tem presa sobre nós, como o alcançamos, como nos toca? Os artistas sem dúvida
não resolvem nenhuma das questões deste tipo. Pelo menos, deslocando os pontos
de vista, revirando os espaços, inventando novas relações, novos contatos,
sabem encarnar as questões mais essenciais, o que é bem melhor que acreditar
responder a elas [...].
Trechos extraídos da obra Ser crânio: lugar, contato, pensamento,
escultura (C/Arte, 2009), do filósofo,
historiador, crítico de arte e professor francês Georges Didi-Huberman. Veja
mais aqui e aqui.
A ARTE DE J. BORGES
O meu nome hoje é muito falado, mas
não chega um quarto do que vai ser depois do meu fim.
A fama sem ter dinheiro nem a todo
mundo agrada.
A fama pelo trabalho honesto, mesmo
sem dinheiro é boa.
A fama vem sem estudos, mas nunca vem
sem trabalho.
Na casa da inteligência, a burrice
não se hospeda.
Extraído da obra
Memórias e contos de J. Borges
(Gráfica Borges, s/d), do artista cordelista J. Borges (José Francisco Borges). Veja mais aqui.
A
DANÇA ARMORIAL DE MARIA PAULA COSTA REGO & GRIAL
A arte da coreógrafa, dançarina,
pesquisadora, professora e produtora cultural Maria Paula Costa Rego que atuou no Balé Popular do Recife e fundou, em 1997, o Grupo Grial.
Veja mais aqui.
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