O QUE SERÁ DO QUE SEMPRE FOI – Imagem: arte da
pintora, fotógrafa, gravurista e xilogravurista Vera Chaves Barcellos. - Alagoinhanduba não saiu na manchete do
jornal! Nunca, nem poderia, a mesma vida besta de sempre. Tirante certa vez as
acrobacias dum comboio de OVNIs, capitaneado pelo Padre Bidião e seguido por
seus nove clones e beatas mil na maior das farras, e o encerramento ruidoso do
Big Shit Bôbras com toda população furiosa no maior linchamento por sobre catabís
e pés na bunda, nada mais passou além de boatos e fuxicaria na maior
normalidade. Bem que podia, é que uns dias chovem, outros mais e sempre sim,
apesar do império do sol que, invariavelmente, é deposto da sua soberania por chuvadas
adventícias. Do contrário, como dizem as más línguas, entre uma casa e outra um
corno pede penico e tudo termina bem. Ali todos amam a terra e a corroem como
britadeiras predatórias e prosperam, falem e se dizem amigos na hora da fartura
e da miséria, apesar de falarem mal uns dos outros, bastando virar as costas e
logo, então, passar o ausente pra banda dos desafetos com uma punhalada nas costelas
– a menos que acertem na titela -, do tipo inimigo público número 1. Não há
quem não veja por conta própria atos de caridade festiva aos abraços,
perdigotos e flatulências em pleno meio dia, quase todo dia da semana. Tapinhas
nas costas, pulhas e risadagens fazem o repertório das saudações diárias, e isso
faz aquela do que foi e o que não é, o que há de muvuca e de perdição, é coisa
pouca, pois, se tivesse de escolher entre a vida e a morte, por mais não se saberia
da lida trôpega, o batalhão de invejosos que mutuamente não se suportam, as
intrigas frequentes pelas insuportáveis vaidades e hipocrisias, quanta
mesquinharia, meu Deus, entre professores sabichões, bestas quadradas e vilões,
tirante uma grande percentagem quase maioria de sem-vergonhas com todas as
regras higiênicas e morais, afora as pilantragens e fanfarronices usuais, uma
solução para tudo no meio duma gambiarra que não passa de uma leviandade, e nem
se atrevem a dizer na cara, porque sequer sabem o que é de João, o que é de Zé,
se Maria e Zefinha não se entendem mais, o amor e seus desatinos no peito com o
eco das paixões não perdendo por esperar. Todo mundo lá quer o saco do Papai
Noel, vez que há um espírito natalino todo final de semana, quando na segunda
haja guerra com peido-de-véia pra cima e pra baixo, pé-na-goela, golpe baixo e
rasteiras, pra render na sabedoria popular do pé na cova, a abjeção ao parasita
de plantão e um monte de aborrecimentos que deles procedem e que afinal são
todos que não se reconhecem como tais. Mas, quem não, né, ainda se encontram
com seus janeiros, setembros e maios, uma só brecha e o irrenunciável atiça os
confins de trilhas opostas, se ofendem, arengam, fazem as pazes, enquanto as
facas afiadas do tempo vão pras vésperas das saudades agudas, no meio dos rumores
das fontes e cada um arrimo dum e doutro, na maior torcida de araque, até onde
se pode ver a visão e as vendas da ignorância, a surdez pelos gritos do
compadrio aos pipocos de pistolas, as mordaças das evacuações orais por conta
de que ninguém é besta de meter a língua nos dentes e acabar mudo de pai e mãe,
o paladar pras bufadas dos maiorais sem poder regurgitar o que está saindo pelo
ladrão de tão indigesto, o olfato sem distinguir dos perfumes e catingas porque
vale mesmo a ocasião, o tato e a confusão das superfícies e texturas por conta
dos cheleleus e suas paparicadas na maior da caboetagem, o raso e as funduras
nem aí que está bom demais, as paredes e grades pra quem não tem simancol de
respeitar carteirada, as rezas e novenas pros calabouços e grilhões do coração,
porque tudo que vai pra lá volta pra cá e amanhã será outra coisa e ninguém
está bestando de cuspir pra cima e não sair de baixo, porque o que vem de cima
não escolhe vítima e Alagoinhanduba passa noite e passa dia é a mesma de sempre
desde sempre, haja o que houver. © Luiz Alberto Machado. Direitos
reservados. Veja mais abaixo e aqui.
RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especial com a música da cantora e atriz Zezé Motta: Missão & 45 anos na ABL; a pianista e cantora Maira Freitas: Nua & Êta; & muito mais nos mais de 2 milhões de
acessos ao blog & nos 35
Anos de Arte Cidadã. Para
conferir é só ligar o som e curtir. Veja mais aqui e aqui.
PENSAMENTO DO DIA – [...] Como o valor de uso, a solidariedade
consciente e deliberada entre os homens é relegada ao domínio privado das
relações de família ou de amizade; nas relações inter-humanas gerais e
notadamente nas econômicas, pelo contrário, a função de uma e de outra
tornou-se implícita, obscurecida pelos únicos fatores que fazem agir o egoísmo do
Homo-oeconomicus, que administra racionalmente um mundo abstrato e puramente
quantitativo de valores de troca. [...].
Trecho extraído da obra Dialética e
Cultura (Paz e Terra, 1991), do filósofo e sociólogo francês Lucien Goldmann (1913-1970). Veja mais
aqui, aqui e aqui.
A CIDADE & O DIREITO À VIDA – [...] a cidade, obra e ato perpétuos, dá lugar a instituições específicas:
municipais. As instituições mais gerais, as que dependem do Estado, da
realidade e da ideologia dominante, têm sua sede na cidade política, militar,
religiosa. Elas aí coexistem com as instituições propriamente urbanas, administrativas,
culturais. [...] O direito à
cidade se manifesta como forma superior dos direitos: direito à liberdade, à individualização
na socialização, ao habitat e ao habitar. O direito à obra (à atividade
participante) e o direito à apropriação (bem distinto à propriedade) estão
implicados no direito à cidade. [...]. Trechos extraídos da obra A natureza e o domínio da natureza (Paz
e Terra, 1969), do filósofo e sociólogo francês Henri Lefebvre (1901-1991), que em outra obra Uma revolução cultural não pode desenrolar-se fora do campo política
(Revista Triunfo – Editorial O Século, 1970), expressou que: [...] Trata-se de problemas urbanos, talvez isso
se deva ao fato de ser na cidade – mais do que na indústria, como força
econômica – que descobriremos, que revelaremos, as condições desta apropriação,
pelo ser humano, da sua própria vida, dos seus próprios desejos, do tempo e do
espaço em seu redor. [...].
A TERCEIRA MARGEM DO RIO - [...] Nosso pai não voltou. Ele não tinha ido a
nenhuma parte. Só executava a invenção de se permanecer naqueles espaços do
rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca mais.
A estranheza dessa verdade deu para estarrecer de todo a gente. Aquilo que não
havia, acontecia. Os parentes, vizinhos e conhecidos nossos, se reuniram,
tomaram juntamente conselho. Nossa mãe, vergonhosa, se portou com muita
cordura; por isso, todos pensaram de nosso pai a razão em que não queriam
falar: doideira. Só uns achavam o entanto de poder também ser pagamento de
promessa; ou que, nosso pai, quem sabe, por escrúpulo de estar com alguma feia
doença, que seja, a lepra, se desertava para outra sina de existir, perto e
longe de sua família dele. As vozes das notícias se dando pelas certas pessoas —
passadores, moradores das beiras, até do afastado da outra banda — descrevendo
que nosso pai nunca se surgia a tomar terra, em ponto nem canto, de dia nem de
noite, da forma como cursava no rio, solto solitariamente. Então, pois, nossa
mãe e os aparentados nossos, assentaram: que o mantimento que tivesse, ocultado
na canoa, se gastava; e, ele, ou desembarcava e viajava s'embora, para jamais,
o que ao menos se condizia mais correto, ou se arrependia, por uma vez, para casa.
No que num engano. Eu mesmo cumpria de trazer para ele, cada dia, um tanto de
comida furtada: a idéia que senti, logo na primeira noite, quando o pessoal nosso
experimentou de acender fogueiras em beirada do rio, enquanto que, no alumiado
delas, se rezava e se chamava. Depois, no seguinte, apareci, com rapadura, broa
de pão, cacho de bananas. Enxerguei nosso pai, no enfim de uma hora, tão custosa
para sobrevir: só assim, ele no ao-longe, sentado no fundo da canoa, suspendida
no liso do rio. Me viu, não remou para cá, não fez sinal. Mostrei o de comer,
depositei num oco de pedra do barranco, a salvo de bicho mexer e a seco de chuva
e orvalho. Isso, que fiz, e refiz, sempre, tempos a fora. Surpresa que mais
tarde tive: que nossa mãe sabia desse meu encargo, só se encobrindo de não
saber; ela mesma deixava, facilitado, sobra de coisas, para o meu conseguir.
Nossa mãe muito não se demonstrava. [...]. Trecho
extraído do conto A terceira margem do
rio, recolhido da coleção Ficção Completa (Nova Aguilar, 1994), do escritor,
médico e diplomata João Guimarães Rosa (1908-1967). Veja mais aqui e
aqui.
UM POETA - Hás
de testemunhar ruínas / antes de existirem ruínas: / engenheiro de troços e
destroços / empreitaras demolições — / desmoronaste muros. / Profeta — risca
riscaste riscarás / roteiros de pássaros no ar — e riscas / calendários
passados e futuros — riscas / a arquitetura dos escombros / antes durante e
depois deles / os tempos ouvem ouviram e ouvirão / esses passos de pedra / que
pisam pisaram pisarão / rosa, lírio, jasmim e às vezes / ovelhas imoladas. / Maios,
janeiros, setembros e os outros meses / meses azuis e meses pluviais / te
saúdam à beira das falésias à beira-mar à beira-rio / à beira-abismos à beira
séculos: / piloto do naufrágio / governador dos tempos tetrarca dos milênios / arquivista
— tabelião das eras / só os dias, poeta, e as noites, te conhecem / sabem teu
nome / e nenhum outro nome. Poema do poeta, jornalista, tradutor e biógrafo
Gerardo Mello Mourão (1917-2007). Veja mais aqui e aqui.
VLADO 30 ANOS DEPOIS
O
documentário Vlado - 30 Anos Depois
(2005), dirigido pelo cineasta, roteirista e escritor João Batista de Andrade, oriundo do livro homônimo escrito pelo diretor,
conta a história do jornalista Vladimir
Herzog, o Vlado, que foi torturado e assassinado na prisão, em 1975 durante
o regime militar brasileiro, com os depoimentos e memória das pessoas que
conviveram com ele.
&
A arte da pintora, fotógrafa, gravurista e xilogravurista
Vera Chaves Barcellos.
&
&
Ela acolheu meu desterro, a literatura
de Vidiadhar Naipaul, a música
de Keith Jarret, Sueli Costa, Eumir Deodato & Rita Lee, a arte de Ewa Ludwiczak & Luciah Lopez aqui.
&
O amanhã de ontem pra hoje, a literatura de Guimarães Rosa, o cinema de Krzysztof Kieslowski, a arte de Tarsila do
Amaral & a música de Marcus Viana aqui.
APOIO CULTURAL: SEMAFIL
Semafil Livros nas faculdades Estácio de Carapicuíba e Anhanguera de São
Paulo. Organização do Silvinha Historiador, em São Paulo.