O AMOR DE
ZINHAZINHA & CALANGUINHO ZÉ – Imagem: arte do
fotógrafo e artista visual Merve Ozaslan.
- Não fosse o embuchamento de Bezinha de Carrinho Calango e o de Nega Conça e
João Buchudo, não haveria compadrio mais estreito, daqueles tipo fábula de La
Fontaine: juntos prosperavam. A prenhez de ambas levou ao pacto de que
seguiriam ali, haja o que houvesse, para sempre, encangados um no outro. E selaram
com um peido quádruplo. As mulheres refugaram: Não pode haver outro jeito? Não.
E foi: poin, poin... poin... e.. poin. É que Bezinha quase caga fora do caco,
não esperava a bosta pronta pra sair naquela hora. O acordo mútuo só não
rebentou na mesma hora, por causa do vexame de Calanguinho Zé nascer quase
antes do tempo, por conta de uma escapulida de um pum fora de hora da mãe, de
agilizar o parto e o menino sair quase melado de merda com um berreiro maior do
que aquelas igrejas de crentes que pensam que Deus é surdo, pense no maior
zoadeiro. Não demorou muito e Zefinhazinhazinha abria a porteira do mundo depois
de uma ajeitada nas pregas do cu, pra lançar uma menina ao coro ao avexado, numa
felicidade geral. Com o passar do tempo ninguém nem mais sabia quem era filho
de quem, o casalzinho de filhos pra lá e pra cá, tudo tratado como se tivesse
dupla paternidade e quase se tornavam siameses de tão unidos que eram. Brincavam,
comiam, aprontavam, largavam peidação e só não adolesceram juntos, porque João
Buchudo teve que mudar de cidade, levando a mulher e a filha na cacunda
peidorrenta. A tragédia não foi maior porque se prometeram visitas mútuas de
tempos em tempos, o que não se deu devido situação periclitante que ficaram
depois da separação: fedidos juntos não precisavam de mais ninguém. Anos se
passaram e Calanguinho Zé já rapaz quase homem feito, topou com aquela que
buliu no seu coração, assim do nada. Quem seria? Ela também ao vê-lo sentiu que
as coisas iam mais pra desmantelo que para simples saudação, e de lá ficou naquele
pisca-pisca olha-não-olha. Ambos tímidos, não saíram do lugar. Foi preciso um
incidente para que se aproximassem. Ele: Que coisa, né? Ela: É. Que terá sido?
Quem sabe. Será que vai dar certo? Sei não, tomara. E assim ficaram bom tempo,
até a hora um gás surgiu assim inadvertidamente. Hum? Nem ele nem ola ousou
acusar um ao outro, mas logo se identificaram. Ambos sem jeito, resolveram ir
embora, despedindo-se. Você vem amanhã por aqui? Pode ser. Na mesma hora? Sim.
Tá certo. No dia seguinte, lá estavam. Não tinham o que dizer, ela tomou a
dianteira: Você veio pela estrada ou pelo atalho? Pelo atalho. Viu um tolote
raçudo na curva do pé de abacate? Vi, caprichado, hem? Fui eu. Mesmo? Sim.
Menina, você é corajosa de botar um daquele, quase não acredito. Quer apostar
quem faz maior de nós dois? Vixe! Agora? Agorinha, ora. Onde? Vamos pegar o
atalho de volta. Só se for agora. E foram. Chegando no local combinado, ela
disse: Comece. Ah, ele se servia da ética profissional: Primeiro, as damas. Com
todo prazer. Ela acocorou-se, ajeitou a saia pra que não visse o que fazia e
dali a pouco a inhaca comeu no centro. Ao levantar-se, disse: Pronto!
Inacreditável! Faça melhor. Agora? Vá, mande ver. Assim? Ora. Calanguinho não
teve dúvidas, arriou as calças, fechou os olhos, fez força e deu um estalo:
poin. Menino, cê tá podre! O seu não foi nada cheiroso, menina. E se riram. Conferiram,
o dela era mais compacto, o dele meio espalhado. Pra tirar a dúvida, apostaram
no número de flatulências. Ah é? Vamos? Era só tocar no bucho e tome
borborigmos: A gente vai terminar envenenando o ar, hem? Destá. Na risadagem se
conheceram melhor: Sou Calanguinho Zé e você? Sou Zefinhazinha, pode me chamar
de Zinhazinha. Filha de João Buchudo e Nega Conça? Sim. Sou Calanguinho de
Bezinha e Carrinho! É mesmo? Quanto tempo, hem? A gente é quase irmão! E saíram
com o peidorreiro rua acima, vila abaixo, até encontrarem os pais dele, darem
as novas e reatarem a amizade de antes, afinal compadres da família. Eles não ligavam
a mínima em queimar a reputação por conta das suas brincadeiras. Foram até os
pais dela e no meio do caminho, bastou soar a campainha, ela desoprimia o peito
e poin. Ele não ficava por baixo, levantava a perna esquerda e soltava o
traque. Quando não, apostavam no meio do caminho no quem é quem. Aí paravam
numa bodega qualquer, se fartavam duma dieta arretada e fechavam com a ingestão
de pimenta malagueta para o maior baile. Se há uma coisa que apreciavam era um
se amostrar pro outro. E pegaram a estrada ensaiando umas bufas. Ela recomendou:
Não se deve passar fósforos nos pés de quem tem cócegas. E se riam, chegou a
hora da aposta e totalmente triunfante ela soltou o gás: Eita, cagou! Nada, sua
vez. E lá vinha a bombacha: toin. Lascou-se. Nada. E ficaram poin toin até se esvaírem
juntos cu ardendo na bacia d’água fria. Ela olhou pra ele e disse: suas pernas
são zambetas. E ele que as dela eram cambitos. Vamos nessa? Vamos. Ela levava a
mão ao ventre, encarcava do estômago estremecer, fazia força na alavanca da
tripa gaiteira e tome rajada. Ele levantava a perna direita e tome trovão. Ela rebolava
os quadris e: Vixe, melei a calcinha. Ele empinou a bunda: oxe, tá na cueca. Findavam
lívidos, olho no outro: coisas tristes não devem ser pensadas – e sorriam. Vamos
aguar as plantas? A maior risadagem. Quem se habilita? Ele abriu o zíper da
calça e mandou ver na mijada. Ela admirando o pênis dele disse: Bonito pau, mas
ganho docê. Ajeitou a calcinha de lado, espremeu o bico da vagina e lançou um
jato mais longe que o dele. Danou-se! Ele ficou abestalhado e ela com aquele
esgar irônico, sapecava: Quem é capaz de beber o próprio mijo, desafiou. Como ele
não era adepto da urinoterapia, abriu do pau com um peraí e ela se ria: Deixe
de leseira. Tenha fé, não vamos estragar. E se abraçaram pela primeira vez,
exultantes, deixando no ar aquela catinga nauseante, até perderem os sentidos
numa capoeira: já não são tão bons quanto imaginavam que fossem, desfaleceram.
Eram mesmo uns peidões sob qualquer ponte de vista. E assim foram felizes para
sempre, pelo menos até agora, né? © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais aqui.
DITOS & DESDITOS:
[...] Conheci
em Londres, dois destes gêmeos ligados, chamados comumente de irmãos siameses e
denominados cientificamente de xifópagos. Edward-Edmond possuíam fortuna
considerável, o que os dispensava de exibir-se como fenômenos. [...] Na adolescência, se pareciam de maneira
extraordinária, a tal ponto que as pessoas, que não diferençavam a sua esquerda
de sua direita, não conseguiam distingui-los. Porém, com o advento da idade,
surgiram entre eles, diferenças morais, muito profundas. Edward era dado aos
estudos e tinha pontos de vista severos, ao passo de Edmond tinha instinto
plebeu. [...] Edward fez-se erudito
conhecido. Mas não podia ser convidado frequentemente a banquetes de
sociedades cientificas, pois o inconveniente Edmond, a partir da sopa,
principiava a contar histórias obscenas, que as pessoas decentes reservam, em
geral, para a sobremesa. No ano passado Edward pediu a mão de uma jovem bela e
rica. O matrimonio realizou-se com grandes pompas. Não houve outra solução
senão convidar Edmond, que, aliás, se portou bastante bem a cerimonia. Teve a
impressão de que a cunhada o intimidava ligeiramente. No cortejo nupcial, a
esposa de Edward, o dito Edward, Edmond e sua dama de honra, desfilaram, os quatro
em fila, em meio a admiração geral. Edmond na noite de núpcias, foi muito
delicado e discreto. Adormeceu antes que os outros e, na manhã seguinte,
aparentou despertar muito tarde. Durante a lua de mel de seu irmão, bebeu com
menos frequência, cuidou do vocabulário e vestiu-se decentemente, pois que
deveria sair em companhia de uma senhora. A jovem esposa – já lhes disse que se
chamava Cecily? – exercia enorme influência sobre Edmond. Ao fim de certo
tempo, aconteceu, o que acontece muito a miúdo, quando se introduz um rapaz
solteiro em seu lar. Cecily e o pérfido Edmond encetaram relações culposas. Durante
seis meses, Edward de nada se apercebeu. Porém, tudo se acaba por saber. Edward
encontrou, em uma caixa mal fechada, umas cartas e soube de maneira
insofismável que sua mulher e seu irmão o traíam diariamente. Que partido
tomar? Bater-se em duelo com Edmond, seria entrar em conflito com os costumes
ingleses. Temia também as soporíferas discussões dos padrinhos. O duelo, com
pistolas, resultaria impossível, bem como o com espadas, dada a proibição do
corpo a corpo. Além do mais que sucederia se matasse o irmão? Poderia continuar
a vida em comum com sua mulher? Sempre haveria um cadáver entre eles! Chamou Cecily.
– A partir de hoje – disse-lhe – não mais profanarás o domicilio conjugal. Vai-te.
– Está nem – disse ela. - Está bem – disse Edmond – eu a acompanho. O marido
não teve outro remédio que segui-los. Edmond instalou Cecily num apartamento
deveras confortável. E, como entre xifópagos, tudo termina por acomodar-se, os três
viveram muito felizes.
Trechos do conto História de dois irmãos siameses (Cultrix, 1969), do dramaturgo,
novelista, jornalista e advogado francês Tristan
Bernard (pseudônimo de Paul Bernard, 1866-1947).
A ARTE
DE MERVE OZASLAN
A arte do fotógrafo e artista visual Merve Ozaslan.
AGENDA:
&
Certo, errado?, Raduan Nassar, Eugene O’Neill,
Camilo José Cela, Coral Bracho, Pierre Bourdieu, John Keynes, Vera
Fischer, Esther Gracia Marques, Jupi, Edu Lobo, Chiquinha Gonzaga, Renato
Borghetti & Zélia Duncan aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje curta na Rádio
Tataritaritatá a
música do compositor, arranjador e estudioso César
Guerra-Peixe
(1914-1993): Sinfonia Brasilia, A retirada da Laguna, Suíte Pernambucana &
Luis Gonzaga Sinfônico & muito mais nos mais de 2
milhões & 900
mil acessos ao
blog & nos 35 Anos de Arte Cidadã. Para
conferir é só ligar o som e curtir. Veja aqui, aqui e aqui.