domingo, maio 01, 2016

GANDHI, HESÍODO, TARSILA, MILTON & CHICO, TRABALHO & PRIMEIRO DE MAIO


PRIMEIRO DE MAIO - O melhor dia de trabalho é o primeiro de maio porque é feriado, isso quando não cai num dia de domingo, senão é mesmo que nada, ora. Afora esse dia, só os finais de semana que são denominados de repouso remunerado, ou as férias remuneradas. Tá bom. O resto é tudo dia de branco: maior trampo. Posso estar redondamente enganado, mas isso não faz a menor diferença. Isso é só pra dar um pontapé nesse papo, manifestando minha insatisfação com a usual conceituação do labor humano numa ótica convencional do processo industrial e capitalista. Fugindo do reducionismo de que o trabalho é apenas uma atividade que produz algo para outras pessoas, e de que é a atividade que dignifica ou de que Deus ajuda a quem madruga trabalhando, há também quem diga que ele serve para aquisição do domínio sobre si mesmo e adquirir sentimento de valor pessoal mediante a avaliação dos outros sobre os seus resultados, o que dá no mesmo. O que quero ressaltar é que o homem começou a trabalhar pela primeira vez quando lhe deu fome: ou caçava, ou morria. Precisando sobreviver, saiu explorando o espaço ao seu redor, a natureza. Depois de encher a pança, a sesta. Cansado de coçar o saco, investiu na desbravação do ambiente, foi aí que aprendeu a usar de madeiras e ossos, a lascar a pedra, a dominar o fogo e a cerâmica, a criar animais, a cultivar plantas, a inventar a roda e a fundir os metais na criação de armas rudimentares pra caça. Com isso, foram se sobrassaindo os mais sabidos e os mais fortes: uns sabidos passaram a governar, outros a filosofar, enquanto os que não eram lá tão bem providos das ideias, usavam da força. Apareceram, então, os dois lados da moeda: as histórias dos gloriosos trabalhos de Hércules e os inglórios de Sísifo, contadas por Homero e Hesíodo. E assim foi desde então, nascendo o primeiro ditado de que trabalha o feio pro bonito comer e que, depois, virou o da faina de mouro quem desfruta é o esperto, estes os manhosos que se prestam a dar continuidade ao trabalho das parcas: Cloto segurava a roca, Láquesis virava o fuso e Átropos em seguida cortava o fio, tudo isso porque as deusas infernais viviam de tecer a trama humana. Huuummmmm. Entendeu? No meio disso, dizem, havia também os que trabalhavam pro bispo: sem lucro, sem glória ou proveito. Eita! Tudo isso dando conta de como a evolução do trabalho foi da escravidão até os dias de hoje, nos quais quem gosta de trabalho é workaholic – ou melhor, quem é viciado em trabalho, trabalhador compulsivo e dependente do trabalho. Alguns poucos deles são multimilionários: estão a serviço de quem? Outros, uns tantos como eu, trabalham porque fazem o que gostam e só por isso. Outros muitos tantos possuem emprego: gozam das benesses da boa vida no reino da incompetência e ganham sem fazer nada, só ocupando os outros e dando trabalho à humanidade com a disfuncionalidade da burocracia, pois adoram dar nó cego e ver os outros pra lá e pra cá fazendo papel de bestas. Mais outros tantos trabalham apenas para ter o seu sustento, andar na moda e usufruir do status de estar empregado, exercendo o “estar” na profissão sem ter a menor vocação e não ter nada a ver com a mesma. Outrantos vivem pendurados nas circunstâncias: não levam desaforo pra casa, não se submetem à hierarquia e pintam o sete pro que der e vier, lícita ou ilicitamente se virando como podem pra defender as gambiarras do seu sustento e o que é seu. Muitoutrantos fazem o que podem com o que tiveram de oportunidades de qualificação ou semiqualificação ou mesmo diplomação que esconde a desqualificação, para serem digeridos pela meritocracia da colocação no cumprimento rígido de procedimentos e dos manuais internos, evitando-se o batalhão de reserva dos excluídos: outros fabos incompetentes. E por aí lá vai teibei. Pelo que posso ter de ideia, dos que possuem empregos majestosos aos que exercem suas profissões, sejam elas das mais humildes às mais chiques, ninguém está feliz com o que faz e com o quanto que ganha, excetuando-se, evidemente, aqueles que fazem o que gostam, reitero. Injustiças sempre vigoram e não é difícil encontrar um médico choramingando, ou um advogado se lamentando ou um engenheiro apertado: todos falam que trabalham demais para ter o que possuem ou para adquirir o que precisam. E que tudo tem o preço da impossibilidade de compra, exigindo-se aquela valsa de meses na aquição. O que quero mesmo levar em conta é que na vida, ou a gente está dormindo, ou trabalhando – óbvio que tem gente que faz outras tantas coisas, mas que aqui não vem ao caso. Ou seja, no dia a dia de uma penca de anos ou a vida toda, a gente está correndo atrás, se cansa e vai dormir; quando acorda, pé na bunda pra labuta, uns feito cantiga de grilo de domingo a domingo, a maioria de segunda a sexta, outros que vão até depois do meio dia de sábado, afora outro bocado de finórios que nem sabe o que é isso e que só dão o ar da graça um dia, dois ou mais por semana. Em suma: a gente vive pra trabalhar e vice-versa. Há o ditado de quem trabalha enrica - isso num país sério, até pode ser; porque aqui, só se amonta no bufunfa quem tem atributos corporais de chamar atenção, ou o sabido que sabe levar o que é dos outros, ou quem vive com dedo pronto pra rapar no gatilho e tomar o que é alheio. Pronto. Eu mesmo trabalho desde os dez anos de idade e nunca saí do lugar, pudera, nunca fiz nada que prestasse mesmo. Taí outro ditado: a ocupação laboral traz recompensas econômicas que determinam o padrão de vida e status social de cada um. Tradução: é mesmo? Parece. Mas quem trabalha de mesmo, veste a camisa na maior pilha, dá o sangue a ponto de se lascar todo, acabar com a saúde e findar da caridade alheia: inútil e chacoalhado de não valer um tostão furado. E quem comeu o vigor da gente, como é que fica? Eu hem!?! Como não estou dizendo coisa coisa, nem sou de reclamar, vou na do Hino Nacional “deitado eternamente em berço esplêndido”, entoando a Filosofia do Ascenso: Hora de comer, comer; hora de dormir, dormir; hora de vadiar, vadiar. Hora de trabalhar: pernas pro ar que ninguém é de ferro! Principalmente porque é Dia do Trabalho e, ainda por cima, é domingo, ora. E vamos aprumar a conversa & tataritaritatá! © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. 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 Imagem: Segunda classe (1933), da pintora brasileira Tarsila do Amaral (1897-1973). Veja mais aqui.

PRIMEIRO DE MAIO 
(Milton Nascimento & Chico Buarque)

Hoje a cidade está parada
E ele apressa a caminhada
Pra acordar a namorada logo ali
E vai sorrindo, vai aflito
Pra mostrar, cheio de si
Que hoje ele é senhor das suas mãos
E das ferramentas

Quando a sirene não apita
Ela acorda mais bonita
Sua pele é sua chita, seu fustão
E, bem ou mal, é o seu veludo
É o tafetá que Deus lhe deu
E é bendito o fruto do suor
Do trabalho que é só seu

Hoje eles hão de consagrar
O dia inteiro pra se amar tanto
Ele, o artesão
Faz dentro dela a sua oficina
E ela, a tecelã
Vai fiar nas malhas do seu ventre
O homem de amanhã.

PESQUISA
 Adam Smith (1723-1790), fudador da escola liberal clássica: O trabalho é a verdadeira e única fonte da riqueza das nações, pois os produtos, industriais ou agrícolas, são obtidos pelo esforço humano, que se torna sempre mais eficiente pela especialização. Agindo de acordo com seus interesses, o homem é conduzido, por mão invisível, ao desenvolvimento do bem comum.
David Ricardo (1772-1823), economista e político britânico: A base de todo o valor econômico é o trabalho-valor. O valor de troca de uma mercadoria é calculado pela quantidade de trabalho empregado na fabricação do produto. As máquinas têm como objetivo diminuir o valor de troca do produto. As máquinas também são trabalho humano acumulado.
Kark Marx (1818-1883), filósofo, sociólogo, jornalista e revolucionário socialista: Não é o trabalho em si que interessa ao capitalista, mas a mercadoria, não por seu valor de uso, mas por seu valor de troca. Se o capital conseguir produzir, em certo período de tempo, com duas máquinas o equivalente em produtos ao que cinquenta operários conseguiriam, ele ficará com as duas máquinas. Ao capitalista interessa baixar os preços de custo do produto, para acumular mais capital. Para isso, só lhe resta uma saída: diminuir o custo do trabalho. Isso pode ser conseguido diminuindo os salários, ou, ainda, substituindo o trabalho humano pela máquina, cada vez mais aperfeiçoada. O fruto do lucro no capital é um trabalho humano não pago: se o trabalhador consegue o que precisa em seis das oito horas que trabalha, as duas horas restantes ele trabalha para manter o capital e garantir que se reproduza, o capital assim obtido é a mais-valia.
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EPÍGRAFE
Os sete pecados sociais, do advogado, idealizador e fundador do moderno Estado indiano, Mohandas Karamchand Gandhi (1869-1948), o grande Mahatma Gandhi. Veja mais aqui, aqui, aqui e aqui.

LEITURA
Os trabalhos e os dias (Hedra, 2013), poema épico do poeta oral grego Hesíodo (cerca de 750-650aC). Veja mais aqui e aqui.

PENSAMENTO DO DIA
Para quem tá naquela da fábula de Esopo - de que a formiga só trabalha porque não sabe cantar -, no dia mundial do trabalhador, como toda formiga que se preze, ela comemora o Dia da Literatura Brasileira. Cuma? Eita! E quem quer saber disso? Pois é, uma data dessa só prova que a literatura do Brasil só serve pra estrangeiro ver.

Veja mais Salmo da Cana, o Projeto de Extensão Infância, Imagem e Literatura: uma experiência psicossocial na comunidade do Jacaré – AL, Auguste Rodin, Chico Buarque, Peisândro de Rodes, Monteiro Lobato, Hércules, Hesíodo, Émile Zola, Vinicius de Moraes, Cândido Portinari, Jorge Luis Borges, Nelson Rodrigues, Charlie Chaplin, Magda Mraz & Darlene Glória aqui.

CRÔNICA DE AMOR POR ELA
1º de Maio, Dia do Trabalhador: comemoração da secretária do Tataritaritatá!
Veja aqui e aqui.

CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Recital Musical Tataritaritatá
Veja aqui.



PATRICIA CHURCHLAND, VÉRONIQUE OVALDÉ, WIDAD BENMOUSSA & PERIFERIAS INDÍGENAS DE GIVA SILVA

  Imagem: Foto AcervoLAM . Ao som do show Transmutando pássaros (2020), da flautista Tayhná Oliveira .   Lua de Maceió ... - Não era ...